terça-feira, 12 de janeiro de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.436, 1.437 Da Extinção do Penhor – VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.436, 1.437

Da Extinção do Penhor – VARGAS, Paulo S. R.

- Parte Especial –  Livro III – Capítulo II – DO PENHOR

Seção IV – Da Extinção do Penhor – (Art. 1.436 e 1.437)

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 Art. 1.436. Extingue-se o penhor: 

I - extinguindo-se a obrigação; 

II — perecendo a coisa;

III - renunciando o credor;

IV — confundindo-se na mesma pessoa as qualidades de credor e de dono da coisa;

V — dando-se a adjudicação judicial, a remissão ou a venda da coisa empenhada, feita pelo credor ou por ele autorizada.

§ 1º Presume-se a renúncia do credor quando consentir na venda particular do penhor sem reserva de preço, quando restituir a sua posse ao devedor, ou quando anuir à sua substituição por outra garantia.

§ 2º Operando-se a confusão tão-somente quanto a parte da dívida pignoratícia, subsistirá inteiro o penhor quanto ao resto. 

Segundo entendimento dos autores Guimarães e Mezzalira, a primeira causa extintiva do penhor é a extinção da obrigação por ele garantida. Em se tratando de direito acessório, extingue-se com a extinção do principal, salientando-se que, nos casos de pagamento, este deve ser integral, tendo em vista o disposto no CC 1.421. 

O perecimento da coisa também constitui causa extintiva do penhor. Se houver destruição parcial, a garantia subsiste em relação à parte remanescente.

Também a renúncia do credor, extingue o penhor. Trata-se de um ato de vontade, podendo ser expressa ou tácita, sendo que o § 1º do CC 1.436 prevê os casos em que há presunção da renúncia, como nas hipóteses de consentimento da venda particular do penhor sem reserva de preço, da restituição da posse ao devedor e de anuência à substituição por outra garantia. 

A extinção do penhor pela confusão ocorre quando, na mesma pessoa, se confundem as qualidades de credor e dono da coisa empenhada. Se a confusão for apenas parcial, substituirá inteiro o penhor quanto ao resto. 

A adjudicação judicial, a remição e a venda da coisa empenhada também implicam na extinção do penhor, tratando-se de medidas disciplinadas pela legislação processual civil. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao CC 1.436, acessado em 12.01.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No saber de Francisco Eduardo Loureiro, o artigo em exame arrola o preceito das causas de extinção do penhor, sem caráter taxativo. Outras causas, além das previstas na lei, são indicadas pela doutrina: a resolução do domínio do bem empenhado, a usucapião do bem empenhado; o decurso do prazo do penhor; a remição ou resgate do penhor. 

O caput substituiu corretamente o termo “ resolve-se” por “extingue-se”. A resolução é termo com significado próprio, de extinção do contrato bilateral por inadimplemento do devedor ou onerosidade excessiva. É espécie de extinção do contrato. 

A primeira causa de extinção do penhor é a extinção da obrigação garantida. Como explica Clóvis Bevilaqua, “o penhor é constituído para assegurar o pagamento de uma obrigação. É acessório desta. Se a obrigação se extingue, desaparece a razão de ser do penhor; ele extingue-se por via de consequência e falta de fundamento” (Direito das coisas, 3. ed. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1951, p. 96). 

Como acessório da obrigação, o penhor segue a sorte jurídica desta. É irrelevante que a extinção se dê por pagamento ou sem pagamento (novação, compensação, confusão, transação). Anota Caio Mário da Silva Pereira que “quando o débito é extinto sem satisfação do credor, poderá subsistir a relação pignoratícia, mas é preciso que interfira a vontade neste sentido, como ocorre com a novação; se outra obrigação se contrair extinguindo-se a primeira, resolve-se com esta o penhor que a assegurava; mas subsistirá se, ao novar-se, o penhor é transferido explicitamente para a nova obligatio” (Instituições de direito civil, 18. ed. atualizada. Rio de Janeiro, Forense, 1995, v. IV, p. 358). 

No caso de pagamento com sub-rogação, o solvens assume a posição do antigo credor, com as garantias e qualidades do crédito original (CC 349). Também não sobrevive o penhor à extinção da obrigação por decadência ou por invalidade - nulidade ou anulabilidade. Embora divirja a doutrina, o melhor entendimento é o de que, prescrita a pretensão da obrigação garantida, não mais faz sentido a persistência do penhor, diante de sua inexigibilidade. É verdade que o pagamento voluntário pelo devedor de crédito prescrito é eficaz e não comporta repetição, mas nenhuma relação guarda com a garantia real do penhor. Parece evidente que, prescrita a pretensão, a retenção do bem empenhado pelo credor até o pagamento constituiria manifesto ato ilícito. 

A segunda causa de extinção é o perecimento da coisa. Pode o perecimento dar-se pela destruição total ou perda da coisa. Se a destruição for parcial, persiste o penhor sobre o remanescente, em vista da indivisibilidade da garantia real. Se o bem empenhado se encontrava no seguro, ou for indenizado por terceiro causador da perda, não se opera extinção, mas sub-rogação no valor da indenização, como visto no comentário ao CC 1.425, § 1º. Se o bem empenhado se perdeu por culpa do credor, seu valor é compensado com o da obrigação garantida. Lembre-se de que o penhor se extingue pela perda do bem, mas persiste a obrigação como crédito quirografário, com vencimento antecipado (CC 1.425). 

A terceira causa de extinção é a renúncia do credor, que pode desistir da garantia em vista de seu caráter patrimonial e disponível. Somente aquele que tem a livre disposição de seus bens pode renunciar à garantia. Pode a renúncia dar-se por ato inter vivos ou causa mortis. Se ocorrer por procurador, se exigem poderes expressos e especiais. Não se exige outorga uxória, por se tratar de bens móveis.

A renúncia pode ocorrer de forma expressa, sempre por escrito, para constituir título hábil a instruir pedido de cancelamento no registro de títulos e documentos ou imobiliário (no caso de penhores especiais).

Pode, ainda, ocorrer de forma tácita, como previsto nas três hipóteses exemplificativas do § Iº deste artigo. Nada impede que outros comportamentos concludentes do credor, embora não arrolados no dispositivo, deixem evidenciado o desejo de renunciar à garantia. As hipóteses do § Iº são: a) o consentimento na venda do bem empenhado sem reserva do preço; b) a restituição de sua posse ao devedor que, na forma do CC 387, já comentado, que prova a renúncia do credor à garantia, mas não ao crédito. Claro que essa regra não se aplica aos casos de penhores especiais rural, industrial e mercantil, ou sobre veículos, nos quais a posse direta não se transmite ao credor; c) a anuência do credor à substituição da garantia. 

A quarta causa de extinção (inciso IV) é a confusão, porque é natural que, se o credor adquire o bem empenhado, não mais há direito real de garantia sobre coisa alheia. Do mesmo modo, se a própria obrigação se extingue em razão da confusão, com ela se extingue a garantia real acessória. O § 2º deste artigo completa o preceito, ressalvando que, se a confusão se opera apenas quanto à parte da garantia, persiste o penhor quanto aos demais bens empenhados.

Finalmente, a quinta e última causa da extinção do penhor (inciso V) opera pela adjudicação, arrematação e remissão-resgate (e não remissão-perdão, como se encontra grafado neste artigo). A excussão do bem empenhado faz com que o credor se satisfaça com o respectivo preço, de modo que o arrematante receba o bem livre e desonerado. É irrelevante que o crédito garantido supere o valor da arrematação, porque o saldo, esgotada a garantia, se converterá em crédito quirografário. Igual fenômeno ocorre se há venda amigável autorizada por cláusula contratual ou por procuração, se o credor adjudica o bem empenhado, ou se há o resgate da dívida por terceiro interessado ou parentes do devedor.

Não explicita o preceito a possibilidade de credor quirografário penhorar e levar o bem empenhado a leilão e seus efeitos em relação ao credor garantido. Aplica-se por analogia o disposto no CC 1.501, adiante comentado. O bem empenhado é alienável e, portanto, penhorável. Não extingue o penhor devidamente registrado a arrematação ou adjudicação feitas por credor quirografário, se não foi notificado o credor pignoratício que não foi, de qualquer modo, parte na execução. A arrematação e adjudicação são válidas, mas ineficazes frente ao credor pignoratício, continuando empenhado o bem.

Os penhores especiais pecuário, industrial e mercantil tornam os bens inalienáveis e, portanto, impenhoráveis. Serão analisados nos comentários aos CC 1.445 e 1.449 os efeitos da inalienabilidade/impenhorabilidade frente aos demais credores com privilégio legal. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.536-37.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 12/01/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo o comentários de Talita Pozzebon Venturini, o CC 1.436 elenca os fatores de extinção, quais sejam: a) Extinção da obrigação principal (devido sua característica de acessoriedade), conforme assevera Rizzardo (2011, p. 1041): Constituem forma de extinção da dívida: o pagamento, a remição, o perdão, a anulação do crédito e a confusão, sendo que nesta, as qualidades de devedor e credor se concentram na mesma pessoa. O que por óbvio, descaracteriza a relação contratual que exige a presença de dois contratantes;

 

b) Conforme reza o CC 1.436, II, o penhor cessa com o perecimento do objeto, porém a obrigação subsiste, uma vez que o penhor é apenas acessório da obrigação;

c) A renúncia do credor que consiste em abdicar da garantia;

d) A confusão entre o credor e o dono da coisa que pode ocorrer quando o credor adquirir a propriedade do bem;

e) Ainda nas hipóteses do CC 1.436, V, ocorrerá a extinção do penhor “dando-se a adjudicação judicial, a remição ou a venda da coisa empenhada, feita pelo credor ou por ele autorizada”.

Outras causas admitidas para a extinção do penhor são a reivindicação do bem empenhado, passando a um terceiro o domínio da coisa e o vencimento do prazo bem como o resgate do penhor por meio do pagamento da dívida, como explica Arnaldo Rizzardo. (Talita Pozzebon Venturini, intitulado “Direitos reais de garantia: breve análise sobre penhor, hipoteca e anticrese”, publicado em outubro de 2015 no site Jus.com.br, acessado em 12.01.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Em artigo produzido por Thiago Cássio D’Ávila Araújo, intitulado “Do penhor”, publicado em março de 2016 no site da Jus.com.br., diz: “Extingue-se o penhor (CC 1.436): I - extinguindo-se a obrigação; II - perecendo a coisa; III - renunciando o credor; IV - confundindo-se na mesma pessoa as qualidades de credor e de dono da coisa; V - dando-se a adjudicação judicial, a remissão ou a venda da coisa empenhada, feita pelo credor ou por ele autorizada. 

Na hipótese do inciso I do 1.436, como o penhor é acessório da obrigação principal, extinta esta, extingue-se aquele, seja qual for a causa da extinção da obrigação principal, se por pagamento direto, pagamento indireto, como na consignação em pagamento, ou sucedâneo de pagamento, como na compensação, transação ou novação. Mas, como já vimos, admitem-se exceções, como a ressalva expressa, na novação (CC 364), transmitindo a garantia para a nova obrigação.

Exige-se a quitação total do débito principal, para extinção do penhor. Se a quitação for apenas parcial, ainda que quase total, permanece o penhor na integralidade, em razão do princípio da indivisibilidade da garantia (CC 1.421). 

Ainda, vale lembrar que a sub-rogação transfere ao novo credor todos os direitos, ações, privilégios e garantias do primitivo, em relação à dívida, contra o devedor principal e os fiadores (CC 349), seja sub-rogação legal (CC 346) ou convencional (CC 347). É que, ainda que a sub-rogação cause o fim da obrigação, tal se dá por substituição de uma dívida por outra e o penhor subsiste como garantia desta nova obrigação.

Resolve-se o penhor também pelo perecimento da coisa apenhada (CC 1.436, II), i.é, se todo o objeto perece (“Sicut re corporali extincta, ita et usufructu extincto pignus vel hypotheca perit”).

É que a própria existência do penhor, enquanto contrato, depende da existência do penhor, enquanto coisa dada em garantia, por tratar-se o penhor, ademais, de direito real de garantia, i.e., que incide sobre coisa (res). Em havendo o perecimento da coisa garantidora do débito, resolve-se a garantia, mas a obrigação principal continua a existir. Como já vimos, o perecimento da coisa, sem substituição da garantia, ocasiona o vencimento antecipado da dívida (CC 1.425, IV).

Se o perecimento do bem deu-se por caso fortuito ou força maior, o penhor se resolve ficando o credor sem qualquer garantia especial e a obrigação passa, então, à condição de crédito quirografário, perdendo a preferência; se por culpa do credor, este responde pelo prejuízo causado ao proprietário da coisa, seja o devedor pignoratício, seja o terceiro garantidor; mas, havendo indenização, por seguro ou por terceiro responsabilizado pelo perecimento da coisa (ressarcimento do dano), a garantia se sub-roga no valor desta indenização, em benefício do credor, a quem assistirá sobre ela preferência até seu completo reembolso (CC 1.425, § 1º). Inclusive, não se fará o penhor de veículos sem que estejam previamente segurados contra furto, avaria, perecimento e danos causados a terceiros (CC 1.463).

Também, extingue-se o penhor pela desapropriação da coisa empenhada, já que o proprietário passará a ser a Fazenda Pública, que nada tem com esta relação travada entre particulares. A desapropriação, inclusive, gera a antecipação do vencimento da dívida garantida pelo penhor, hipótese na qual se depositará a parte do preço que for necessária para o pagamento integral do credor (CC 1.425, V). Em reforço, diga-se que o art. 31 do Decreto-lei 3.365/41 prevê que: “Ficam sub-rogados no preço quaisquer ônus ou direitos que recaiam sobre o bem expropriado.”

Há, todavia, que atentar-se que a sub-rogação dos créditos com garantia real no valor da indenização (preço da desapropriação) não se opera automaticamente, querendo isto significar que é necessária a prévia excussão da dívida pelas vias próprias, pelo credor contra o devedor, para recebimento do crédito depositado em seu favor nos autos da ação expropriatória.

O inciso III do CC 1.436 trata da extinção do penhor pela renúncia do credor, enquanto ato unilateral, que pode ser expressa, por ato inter vivos ou causa mortis, ou tácita. O dispositivo trata exclusivamente da extinção do penhor por renúncia do credor a esta garantia, passando o crédito à condição de quirografário. No entanto, se o credor renunciar ao crédito da obrigação principal, evidentemente o penhor também estará extinto, em razão de seu caráter acessório.

A renúncia do credor, ao penhor, será tácita, nas hipóteses do § 1º do CC 1.436, i.é, quando o credor consentir na venda particular do penhor sem reserva de preço, anuir à substituição do penhor por outra garantia, ou, ainda, restituir a posse da coisa apenhada ao devedor (neste caso, obviamente, se tinha a posse do bem, por transmissão efetiva quando da avença de garantia real). Neste último caso, é relevante recordar também que a restituição voluntária do objeto empenhado prova a renúncia do credor à garantia real, não a extinção da dívida (CC 387). Por isso, mais uma vez frisa-se que no inciso III do art. 1.436 do Código Civil trata-se exclusivamente da extinção do penhor, não da extinção da obrigação principal. 

A Lei nº 11.101, de 09 de fevereiro de 2005, dispõe (art. 50, XI) que a venda parcial dos bens constitui meio de recuperação judicial, observada a legislação pertinente a cada caso. Todavia, faz ressalva, no § 1º do mesmo art. 50, de que na alienação de bem objeto de garantia real, a supressão da garantia ou sua substituição somente serão admitidas mediante aprovação expressa do credor titular da respectiva garantia.

O penhor também se extingue pela confusão (CC 1.436, IV), ou seja, se o credor vier a tornar-se o proprietário da coisa empenhada, por ato inter vivos ou causa mortis. De outro modo, dá-se a confusão também se o proprietário da coisa empenhada, devedor pignoratício ou terceiro, vier a tornar-se o titular do direito de crédito ao qual dirige-se a garantia. Operando-se a confusão apenas quanto a parte da dívida pignoratícia, subsistirá inteiro o penhor quanto ao resto, em razão do princípio da indivisibilidade da garantia (CC 1.436, § 2º). 

Nos termos do inciso V do CC 1.436, extingue-se o penhor pela adjudicação judicial, remissão ou venda da coisa empenhada, feita pelo credor ou por ele autorizada. O legislador errou a redação, claramente. “Remissão” da dívida é: “O ato de liberalidade do credor, perdoando a dívida ou renunciando ao direito de exigi-la”. 

A remissão do penhor seria, então, a renúncia à garantia, que, todavia, já veio prevista no inciso III, CC 1.436. Ademais, por referir-se ainda à adjudicação judicial e à venda da coisa empenhada, o inciso V do CC 1.436 insere-se num contexto que mais favoreceria à redação do instituto da “remissão”, por sua vez, 

“...a exoneração ou a salvação do ônus ou encargou da execução, pelo resgate ou pagamento, que se efetiva, do valor do débito, da obrigação, do ônus ou da execução”. 

E assim,

“Na ortografia oficial, no sentido de resgate, é remissão, de remir, não remissão de remitir” (para clarear o português: REMIÇÃO (verbo remir): perdão oneroso, por meio de algum esforço, como estudo ou trabalho. ... REMISSÃO (verbo remitir): perdão por compaixão, por misericórdia, sem nenhum ônus – Nota VD).

Vale registrar que, na falência, ao administrador judicial compete, sob a fiscalização do juiz e do comitê de Credores, remir, em benefício da massa e mediante autorização judicial, os bens apenhados (Lei n] 11.101/2005, art. 22, III, “m”).

Finalmente, o penhor pode ser extinto por outras causas não previstas no Código Civil, conforme entendimento presente na doutrina pátria. Por exemplo, pela resolução da propriedade da coisa gravada, pelo lapso do tempo pelo qual incide o ônus real conforme a avença pactuada ou, ainda, ocorrência de condição determinada pelas partes. (Thiago Cássio D’Ávila Araújo, artigo intitulado “Do penhor”, publicado em março de 2016 no site da Jus.com.br., Acessado 12/01/2021. Ref. CC 1.436 - Revista e atualizada nesta data por VD). 

Art. 1.437. Produz efeitos a extinção do penhor depois de averbado o cancelamento do registro, à vista da respectiva prova.

Como alerta Loureiro, o artigo em exame merece interpretação cuidadosa. O preceito pode ser dividido em duas partes: a) os efeitos da averbação do cancelamento do registro; b) a prova, ou seja, o título necessário para fazer a averbação do cancelamento.

Quanto à primeira parte, cabe lembrar que o registro do penhor gera consequências diversas, de acordo com sua modalidade. No comentário ao art. 1.432 do Código Civil, vimos que o penhor comum, ou vulgar, se constitui com a entrega da posse direta do bem empenhado ao credor. O registro não tem efeito constitutivo do direito penhor, mas apenas efeito publicitário. Gera oponibilidade contra terceiros de boa-fé. Os CC 1.438, 1.448 e 1.462, adiante comentados, que tratam respectivamente dos penhores rural, industrial/mercantil e de veículos, são expressos ao dispor que o direito real se constitui pelo registro. Como não há entrega da posse direta do bem empenhado ao credor, fica a cargo do registro toda a publicidade inerente ao direito real. Sem registro, não há direito real de penhor. 

Disso decorre que a extinção do penhor deve ser averbada nos respectivos registros (títulos e documentos para os penhores comum e de veículos; registro de imóveis para os penhores rural, industrial e mercantil), como, de resto, preveem os arts. 164/165 (RTD) e 248/254 (RI) da Lei de Registros Públicos (Lei n. 6.015/73).

Embora este artigo, de modo imperfeito, dê a impressão de que todos os efeitos da extinção do penhor ocorrem somente depois da averbação do cancelamento do registro, isso não é exato. Na verdade, há um fato extintivo e, como efeito desse fato, o cancelamento do registro do penhor. Entre as partes, via de regra o penhor deixa de produzir efeito desde o fato extintivo, mas, em relação a terceiros, somente a partir do momento em que se averba o cancelamento junto ao registro de títulos e documentos ou imobiliário, dependendo da modalidade da garantia. 

O que visa a lei é preservar o interesse de terceiros de boa-fé, como o cessionário do crédito pignoratício que, fiado no registro, ignora o anterior fato extintivo. Lembre-se apenas de que até mesmo em relação a terceiros há causas extintivas que constituem modo originário de aquisição da propriedade e que independem de ingresso no registro, como a usucapião ou desapropriação do bem empenhado. 

A segunda parte do artigo diz que a averbação do cancelamento do registro se faz “à vista da respectiva prova”. O art. 250 da Lei n. 6.015/73 melhor regula o tema e dispõe que o cancelamento se faz: a) em cumprimento de decisão judicial transitada em julgado; b) a requerimento unânime das partes que tenham participado do ato registrado; c) a requerimento do interessado, instruído com documento hábil. 

Exige-se um título instrumentalizado em documento para a averbação do cancelamento. Nem sempre se faz necessária a intervenção judicial. Em diversos casos, basta o requerimento da parte acompanhado de documento suficiente para, a um exame extrínseco, demonstrar a causa extintiva. A renúncia expressa instrumentalizada pelo credor por escrito, a quitação passada pelo credor, o decurso do prazo e o documento demonstrativo da alienação amigável da coisa empenhada a terceiro bastam para obtenção do cancelamento. Em outros casos, quando a causa extintiva depender do exame de fatos não demonstrados na face do título, como o perecimento da coisa, há necessidade de intervenção judiciai e o cancelamento se faz à vista de mandado. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.538-39.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 12/01/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Seguindo na toada de Talita Pozzebon Venturini, assim como o penhor comum, o penhor especial pode ser visto como um direito real de garantia, que visa assegurar uma dívida:

O Penhor Especial classifica-se em determinadas modalidades. São elas: penhor rural (agrícola e pecuário), penhor industrial e mercantil, penhor de direito de títulos de crédito, penhor de veículos e penhor legal. 

O Código Civil de 1916 previa o penhor agrícola e penhor pecuário, porém eram tratados conjuntamente. Posteriormente a Lei 492/37 passou a disciplinar o penhor rural, sendo o mesmo assunto acolhido pelo Código Civil de 2002, (subsistindo ainda a Lei 492/37 em alguns pontos que não enfoca o CC/02) o qual disciplina a matéria a partir do CC 1438, dividindo o penhor rural em agrícola e pecuário. (Talita Pozzebon Venturini, artigo intitulado “Direitos reais de garantia: breve análise sobre penhor, hipoteca e anticrese”, publicado em outubro de 2015 no site Jus.com.br, acessado em 12.01.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

No dizer de Thiago Cássio D’Ávila Araújo, ressalte-se que produz efeitos a extinção do penhor somente depois de averbado o cancelamento do registro, à vista da respectiva prova (CC 1.437). Assim, conforme for o caso, não havendo prova hábil ao cancelamento do registro, será necessária a decisão judicial transitada em julgado em favor do proprietário do bem dado em penhor.  

Como visto acima, são títulos executivos extrajudiciais os contratos garantidos por penhor. Contudo, o art. 785 do CPC/2015 vem com a estranha proposta de que: “A existência de título executivo extrajudicial não impede a parte de optar pelo processo de conhecimento, a fim de obter título executivo judicial”. 

Com base nesse dispositivo, não será inadmissível, portanto, que o credor pignoratício proponha ação de conhecimento, para condenação do devedor ao pagamento da dívida, ao invés de propor a execução do título extrajudicial. No entendimento do autor, todavia, tal iniciativa processual poderá significar a renúncia tácita do credor à garantia real, sendo hipótese de extinção do penhor, malgrado não esteja prevista no § 1º do CC 1.436.

Assim o será, porque a intenção do credor, ao propor a ação de conhecimento, será a de poder receber o valor da dívida a partir do título judicial, sem execução que se dê pelo título extrajudicial e penhora preferencial sobre o bem empenhado. Assim, dá-se a renúncia tácita ao penhor.

A consumação desta renúncia é quando, citado o devedor, tiver este contestado a ação, pois o credor (autor) não mais poderá desistir da ação de conhecimento sem o consentimento do réu. Com efeito, dispõe o novo CPC/2015: “Oferecida a contestação, o autor não poderá, sem o consentimento do réu, desistir da ação” (art. 485, § 4º).

 

A partir daí, pendente de julgamento a lide do processo de conhecimento, o credor não terá interesse de agir para propositura da execução do contrato garantido por penhor, enquanto título executivo extrajudicial, porque já ocorreu a extinção do penhor, de forma tácita. Melhor dizendo: o credor nem mais disporá de título executivo extrajudicial. É bem verdade que o § 1º do art. 784 do CPC/2015 também dispôs que: “A propositura de qualquer ação relativa a débito constante de título executivo não inibe o credor de promover-lhe a execução.”

 

Mas, note-se que, no caso do crédito pignoratício, tem-se como título executivo extrajudicial o contrato garantido por penhor e, não mais subsistindo o penhor por renúncia tácita do credor, não há mais título executivo extrajudicial, já que o contrato em si terá perdido tal eficácia, situação que difere de outros títulos executivos extrajudiciais, para os quais possa ser aplicado o referido § 1º do art. 784 do CPC/2015.

Entretanto, em razão do disposto no CC 1.437, deve haver decisão judicial, transitada em julgado, reconhecendo que, em hipótese como esta, houve renúncia tácita do credor ao penhor, o que pode obter-se por ação declaratória ajuizada pelo proprietário da coisa empenhada contra o credor, ou, ainda, por meio de embargos do devedor pignoratício à execução extrajudicial movida pelo credor, após ter o devedor contestado a ação do processo de conhecimento a que se referiu acima, ou mesmo por meio de embargos de terceiro, quando for terceiro o proprietário da coisa empenhada. A sentença, transitada em julgado, funcionará, na hipótese, para as finalidades do art. 1.437 do CC/2002, como título idôneo para extinção do penhor, mediante averbação. (Thiago Cássio D’Ávila Araújo, artigo intitulado “Do penhor”, publicado em março de 2016 no site da Jus.com.br., Acessado 12/01/2021. Ref. CC 1.437 - Revista e atualizada nesta data por VD).

segunda-feira, 11 de janeiro de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.435 Das obrigações do credor pignoratório – VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.435

Das obrigações do credor pignoratório – VARGAS, Paulo S. R.

- Parte Especial –  Livro III – Capítulo II – DO PENHOR

Seção III – Das obrigações do Credor Pignoratório – (Art. 1.435)

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 Art. 1.435. O credor pignoratício é obrigado: 

I — à custódia da coisa, como depositário, e a ressarcir ao dono a perda ou deterioração de que for culpado, podendo ser compensada na dívida, até a concorrente quantia, a importância da responsabilidade; 

II — à defesa da posse da coisa empenhada e a dar ciência, ao dono dela, das circunstâncias que tornarem necessário o exercício de ação possessória; 

III— a imputar o valor dos frutos, de que se apropriar (CC 1.433, inciso V) nas despesas de guarda e conservação, nos juros e no capital da obrigação garantida, sucessivamente;

 IV — a restituí-la, com os respectivos frutos e acessões, uma vez paga a dívida;

V — a entregar o que sobeje do preço, quando a dívida for paga, no caso do inciso IV do CC 1.433.

No dizer de Loureiro, o artigo em exame elenca as obrigações do credor pignoratício, em norma dispositiva, que pode ser contrariada pela vontade das partes, em cláusula contratual expressa. Nada impede, por outro lado, que o contrato crie mais deveres ao credor do que os previstos em lei.

A primeira obrigação do credor é à custódia da coisa, para restituí-la íntegra quando da solução da obrigação. Deve conservar a coisa, com diligência e cuidado, respondendo pela perda ou deterioração a que der causa, por ato culposo ou doloso. Por outro lado, se a coisa se perder ou deteriorar sem culpa do credor, por caso fortuito ou força maior, o risco é do proprietário (res perit domino), que é o devedor ou terceiro prestador da garantia. Ressalte-se que, em determinados casos, há relação de consumo, e o dever de guarda é exercido em caráter habitual, como nos casos de instituições financeiras. A responsabilidade então é objetiva e somente há excludente por falta de nexo causai, em especial fortuito externo, não ligado à atividade do credor. Já decidiu o STJ que, em relação de consumo, é abusiva a cláusula que prefixa o valor do bem empenhado a ser indenizado abaixo do mercado.

Completa o preceito dizendo que, no caso de responsabilidade do credor frente ao devedor, o prejuízo é compensado com a dívida garantida. É um caso de compensação especial determinada pelo legislador, na qual uma das obrigações pode não ser líquida. Apura-se o dano e em seguida se procede à compensação. Se o dano for de valor inferior ao valor da obrigação garantida, o saldo pode ser executado, inclusive com penhora do bem deteriorado. Se o bem se perder, o saldo do crédito se converte em quirografário. 

Diz ainda o inciso I que o credor tem a custódia do bem empenhado como depositário. Caso não devolva o bem empenhado após a solução da obrigação, tornar-se-á o credor depositário infiel, sujeito à sanção da prisão civil. Discute-se a constitucionalidade da prisão civil nos depósitos de garantia de crédito, porque a sanção estaria limitada ao depósito de guarda (STJ, REsp n. 11.409/iVlG, rel. Min. Waldemar Zveiter). No caso da custódia do credor, porém, este não usa ou explora a coisa e a apropriação dos frutos presta apenas para abatimento da dívida. Evidente que existem algumas distinções entre o contrato de depósito do CC 628 e o depósito necessário do credor pignoratício, uma vez que o depositante não pode reaver o bem a qualquer tempo. O depósito advém da lei, independentemente de consentimento específico do credor pignoratício e se assemelha à figura do depósito necessário dos CC 647 e ss. Por isso, não pode o credor pignoratício equiparar-se ao devedor fiduciante ou ao devedor pignoratício rural, industrial e mercantil e beneficiar-se do entendimento de que o depósito atípico, ou de uso, não serve para a prisão civil. Aqui não há depósito de uso e o credor será considerado depositário infiel. 

O segundo dever do credor pignoratício (inciso II) é a defesa da posse. Deve o credor restituir o bem empenhado incólume física e juridicamente ao devedor no momento da solução da obrigação. Por isso, tem o direito e o dever de defendê-la dos ataques injustos de terceiros. Pode, para tanto, usar dos remédios possessórios - reintegração, manutenção e interdito proibitório - e da autotutela do CC 1.210, § Iº. Além disso, a lei atribui ao credor a obrigação de cientificar o dono da coisa de seu ato, para que este adote, se quiser, as medidas defensivas cabíveis. Não exige a lei forma especial para a cientificação, bastando a prova de que o dono do bem empenhado conhece a existência do litígio sobre a coisa. A omissão do credor acarreta o dever de indenizar, caso se demonstre o nexo causai entre sua inércia na defesa ou na cientificação e a perda ou a deterioração do bem empenhado.

O terceiro dever do credor (inciso III) é imputar os frutos dos quais se apropriar no pagamento das despesas de guarda, conservação, juros ou capital da dívida. O preceito tem estrita ligação com o CC 1.433, V, já comentado. A apropriação dos frutos decorre da lei, independendo de convenção entre as partes, embora seja norma dispositiva. O credor apenas retém a posse dos frutos e, com a extinção do penhor, deve devolvê-los ao dono juntamente com o bem empenhado. Pode optar, porém, por compensar os frutos, utilizando-os para abater as despesas com a coisa, os juros e o capital da obrigação garantida, sucessivamente.

O quarto dever do credor (inciso IV) é a restituição da coisa empenhada, uma vez paga a dívida e as despesas com a guarda e a conservação do bem empenhado. A posse direta e justa se converte em posse injusta, marcada pelo vício da precariedade. A mora é ex re e independe de notificação ou interpelação. Cabe ao devedor o ajuizamento de ação possessória ou de ação de depósito contra o credor inadimplente, que somente se exime da obrigação se demonstrar que o bem se perdeu por força maior ou caso fortuito. A devolução é feita acompanhada dos frutos e das acessões, que se incorporam ao bem. No que se refere aos frutos, podem ser compensados com a dívida, como visto anteriormente.

O quinto e último dever do credor (inciso V) é devolver o saldo do preço do produto da excussão do bem empenhado, quando superar o valor da obrigação garantida. Faz o preceito remissão ao inciso IV do CC 1.433, que alude não somente à execução judicial como também à alienação administrativa ou à venda amigável. O que sobejar do preço de venda, em qualquer modalidade, após pagamento do principal, encargos legais e contratuais, custas, honorários advocatícios e despesas com a conservação do bem, é restituído ao dono do bem empenhado. No caso de alienação judicial, o próprio juiz controla e determina o levantamento do saldo pelo dono do bem. Nos casos de alienação extrajudicial, deve o credor prestar contas ao devedor e devolver-lhe incontinenti o saldo, notificando-o para vir recebê-lo. A inércia do devedor não autoriza o credor a apropriar-se do saldo, que deve ser consignado em pagamento, para evitar os efeitos da mora. Somente com a prescrição ordinária da pretensão - dez anos - é que se desobriga o credor pignoratício de devolver o saldo ao devedor. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.533-35.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 11/01/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Como explica o relator da Lei nº 10.406, de 10 janeiro de 2002, Ricardo Fiuza, O credor pignoratício tem apenas a guarda da coisa e a possui para determinado fim. Nessa guarda, emprega as diligências exigidas pela natureza da coisa. Cumpre-lhe, portanto, usar de todos os meios que assegurem e conservem os bens empenhados, respondendo pelas perdas e danos ocorridos por culpa sua. Como só possui a coisa para garantir a solução da divida, tem de restituí-la, com seus frutos e rendimentos, quando for paga. Na hipótese de venda amigável do bem para pagamento, devolverá o que exceder do que lhe cabe pela dívida e pelas despesas justificadas que tiver feito. 

O dispositivo equipara-se aos arts. 774 e 775 do Código Civil de 1916, conjugando-os com considerável melhora de sua redação. No mais, deve ser aplicado à matéria o mesmo tratamento doutrinário dado aos artigos apontados. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 733, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 11/01/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Na explanação de Talita Pozzebon Venturini, intitulado “Direitos reais de garantia: breve análise sobre penhor, hipoteca e anticrese”, para a autora, as obrigações constam elencadas no 1.435/CC e consistem em empregar diligência na guarda da coisa devendo ressarcir o dono de quaisquer prejuízos dos quais for culpado, depois de quitada a obrigação, restituir a coisa com os respectivos frutos, devendo apropriar-se apenas dos necessários para à conservação do bem, defender a posse da coisa empenhada, entregar ao dono da coisa o que exceder, quando a dívida for paga. 

Conforme Bevilaqua (2003), o devedor continua proprietário da coisa empenhada e detentor da posse indireta, reaver a coisa empenhada depois de efetuado o pagamento integral da dívida, ser ressarcido pelo credor no caso de perecimento da coisa, o direito de remir o penhor efetuando o pagamento em juízo antes do seu vencimento. 

Ao pagamento da dívida, deverá satisfazer o credor sobre eventuais despesas de conservação da coisa, indenizar eventuais prejuízos causados por vícios e substituir a coisa caso essa venha a sofrer deterioração sem que haja culpa do credor. Naturalmente que essas obrigações resultam logicamente dos direitos do credor. 

As situações em que ocorrerá o vencimento da dívida estão elencadas no CC 1.425: se ocorrer deterioração da coisa e esta não for substituída pelo devedor, se o devedor falir ou cair em insolvência, o recebimento de prestação atrasada pelo credor importa em renúncia de seu direito de execução imediata, se perecer o bem em consequência de culpa do credor e se for desapropriado o bem dado em garantia com o consequente depósito do valor devido ao credor. (Talita Pozzebon Venturini, intitulado “Direitos reais de garantia: breve análise sobre penhor, hipoteca e anticrese”, publicado em outubro de 2015 no site Jus.com.br, acessado em 11.01.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

No entender de Guimarães e Mezzalira, o credor pignoratício deve conservar a coisa empenhada, equiparando-se ao depositário, devendo ressarcir ao dono a perda ou deterioração do bem quando for culpado, podendo a importância da responsabilidade ser compensada na dívida. 

A posse direta do credor pignoratício não anula a posse indireta do proprietário (devedor pignoratício), incumbindo-lhe a defesa da sua posse e a obrigação de dar ciência ao dono a respeito de eventual ameaça, turbação ou esbulho, uma vez que a eventual perda ou deterioração da coisa não extinguirá a dívida, de modo que o prejuízo será do devedor. 

A apropriação dos frutos pelo credor constitui adiantamento do pagamento, devendo imputar aqueles valores apropriados nas despesas de guarda e conservação, nos juros e no capital. 

O credor pignoratício não é proprietário do bem empenhado, tendo os deveres de entregar a coisa e, no caso de execução judicial, o de entregar o produto que exceder o valor da dívida. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao CC 1.435, acessado em 11.01.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

sexta-feira, 8 de janeiro de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.433, 1.434 Dos Direitos do Credor Pignoratício – VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.433, 1.434

Dos Direitos do Credor Pignoratício – VARGAS, Paulo S. R.

- Parte Especial –  Livro III – Capítulo II – DO PENHOR

Seção II – Dos Direitos do Credor Pignoratício – (Art. 1.433 e 1.434) - 

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 Art. 1.433. O credor pignoratício tem direito: 

I - à posse da coisa empenhada;

II - à retenção dela, até que o indenizem das despesas devidamente justificadas, que tiver feito, não sendo ocasionadas por culpa sua;

III - ao ressarcimento do prejuízo que houver sofrido por vício da coisa empenhada;

IV - a promover a execução judicial, ou a venda amigável, se lhe permitir expressamente o contrato, ou lhe autorizar o devedor mediante procuração; 

V - a apropriar-se dos frutos da coisa empenhada que se encontra em seu poder; 

V I - a promover a venda antecipada, mediante prévia autorização judicial, sempre que haja receio fundado de que a coisa empenhada se perca ou deteriore, devendo o preço ser depositado. O dono da coisa empenhada pode impedir a venda antecipada, substituindo-a, ou oferecendo outra garantia real idônea.

No lecionar de Loureiro, o artigo em exame condensa os arts. 772, 773 e 774 do Código Civil de 1916, com diversas alterações. Elenca de modo ordenado os direitos do credor pignoratício. São faculdades de ordem dispositiva e que decorrem da lei, aplicando-se no silêncio do contrato. Nada impede, porém, que as partes convencionem regras em sentido contrário, salvo em relação a direitos fundamentais à caracterização do penhor, como a transferência da posse ao credor.

O primeiro direito do credor (inciso I) é à posse do bem empenhado, até a solução completa da obrigação. A posse é a direta, que não anula a posse indireta do devedor. Ambos têm direito à tutela possessória, contra terceiros, e um para coibir os atos ilícitos do outro. A posse do credor, porém, é afetada à garantia do cumprimento da obrigação. Não pode, assim, usar e explorar o bem, mas apenas guardá-lo, como depositário, até a solução da obrigação. O preceito somente se aplica ao penhor comum, porque, como já visto, quanto aos penhores especiais - rural, industrial, mercantil e sobre veículos a posse dos bens permanece com o devedor.

O segundo direito do credor (inciso II) é à retenção do bem empenhado, até que se indenizem as despesas devidamente justificadas que tiver feito, desde que não sejam causadas por culpa sua. O preceito deve ser lido em consonância com o CC 1.434, adiante comentado. O credor retém a posse da coisa até integral satisfação de seu crédito, inclusive as despesas necessárias à manutenção e preservação do bem. Tais despesas devem estar devidamente justificadas e comprovadas pelo credor. Cabe ao credor a prova da existência, da necessidade e da origem das despesas. Não cabe a retenção se as despesas decorrem de comportamento culposo do próprio credor. A regra se dirige ao devedor e ao terceiro prestador da garantia, mas não ao arrematante, porque o credor satisfará seu crédito e reembolso de despesas com o produto da venda.

O terceiro direito (inciso III) do credor é o de reaver do devedor ou do prestador da garantia o prejuízo que sofreu por vício do bem empenhado. O prejuízo não se refere à própria desvalorização ou depreciação do bem empenhado, mas ao patrimônio do credor, como no caso de animais contaminados, ou de mercadorias com pragas. 

O quarto direito do credor (inciso IV ) é à excussão, a penhorar e vender o bem empenhado, no caso de inadimplemento do devedor. Assinala Gladston Mamede que a lei prevê três modalidades de realização da garantia: a) execução judicial; b) leilão administrativo; c) venda amigável (Código Civil comentado. São Paulo, Atlas, 2003, v. XIV, p. 149). O contrato de penhor é título executivo extrajudicial (art. 784, III, do CPC), de modo que, na execução judicial, deve a penhora recair sobre o bem dado em garantia, independentemente de nomeação, avaliado e levado a leilão. O Decreto n. 4.371/2002 regula o penhor da Caixa Econômica Federal e prevê, em seu art. 36, § Iº, leilão administrativo feito por prepostos da credora especialmente designados, após a publicação de editais em jornais de grande circulação.

Finalmente, admite a lei venda amigável do bem empenhado, desde que expressamente ajustada pelas partes. A convenção nesse sentido pode ser feita no momento da contratação do penhor, ou em momento posterior, antes ou depois do vencimento da obrigação. Exige-se apenas que a cláusula seja expressa, para afastar o modo normal de excussão, que é o judicial. Admite ainda a lei que a venda amigável seja autorizada por procuração com poderes especiais e expressos outorgados pelo devedor ao credor. Devem constar da procuração poderes especiais para alienar e expressos quanto ao bem que será alienado. O que não se admite é o comportamento do representante contrário ao interesse do representado, sob pena de invalidade da alienação (CC 117 e 119). Isso significa que a alienação por preço vil, sem avaliação convencional e exata do bem empenhado ou sem conferir ao devedor a prerrogativa de acompanhar a venda, constitui situação ilícita no regime do Código Civil, porque fere os princípios da boa-fé objetiva e do equilíbrio contratual e é abusiva no regime do Código de Defesa do Consumidor.

Em suma, a alienação amigável, via de regra imposta pelo credor ao devedor no momento da concessão do crédito, não pode se revestir de condições especialmente gravosas à parte mais frágil, imputando-lhe prerrogativas básicas, como a venda por preço mínimo e acompanhada pelo interessado. Há o correlato dever do credor de prestar contas ao devedor, com restituição do saldo, se houver. Evidente que a cláusula, ou poderes conferidos ao credor, para venda amigável, não lhe permite se apropriar do bem empenhado, sob pena de violação à proibição cogente da cláusula comissória. Como ressalta Caio Mário da Silva Pereira, “ na hipótese de ser o credor autorizado a vender a coisa amigavelmente, não pode comprá-la para si mesmo, pois que uma tal operação envolveria o pacto comissório, vedado por lei. Promovendo, todavia, a excussão do penhor, nada impede a adjudicação na forma e nos termos do que prescreve a lei processual” (Instituições de direito civil, 18. ed. atualizada. Rio de Janeiro, Forense, 1995, v. IV, p. 343). 

O quinto direito do credor é o de apropriar-se dos frutos do bem empenhado que se encontra em seu poder. O preceito deve ser lido em conjunto com o inciso III do CC 1.435, adiante comentado. Pode apropriar-se dos frutos, mas deve imputá-los nas despesas, juros e no capital da obrigação garantida.

O sexto direito do credor (inciso VI) é promover a venda antecipada do bem empenhado, sempre que houver receio fundado de sua perda ou deterioração, sem substituição da garantia pelo devedor. Não se confundem a venda antecipada com o vencimento antecipado da obrigação garantida, previsto no CC 1.425, acima comentado. Para o vencimento antecipado se exige a real perda ou deterioração do bem dado cm garantia (incisos I e IV ). Para a venda antecipada, se contenta o legislador com o receio fundado, a probabilidade efetiva de perda ou deterioração, cuja prova fica a cargo do credor, quer a obrigação esteja vencida ou não. O que desejou o legislador, aliás, foi evitar a perda ou deterioração e o consequente vencimento antecipado da obrigação, permitindo que a garantia se sub-rogue do bem para seu preço.

Exige a lei que a venda antecipada se dê mediante prévia autorização judicial, não valendo, por consequência, a mera previsão contratual entre as partes. A autorização se obtém em medida cautelar inominada e o preço obtido será depositado em conta judicial. A venda pode ser judicial ou amigável, como visto no inciso anterior, desde que devidamente acompanhada pela parte interessada, intimada para tanto. Podem o devedor ou o dono da coisa - e por isso devem ser ouvidos previamente sobre o pedido - elidir a venda antecipada do bem empenhado, ofertando substituição idônea da garantia. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.530-32.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 08/01/2021. Revista e atualizada nesta data por VD). 

Dentre os direitos do credor pignoratício, como leciona Talita Pozzebon Venturini, que constam elencados no 1.433/CC, destaca-se que o credor possui o direito de reter a coisa empenhada enquanto o devedor não adimplir com sua obrigação. Conforme assevera Bevilaqua (2003), como o credor pignoratício tem a posse fundada em seu direito real, que vincula a coisa ao cumprimento de uma obrigação, este direito de retenção difere de outros direitos tais como o direito de retenção do possuidor de boa fé para garantir benfeitorias ou ainda a retenção prevista em lei em que o devedor pode retardar a entrega de um bem enquanto seu credor não dá o que lhe deve, de cujo fato se origina a obrigação, pois esses casos se referem a mero direito pessoal. 

Ainda como direito do credor está a possibilidade de exigir a substituição da coisa caso essa tenha se deteriorado. Pode ainda exigir eventuais prejuízos sofridos devido a vício da coisa empenhada, salvo se o vício é de conhecimento do credor; possui o direito de excutir a coisa empenhada, inclusive com direito de preferência frente a outros credores, com exceção apenas do trabalhador rural com relação ao produto da colheita na qual tenha trabalhado e do trabalhador vítima de acidente de trabalho. Pode ainda proceder com a venda amigável do bem, uma vez que exista permissão no contrato. Não está permitida a apropriação do bem e a excussão deve se dar por meio de processo de execução previsto no art. 784, III/ CPC. E por fim, apropriar-se dos frutos da coisa empenhada a fim de usá-los na sua conservação e promover, mediante ordem judicial, a venda antecipada sempre que houver o risco de deterioração da coisa. (Talita Pozzebon Venturini, intitulado “Direitos reais de garantia: breve análise sobre penhor, hipoteca e anticrese, publicado em outubro de 2015 no site Jus.com.br, acessado em 08.01.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Tratando-se dos direitos do credor pignoratício, assinalam Guimarães e Mezzalira, tratar-se o dispositivo, estabelecendo em seu inciso I o direito à posse da coisa empenhada. Essencial nos casos do penhor comum, a posse do credor pignoratício pode ser protegida pelos interditos possessórios.

O direito de retenção tem como escopo o ressarcimento de despesas realizadas, desde que justificadas e não decorram de culpa do credor.

O vício da coisa empenhada poderá ensejar o direito ao ressarcimento do prejuízo sofrido pelo credor, como no exemplo dado por Caio Mário da Silva Pereira de contágio do rebanho do credor por enfermidade de gado empenhado, com o conhecimento do devedor (Instituições, volume IV, 2004, p. 344).

Pode o credor promover a execução judicial, como forma de excutir o bem, nos termos da legislação processual. Também poderá promover a venda amigável da coisa empenhada, desde que exista autorização expressa no contrato ou que seja obtida posteriormente, devendo prestar contas ao devedor, devolvendo eventual saldo.

Não poderá o credor apropriar-se do bem empenhado para o pagamento do débito, pois o CC 1.428 considera nula a cláusula comissória. No caso de venda amigável, não poderá adquiri-la para si mesmo. Poderá, contudo, adjudicar o bem na hipótese de execução judicial. 

O credor também poderá apropriar-se dos frutos da coisa empenhada, como uma forma de reforçar a garantia e de obter um adiantamento das parcelas que lhe são devidas (Carlos Roberto Gonçalves, vol. 5, 2010, p. 555), direito este a que corresponde uma obrigação correlata de que o valor dos frutos apropriados seja imputado nas despesas mencionadas no CC 1.535, inciso III.

Enfim, prevê o Código o direito de promover a venda antecipada da coisa empenhada quando houver receio fundado de que venha a se perder ou deteriorar. Cabe ao Juiz avaliar a presença do requisito exigido em lei. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao CC 1.433, acessado em 08.01.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.434. O credor não pode ser constrangido a devolver a coisa empenhada, ou uma parte dela, antes de ser integralmente pago, podendo o juiz, a requerimento do proprietário, determinar que seja vendida apenas uma das coisas, ou parte da coisa empenhada, suficiente para o pagamento do credor.

Como aponta Loureiro, tem o credor direito de reter a posse direta, até integral satisfação de seu crédito, inclusive as despesas com o bem empenhado. Lembre-se, porém, de que a garantia do penhor é acessória à obrigação, de modo que segue sua sorte jurídica. Extinta a obrigação por qualquer causa, extingue-se o penhor e o bem deve ser devolvido ao devedor.

Além disso, o direito de retenção da posse direta não pode ser abusivo. Inadimplida a obrigação, o credor mantém a posse do bem e promove a execução, com o objetivo de excutir o bem empenhado e se pagar. A inércia prolongada do credor de posse do bem empenhado, em detrimento do devedor, pode configurar abuso de direito, a teor do art. 187 do Código Civil. Prescrita a pretensão, com ela prescreve a garantia real. Antes mesmo da prescrição, constatado que a inércia do credor excede manifestamente as funções econômica e social da garantia, ou a boa-fé objetiva, pode o devedor pedir ao juiz a devolução do bem empenhado, ou exigir que se execute de uma vez o credito. 

Reproduz o preceito o princípio da indivisibilidade da garantia real (art. 1.421 do CC, já comentado), que recai sobre a totalidade dos bens empenhados e que os bens empenhados respondem pelo integral pagamento da dívida. Isso quer dizer que não tem o devedor, salvo convenção expressa no título, ou anuência do credor, o direito de obter a liberação parcial dos bens empenhados, proporcional aos pagamentos feitos.

Cria este artigo em sua parte final, porém, exceção relevante ao princípio da indivisibilidade, em atenção às cláusulas gerais do abuso de direito (art. 187 do CC), boa-fé objetiva (art. 422 do CC) e equilíbrio contratual. Dispõe que pode o juiz, provocado pelo dono dos bens empenhados, determinar a alienação de apenas uma das coisas, ou de parte dela, suficiente para o pagamento do credor. A regra está em consonância com o art. 805 do Código de Processo Civil, que determina que a execução se fará do meio menos gravoso para o devedor.

São requisitos da excussão parcial da garantia: a) intervenção judicial, provocada pelo dono dos bens empenhados, ou pelo devedor, interessado na medida; b) que a alienação de um dos bens, ou de parte, baste para integral satisfação do credor, abrangendo principal, encargos, custas judiciais, honorários advocatícios e despesas com conservação da garantia. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.532-33.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 08/01/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

A primeira parte do artigo, comentada por Guimarães e Mezzalira, evidencia a indivisibilidade da garantia real, estabelecendo que o credor não pode ser obrigado a devolver nem mesmo parte da coisa enquanto não ocorrer o pagamento integral.

A regra poderá ser excepcionada nas hipóteses em que o devedor requerer autorização judicial para a venda de uma das coisas dadas em garantia ou de parte da única coisa, para que obtenha valor suficiente para o cumprimento do restante da obrigação, o que atende ao princípio de que a execução deverá ser realizada na forma menos onerosa ao devedor. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao CC 1.434, acessado em 08.01.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Em tese defendida por Alexandre Gaetano Nicola Liquidato, teses.usp.br/teses disponíveis, intitulada “O contrato de penhor”, a partir das pp 32, trata-se, portanto, o penhor, de um direito substancial e absoluto ao qual correspondem deveres de abstenção da parte de todos os potenciais interessados. Note-se que o inciso I ao CC 1.433 e a primeira parte do CC 1.434, concretizam no texto da lei a primeira das posições ativas do credor pignoratício. As outras duas posições ativas principais são a sequela e a preferência. A sequela aparece como a pretensão de perseguir a coisa para fazê-la expropriar até mesmo se, no entretempo, essa tiver sido adquirida por um terceiro. 

Afirma-se a sequela como uma pretensão, porquanto seja uma posição jurídica subjetiva elementar decorrente da norma comportamental, proibitiva da violação da posse ou da retenção da coisa empenhada. Em verdade, a sequela pode ser compreendida como uma manifestação da ideia mais ampla da oponibilidade erga omnes (Explica Orlando gomes que a ideia de oponibilidade corresponde à “eficácia de poderes e faculdades do titular do direito real em relação a todos os outros sujeitos direta e concretamente interessados”, de modo que a oponibilidade resulte de sua inerência à coisa, ou seja, da “ligação do poder do titular com uma coisa determinada” (ORLANDO GOMES. Significado ideológico do conceito de direito real. In: Revereor: estudos jurídicos em homenagem à Faculdade de Direito da Bahia: 1891-1981. São Paulo: Saraiva, 1.981, p. 4).

Explica-se: se sob o manto do principio da especialidade, (Em página acerca da hipoteca – perfeitamente aplicável ao penhor – escreveu Lysippo Garcia: “Denomina-se especialidade a individuação do bem sujeito ao vínculo, de modo  a torna-lo inconfundível, e a determinação do valor da responsabilidade, que a hypotheca assegura” (LYSIPPO GARCIA. O registro de imóveis: a inscripção; a hypotheca. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1927, v. II, p. 38), o penhor se torna inerente a uma determinada coisa e, ao seu titular, confere-se a pretensão de excluir a todas as demais pessoas da ingerência sobre o objeto empenhado, de modo que o credor pignoratício possa fazer valer sua posição jurídica ativa contra qualquer sujeito. (GAMBARO, La proprietà, comunione. In: IUDICA (org.); ZATTI (org.). Tratado di diritto privato..., p. 62-63).

Note-se que apenas o poder de expropriação acima aludido, entendido como a pura e simples ação executiva, não é característico do penhor, porque compete a qualquer credor, inclusive ao quirografário.

Trata-se de expropriação com preferência. A preferência, nesse caso, é o poder de satisfazer o crédito garantido com a coisa, prioritariamente com relação aos outros credores (segunda parte dos CC 1.422, 958 e 961). Além disso, do ponto de vista prático, o penhor assumiu a função de reforçar as ações (em sentido material) do credor possibilitando a esse o cumprimento da garantia, de modo que ele prevalecesse sobre outros sujeitos com os quais poderia ter um conflito de interesses.

Então, as ações pignoratícias (notadamente as mandamentais e as executivas), a sequela e a preferência formam um complexo unitário. Estruturalmente, importam em poderes distintos que, frequentemente, atuam em conjunto. Explica-se: sequela e preferência podem compor ações pignoratícias de forças mandamental ou executiva, sem que, necessariamente, operem no plano da eficácia, contemporaneamente àquelas, de modo que ganha contornos mais nítidos a afirmação de que a sequela e a preferência correspondam a posições ativas características do penhor. 

Assim, além de ser absoluto, o penhor é igualmente imediato, na medida em que não depende da colaboração do devedor pignoratício, diferentemente de um direito de crédito. (GIORGIANNI,  Michelle. Diritti reali (diritto  civile).  In:  Novissimo  Digesto  Italiano.  Torino:  UTET,  1957, p. 749). Então, o credor pignoratício é titular de posições que apresentam duas características marcantes dos direitos reais a saber: são absolutas e imediatas. 

Diante disso, Rubino (RUBINO, Il pegno. In: VASSALLI, Trattato di diritto civile italiano ..., v. 14, t. 1, p. 186-187) conclui dizendo que a complexidade do penhor compreende diversas posições jurídicas cuja natureza é variada, podendo até mesmo compreender posições ativas processuais, mas o seu centro é constituído, invariavelmente, por um direito real cuja disciplina absorve todas as demais. 

Dessa maneira, a natureza real do penhor o distingue dos outros direitos pessoais de garantia, enquanto sua função o separa dos direitos reais limitados de gozo.

Então, considerando tudo o que foi acima exposto, destaque-se a admirável síntese de Pontes de Miranda, (PONTES DE MIRANDA, Tratado de direito privado ..., t. XX, p. 393-394), segundo a qual o penhor é direito real limitado e de realização de valor (Em sentido análogo, vide: OSSORIO Y FLORIT, Prenda..., p. 854). Não se confunde com a retenção do credor pignoratício por despesas ou benfeitorias, muito menos está circunstrito a isso. Em verdade, ele tem o direito de extrair o valor da coisa móvel empenhada que serve de garantia, sendo de se supor a posse imediata dessa, ou, conforme o caso, a mediata. (Alexandre Gaetano Nicola Liquidato, teses.usp.br/teses disponíveis, intitulada “O contrato de penhor”, a partir das pp 32-34, Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo – SP, 2012, Acessado 08/01/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).