segunda-feira, 11 de janeiro de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.435 Das obrigações do credor pignoratório – VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.435

Das obrigações do credor pignoratório – VARGAS, Paulo S. R.

- Parte Especial –  Livro III – Capítulo II – DO PENHOR

Seção III – Das obrigações do Credor Pignoratório – (Art. 1.435)

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 Art. 1.435. O credor pignoratício é obrigado: 

I — à custódia da coisa, como depositário, e a ressarcir ao dono a perda ou deterioração de que for culpado, podendo ser compensada na dívida, até a concorrente quantia, a importância da responsabilidade; 

II — à defesa da posse da coisa empenhada e a dar ciência, ao dono dela, das circunstâncias que tornarem necessário o exercício de ação possessória; 

III— a imputar o valor dos frutos, de que se apropriar (CC 1.433, inciso V) nas despesas de guarda e conservação, nos juros e no capital da obrigação garantida, sucessivamente;

 IV — a restituí-la, com os respectivos frutos e acessões, uma vez paga a dívida;

V — a entregar o que sobeje do preço, quando a dívida for paga, no caso do inciso IV do CC 1.433.

No dizer de Loureiro, o artigo em exame elenca as obrigações do credor pignoratício, em norma dispositiva, que pode ser contrariada pela vontade das partes, em cláusula contratual expressa. Nada impede, por outro lado, que o contrato crie mais deveres ao credor do que os previstos em lei.

A primeira obrigação do credor é à custódia da coisa, para restituí-la íntegra quando da solução da obrigação. Deve conservar a coisa, com diligência e cuidado, respondendo pela perda ou deterioração a que der causa, por ato culposo ou doloso. Por outro lado, se a coisa se perder ou deteriorar sem culpa do credor, por caso fortuito ou força maior, o risco é do proprietário (res perit domino), que é o devedor ou terceiro prestador da garantia. Ressalte-se que, em determinados casos, há relação de consumo, e o dever de guarda é exercido em caráter habitual, como nos casos de instituições financeiras. A responsabilidade então é objetiva e somente há excludente por falta de nexo causai, em especial fortuito externo, não ligado à atividade do credor. Já decidiu o STJ que, em relação de consumo, é abusiva a cláusula que prefixa o valor do bem empenhado a ser indenizado abaixo do mercado.

Completa o preceito dizendo que, no caso de responsabilidade do credor frente ao devedor, o prejuízo é compensado com a dívida garantida. É um caso de compensação especial determinada pelo legislador, na qual uma das obrigações pode não ser líquida. Apura-se o dano e em seguida se procede à compensação. Se o dano for de valor inferior ao valor da obrigação garantida, o saldo pode ser executado, inclusive com penhora do bem deteriorado. Se o bem se perder, o saldo do crédito se converte em quirografário. 

Diz ainda o inciso I que o credor tem a custódia do bem empenhado como depositário. Caso não devolva o bem empenhado após a solução da obrigação, tornar-se-á o credor depositário infiel, sujeito à sanção da prisão civil. Discute-se a constitucionalidade da prisão civil nos depósitos de garantia de crédito, porque a sanção estaria limitada ao depósito de guarda (STJ, REsp n. 11.409/iVlG, rel. Min. Waldemar Zveiter). No caso da custódia do credor, porém, este não usa ou explora a coisa e a apropriação dos frutos presta apenas para abatimento da dívida. Evidente que existem algumas distinções entre o contrato de depósito do CC 628 e o depósito necessário do credor pignoratício, uma vez que o depositante não pode reaver o bem a qualquer tempo. O depósito advém da lei, independentemente de consentimento específico do credor pignoratício e se assemelha à figura do depósito necessário dos CC 647 e ss. Por isso, não pode o credor pignoratício equiparar-se ao devedor fiduciante ou ao devedor pignoratício rural, industrial e mercantil e beneficiar-se do entendimento de que o depósito atípico, ou de uso, não serve para a prisão civil. Aqui não há depósito de uso e o credor será considerado depositário infiel. 

O segundo dever do credor pignoratício (inciso II) é a defesa da posse. Deve o credor restituir o bem empenhado incólume física e juridicamente ao devedor no momento da solução da obrigação. Por isso, tem o direito e o dever de defendê-la dos ataques injustos de terceiros. Pode, para tanto, usar dos remédios possessórios - reintegração, manutenção e interdito proibitório - e da autotutela do CC 1.210, § Iº. Além disso, a lei atribui ao credor a obrigação de cientificar o dono da coisa de seu ato, para que este adote, se quiser, as medidas defensivas cabíveis. Não exige a lei forma especial para a cientificação, bastando a prova de que o dono do bem empenhado conhece a existência do litígio sobre a coisa. A omissão do credor acarreta o dever de indenizar, caso se demonstre o nexo causai entre sua inércia na defesa ou na cientificação e a perda ou a deterioração do bem empenhado.

O terceiro dever do credor (inciso III) é imputar os frutos dos quais se apropriar no pagamento das despesas de guarda, conservação, juros ou capital da dívida. O preceito tem estrita ligação com o CC 1.433, V, já comentado. A apropriação dos frutos decorre da lei, independendo de convenção entre as partes, embora seja norma dispositiva. O credor apenas retém a posse dos frutos e, com a extinção do penhor, deve devolvê-los ao dono juntamente com o bem empenhado. Pode optar, porém, por compensar os frutos, utilizando-os para abater as despesas com a coisa, os juros e o capital da obrigação garantida, sucessivamente.

O quarto dever do credor (inciso IV) é a restituição da coisa empenhada, uma vez paga a dívida e as despesas com a guarda e a conservação do bem empenhado. A posse direta e justa se converte em posse injusta, marcada pelo vício da precariedade. A mora é ex re e independe de notificação ou interpelação. Cabe ao devedor o ajuizamento de ação possessória ou de ação de depósito contra o credor inadimplente, que somente se exime da obrigação se demonstrar que o bem se perdeu por força maior ou caso fortuito. A devolução é feita acompanhada dos frutos e das acessões, que se incorporam ao bem. No que se refere aos frutos, podem ser compensados com a dívida, como visto anteriormente.

O quinto e último dever do credor (inciso V) é devolver o saldo do preço do produto da excussão do bem empenhado, quando superar o valor da obrigação garantida. Faz o preceito remissão ao inciso IV do CC 1.433, que alude não somente à execução judicial como também à alienação administrativa ou à venda amigável. O que sobejar do preço de venda, em qualquer modalidade, após pagamento do principal, encargos legais e contratuais, custas, honorários advocatícios e despesas com a conservação do bem, é restituído ao dono do bem empenhado. No caso de alienação judicial, o próprio juiz controla e determina o levantamento do saldo pelo dono do bem. Nos casos de alienação extrajudicial, deve o credor prestar contas ao devedor e devolver-lhe incontinenti o saldo, notificando-o para vir recebê-lo. A inércia do devedor não autoriza o credor a apropriar-se do saldo, que deve ser consignado em pagamento, para evitar os efeitos da mora. Somente com a prescrição ordinária da pretensão - dez anos - é que se desobriga o credor pignoratício de devolver o saldo ao devedor. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.533-35.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 11/01/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Como explica o relator da Lei nº 10.406, de 10 janeiro de 2002, Ricardo Fiuza, O credor pignoratício tem apenas a guarda da coisa e a possui para determinado fim. Nessa guarda, emprega as diligências exigidas pela natureza da coisa. Cumpre-lhe, portanto, usar de todos os meios que assegurem e conservem os bens empenhados, respondendo pelas perdas e danos ocorridos por culpa sua. Como só possui a coisa para garantir a solução da divida, tem de restituí-la, com seus frutos e rendimentos, quando for paga. Na hipótese de venda amigável do bem para pagamento, devolverá o que exceder do que lhe cabe pela dívida e pelas despesas justificadas que tiver feito. 

O dispositivo equipara-se aos arts. 774 e 775 do Código Civil de 1916, conjugando-os com considerável melhora de sua redação. No mais, deve ser aplicado à matéria o mesmo tratamento doutrinário dado aos artigos apontados. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 733, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 11/01/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Na explanação de Talita Pozzebon Venturini, intitulado “Direitos reais de garantia: breve análise sobre penhor, hipoteca e anticrese”, para a autora, as obrigações constam elencadas no 1.435/CC e consistem em empregar diligência na guarda da coisa devendo ressarcir o dono de quaisquer prejuízos dos quais for culpado, depois de quitada a obrigação, restituir a coisa com os respectivos frutos, devendo apropriar-se apenas dos necessários para à conservação do bem, defender a posse da coisa empenhada, entregar ao dono da coisa o que exceder, quando a dívida for paga. 

Conforme Bevilaqua (2003), o devedor continua proprietário da coisa empenhada e detentor da posse indireta, reaver a coisa empenhada depois de efetuado o pagamento integral da dívida, ser ressarcido pelo credor no caso de perecimento da coisa, o direito de remir o penhor efetuando o pagamento em juízo antes do seu vencimento. 

Ao pagamento da dívida, deverá satisfazer o credor sobre eventuais despesas de conservação da coisa, indenizar eventuais prejuízos causados por vícios e substituir a coisa caso essa venha a sofrer deterioração sem que haja culpa do credor. Naturalmente que essas obrigações resultam logicamente dos direitos do credor. 

As situações em que ocorrerá o vencimento da dívida estão elencadas no CC 1.425: se ocorrer deterioração da coisa e esta não for substituída pelo devedor, se o devedor falir ou cair em insolvência, o recebimento de prestação atrasada pelo credor importa em renúncia de seu direito de execução imediata, se perecer o bem em consequência de culpa do credor e se for desapropriado o bem dado em garantia com o consequente depósito do valor devido ao credor. (Talita Pozzebon Venturini, intitulado “Direitos reais de garantia: breve análise sobre penhor, hipoteca e anticrese”, publicado em outubro de 2015 no site Jus.com.br, acessado em 11.01.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

No entender de Guimarães e Mezzalira, o credor pignoratício deve conservar a coisa empenhada, equiparando-se ao depositário, devendo ressarcir ao dono a perda ou deterioração do bem quando for culpado, podendo a importância da responsabilidade ser compensada na dívida. 

A posse direta do credor pignoratício não anula a posse indireta do proprietário (devedor pignoratício), incumbindo-lhe a defesa da sua posse e a obrigação de dar ciência ao dono a respeito de eventual ameaça, turbação ou esbulho, uma vez que a eventual perda ou deterioração da coisa não extinguirá a dívida, de modo que o prejuízo será do devedor. 

A apropriação dos frutos pelo credor constitui adiantamento do pagamento, devendo imputar aqueles valores apropriados nas despesas de guarda e conservação, nos juros e no capital. 

O credor pignoratício não é proprietário do bem empenhado, tendo os deveres de entregar a coisa e, no caso de execução judicial, o de entregar o produto que exceder o valor da dívida. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao CC 1.435, acessado em 11.01.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

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