quinta-feira, 11 de fevereiro de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.506, 1.507 Da Anticrese - VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.506, 1.507

Da Anticrese - VARGAS, Paulo S. R.

- Parte Especial –  Livro III – Capítulo IV – DA ANTICRESE

– (Art. 1.506 a 1.510) - digitadorvargas@outlook.com  

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 Art. 1.506. Pode o devedor ou outrem por ele, com a entrega do imóvel ao credor, ceder-lhe o direito de perceber, em compensação da dívida, os frutos e rendimentos. 

§ 1º É permitido estipular que os frutos e rendimentos do imóvel sejam percebidos pelo credor à conta de juros, mas se o seu valor ultrapassar a taxa máxima permitida em lei para as operações financeiras, o remanescente será imputado ao capital.

§ 2º  Quando a anticrese recair sobre bem imóvel, este poderá ser hipotecado pelo devedor ao credor anticrético, ou a terceiros, assim como o imóvel hipotecado poderá ser dado em anticrese.

Historicamente esta era a redação original do presente dispositivo quando de seu envio ao Senado Federal: “Pode o devedor ou outrem por ele, entregando ao credor imóvel, ceder-lhe o direito de perceber, em compensação da dívida, os frutos e rendimentos”. Emenda da lavra do Senador Josaphat Marinho foi apresentada com a seguinte justificativa: “modifica-se a redação do dispositivo para facilitar o entendimento, evitando-se a expressão credor imóvel”. A linguagem adotada pela emenda é mais correta, evitando a cacofonia. O relator Fiuza foi pela sua aprovação. No tocante à manutenção do instituto da anticrese, condenada por muitos, o Deputado Fiuza abraça os argumentos de Ernani Satyro: A anticrese “não merece ser excluída do Código, especialmente em virtude da disciplina atualizada que recebeu no Projeto, o que permitirá o seu maior emprego. Não é demais que se disponha de um modelo jurídico que, quando menos se espera, passa a atender, com mais frequência, aos interesses da vida prática. Foi o que se deu com o antes vetusto instituto da ‘superfície’, que reaparece”.

Em seus comentários, Ricardo Fiuza, em sua Doutrina cita, na clássica definição de Clóvis Beviláqua, “anticrese é o direito real sobre imóvel alheio, cru virtude do qual o credor obtém a posse da coisa, a fim de perceber-lhes os frutos e imputá-los no pagamento da dívida, juros e capital sendo, porem permitido estipular que os frutos sejam, na sua totalidade, percebidos à conta de juros” (Código Civil dos Estados Unidos do Brasil).

Equipara-se este dispositivo ao art. 805 do Código Civil de 1916, com considerável melhora em sua redação. No mais, deve ser aplicado à matéria o mesmo tratamento doutrinário dado ao dispositivo apontado.

Muito se tem discutido sobre a utilidade desse tipo de direito real de garantia entendendo-se que a anticrese foi substituída pela hipoteca, que tem preferência, uma vez que o devedor fica com o bem. A nosso ver deve aquela ser mantida, já que amplia os direitos reais de garantia com mais uma opção a credores e devedores, e pode ser mais vantajosa que a hipoteca e o penhor , por não permitir a venda da coisa dada em garantia, sendo apenas um direito de retenção e fruição, até que se pague a totalidade da divida. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 759-60, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 11/02/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Nos comentários de Loureiro, repete o entendimento de Clóvis Beviláqua, citado acima por Ricardo Fiuza no artigo em exame que contém alterações pontuais em seus dois parágrafos, em relação ao correspondente art. 805.

Não se justifica a manutenção da anticrese em nosso ordenamento jurídico, diante de sua escassa utilidade e do raro uso nos negócios. Define-se, na lição de Clóvis Bevilaqua, como “o direito real sobre imóvel alheio, em virtude do qual o credor o possui, a fim de perceber-lhes os frutos e imputá-los no pagamento da dívida, juros e capital, ou somente dos juros” (Direito das coisas, 3. ed. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1951,1.1, p. 101).

Recai sobre bens imóveis frutíferos pertencentes ao devedor ou a terceiro prestador da garantia. O objeto da anticrese não é propriamente o imóvel, mas sim os seus frutos. O credor anticrético pode usar o imóvel e receber os seus frutos, retendo a posse até a solução da obrigação, mas não levar o prédio à excussão.

A constituição se dá mediante negócio jurídico solene, sempre por escrito e mediante escritura pública, se de valor superior a trinta salários-mínimos, com a devida especialização. O título é levado ao registro imobiliário, de natureza constitutiva do direito real. Antes do registro, há mero direito obrigacional - iura ad rem - do credor anticrético. A posse direta do imóvel é transferida ao credor, mas sem caráter constitutivo da garantia.

Podem constituir a anticrese não somente o proprietário do imóvel, mas também os titulares de poder de disposição dos rendimentos, entre os quais o enfiteuta, o usufrutuário e o superficiário.

O credor anticrético pode explorar pessoalmente o imóvel, atribuindo valor ao uso, ou entregá-lo à exploração de terceiros e receber os seus frutos e rendimentos, em ambos os casos com a finalidade de amortização da dívida. Nada impede que recaia a anticrese também sobre produtos, mediante expressa convenção entre as partes. Anota com razão Gladston Mamede que nada impede que recaia a anticrese sobre frutos naturais ou industriais e que a cessão do imóvel seja feita com acessórios e pertenças, marca e outros direitos. Haveria negócio de anticrese sobre a base física - imóvel - e penhor sobre bens móveis e pertenças (Código Civil comentado, São Paulo, Atlas, 2003, v. XIV, p. 473).

O § Iº prevê o critério de amortização da dívida garantida com os frutos e rendimentos recebidos pelo credor anticrético. A norma, de caráter dispositivo, vigente no silêncio de convenção em contrário das partes, dispõe que os rendimentos do imóvel anticrético serão imputados preferencialmente no pagamento dos juros. Os juros convencionais e legais encontram limite nos CC 591 e 406 do Código Civil, salvo no caso de instituições financeiras, às quais se permite cobrar juros livremente convencionados, à taxa de mercado. Se os frutos superarem o valor dos juros, serão imputados ao capital.

O § 2º tem relevante novidade, pois não mais adota a limitação, como fazia o Código Civil de 1916, de que a hipoteca e a anticrese de imóveis já gravados com garantia real sejam constituídas apenas em favor do mesmo credor. O devedor anticrético não perde a disponibilidade do imóvel, podendo aliená-lo a terceiros, que respeitarão as garantias reais já constituídas. É lógico, portanto, que o devedor anticrético constitua hipoteca em favor do credor ou de terceiros, ou que o devedor hipotecário possa constituir anticrese em favor do credor ou de terceiros, sem afetar a garantia real anterior. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.612-13.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 11/02/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

No dizer de Guimarães e Mezzalira, constitui-se a anticrese por uma garantia real instituída em favor do credor (credor anticrético), que retém em seu poder bem imóvel alheio, podendo explorá-lo economicamente a fim de pagar-se integralmente quanto a seu crédito.

Distingue-se da hipoteca – daí sua pífia utilização – pelo fato de o devedor, na anticrese, perder a posse direta do bem imóvel, em favor do credor, que o utiliza com o intuito de perceber os frutos extraídos e contabilizá-los no pagamento da dívida principal.

Se já se torna dificultoso alguém adquirir bem gravado com ônus hipotecário, o que dizer de um bem imóvel onerado de anticrese, onde a posse dieta permanece nas mãos do credor, até que seja pago integralmente seu crédito. Trata-se, pois, de um negócio extremamente desvantajoso para o devedor e complexo demais para o próprio credor.

Prescreve o § 2º do CC 1.506 que o bem gravado de anticrese poderá ser hipotecado pelo devedor ao credor anticrético, ou a terceiros, assim como o bem dado em hipoteca poderá ser dado em anticrese. Ou seja, o mesmo credor anticrético poderá ter a seu favor, cumulativamente, a garantia anticrética e hipotecária em relação ao imóvel. Neste caso, a dificuldade comercial do imóvel, para o devedor, aumenta significativamente.

Distingue-se da hipoteca (e do penhor) por outra razão basilar: na anticrese não há direito de preferência ao credor anticrético em caso de inadimplência da dívida principal. Em favor deste há somente direito de retenção do imóvel, até que seja pago integralmente a obrigação, conforme a primeira parte do CC 1.423.

Extingue-se a anticrese pelas mesmas razões que vierem a extinguir a dívida principal, pois é acessória desta, como mera garantia real. Perecendo o bem, de igual forma perecerá a garantia de que se cuida.

Também será extinta a anticrese pela caducidade, quando decorrido o prazo de quinze anos de sua constituição, nos moldes do CC 1.423, segunda parte, do Código Civil. Após tal prazo, ainda que a dívida persista, a garantia real deixa de existir e, via de consequência, o direito de retenção. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao CC 1.506, acessado em 11.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.507. 0 credor anticrético pode administrar os bens dados em anticrese e fruir seus frutos e utilidades, mas deverá apresentar anualmente balanço, exato e fiel, de sua administração.

§ Iº Se o devedor anticrético não concordar com o que se contém no balanço, por ser inexato, ou ruinosa a administração, poderá impugná-lo, e, se o quiser, requerer a transformação em arrendamento, fixando o juiz o valor mensal do aluguel, o qual poderá ser corrigido anualmente.

§ 2º O credor anticrético pode, salvo pacto em sentido contrário, arrendar os bens dados em anticrese a terceiro, mantendo, até ser pago, direito de retenção do imóvel, embora o aluguel desse arrendamento não seja vinculativo para o devedor.

O artigo em exame corresponde ao art. 806 do Código Civil de 1916, com significativas alterações. Como explica Loureiro, recebe o credor anticrético a posse direta do imóvel, podendo usá-lo, fruí-lo e administrá-lo, imputando os frutos e rendimentos na amortização da dívida garantida.

A exploração do imóvel poderá ser feita diretamente pelo credor, que usará as vantagens auferidas no pagamento da dívida. Nada impede que as partes ajustem desde logo um valor prefixado de remuneração decorrente do uso, desde que respeitados os princípios cogentes da boa-fé objetiva e do equilíbrio contratual. Caso não haja prévia estipulação do valor da utilização, deverá o credor apresentar anualmente balanço exato de sua administração, demonstrando os rendimentos e os custos da exploração do imóvel.

No caso de divergência fundada do devedor, quando os rendimentos apresentados forem inferiores aos reais, ou a administração do imóvel for ruinosa, inclusive no que se refere à sua conservação, a exploração direta poderá ser convertida em arrendamento. O juiz, na falta de acordo entre as partes, fixará o valor mensal do aluguel pela exploração do imóvel.

Salvo pacto em contrário, pode ainda o credor arrendar o imóvel a terceiro e receber os rendimentos e aluguéis, usando-os na amortização da dívida. Reterá o imóvel até a solução da obrigação garantida, mas o arrendamento não vincula o devedor anticrético, pois é parte estranha ao contrato. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.613-14.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 11/02/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Constando na doutrina o comentário de Ricardo Fiuza, Credor Anticrético é o titular do direito de retenção do imóvel dado em anticrese. Assim , cabe ao credor anticrético a administração do bem dado em anticrese, devendo prestar contas anualmente ao devedor anticrético . Na hipótese de administração do credor anticrético ser ruinosa, poderá o devedor anticrético impugnar as contas apresentadas, e inclusive transformar a anticrese em arrendamento, sendo o aluguel fixado judicialmente. • O § 2º do artigo trata da faculdade de o credor anticrético arrendar o bem a terceiro, receber o aluguel do arrendamento, que não será vinculado ao devedor, isso se não houver disposição contratual em contrario. • Este dispositivo equipara-se ao art. 806 do Código Civil de 1916, com considerável melhora em sua redação. No mais, deve ser aplicado à matéria o mesmo tratamento doutrinário dado ao referido artigo. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 760, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 11/02/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Complementando Guimarães e Mezzalira, o credor anticrético deve conservar a coisa e administrá-la de acordo com a sua finalidade natural, não podendo aplicar as rendas auferidas com a retenção do bem em outros negócios, limitando-se ao pagamento da obrigação contraída (Gonçalves, 2010, p. 639).

Poderá o credor anticrético, se não quiser utilizar o bem e perceber seus frutos, arrenda-lo a terceiros, salvo se estipulado o contrário no contrato. Deve o credor apresentar balanço anual de sua administração e, se o devedor discordar, poderá impugná-lo e requerer a transformação em arrendamento, fixando o juiz o valor mensal do aluguel. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao CC 1.507, acessado em 11.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.502, 1.503, 1.504, 1.505 Da Hipoteca de Vias Férreas - VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.502, 1.503, 1.504, 1.505

Da Hipoteca de Vias Férreas - VARGAS, Paulo S. R.

- Parte Especial –  Livro III – Capítulo III – DA HIPOTECA

Seção V – Da Hipoteca de Vias Férreas – (Art. 1.502 a 1.505) –

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 Art. 1.502. As hipotecas sobre as estradas de ferro serão registradas no Município da estação inicial da respectiva linha. 

No comentário de Eduardo Loureiro, o artigo em exame regula o registro da hipoteca de estradas de ferro, a ser feito no oficial do registro de imóveis da estação inicial. Constitui exceção à regra do CC 1.492, no sentido de que o registro deve ser feito em todos os oficiais onde estiverem situados os imóveis hipotecados. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.611.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 10/02/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

No entender de Ricardo Fiuza, em sua doutrina, este artigo destaca as estradas de ferro e seus acessórios como objeto de hipoteca, em lace do valor econômico desses bens. A estrada de ferro deve ser compreendida como o leito sobre o qual se assentam a superestrutura metálica (trilhos e dormentes), os prédios destinados às estações, assim como o material rodante, os quais formam um todo que, por estar ligado diretamente ao solo, por acessão intelectual, caracteriza-se como imóvel. • Corresponde ao art. 852 do Código Civil de 1916, devendo a ele ser dado o mesmo tratamento doutrinário.

No mesmo sentido Guimarães e Mezzalira, a hipoteca de estrada de ferro, que abrange o solo, o trilho, as estações, os terrenos marginais e o trem, deve ser registrada no Município da estação inicial da respectiva linha. Trata-se de exceção ao disposto no CC 1.492, uma vez que o seu registro não será feito no local do imóvel. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao CC 1.502, acessado em 10.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.503. Os credores hipotecários não podem embaraçar a exploração da linha, nem contrariar as modificações, que a administração deliberar, no leito da estrada em suas dependências, ou no seu material.

Para a realidade de Loureiro, a regra nada mais é do que o desdobramento de uma das características do direito real de hipoteca, de que o devedor ou prestador da garantia não transfere a posse do bem ao credor.

Avulta-se a importância do preceito, pois a hipoteca sobre linhas férreas recai sobre bem coletivo, destinado à exploração de atividade de interesse público. A falta de preservação da incolumidade de certos componentes da linha, como composições, poderia comprometer a qualidade e a finalidade do transporte coletivo. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.611.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 10/02/2021. Revista e atualizada nesta data por VD). 

No entender de Guimarães e Mezzalira, o credor hipotecário não pode impedir a utilização e a exploração da linha, uma vez que se trata desserviço público que deve ser contínuo e eficiente, tal como estabelecido na Constituição Federal, na Lei n. 8.987/1995 e no Código de Defesa do Consumidor. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao CC 1.503, acessado em 10.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No artigo “A hipoteca das estradas de ferro”, publicada por Rogério Tadeu Romano no site jusbrasil.com.br, em setembro de 2020, tem-se generosamente, um panorama em que o autor da um plus ao artigo em comento, veja-se:

 

A hipoteca é o direito real que o devedor confere ao credor, sobre o bem imóvel ou de sua propriedade ou de outrem para que ele responda sobre o resgaste sobre a dívida. Regem a hipoteca os seguintes princípios: a) Inscrição; b) Especialização (na hipoteca judicial ela se fará por sentença); c) Legalidade; d) Prioridade; e) Publicidade. O seu caráter acessório é nítido. Não há hipoteca em que exista um crédito. Diante dos créditos trabalhistas e ainda fazendários, concorrentes, mas não concursais, o crédito hipotecário real perde a sua preferência.

 

A hipoteca pode ser: Convencional, se vem de relações contratuais; Legal, quando emana da lei; Judicial, se surge de uma decisão judicial podendo ter o conteúdo assecuratório.

Discute-se sobre a hipotecabilidade das estradas de ferro. Até 1890 a questão permaneceria em aberto não figurando, entre os dispositivos da legislação hipotecária revogada, qualquer alusão à hipotecabilidade das estradas de ferro, como o que se pode ler no art. § 1º do Decreto 169 – A, de 19 de janeiro de 1890: § 1º Só podem ser objecto de hypotheca: (…) As estradas de ferro, comprehendendo todos os seus immoveis, accessorios, material fixo e rodante.


Ruy Barbosa, em parecer que ofereceu à Companhia Paulista de Vias Férreas e Fluviais, em 6 de agosto de 1904, concluiu sobre a possibilidade das estradas de ferro serem hipotecadas.

 

Comentando o art. 233 do Decreto 370, de 2 de maio de 1890, diz Ruy Barbosa:

reg. n. 370, de 2 de maio de 1890, art. 243 prescreve que “à exceção das concessões diretamente feitas pelo Estado, mediante lei ou decreto, como sejam as de minas, caminhos de ferro e canais, as demais transmissões entre os particulares e o Estado, como pessoa civil, são sujeitas à transcrição do art. 233 desse regulamento”.

 

Ora o art. 233 desse regulamento só adscreve à transcrição a transmissão entre vivos “dos imóveis suscetíveis de hipoteca“. Se, portanto, as concessões de vias férreas não importassem direitos imobiliários, suscetíveis de hipoteca, o art. 243 daquele ato não as teria que excetuar do preceito da transcrição, consignado no art. 233.

 

Logo a seguir, aludindo ao Decreto 169-A, de 1890, disse: A nossa lei hipotecária (dec. n. 169 A, de 1890, art. 2º, § 1º, declara que podem ser objeto de hipoteca “as estradas de ferro, compreendendo todos os seus imóveis, acessórios, material fixo e rodante”.

 

Ora, não se poderiam chamar estrada de ferro as linhas interiores de carris, que os particulares assentam e mantêm dentro nos limites de seus estabelecimentos e propriedades. Mas, tirando essas, só nos restam as vias férreas do Estado e as pelo Estado concedidas. A estas duas espécies, logo, é que alude o texto acima transcrito. A hipotecabilidade ali determinada abrange, pois, as vias férreas exploradas pelo Estado e as vias férreas exploradas pelas empresas a que o Estado as outorga. O decr. de 1890 cortou aqui, assim, a questão sobre dois pontos controversos noutros países. As ferrovias do Estado não são propriedades dominiais; não estão fora de comércio; não são inalienáveis (…).

 

Podem ser, portanto, hipotecadas. A matéria foi objeto de disciplina no artigo 852 a 855 do Código Civil de 1916. Ditava o artigo 180 do Decreto 4.857, de 9 de novembro de 1939, diploma já revogado: Art. 180. Os atos relativos a vias férreas serão registados no cartório correspondente à estação inicial da respectiva linha.

 

Lei dos Registros Públicos, Lei 6.015/73 assim determinou:

 

Art. 171. Os atos relativos, a vias férreas serão registrados no cartório correspondente à estação inicial da respectiva linha. (Renumerado do art. 170 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975)

 

Somente mais tarde, pela redação dada pelo Código Civil (art. 852 e seguintes), a matéria seria adequadamente regulada. Do Código de 1916, migrou para os regulamentos de Registro e atualmente está disciplinada no art. 171 da Lei 6.015, de 1973).

 

Determina o Código Civil, no artigo 1.473, que as estradas de ferro podem ser objeto de hipoteca. A ferrovia é suscetível de hipoteca, como complexo abrangente de material fixo, envolvendo: trilhos assentados, oficinas, estações, linhas telegráficas.

 

No entendimento de Caio Mário da Silva Pereira (Instituições de Direito Civil, 2ª edição, volume IV, pág. 310) a característica predominante na hipoteca das vias férreas reside na continuidade do seu funcionamento. Para tanto, quer a lei que o credor respeite a administração e suas deliberações, assim no tocante à exploração da linha como nas modificações deliberadas no leito da estrada, em suas dependências e no seu material. Tem-se assim o artigo 1.502 do Código Civil de 2002:

 

Art. 1.502. As hipotecas sobre as estradas de ferro serão registradas no Município da estação inicial da respectiva linha.

 

A hipoteca deve ser objeto de inscrição no Município sede da estação inicial. E quanto à extensão, poderá abranger toda a estrada ou uma determinada linha, caso em que os credores hipotecários têm o direito de impedir operações que possam romper a unidade da exploração comercial, tais como a venda da estrada ou de suas linhas, ou ainda a fusão com outra empresa que a garantia lhes parece com isso ser enfraquecida.

 

Defende-se aqui a aplicabilidade do art. 171 da Lei nº 6.015/73, pois os atos relativos às vias férreas devem ser registrados no cartório correspondente à estação inicial da respectiva linha, a fim de respeitar o vetor de conhecimento da territorialidade. Aliás, este dispositivo legal deveria ser paragrafado lançando a obrigatoriedade de remissões recíprocas nas matrículas interceptadas pelo eixo da linha férrea nas respectivas Serventias Extrajudiciais Imobiliárias, como bem acentuou André Luís Fontanela (O procedimento registral das linhas férreas).

 

Tem-se do artigo 1.503 do Código Civil de 2002: Art. 1.503. Os credores hipotecários não podem embaraçar a exploração da linha nem contrariar as modificações, que a administração deliberar, no leito da estrada ,em suas dependências, ou no seu material.

Embaraçar é estorvar, impedir, tolher, dificultar, incomodar. O texto não só cogita de credores hipotecários, e, como tais, não podem pretender nem a posse, nem o uso, nem o gozo ou a exploração da via hipotecada. (Rogério Tadeu Romano no site jusbrasil.com.br, em setembro de 2020, no artigo “A hipoteca das estradas de ferro”,  acessado em 10.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Art. 1.504. A hipoteca será circunscrita à linha ou às linhas especificadas na escritura e ao respectivo material de exploração, no estado em que ao tempo da execução estiverem; mas os credores hipotecários poderão opor-se à venda da estrada, à de suas linhas, de seus ramais ou de parte considerável do material de exploração; bem como à fusão com outra empresa, sempre que com isso a garantia do débito enfraquecer. 

Como no comentário ao artigo, Loureiro alerta: O artigo em exame reúne algumas regras específicas sobre a hipoteca de linhas férreas. A primeira é que a hipoteca pode recair sobre toda a estrada de ferro ou somente sobre determinadas linhas, de acordo com o que especificar o respectivo título.

A segunda é que a linha férrea é um bem coletivo (art. 90 do CC), pois se constitui de uma pluralidade de bens singulares, pertinentes à mesma pessoa, com destinação unitária. A garantia abrange a totalidade do bem, incluindo materiais de exploração tais como estações, escritórios, pátios de manobras, bilheterias, galpões de carga, locomotivas, vagões e tudo o mais que for necessário ao funcionamento regular da linha.

A terceira é que os credores podem se opor à venda da estrada, das linhas ou de parte considerável do material de exploração, assim como à fusão com outra empresa, sempre que tais atos enfraquecerem a garantia. Não se aplica às linhas férreas, portanto, a regra cogente do art. 1.475 do Código Civil, que comina a nulidade da cláusula proibitiva de alienação do bem hipotecado. Cabe ao credor uma de duas alternativas: (i) opor-se à venda; (ii) considerar a dívida vencida antecipadamente. Cabe-lhe, porém, o ônus de demonstrar que os atos de alienação ou fusão provocaram a deterioração da garantia. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.611-12.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 10/02/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

No comentário de Rogério Tadeu Romano, por sua vez, segundo o CC 1.504, prescreve: A hipoteca será circunscrita à linha ou às linhas especificadas na escritura e ao respectivo material de exploração, no estado em que ao tempo da execução estiverem; mas os credores hipotecários poderão opor-se à venda da estrada, à de suas linhas, de seus ramais ou departe considerável do material de exploração; bem como à fusão com outra empresa, sempre que com isso a garantia do débito enfraquecer.

Estudando o artigo 854 do Código Civil de 1916, Tito Fulgêncio (Direito Real de Hipoteca, volume II, 1960, pág. 491) dizia com relação a expressão “a hipoteca será circunscrita à linha, ou linhas especificadas”, que isso, porém, se entende, como de hermenêutica, sem prejuízo da compreensão, de maneira que, particularizadas às linhas, o ramal, a estrada, o vínculo hipotecário abrange o solo, os trilhos, construções acessórias, respectivo material de exploração. A escritura é forma especial de constituição da garantia.

Entende-se que a hipoteca em geral não impede as alienações, o devedor hipotecário continua senhor e possuidor do imóvel, pode livremente dispor da coisa, que seguirá para o poder do adquirente com o ônus hipotecário, garantido o credor por sequela e preferência.

Os credores hipotecários, não obstante, poderão opor-se: a) à venda de estrada, à de suas linhas, de seus ramais, ou de parte considerável do material de exploração; bem como à fusão com outra empresa, sempre que a garantia lhes parecer enfraquecida (artigo 824 do CC de 1916).

Disse então Tito Fulgêncio (obra citada, pág. 492): “O legislador, aqui, por necessidades de crédito, restringe esse direito do devedor, concedendo ao credor a faculdade de impedir-lhe o uso, vetando a venda in totum ou em parte, da estrada, de uma ou mais linhas, de todo ou de parte considerável do material de exploração, do ramal ou ramais.

Em caso de arrematação, nos casos de execução, não se passará carta ao maior licitante antes da intimação ao representante da Fazenda Nacional ou do Estado a que tocar a preferência para utilizá-la no prazo de quinze dias, pagando o preço da arrematação ou da adjudicação. 

Tal refere-se ao credor hipotecário que requerer para seu pagamento a adjudicação da via férrea hipotecada, ao qual, sendo requerido, expede-se para título e prova do seu direito, carta de adjudicação com as formalidades da arrematação, substituindo o auto desta pela de adjudicação, como ainda informou Tito Fulgêncio (obra citada, pág. 493). (Rogério Tadeu Romano no site jusbrasil.com.br, em setembro de 2020, no artigo “A hipoteca das estradas de ferro”,  acessado em 10.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Lecionando, Guimarães e Mezzalira, demonstram que o dispositivo exige a perfeita especialização dos bens gravados como forma de delimitação da garantia, até mesmo para que não ocorra a confusão com bens de terceiros. 

Os credores hipotecários poderão opor-se à venda da estrada, de suas linhas, de seus ramais ou de parte considerável do material de exploração. Trata-se de exceção à regra de que a venda não viola a garantia, tendo em vista a possibilidade de enfraquecimento da garantia. A alienação da via férrea, apesar da oposição do credor, constitui causa configuradora do vencimento antecipado da dívida (CC 1.425). (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao CC 1.504, acessado em 10.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.505. Na execução das hipotecas será intimado o representante da União ou do Estado, para, dentro em quinze dias, remir a estrada de ferro hipotecada, pagando o preço da arrematação ou da adjudicação. 

De acordo com o comentário de Loureiro, a antinomia com o art. 699 do CPC (Revogado pela Lei nº 11.382, de 2006) se resolve a favor do Código Civil de 2002, lei posterior, da mesma hierarquia, que regula idêntico tema de modo diverso. Diante do interesse público decorrente da natureza da atividade de transporte público, confere a lei o direito potestativo da administração pública federal ou estadual de remir a hipoteca, pelo preço da arrematação ou adjudicação, no prazo fatal de quinze dias, com termo inicial da data da intimação. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.612.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 10/02/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Estudando no compasso de Guimarães e Mezzalira, no caso de execução da garantia e de arrematação ou adjudicação da coisa, tendo em vista o interesse público, o representante da União ou do Estado deverá ser intimado para o exercício de direito de preferência, mediante remição, no prazo de 15 dias contados da intimação.

A previsão se ajusta à função social da propriedade, possibilitando que uma pessoa jurídica de direito público venha a continuar a exploração da estrade de ferro. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao CC 1.505, acessado em 10.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Comentando o artigo 1.505, Romano cita, tinha-se o artigo 855 do Código Civil de 1916, revogado: Nas execuções dessas hipotecas não se passará carta ao maior licitante, nem ao credor adjudicatário, antes de se intimar o representante a Fazenda Nacional, ou do Estado, a que tocar a preferência, para, dentro em quinze dias, utilizá-la, se quiser, pagamento o preço da arrematação, ou da adjudicação fixada. Consagrava aquele artigo 855 do Código Civil de 1916 o direito de remir, sobreposto ao de arrematação ou adjudicação. 

Como acentuou Caio Mário da Silva Pereira (obra citada, pág. 311) outra peculiaridade da hipoteca de ferrovia é que, no caso de arrematação, não se passará carta ao maior licitante antes da intimação do Representante da Fazenda Nacional ou do Estado, a que tocar a preferência, para utilizá-la no prazo de 15 (quinze) dias, pagando o preço da arrematação ou adjudicação. 

A propósito leia-se: o que dizia o CPC de 1939 (artigo 976, parágrafo único; artigo 985 e 953; Decreto-lei nº 3.109, de 13 de setembro de 1945; Decreto nº 4.857, de 9 de novembro de 1939, artigo 180; Decreto-lei nº 1.000, de 21 de outubro de 1969, artigo 169).

O prazo instituído no artigo 855 do Código Civil de 1916 não é extintivo para a Fazenda Pública, como disse Clóvis Beviláqua, ao ensinar: “Não obstante a carta, a Fazenda Pública exercerá esse direito, chamando a si a estrada pelo preço fixado”. (Rogério Tadeu Romano no site jusbrasil.com.br, em setembro de 2020, no artigo “A hipoteca das estradas de ferro”,  acessado em 10.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

terça-feira, 9 de fevereiro de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.499, 1.500, 1.501 Da Extinção da Hipoteca - VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.499, 1.500, 1.501

Da Extinção da Hipoteca - VARGAS, Paulo S. R.

- Parte Especial –  Livro III – Capítulo III – DA HIPOTECA

Seção IV – Da Extinção da Hipoteca – (Art. 1.499 a 1.501) –

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 Art. 1.499. A hipoteca extingue-se:

I — pela extinção da obrigação principal;

II— pelo perecimento da coisa;

III — pela resolução da propriedade;

IV — pela renúncia do credor;

V — pela remição;

VI — pela arrematação ou adjudicação.

Falha no cumprimento da Lei, denunciado por Loureiro, o artigo em exame contém alterações em relação ao seu correspondente no Código Civil de 1916. Foram suprimidas duas hipóteses legais de extinção da hipoteca - sentença passada em julgado e prescrição - que, porém, ainda persistem no ordenamento jurídico, englobadas em outras causas.

Engloba o preceito causas extintivas somente da hipoteca, mantendo íntegra a obrigação, com outras que extinguem a obrigação e, por via de consequência, a hipoteca que lhe é acessória. Todas as causas extintivas devem ser levadas ao registro de imóveis, para efeito de averbação do cancelamento.

Não é o rol do artigo em estudo exaustivo, tanto assim que o art. 1.500, adiante comentado, acrescenta que a hipoteca também se extingue com o cancelamento do registro, à vista da respectiva prova. Além disso, outras causas podem ser somadas, como a consolidação, a perempção (CC 1.485), a falta de renovação da especialização (CC 1.498), o decurso do prazo da garantia, a desapropriação e a usucapião do bem hipotecado.

A primeira causa (inciso I) diz que se extingue a hipoteca pela extinção da obrigação principal. A hipoteca, como direito real de garantia, é acessória à obrigação principal e segue a sorte jurídica desta. Não se concebe a persistência da garantia após o desaparecimento da obrigação garantida. No caso de extinção da obrigação pelo pagamento, deve ser este integral, pois se saldo credor houver a hipoteca permanece por inteiro, em obediência ao princípio da indivisibilidade.

Como adverte, porém, Caio Mário da Silva Pereira, a regra não tem caráter absoluto. Pode ocorrer de a obrigação se extinguir por razão que permita a sobrevivência ou transferência da obrigação acessória. É o caso do pagamento com sub-rogação, que “sem perder a qualificação de modalidade extintiva da obrigação transfere ao solvens todos os direitos, ações, privilégios e garantias do primitivo, em solução da dívida contra o devedor principal e os fiadores (CC 349 do CC)” (Instituições de direito civil, 18. ed. Rio de Janeiro, Forense, v. IV, p. 406).

A novação extingue a obrigação primitiva em razão do surgimento de nova obrigação. Em tal caso, somente persistem as garantias da obrigação extinta se o devedor ou mesmo o terceiro prestador da garantia participarem da novação, com expressa ressalva da manutenção dos acessórios (CC 364). No silêncio das partes, o efeito natural é o da extinção dos acessórios, entre os quais a hipoteca.

A dação em pagamento, após o vencimento da dívida (CC 1.428), também extingue a hipoteca, salvo o caso de evicção (CC 359), com o restabelecimento da obrigação primitiva e de seus acessórios.

Os demais casos de extinção da obrigação, como inexistência, nulidade ou anulação, também levam à extinção da hipoteca. A prescrição da pretensão da obrigação principal acarreta a prescrição da pretensão de execução da garantia, o mesmo podendo ser dito da decadência.

A segunda causa (inciso II) diz que se extingue a hipoteca pelo perecimento da coisa. O perecimento será mais comum nos casos de hipotecas sobre navios e aeronaves. Pode ocorrer, em casos excepcionais, o perecimento do imóvel, que deve ser total para a extinção da garantia. Se for parcial, a hipoteca continua a gravar o remanescente, podendo o credor pedir o reforço, sob pena de vencimento antecipado. 

Na lição de Caio Mário da Silva Pereira, “se for devida indenização por terceiro, tendo como causa a destruição da coisa, não se altera o princípio da extinção da hipoteca, pois o direito do credor hipotecário se desloca para o seu valor (sub-rogação real), conservando o caráter preferencial” (op. cit., p. 401). O mesmo se dá na desapropriação, sub-rogando-se o credor hipotecário no respectivo preço.

A terceira causa (inciso III) diz que se extingue a hipoteca pela resolução da propriedade. A propriedade resolúvel está regulada nos arts. 1.359 e 1.360 do Código Civil, já estudados. Não perde o proprietário resolúvel o jus disponendi, de modo que também pode gravar o imóvel com direito real de garantia. Resolvido o domínio, com ele resolvem-se juntamente todos os direitos reais sobre coisa alheia. Pode a propriedade resolver-se por causa já constante do título, ou por causa superveniente. Se a causa constar do próprio título, como condição ou cláusula resolutiva expressa, a termo, ou cláusula de retrovenda, ou propriedade fiduciária, levadas ao registro imobiliário, a resolução da propriedade arrasta consigo os direitos reais posteriormente constituídos (CC 1.359). Se a resolução se der por causa superveniente, como nos casos de revogação da doação, ou cláusula resolutiva tácita, ou descumprimento de encargo (propriedade ad tempus), o fato extintivo acarreta a transmissão do domínio no estado em que se encontra: diminuído, modificado, aumentado, juridicamente ou materialmente. Sua eficácia é para o futuro (CC 1.360).

Alguns autores encaixam a usucapião do imóvel hipotecado no inciso III, em estudo. O usucapiente adquire o imóvel desonerado, pois rompe a cadeia dominial, dado o modo originário de aquisição. Por isso, deve o credor hipotecário ser citado como litisconsorte necessário passivo na ação de usucapião, pois será atingido no caso de sentença de procedência. 

A quarta causa (inciso IV ) diz que se extingue a hipoteca pela renúncia do credor. Aplica-se a regra à hipoteca convencional. Alguns casos de hipoteca legal são irrenunciáveis (incisos I e II do CC 1.489), pois envolvem normas cogentes, ou interesses de incapazes. Admite-se, porém, a renúncia à hipoteca legal em outros casos, como o do coerdeiro para garantia da torna, ou do credor sobre o imóvel arrematado, ou do ofendido capaz sobre os imóveis do delinquente, pois envolvem direito patrimonial disponível (incisos III, IV e V do CC 1.489).

A renúncia é forma de exercício de direito e exige do renunciante não só a capacidade para a prática dos atos da vida civil em geral, como também a disposição do crédito garantido. Por isso se admite a renúncia em necessidade de outorga uxória. Se expressa, deve instrumentalizar-se por escritura pública, em respeito ao que dispõe o CC 108, que expressamente alude a renúncia de direitos reais sobre imóveis. Embora controversa, admite-se a renúncia tácita, por comportamento concludente do credor, abdicando da garantia. São os casos da assinatura sem ressalva do credor, com o vendedor, da escritura de venda do imóvel gravado, prevista no art. 276 da LRP (Lei n. 6.015/73), ou quando permanece inerte, depois de notificado da penhora sobre o bem gravado, levada a efeito por credor quirografário (CC 1.501).

Com a renúncia da hipoteca, remanesce o crédito sem garantia, convertendo-se em quirografário. Se a renúncia for do crédito, extingue-se com ele a garantia acessória.

A quinta causa (inciso V) diz que se extingue a hipoteca pela remição, ou resgate, estudada nos CC 1.478 a 1.481, aos quais se remete o leitor.

A sexta e última causa prevista em lei (inciso VI) diz que se extingue a hipoteca pela arrematação ou adjudicação. Levado o bem objeto da garantia à excussão, o credor se satisfez com o produto da venda judicial, ou pela adjudicação do bem para si. O valor da venda judicial substitui o bem objeto da garantia. Se o produto da alienação for inferior ao crédito garantido, o saldo remanescente persistirá como quirografário, pois esgotada está a garantia. O arrematante recebe o imóvel livre das hipotecas, ainda que posteriores, pois o concurso de credores se estabelecerá sobre o produto da arrematação. 

A única dúvida que desperta o preceito é a sua aplicação a qualquer alienação em hasta pública, ou somente à venda judicial promovida pelo próprio credor hipotecário. A resposta está no CC 1.501, adiante comentado. Se o credor hipotecário for notificado judicialmente da execução promovida por outros credores e permanecer inerte, a arrematação e a adjudicação extinguem a hipoteca. Caso não se faça a notificação, a venda judicial é ineficaz perante o credor hipotecário e não extingue a hipoteca, que continua a gravar o bem do arrematante.

A mesma regra vale para a adjudicação, na ausência de licitantes. Pode o credor hipotecário requerer a adjudicação, por preço não inferior ao que consta do edital. Se o valor do bem for superior ao do crédito, depositará o credor a diferença, para ser rateada entre os demais credores, ou, na sua falta, devolvida ao devedor. Admitem os tribunais que em segunda praça a adjudicação se faça por valor inferior ao da avaliação, desde que o preço não se qualifique como vil (RSTJ 75/345, STJ-RT 788/212). O terceiro credor que pretenda adjudicar o bem hipotecado deve previamente notificar o credor hipotecário. Caso esse manifeste preferência, o terceiro credor deverá depositar inteiramente o valor de avaliação, para não frustrar o privilégio da hipoteca (RT608/108,612/167,661/107, entre outros). Se o credor hipotecário permanecer inerte, será dispensado o depósito e a hipoteca se extingue, tal como ocorre na arrematação. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.604-06.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 09/02/2021. Revista e atualizada nesta data por VD). 

Na mensagem do relator Ricardo Fiuza, são causas da extinção de hipoteca: a) o desaparecimento da obrigação principal — sendo a hipoteca um direito acessório para garantir uma obrigação, extinguindo-se esta, a hipoteca perde sua razão de ser e existir, não se indagando da causa extintiva da obrigação; b) o perecimento da coisa — a destruição da coisa tira da hipoteca seu objeto; c) a resolução da propriedade — havendo desapropriação. transfere-se o bem para o patrimônio do Poder Público, produzindo assim o mesmo resultado da destruição; d) a renúncia do credor deve ser sempre expressa, não se admitindo renúncia tácita; será considerado renúncia da hipoteca o requerimento de seu cancelamento, mesmo sendo o pagamento feito em conjunto pelo devedor e pelo credor; e) a remição — não a remição da dívida, e sim a do imóvel (v. os arts. 1.478, 1.481 e 1.484); f) a arrematação ou a adjudicação — modalidades de aquisição em hasta pública, em ambas as hipóteses, uma vez depositado o preço, será expedida a carta respectiva pelo cartório competente. • O dispositivo é idêntico ao art. 849 do Código Civil de 1916, devendo a ele ser dado o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 757, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 09/02/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Nos comentários de Guimarães e Mezzalira, pela extinção da obrigação principal: tratando-se de mero direito acessório, vinculado à obrigação principal, ficará extinta a  garantia real quando igualmente for extinta aquela, da qual é dependente. Já a recíproca não é verdadeira, pois a obrigação principal pode sobreviver por si só (Rodrigues, 2003, p. 414). 

Pelo perecimento da coisa: tal previsão tem amparo no preceito geral informativo de que, deixando de existir o bem que gerou o direito, este também deixará de existir, por consequência lógica e perda de objeto. 

Pela resolução da propriedade: tal disposição segue o preceito contido no CC 1.359, prevendo que “resolvido o domínio pela condição ou advento do termo, resolvem-se também os direitos reais pendentes”. 

Pela renúncia do credor: em se tratando de renúncia pelo credor quanto à garantia real que assegura o pagamento da obrigação principal, a consequência jurídica de tal ato é que deixará de haver a preferência a seu favor, quanto a eventual alienação judicial do bem. Por outro lado, se o credor hipotecário renunciar à obrigação principal, ocorrerá o perdão da dívida (remissão). Extinguindo a obrigação, conforme o CC 385. 

Pela remição: a remição consiste na liberação do ônus real incidente sobre o bem imóvel, mediante o pagamento da hipoteca, feita pelo devedor, pelo credor subipotecário ou pelo adquirente do imóvel hipotecado, independentemente de autorização do  credor, gerando a extinção da hipoteca. 

Pela arrematação ou adjudicação: com o praceamento do imóvel hipotecado, em função da inadimplência do devedor, extingue-se o direito real de hipoteca sobre ele incidente, seja por arrematação ou adjudicação, eis que o bem imóvel sai do domínio do devedor. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao CC 1.499, acessado em 09.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Art. 1.500. Extingue-se ainda a hipoteca com a averbação, no Registro de Imóveis, do cancelamento do registro, à vista da respectiva prova. 

Como instrui Loureiro, é dispensável a regra, pois a matéria se encontra disciplinada de modo superior pelo art. 251 da LRP (Lei n. 6.015/73). O cancelamento do registro é ato essencialmente causai. Repousa na vontade das partes (voluntária ou convencional) ou por decisão judicial ou administrativa (coativa ou necessária).

Dispõe o aludido artigo que a averbação do cancelamento da hipoteca poderá ser feita nos seguintes casos:

• À vista de autorização expressa de quitação outorgada pelo credor ou seu sucessor, em instrumento público ou particular.

• Em razão de procedimento administrativo ou contencioso, no qual o credor tenha sido intimado. A intimação do credor é indispensável. O procedimento pode ser contencioso, no qual se ataca o título e por tabela o registro, ou somente o registro. O procedimento pode ser ainda administrativo, perante o juiz corregedor permanente, com base em vícios do próprio mecanismo de registro, ou em matéria que dependa de aferição de fatos (perecimento, renúncia tácita etc.).

• De conformidade com a legislação especial referente às cédulas hipotecárias (Decreto-lei n. 70/66), à vista do título em poder do devedor.

Nos termos do art. 253 da LRP, ao terceiro prejudicado é lícito, em juízo, fazer prova da extinção dos ônus reais, e promover o cancelamento do registro. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.607.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 09/02/2021. Revista e atualizada nesta data por VD). 

Guimarães e Mezzalira escrevem que a extinção da hipoteca começa a produzir efeitos em relação a terceiros a partir da averbação, cujos efeitos retroagem à data em que ocorreu a causa extintiva.

O cancelamento da hipoteca opera da mesma forma que o seu registro. Confere publicidade ao ato, possibilitando o conhecimento a respeito da solução do débito. Pode ser requerida pelo devedor, ou por quem o represente, apresentando-se prova da sua extinção. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao CC 1.500, acessado em 09.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No dizer de Vilson Farias e Luciane da Costa Chaves, em artigo de 21 de junho de 2009, publicado no site Consultor Jurídico, conjur.com.br/ intitulado “Exoneração da fiança deve ter prazo indeterminado”.

Primeiramente, faz-se necessário trazer à baila a definição de fiança. Pois bem, a partir da interpretação do artigo 818 do Código Civil de 2002, tem-se que a fiança é um contrato acessório, pelo qual uma pessoa garante satisfazer a obrigação assumida ao credor pelo devedor, num outro contrato principal.

Já adentrando no tema por proposto no presente artigo, cumpre mencionar que o Código Civil de 1916 já previa a possibilidade do fiador requerer a exoneração da fiança, nos casos de contratos por tempo indeterminado, em seu artigo 1.500, que ora transcrevemos: “Artigo 1.500. O fiador poderá exonerar-se da fiança que tiver assinado sem limitação de tempo, sempre que lhe convier, ficando, porém, obrigado por todos os efeitos da fiança, anteriores ao ato amigável, ou à sentença que o exonerar.” 

Tal faculdade do fiador foi recepcionada pelo novo Código Civil de 2002, através do artigo 535, o qual apresenta redação diferente apenas na sua parte final, senão vejamos: “Artigo 535. O fiador poderá exonerar-se da fiança que tiver assinado sem limitação de tempo, sempre que lhe convier, ficando obrigado por todos os efeitos da fiança, durante os sessenta dias após a notificação do credor.”

Assim, por exemplo, se um contrato de locação, que originalmente foi firmado por prazo determinado, sofrer prorrogação e passar a vigorar por prazo indeterminado, pode o fiador exonerar-se da fiança, ingressando com Ação de Exoneração de Fiança, com amparo legal, nos dispositivos supramencionados. 

O problema surge quando presente no contrato de fiança cláusula de renúncia ao artigo 1.500 do Código Civil de 1916 ou ao artigo 535 do Código Civil de 2002, devido à controvérsia tanto na doutrina como na jurisprudência, sobre a eficácia, ou não, nos contratos de fiança, sem limitação de tempo, de cláusula de renúncia do fiador à faculdade de exonerar-se de tal ônus.

Também há controvérsia acerca da eficácia da cláusula “até a entrega das chaves”, contida nos contratos de locação. De um lado, entende-se que a garantia da fiança não induz perpetuidade, não podendo, o fiador, permanecer indefinidamente obrigado, conforme ensinam os civilistas brasileiros clássicos, Clóvis Beviláqua e Carvalho Santos.

Outra corrente considera impróprio o argumento de impossibilidade de perpetuidade, porque, contrato acessório, perdurará enquanto existir o contrato principal, sem que se questione a eternidade de ambos os contratos, mesmo os de prazo indeterminado. E salienta serem renunciáveis todos os direitos disponíveis, inclusive o previsto no artigo 535 do Código Civil de 2002, antigo artigo 1.500 do Código Civil de 1916. 

Na jurisprudência predomina o entendimento de que o fiador pode se exonerar da fiança por prazo indeterminado, mesmo quando o contrato estipula cláusula de renúncia ao artigo 1500 do Código Civil de 1916 ou ao artigo 535 do Código Civil de 2002 ou a cláusula “até a entrega das chaves” (nos contratos de locação), conforme ilustrado com as seguintes ementas:

Apelação civil. Ação de exoneração de fiança. locação não residencial. Contrato de locação prorrogado por prazo indeterminado. Notificação extrajudicial procedida. Invalidade da cláusula contratual que dispõe sobre renuncia ao direito de exoneração da fiança. Manifesta adesão. Prerrogativa prevista no artigo 835 do Código civil vigente. Sentença mantida por seus próprios fundamentos jurídicos e de direito. por unanimidade, negaram provimento ao apelo.  (Apelação cível 70014830491, DÉCIMA QUINTA CÂMARA CÍVEL DO TJRS, REL. ANGELO MARANINCHI GIANNAKOS, JULGADO EM 03/05/2006).

Declaratória - Exoneração de Fiança - Locação prorrogada. Obrigação dos fiadores até a entrega das chaves. Admissibilidade. Podem os fiadores, em contrato de locação, prorrogado por prazo indeterminado, em que se obrigaram a cumprir as cláusulas contratuais até a entrega das chaves do imóvel, exonerar-se da garantia prestada, independentemente de notificação prévia, mediante ação declaratória (artigo 1.500 do Código Civil). (TAPR - AC 3.378/88 - 1ª C - Rel. Juiz Accacio Cambi - J. 20.12.88) (RTJE 69/172).

Fiança - contrato prorrogado por tempo indeterminado  - O artigo 34 da Lei 6.649, de 1979, faculta ao locador exigir do inquilino novo fiador no prazo de trinta dias após a prorrogação da avença, sob pena de garantir-se mediante caução. Mas ao fiador incumbe, não mais desejando continuar como garante do cumprimento do contrato, pedir sua exoneração nos moldes do artigo 1.500 do Código Civil, não se podendo falar em interpretação extensiva, porque a vinculação da fiança ao contrato prorrogado não representa ampliação de ônus para o fiador. Provida. (TJ-MS - Ap. 1.004/86 - T. Civ. - Rel. Des. Sérgio Martins - J. 17.06.86) (RJ 123/153).

Fiança - locação - Cláusula "até a entrega das chaves'' - Exoneração - Artigo 1.500 do CC - A fiança dada a contrato de locação com cláusula "até a entrega das chaves'' não implica renúncia à faculdade de exonerar-se o fiador da garantia, concedida pelo art. 1.500 do CC. (STJ - REsp 1.765-SP - 3ª T - Rel. Min. Cláudio Santos - DJU 23.04.90) (RJ 152/81).

Devido à acessoriedade do contrato de fiança em relação ao principal, se este último se extingue, automaticamente a fiança se extingue. Do mesmo modo, se o contrato principal é prorrogado, prorroga-se também a fiança. Porém, conclui-se que no caso do contrato prorrogar-se por prazo indeterminado, o fiador não está obrigado a permanecer com o ônus infinitamente, pois a legislação civil pátria prevê a possibilidade do mesmo exonerar-se da fiança, até porque, seria injusto se não houvesse tal hipótese, tendo em vista que o fiador muitas vezes acaba aderindo ao contrato sem saber ao certo quais as obrigações daí advindas.  (Vilson Farias e Luciane da Costa Chaves, em artigo de 21 de junho de 2009, publicado no site Consultor Jurídico, conjur.com.br/ intitulado “Exoneração da fiança deve ter prazo indeterminado”, acessado em 09.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Segundo a doutrina do Relator Ricardo Fiuza, este artigo prevê a extinção da hipoteca pelo cancelamento do registro. mediante apresentação da prova de quitação. Equipara-se aos arts. 850 e 851 do Código Civil de 1916, conjugando-os com considerável melhora em sua redação. No mais, deve ser aplicado à matéria o mesmo tratamento doutrinário dado aos dispositivos apontados. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 757, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 09/02/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Art. 1.501. Não extinguirá a hipoteca, devidamente registrada, a arrematação ou adjudicação, sem que tenham sido notificados judicialmente os respectivos credores hipotecários, que não forem de qualquer modo portes na execução. 

Segundo parecer de Loureiro, viu-se no comentário ao CC 1.499, VI, que a arrematação e a adjudicação do imóvel extinguem a hipoteca. Exceção a tal regra é a venda em hasta pública promovida por terceiro credor, sem prévia notificação dos credores hipotecários que não forem de qualquer modo parte na execução.

O art. 615 do Código de Processo Civil/1973, (correspondendo hoje ao art. 799 no CPC/2015) dispõe que incumbe ainda ao credor requerer a intimação dos credores pignoratício, hipotecário e anticrético e do usufrutuário, quando a penhora recair sobre bem gravado. O art. 619 do Código de Processo Civil/1973 (atual art. 804 no CPC/2015) acrescenta ser ineficaz a alienação dos bens gravados em relação aos credores garantidos e ao usufrutuário, se não forem estes intimados. Disso decorre a necessidade da intimação dos aludidos credores tanto da penhora quanto da hasta pública. 

O art. 694 do Código de Processo Civil/1973 (correspondendo atualmente ao art. 903 no CPC/2015) reza que poderá desfazer-se a arrematação nos casos previstos no art. 698 (substituído e correspondendo atualmente ao inciso II do art. 899, no CPC/2015). 0 art. 698 do Código de Processo Civil/1973, (substituído e correspondendo atualmente ao inciso II do art. 899, no CPC/2015), finalmente, determina que não se efetuará a praça de imóvel hipotecado ou emprazado, sem que seja cientificado, por qualquer modo idôneo, com dez dias pelo menos de antecedência, o credor hipotecário ou o senhorio direto, que não seja de qualquer modo parte na execução. 

Devem ser intimados todos os credores hipotecários, no caso de hipotecas de diversos graus, sem distinção entre eles. De igual modo, deve o credor hipotecário de grau superior intimar o credor hipotecário de grau inferior, para o exercício da preferência (RTJ 98/1.111 e 105/377). 

Os tribunais ora afirmavam que a praça realizada sem prévia intimação do credor hipotecário era nula (desfeita), ora que era ineficaz, ou, ainda, que poderia optar o credor entre a nulidade e a ineficácia. O artigo em exame põe fim à vacilação dos tribunais. A praça é válida e a arrematação ou adjudicação não são desfeitas. Apenas e tão somente a hipoteca não se extingue e continua a gravar o imóvel adquirido pelo arrematante ou adjudicatário. Embora o art. 698 do CPC/1973 (correspondendo atualmente ao art. 903 no CPC/2015),  tenha recebido nova redação por força da Lei n. 11.382/2006, ou seja, tornou-se norma posterior à do Código Civil, o melhor entendimento ainda é no sentido de que a alienação é válida, mas apenas ineficaz frente ao credor hipotecário.

O oficial do registro imobiliário, ao fazer o registro da arrematação/adjudicação, deve exigir prova da prévia intimação do credor hipotecário, para fazer a averbação do cancelamento da hipoteca. Sem tal prova, a arrematação/adjudicação ingressa no registro, mas o imóvel continua gravado. Entendem os tribunais não ter o devedor legitimidade para arguir a invalidade ou ineficácia da hasta pública, por falta de intimação do credor hipotecário (RSTJ 36/309). 

Se o credor hipotecário, porém, foi regularmente intimado dos termos da execução e permaneceu inerte, deixando de manifestar o seu interesse ou de exercer a preferência no recebimento do preço da arrematação, ou ainda de exigir o depósito do preço na adjudicação, opera-se a extinção da hipoteca. Não parece ser exata, porém, a afirmação contida em alguns julgados, inclusive do STJ, de que a hipoteca em tal caso se extingue, dada a natureza originária da aquisição por arrematação. A aquisição na verdade é derivada, tanto assim que outros direitos reais sobre coisa alheia - usufruto, servidão, superfície - não são afetados nem se extinguem pela arrematação. O que ocorre é a sub-rogação dos direitos reais de garantia, que tinham por objeto a coisa e passam a incidir sobre o preço, para a satisfação do crédito. 

O credor hipotecário, devidamente intimado, mediante simples pedido formulado nos autos da execução movida pelo credor quirografário, assegurará sua preferência no recebimento do crédito decorrente da arrematação. Não há a necessidade de o credor hipotecário ter a iniciativa da execução, ou ter realizado a penhora, para exercer a preferência em execução alheia. Diverge a jurisprudência apenas sobre a necessidade de o credor hipotecário já ter ajuizado a ação de execução para o fim de submeter seu crédito ao crivo do contraditório. O entendimento majoritário e mais recente do STJ é no sentido da desnecessidade de tal providência. Também não há necessidade nem cabimento do ajuizamento de embargos de terceiro, pois a constrição realizada por credor quirografário será mantida. O que se discutirá é apenas a preferência no concurso sobre o produto da arrematação. 

Outro problema controverso diz respeito às obrigações não vencidas, ou ilíquidas, garantidas por hipoteca. O credor hipotecário não pode exercer a preferência, pois não é seu crédito ainda exigível. Na opinião de Gladston Mamede, aplica-se por analogia o disposto no CC 1.477 “salvo caso de insolvência do devedor, o credor de segunda hipoteca não poderá executar o imóvel antes de vencida a primeira”. Se a regra vale para credor hipotecário de grau mais elevado, vale também para o credor quirografário, sem o que ficaria em melhor posição do que o credor garantido (Código Civil comentado. São Paulo, Atlas, 2003, v. XIV, p. 461). Há posicionamento do STJ, no entanto, no sentido de que, “ não estando vencida e não tendo o credor hipotecário condições de promover a sua execução, a garantia acompanha o bem objeto da arrematação” (STJ, REsp n. 32.881/SP, 4ª T., rel. Min. Cesar Asfor Rocha, voto do Min. Ruy Rosado de Aguiar, j. 02.12.1997, DJ 27.04.1998). 

Questão distinta é a das cédulas de crédito hipotecárias (Decretos-lei n. 167/67 e 413/69), que conferem garantia exclusiva ao credor e impedem a alienação dos bens hipotecados. Não podem tais imóveis ser penhorados por credores diversos, o que enseja ao credor hipotecário embargos de terceiro, para levantar a constrição indevida. Lembre-se, todavia, de que a impenhorabilidade não alcança os créditos com privilégio legal (fiscais, trabalhistas, acidentários e previdenciários) que gozam de melhor preferência. A inalienabilidade, segundo entendimento dos tribunais, não pode subverter a ordem de preferência, razão pela qual se admitem a penhora e a venda dos imóveis hipotecados em hasta pública, para instauração de concurso de credores (STJ, REsp n. 247.855/MG, 4ª T„ rel. Sálvio de Figueiredo Teixeira, j. 08.08.2000, DJ 12.02.2002; STJ, REsp n. 117.368/PE, 2ª T„ rel. Min. Peçanha Martins, j. 15.09.1997, DJ01.12.1997). (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.608-09.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 09/02/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Para Guimarães e Mezzalira, não será extinta a hipoteca quando não tiver havido a notificação dos credores hipotecários que não foram partes na execução. Destarte, como se faz necessária a intimação de todos os credores hipotecários, para validade do praceamento do imóvel dado em garantia, o ônus real não desaparecerá se eles não forem devidamente cientificados. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao CC 1.501, acessado em 09.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Sobre Adjudicação e Penhora, em pergunta feita e respondida registrada em Colégio Registral, publicado sem data, extraídos do site colegioregistral/rs.org.br.: a) O Registro de Imóveis pode negar o acesso à carta de adjudicação ou à carta de arrematação se existir registro de hipoteca ou penhora averbada, se, nos documentos apresentados, não houver prova de que houve a ciência do titular do direito contraditório? 

b) Ou deve o registrador considerar a adjudicação em ação executiva uma “ato de império” e pressupor que o juiz fez cumprir a determinação do art. 698 do CPC//1973 (correspondendo atualmente ao art. 903 no CPC/2015),  e, assim, registrar a carta?

c) Se puder ser registrado a carta, devem ser cancelados os registros de penhoras e demais direito reais contraditórios? 

RESPOSTA:  a) Entendemos que não, pois a matéria é processual (art. 698 CPC) (correspondendo atualmente ao art. 903 no CPC/2015), não afeita ao conhecimento do Registrador. Mais. Pelo direito de sequela, a hipoteca enquanto não cancelada acompanha o imóvel. 

b) O cumprimento das regras processuais compete ao Juiz, a quem cumpre dar os impulsos necessários ao atendimento do princípio da legalidade, motivo pelo qual a carta deverá ser registrada, sendo salutar informar ao arrematante/adjudicante que enquanto não for apresentada ordem expressa de cancelamento, permanecem íntegros os registros de tais constrições e hipotecas.

c) A ordem a que se refere o art. 415, parágrafo 5º, CNNR diz respeito tão somente às penhoras. Para o cancelamento de outras constrições ou hipotecas deverá haver ordem expressa neste sentido. (Colégio Registral, publicado sem data, extraídos do site colegioregistral/rs.org.br., acessado em 09.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).