quarta-feira, 17 de fevereiro de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.514, 1.515, 1.516 Do Casamento – Disposições Gerais - VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.514, 1.515, 1.516

Do Casamento – Disposições Gerais - VARGAS, Paulo S. R.

- Parte Especial –  Livro IV –Do Direito de Família –

Título I – Do Direito Pessoal – Subtítulo I – Do casamento

 Capítulo I – Disposições Gerais

– (Art. 1.511 a 1.516) - digitadorvargas@outlook.com  

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 Art. 1.514. 0 casamento se realiza no momento em que o homem e a mulher manifestam, perante o juiz, a sua vontade de estabelecer vínculo conjugal, e o juiz os declara casados. 

Na forma de ver de Carvalho Filho, o casamento é ato solene e formal e sua celebração exige o cumprimento das formalidades do processo de habilitação (v. comentários aos arts. 1.525 a 1.532). Para que seja consumado o casamento, o homem e a mulher deverão inicialmente manifestar ao juiz, um após o outro, sua vontade de estabelecer o vínculo conjugal. A vontade dos nubentes, por determinação legal (CC 1.535, v. comentário), deve ser livre e espontânea. A ausência de completa liberdade do querer casar-se e a vontade viciada, sujeita a constrangimentos, impõem a suspensão da celebração e impedem a consumação do casamento (v. comentário ao CC 1.538). Diante da resposta positiva (sem nenhuma condição ou termo), clara e consciente dos nubentes, o celebrante declarará formalizado o casamento, pronunciando os dizeres contidos no CC 1.535 (v. comentário). Só haverá casamento após essa declaração do celebrante. A diversidade de sexo dos nubentes é pressuposto para a realização do casamento válido. Será inexistente o casamento convolado entre duas pessoas do mesmo sexo e, por consequência, não produzirá nenhum efeito jurídico (ver comentários aos arts. 1510 A, B, C, D e E – nota de VD). Maria Helena Diniz ensina que, se porventura o magistrado deparar com caso dessa espécie, deverá tão somente pronunciar sua inexistência, negando a tal união o caráter matrimonial. Deve, é óbvio, distinguir prudentemente a identidade do sexo dos vícios congênitos de conformação, da dubiedade de sexo, da malformação dos órgãos genitais ou da disfunção sexual, que apenas acarretam anulabilidade (Curso de direito civil brasileiro - direito de família. São Paulo, Saraiva, 2002, v. V). (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.620.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 17/02/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Historicamente, o dispositivo em tela recebeu alteração, por meio de emenda de redação na Câmara dos Deputados, no período final de tramitação do projeto, de modo a substituir a expressão que qualifica o vínculo. A redação atual, no restante, é a mesma do projeto, cujo Livro IV, referente ao direito de família, ficou a cargo de Clóvis do Couto e Silva.

Na doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, a substituição da expressão que qualifica o vínculo (“matrimonial” por “conjugal”) está adequada à nomenclatura utilizada na Constituição Federal e no Código Civil, que sempre se referem a casamento e não a matrimônio. Anteriormente à celebração do casamento deve ser realizado o processo de habilitação, conforme o disposto nos CC 1.525 a 1.532. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 764, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 17/02/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Sob a visão de Carvalho Rocha, estende-se o assunto da diversidade de sexos no casamento. Embora não seja o núcleo do dispositivo, que cuida do momento em que se considera estabelecido o vínculo matrimonial, destaca-se a referência ao homem e à mulher como a primeira e única do direito brasileiro relativa à heterossexualidade do casamento.

A omissão dos textos anteriores sobre a necessidade de diversidade de gêneros na formação do casamento não significava permissão para as uniões conjugais homoafetivas. Ao contrário, na tradição judaico-cristã a heterossexualidade era considerada exigência do próprio conceito de casamento. Desse modo, o casamento entre pessoas do mesmo sexo, mais do que ato jurídico nulo era considerado ato jurídico inexistente, por faltar-lhe base material e tampouco possuir a aparência de ato jurídico válido. Foi essa a tese formulada por Zachariae Von Lingenthal no final do Século XIX, para justificar a inexistência de efeitos jurídicos do casamento entre pessoas do mesmo sexo no direito francês mesmo sem norma proibitiva, que se espraiou para outros ramos do direito.

Ao julgar procedente a Arguição de Descumprimento Fundamental n. 132, o Supremo Tribunal Federal admitiu a possibilidade jurídica da união estável homoafetiva. O referido entendimento vem sendo interpretado, por analogia, no sentido de se permitir o próprio casamento entre pessoas do mesmo sexo. Neste sentido, o Superior Tribunal de Justiça decidiu inexistir óbices legais ao casamento entre pessoas do mesmo sexo (REsp 1.183.378/RS, j. 25.10.2011; e que a vedação implícita seria constitucionalmente inaceitável. 

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) proibiu a recusa de habilitação, celebração de casamento civil ou de conversão de união estável entre pessoas do mesmo sexo por meio da resolução n. 175, de 14.05.2013.

A questão ainda não foi decidida pelo Supremo Tribunal Federal, que deve se pronunciar sobre a constitucionalidade da Resolução n. 175 do CNJ no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 4.966 ajuizada pelo Partido Social Cristão (PSC) em 2013. 

A Holanda foi o primeiro país do mundo a legalizar o casamento entre pessoas do mesmo sexo, em 2001. Seguiram-na, Bélgica (2003), Canadá e Espanha (2005), África do Sul (2006), Noruega e Suécia (2009), Argentina, Islândia e Portugal (2010), Dinamarca (2012), França, Nova Zelândia e Uruguai (2013), Escócia, Inglaterra, Luxemburgo e País de Gales (2014), Irlanda, Finlândia e Colômbia (2016), Alemanha, Taiwan e Malta (2017).

Todos esses países valeram-se de procedimento legislativo para a aprovação do casamento homoafetivo, sublinhando que, por força do princípio da separação dos poderes, a matéria se encontra sujeita à regra da maioria e representa escolha da sociedade. 

Em sentido contrário, as supremas cortes dos EUA e do México declararam o direito ao casamento entre pessoas do mesmo sexo em 2015 fazendo-o prevalecer sobre lei locais. O Congresso mexicano rejeitou a aprovação do casamento homoafetivo em 2016.

O artigo em comento, CC 1.514 – Momento da realização do casamento – cuida somente de uma das formas de celebração do casamento: o casamento civil. Além desta de casamento, outras duas existes: o casamento religioso, previsto no parágrafo 2º do art. 226 da Constituição e o casamento por conversão de união estável, nos termos do CC 1.726.

O juiz que trata o dispositivo é o juiz de paz, que passou a ter competência para a celebração do casamento civil com a proclamação da República e a mantém conforme o art. 98, inciso II, da Constituição. A regra não exclui o casamento nuncupativo que constitui forma excepcional de casamento civil e que dispensa a presença do juiz de paz.

O casamento entende-se realizado no exato momento em que os nubentes manifestam sua anuência. Desse modo, o registro do termo de casamento que se segue à celebração tem, para esse efeito, função meramente declaratória. Dessa regra resulta que o casamento terá sido realizado ainda que um dos cônjuges venha a falecer após a aceitação e antes do registro do termo de casamento. (Marco Túlio de Carvalho Rocha, Mestre e Doutor em Direito Civil pela FDUFMG, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.514, acessado em 17.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 Art. 1.515. O casamento religioso, que atender às exigências da lei para a validade do casamento civil, equipara-se a este, desde que registrado no registro próprio, produzindo efeitos a partir da data de sua celebração.

Há um histórico. O presente dispositivo recebeu alteração, por meio de emenda de redação na Câmara dos Deputados, no período final de tramitação do projeto, de modo a substituir a expressão “matrimônio” por “casamento”, tendo em vista que a Constituição Federal de 1988 utiliza a primeira expressão e não a segunda (CF. Art. 226, §~ P e 2~). E também houve emenda de redação para substituir o verbo no particípio passado “inscrito” pelo particípio passado “registrado”, em face das expressões consagradas pela Lei de Registros Públicos — Lei n. 6.015/73.

Em sua Doutrina, para o relator Ricardo Fiuza não havia regulamentação no Código Civil anterior do casamento religioso com efeitos civis. Tal regramento era realizado pela Lei n. 6.015 fls., arts. 71 a 75, revogados pelo atual Código Civil. • Na conformidade deste artigo e do artigo seguinte, o casamento religioso, para que gere efeitos civis, deve seguir as mesmas formalidades do casamento civil, tendo iguais impedimentos. Desse modo, o casamento religioso que não atende ao disposto nestes artigos configura-se juridicamente como união estável (arts. 1.723 a 1.727) (v. Maria Helena Diniz, Curso de direito civil brasileiro, 16. ed., São Paulo, Saraiva, 2001, v. 5, p. 46-9). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 765, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 17/02/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

De acordo com os ensinamentos de Carvalho Rocha, até a Proclamação da República a única forma de realização do casamento era a religiosa. A atribuição de efeitos civis ao casamento religioso foi revogada pela República. A Constituição de 1934 a reintroduziu, com a condição de serem observadas as disposições legais no tocante a impedimentos, habilitação, processo de oposição e registro (art. 146). A Constituição de 1988 a manteve (art. 226, § 2º). A Lei n. 1.110/50 regula o reconhecimento dos efeitos civis ao casamento religioso. Os artigos 71 a 75 da Lei n. 6.015/73 estabelecem o procedimento.

O art. 72 da Lei n. 6.015/73 exige que o termo do casamento religioso seja subscrito pela autoridade religiosa que o celebrar, pelos nubentes, por duas testemunhas, devendo constar do mesmo as informações enumeradas no art. 70 da mesma lei. 

Por força do disposto no art. 5º, inciso VI, da Constituição, “autoridade religiosa” é qualquer pessoa como tal socialmente aceita. O casamento religioso pode se dar com habilitação prévia ou com habilitação posterior. (Marco Túlio de Carvalho Rocha Mestre e Doutor em Direito Civil pela FDUFMG, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.515, acessado em 17.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No entendimento de Carvalho Filho, como já salientado (v. comentário ao art. 1.512), outra espécie de casamento, além do civil, autorizada pela Constituição federal é o religioso com efeitos civis, referido neste artigo e no seguinte. O casamento religioso realizado perante autoridade religiosa ou ministro religioso tem sua validade sujeita a uma condição: de que seja ele inscrito no livro de registro civil das Pessoas Naturais, após cumpridas as formalidade do processo de habilitação, antes ou depois da celebração religiosa (v. comentário ao CC 1.516), produzindo efeitos civis, contudo, a partir de tal data. (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.620.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 17/02/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Art. 1.516. O registro do casamento religioso submete-se aos mesmos requisitos exigidos para o casamento civil.

§ Iº O registro civil do casamento religioso deverá ser promovido dentro de noventa dias de sua realização, mediante comunicação do celebrante ao ofício competente, ou por iniciativa de qualquer interessado, desde que haja sido homologada previamente a habilitação regulada neste Código. Após o referido prazo, o registro dependerá de nova habilitação.

§ 2º O casamento religioso, celebrado sem as formalidades exigidas neste Código, terá efeitos civis se, a requerimento do casal, for registrado, a qualquer tempo, no registro civil, mediante prévia habilitação perante a autoridade competente e observado o prazo do art. 1.532.

§ 3º Será nulo o registro civil do casamento religioso se, antes dele, qualquer dos consorciados houver contraído com outrem casamento civil. 

No lecionar de Carvalho Filho, a lei impõe que, para ter validade o casamento religioso, devem ser atendidas as mesmas exigências legais de validade do casamento civil. Os efeitos civis do casamento religioso serão alcançados após o regular processo de habilitação exigido pela lei, que poderá ser prévio ou posterior à celebração religiosa do casamento. A regra é que a habilitação seja prévia, ou seja, os nubentes deverão inicialmente apresentar-se perante o oficial do registro civil e solicitar que sejam habilitados para o casamento posterior. Esse procedimento de habilitação é o previsto nos arts. 1.525 a 1.532 (v. comentários). Ao final, será extraída uma certidão de habilitação que deverá ser apresentada à autoridade religiosa. Excepcionalmente, a lei autoriza que a habilitação para o casamento seja efetivada pelos nubentes após a realização da celebração do ato religioso. Nessa hipótese, a validade do casamento ficará condicionada ao registro posterior, mediante a comprovação da capacitação dos nubentes para o casamento.

O § Iº do presente artigo trata do casamento religioso com habilitação prévia. Estabelece o legislador o prazo decadencial de noventa dias para que seja feito o registro civil do casamento religioso, período esse superior àquele fixado pela Lei de Registros Públicos (art. 73). Decorrido esse prazo, que é contado a partir da data da celebração, o registro do casamento religioso dependerá de nova habilitação, permanecendo válida, contudo, a celebração religiosa já efetivada. O prazo da comunicação ao registro civil é para o celebrante ou para qualquer interessado. A morte de um dos cônjuges não impedirá o registro civil do casamento religioso realizado validamente, quando o pedido de registro for encaminhado dentro do prazo estabelecido pela lei.

O §2° do artigo trata do casamento religioso com habilitação posterior. Não estabelece a lei prazo para que seja inscrito no registro civil o casamento religioso, o que poderá ser feito a qualquer tempo, desde que seja efetivada pelos nubentes a habilitação perante a autoridade competente. Os efeitos do casamento religioso retroagirão, em qualquer dos casos, à data da celebração, como estabelece o art. 1.515, parte final.

Será considerado nulo, por força do que dispõe o §3° deste artigo, o registro do casamento civil realizado por qualquer dos cônjuges exatamente no período que intermedeia a data da celebração e do registro do casamento religioso. Igualmente será nulo o registro civil do casamento religioso quando já registrado anteriormente o casamento civil de algum dos cônjuges. (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.623-24.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 17/02/2021. Revista e atualizada nesta data por VD). 

Buscando o histórico, tal era a redação original do dispositivo constante do projeto: “O registro do casamento religioso submete-se aos mesmos requisitos exigidos para o do civil. § lº O registro civil do casamento religioso deverá ser feito logo após a celebração, por comunicação do celebrante ao oficial do registro civil, quando os consorciados se houverem habilitado para o casamento, nos termos do Capítulo V deste Livro, e pelos consorciados; e, a qualquer tempo, se assim o requerer, qualquer interessado. § 2º Será ineficaz o registro civil do casamento religioso, se, antes dele, qualquer dos consorciados houver contraído com outrem matrimônio civil. § 3º O casamento religioso, celebrado sem a observância das exigências da lei civil, só produz efeitos civis se, a requerimento do casal, for inscrito no registro publico , mediante prévia habilitação perante a autoridade competente”. Durante a tramitação no Senado Federal o dispositivo ganhou a seguinte redação: “O registro do casamento religioso submete-se aos mesmos requisitos exigidos para o casamento civil. § lº O registro civil do casamento religioso deverá ser promovido nos noventa dias após a sua realização, mediante comunicação do celebrante ao oficio competente, ou por iniciativa de qualquer interessado, desde que haja sido julgada previamente a habilitação regulada neste Código. § 2º O casamento religioso, celebrado sem as formalidades exigidas neste Código, terá efeitos civis se, a requerimento do casal, for inscrito, a qualquer tempo, no registro civil, mediante prévia habilitação perante a autoridade competente e observado o prazo do CC 1.531. § 3º Será nulo o registro civil do casamento religioso se, antes dele, qualquer dos cônjuges houver contraído com outrem casamento civil”. Retomando o projeto à Câmara, houve nova alteração, procedida pelo Deputado Ricardo Fiuza e que restou aprovada em definitivo, dando origem ao texto atual. Segundo justificativa do Senador Nélson Carneiro, quando fez a primeira modificação neste artigo, “somente na hipótese do § lº, o registro poderá ser requerido por qualquer interessado, já que houve habilitação prévia. Mas é necessário fixar um prazo máximo para essa providência, tanto mais quando a habilitação civil tem eficácia apenas em três meses. A redação dos §§ lº e 2º reproduziu, em parte, os textos constitucionais de 1946 e 1969”. Havia, todavia, necessidade de aprimoramento técnico no novo texto proposto, assim considerando: a) no § 2º, impôs-se a substituição do termo ‘julgada” Por “homologada”, uma vez que a habilitação não está sujeita a sentença judicial; b) no § 3º foi necessária a substituição da expressão “cônjuges” por “consorciados”, já que diante de nulidade do casamento não pode ser utilizada a primeira expressão.

Concluindo o capítulo em sua doutrina, Ricardo Fiuza aponta a distinção entre o regramento do casamento religioso com efeitos civis que constava da Lei n. 6.015/73 (arts. 71 a 75) e a regulamentação do novo Código, conforme o Art. 1.516, reside no prazo para a realização do registro do casamento religioso, com prévia habilitação, que era de trinta dias e passou a ser de noventa dias. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 765-66, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 17/02/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

terça-feira, 16 de fevereiro de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.511, 1.512, 1.513 Do Casamento – Disposições Gerais - VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.511, 1.512, 1.513

Do Casamento – Disposições Gerais - VARGAS, Paulo S. R.

- Parte Especial –  Livro IV –Do Direito de Família –

Título I – Do Direito Pessoal – Subtítulo I – Do casamento

 Capítulo I – Disposições Gerais

– (Art. 1.511 a 1.516) - digitadorvargas@outlook.com  

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 Art. 1.511. O casamento estabelece comunhão plena devida, com base na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges. 

Inaugurando o Direito de Família em sua forma real de iniciar seu comentário, Milton Paulo de Carvalho Filho deve fazer casais repensarem antes de tomarem a decisão final, a não ser aqueles que têm a certeza de viverem como Rato-silvestre-da-pradaria, animais reconhecidos como exemplos de monogamia. Diz ele: O direito de família é o complexo dos princípios que regulam a celebração do casamento, sua validade, seus efeitos, a dissolução, a união estável, os vínculos de parentesco e os institutos complementares da tutela e da curatela. O direito de família cuida, pois, das relações que envolvem o indivíduo dentro do núcleo social em que ele nasce, cresce e se desenvolve.

Os princípios constitucionais relativos à família estão no art. 226 da Constituição Federal. As principais modificações decorrentes de tais princípios foram a admissão da pluralidade de famílias (a união estável e a família monoparental passaram a ter também a proteção do Estado); a igualdade entre os cônjuges (a direção da família passou a ser exercida por ambos os cônjuges em igualdade); e, por fim, a igualdade entre filhos, advindos ou não do casamento, biológicos ou resultantes de adoção (proibição de toda distinção entre os filhos).

O direito de família previsto no Código Civil é dividido em quatro títulos. O primeiro, relativo ao direito pessoal, encampa o casamento e as relações de parentesco (arts. 1.511 a 1.638). Disciplina as regras de ambos os institutos. O segundo, o direito patrimonial, compreende o regime de bens no casamento, o usufruto e a administração dos bens de filhos menores, alimentos e bem de família (arts. 1.639 a 1.722). Cuida, portanto, do aspecto patrimonial que resulta do casamento. O terceiro, a união estável (arts. 1.723 a 1.727), encontra-se deslocado, pois deveria ser tratado nos títulos do direito pessoal e patrimonial. O quarto e último refere-se ao direito protetivo e envolve a tutela e a curatela (arts. 1.728 a 1.783).

Em um sentido mais amplo, a família pode ser definida como a comunidade dos parentes consanguíneos, civis ou por afinidade. Em sentido estrito, como a comunidade formada pelos pais ou um deles e os filhos (LOTUFO, Maria Alice Zaratin. Curso avançado de direito civil - direito de família. São Paulo, RT, v. V ). Segundo a doutrina mais avançada em direito de família, a ideia de família é imortal, como a do núcleo básico ao qual nos integramos ao nascer, um ponto de referência central do indivíduo na sociedade, de solidariedade, que lhe dá segurança, transmite-lhe valores e o torna apto a perseguir um projeto para sua realização pessoal e para alcançar a felicidade (Oliveira, Euclides de & Hironaka, Giselda Maria Fernandes Novaes. “ Do direito de família” . In: Direito de família e o novo Código Civil. Belo Horizonte, Del Rey - IBDFam , 2002).

A família pode ser constituída por órfãos ou pelos avós e netos, por exemplo, pois eles se enquadram no conceito de núcleo básico de afeto e amor que caracteriza a família. Em consequência, merecem proteção jurídica.

A família pode ser encarada sob o aspecto individual, que tem em vista a pessoa em relação a seus pais, colaterais, cônjuges e descendentes. Pode também ser compreendida a partir do interesse do Estado em sua sólida organização e na segurança das relações humanas. A família constitui a célula básica da sociedade. Representa o alicerce de toda a organização social, sendo compreensível, portanto, que o Estado a queira preservar e fortalecer. Na família se fundam a vida econômica e as raízes morais. Os interesses individuais da família refletem nos interesses da sociedade e, reciprocamente, esses últimos correspondem aos primeiros, garantindo condições de desenvolvimento e sobrevivência.

O direito de família é extrapatrimonial ou personalíssimo. É irrenunciável e intransmissível, não admitindo condição ou termo ou o seu exercício por meio de procurador. Apesar de esse direito sofrer a intervenção estatal, entende-se que a ingerência não pode ser tal que tolha substancialmente a liberdade individual, preservando-se, assim, os interesses individuais que dão o caráter privado ao direito de família.

Da Constituição Federal é possível extrair os princípios que norteiam o direito de família. Segundo Maria Helena Diniz, são eles: a) o princípio da ratio do matrimônio (a afeição entre os cônjuges e a necessidade de que perdure completa comunhão de vida); b) o princípio da igualdade jurídica dos cônjuges, já referido anteriormente; c) o princípio da igualdade jurídica de todos os filhos, também apontado anteriormente; d) o princípio do pluralismo familiar, já mencionado; e) o princípio da consagração do poder familiar, que pode ser incluído no da igualdade entre os cônjuges; f) o princípio da liberdade do casal no desenvolvimento das atividades destinadas à família; e, por fim, g) o princípio do respeito à dignidade da pessoa humana, garantia do pleno desenvolvimento dos membros da comunidade familiar (Curso de direito civil brasileiro - direito de família. São Paulo, Saraiva, 2002, v. V).

Por força do disposto nos §§ 3º e 4º do art. 226 da Constituição Federal, a família passou a ser tanto aquela constituída pelo casamento como pela união estável, ou ainda por um dos genitores e sua prole. O casamento deixou, portanto, de ser a única forma de constituição da família. O casamento é a união legal, formal e solene entre homem e mulher, em que ambos buscam a constituição de família - propósito da comunhão plena de vida e de interesses, assentada na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges -, para auxílio mútuo, material e espiritual, e também da prole advinda dessa união. Pelo casamento, homem e mulher assumem mutuamente a condição de consortes, companheiros e responsáveis pelos encargos da família (art. 1.565). O objetivo de estabelecer comunhão plena de vida e a igualdade de direitos e deveres dos cônjuges são pressupostos de existência e validade do casamento. A comunhão plena de vida pressupõe a existência de amor e afeto entre o casal, a dedicação exclusiva ao outro cônjuge e aos filhos. A relação matrimonial impõe a mútua convivência, a reciprocidade de interesses na organização da vida e nas atitudes ou condutas individuais e, por fim, uma gama de direitos e deveres iguais, que irão disciplinar a vida em comum. “A comunhão de vida é a nota fulcral que marca o casamento. Sem esta, desaparecem seu sentido e sua finalidade. O enlace envolve a comunhão de afetos e dos demais componentes de uma vida em comum, como a ajuda mútua, a dedicação recíproca e a colaboração pessoal, doméstica e econômica. Mas o elo espiritual que une os cônjuges é que torna realidade a comunhão material” (RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família. Rio de Janeiro, Forense, 2004). A ausência de comunhão plena de vida pode gerar a separação do casal, fundamentada na insuportabilidade da manutenção da vida em comum (vide comentário ao art. 1.573).

A igualdade de direitos entre marido e mulher, já ressaltada, decorre do disposto no art. 226, § 5º, da Constituição Federal, originário do princípio da igualdade previsto no art. 5º da Carta. Dispõe o citado parágrafo que “os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher”. Neste Código, a igualdade entre ambos os cônjuges vem bem retratada no disposto dos arts. 1.565 a 1.570, para os quais remete-se o leitor. Desse princípio decorrem, por exemplo, o direito de ambos os cônjuges dirigirem a sociedade conjugal e o direito de ambos de acrescer o sobrenome do outro (sobre a subsistência do privilégio conferido à mulher relativo à propriedade exclusiva dos bens reservados, vide comentários ao art. 1.642). O disposto no art. 1.584 também retrata o princípio da igualdade entre os cônjuges ao definir que a guarda dos filhos poderá ser atribuída tanto ao pai quanto à mãe, segundo as condições de cada um para exercê-la. A isonomia tratada neste artigo procura evitar que pessoas em situação essencialmente igual tenham tratamento diferente. Cláudia Lima Marques assevera que “esta isonomia de tratamento jurídico é aquela que, em abstrato, permite que se considerem iguais marido e mulher em relação ao papel que desempenham na chefia da sociedade conjugal. É também a isonomia que se busca na identificação dos filhos de uma mesma mãe ou de um mesmo pai. É ainda a isonomia que protege o patrimônio entre personagens que disponham do mesmo status familiae”. (“ Igualdade entre filhos no direito brasileiro atual - direito pós-moderno?” In: Revista dos Tribunais, n. 764, p. 19). 

São três as correntes que controvertem a natureza do casamento. Para a corrente clássica ou individualista, ou de concepção contratualista, o casamento é um contrato. Contudo, a razão preponderante do casamento não é econômica, nem ele pode ser desfeito pelo simples consentimento mútuo das partes. Para a institucional ou de concepção institucionalista, é uma instituição social. Às regras impostas pelo Estado as partes têm a faculdade de aderir, mas a vontade dos cônjuges tornar-se-á impotente para alterar os efeitos da instituição que se produzem automaticamente. Por fim, para a corrente eclética ou mista, o casamento é um contrato e uma instituição. É exatamente a dificuldade de identificar a natureza jurídica do casamento que faz com que ele seja tratado como ato complexo, no qual estão presentes elementos volitivos, típicos dos contratos e elementos institucionais. Silvio Rodrigues se refere ao casamento como contrato de direito de família, desejando diferenciar o contrato de casamento dos outros contratos de direito privado.

Podem ser resumidas a três as finalidades do casamento: a) disciplinar as relações sexuais entre os cônjuges; b) proteger a prole; e c) assegurar a mútua assistência entre os cônjuges. São princípios norteadores do casamento: a) liberdade da união; b) solenidade do ato nupcial; c) monogamia; d) indissolubilidade; e e) convivência ou vida em comunidade. (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.615.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 16/02/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Conhecendo o histórico, o texto original deste artigo, aprovado pela Câmara no período inicial de tramitação do projeto, era o seguinte: “O casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade dos cônjuges e família legítima”. Durante a tramitação no Senado Federal, o dispositivo foi alterado nos seguintes termos: “O casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade dos cônjuges e institui a família”. O Relator Josaphat Marinho, no Senado, promoveu essa modificação em face da vedação constitucional às designações discriminatórias na família (CF, art. 226, caput e §~ P, 32 e ‘P, cart. 227, § 9). Retornando o projeto à Câmara, o Relator Ricardo Fiuza apresentou a emenda que deu ao dispositivo a redação atual, em que foi suprimida a seguinte parte: “e institui a família”, porque a permanência dessa expressão ainda trazia a ideia da constituição da família exclusivamente pelo casamento, com “nítido caráter discriminatório a outras formas de sua existência”, conforme assinalado nos debates pelo Desembargador Jones Figueiredo Alves, do Tribunal de Justiça de Pernambuco, dentre outros ouvidos. Assim, foi aprovada subemenda supressiva, para a devida adequação constitucional. Fez-se necessário, também, modificar a redação para a compreensão do texto e adequação aos ditames constitucionais, no tocante à denominada “igualdade dos cônjuges”, já que, a rigor, tal igualdade diz respeito aos direitos e deveres, como dispõe o Art. 226, § 5~, da Constituição Federal, e não às pessoas em si mesmas.

Então, em sua doutrina, Ricardo Fiuza aprovou como relator final: nas disposições gerais sobre casamento, foram eliminadas todas as referências à legitimidade da família oriunda de casamento civil, em respeito à Constituição Federal de 1988. Enquanto a Constituição anterior previa, em seu art. 175, que “A família é constituída pelo casamento”, a atual Lei Maior estatui, no caput do Art. 226, que “A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado”, e o mesmo artigo, em seus §~ 1~ e trata do casamento civil e religioso, reconhecendo, no § IV, a união estável como entidade familiar para efeito de tutela do Estado, e considerando, também como tal, a família monoparental, em seu § 4~. Dessa forma, tanto a união estável como a família monoparental perderam o caráter da ilegitimidade, em face do que a criação da família deve ser havida como efeito do casamento, sem qualquer qualificação. Além disso, o Art. 227, § 62, da atual Constituição da República veda as designações discriminatórias no âmbito da filiação, atribuindo iguais direitos e qualificações aos filhos, oriundos ou não da relação matrimonial. Assim, não pode mais haver na família a qualificação de legítima ou ilegítima. A família tanto pode ser constituída pelo casamento como pela união estável; ou, ainda por um dos genitores e sua prole (a propósito da modificação operada no Senado Federal, com o fito de eliminar a qualificação de legítima na família oriunda de casamento, v. Álvaro Villaça Azevedo e Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos, Sugestões ao projeto de Código Civil. Direito de família, RIS 730/13).

A consagração da igualdade entre os cônjuges é indispensável para que se garanta o cumprimento do princípio fundamental da preservação da dignidade da pessoa humana. Embora nossas Constituições sempre tenham reconhecido o princípio de que a lei deve ser igual para todos, a legislação ordinária, por longos anos, estabeleceu regras marcadas pela desigualdade entre os cônjuges, na matéria do casamento. Verifica-se, assim, a relevância da Constituição da República, de 1988, que, além dos princípios gerais de que “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza...”, e que “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações...”, estatuídos no ar. 52, caput e inciso 1, estabeleceu, expressamente, no art. 226, ~ 5~, que “Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher”. No entanto, passados vários anos da promulgação da Constituição Federal. as disparidades ainda constavam da legislação ordinária, que não havia recebido as alterações necessárias, criando perplexidades e a necessidade de interpretações constantes sobre a autoaplicabilidade do princípio constitucional em tela (v. Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos, Reparação civil na separação e no divórcio, São Paulo, Saraiva, 1999. p. 63-70). O novo Código Civil está adequado ao princípio constitucional da absoluta igualdade de direitos e deveres entre os cônjuges, com a consequente preservação da dignidade das pessoas casadas. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 762-63, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 16/02/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Em seu artigo “Direito das Famílias: breve abordagem”, o Dr. Tcharlye Guedes publicou no site Jus.com.br/artigos, em janeiro de 2016, inicia o tema assim: “Definir Direito de família como um ramo seria uma forma resumida de tratar do assunto, destarte, doutrinadores em suas concordâncias e discordâncias afirmam ser o ramo do direito que contém normas jurídicas relacionadas com a estrutura.

E continua: Muitas são as indagações sobre o tema, e, de certa forma, novos operadores do Direito têm mostrado cada vez mais interesse no assunto em pauta.

Para o autor, definir Direito de Família com um ramo seria uma forma resumida de tratar do assunto, destarte, o resumo inicial sobre estrutura, organização e proteção da família. Trata-se de ramo das relações familiares, direta e indiretamente, e das obrigações e direitos decorrentes dessas relações, ou seja, é o ramo do direito que regula e estabelece as normas de convivência familiar.

Com a crescente diversificação de conceito de família, este conceito geral com o fim de tentar classificar Direito de Família, para muitos parece ultrapassado, todavia na abordagem destas classes familiares, pode-se brevemente adentrar no Direito propriamente dito.

Em breve evolução histórica, Família pré Constituição de 1988, diz-se da Família hierarquizada: Com o pátrio poder pertencendo ao varão (as decisões não eram tomadas em conjunto, quem decidia era somente o homem, inclusive sobre o trabalho da mulher).

Na família matrimonializada, a família era formada exclusivamente com o casamento, qualquer união que não fosse dessa forma era tratada como concubinato. O Estado não protegia nem mesmo os filhos havidos fora do casamento. O vínculo matrimonial era indissolúvel, apenas se admitia o desquite (não estar quite com as obrigações matrimoniais) liberando tão somente o dever de fidelidade e coabitação, porém não sendo possível outro casamento, considerando inclusive uma vergonha para a mulher desquitada.

Família patrimonializada: o objetivo da família à essa época era somente acumular riqueza, explicando-se assim o grande número de filhos para aumentar a mão de obra para amealhar patrimônio.

Esse cenário começa a se mudar com o advento da lei n. 6.515/1977, chamada lei do divórcio, culminado na emenda à CF/88 em 2010, que extinguiu a separação e permitiu que o casamento fosse terminado simplesmente pelo divórcio.

Família pós Constituição de 1988: Art. 5º, CF/88 à isonomia (homem e mulher passam a ser iguais perante a lei) e art. 226 e 227, CF/88 (isonomia entre homem e mulher no casamento “isonomia conjugal), bem como isonomia entre os filhos “isonomia filial”, independentemente da constância ou não no casamento.

Família isonômica: Não há mais o Pátrio Poder, a partir de então existe o Poder Familiar, em que as decisões são tomadas em conjunto, caso não haja consenso, estas deverão ser suprimidas pelo judiciário.

Família plural: Hoje existem várias formas das famílias serem constituídas além do casamento (art. 226 § 2º e 3º), inclusive com a união estável (CC 1.723). 

São tipos de famílias:

Família monoparental: art. 226 § 4º, Comunhão entre qualquer dos pais com filhos, recebendo todas as garantias das famílias. 

Família anaparental: Família formada somente por irmãos, sem os pais. (Ana = falta; parental = parentes, ou seja, falta de parentes, ou falta dos pais).

Família personalizada: A partir da CF/88, visa-se a promoção da dignidade da pessoa humana, valorizando muito mais o SER que o TER, diferentemente da família patrimonialista. O direito de família atualmente é analisado muito mais pelo lado afetivo do que na ótica estritamente legal. Sai de cena o patrimônio e entra a personalidade.

Atualmente para que seja considerada entidade familiar, com todas as proteções estatais, serão analisadas três características: 1) afetividade; 2) publicidade; 3) continuidade. Veja-se a disposição do direito das famílias no Código Civil: a) do direito pessoal (CC 1.511 a 1.638); b) do direito patrimonial (CC 1.639 a 1.722); c) da união estável (CC 1.723 a 1.727); d) da tutela e curatela (CC 1.728 a 1.783), todos do Código Civil de 2002.

O autor define como “Conceito” em seu item 3: “É um conjunto de normas, princípios e regras jurídicas que regulam as relações decorrentes do vínculo afetivo, mesmo sem casamento, tendentes à promoção da personalidade humana, através de efeitos pessoais, patrimoniais e assistenciais.” 

Relação de parentesco (CC 1.591 a 1.595) –  a) vínculos: Matrimonial (casamento, união estável etc.); b) de parentesco; c) natural (consanguíneo); d) civil (adoção, inseminação artificial heteróloga (quando se utiliza material genético de um dos cônjuges e terceiro) e socioafetividade); e) afinidade: vínculo que liga o cônjuge ou companheiro aos parentes do outro (não resultando obrigações no mundo jurídico).

Dos grados de parentesco: Linha reta: são provenientes do mesmo tronco descendendo uma das outras. Podem ser ascendentes (pais, avós, bisavós...) e descendentes (filhos, netos, bisnetos), não existindo limitação de grau de parentesco em linha reta, sendo contados os graus de acordo com o número de gerações. 

Na linha colateral, transversal ou oblíquo, CC 1.592: são provenientes do mesmo tronco, porém não descendendo umas das outras.

Atenção (1): a) O parentesco na linha colateral se limita ao 4º grau; b) não existe parentesco colateral de 1º grau.

2º Grau: Irmãos somente (não importando se são de pai e mãe em comum (chamados bilaterais) ou de somente de um dos pais (“unilaterais uterinos” da mesma mãe e “unilaterais consanguíneos” do mesmo pai);

3º Grau: Tios e sobrinhos;

4º Grau: Tios avós, sobrinhos netos e primos.

Atenção (2): a) Em se tratando de parentesco por afinidade em linha colateral, a contagem se limita ao segundo grau (CC 1.595, § 1º). A contagem de grau é feita da mesma forma que no parentesco consanguíneo; b) o parentesco por afinidade em linha reta jamais se extingue, nem mesmo com a morte ou dissolução do casamento, não havendo, pois, casamento entre, por exemplo, genro e sogra (concubinato, CC 1.521). Diferentemente dos afins colaterais que desde que o casamento haja se dissolvido, não mais existe parentesco. 

Casamento (CC 1.511 a 1.565) – Conceito: “É a união de duas pessoas independentemente do sexo) reconhecida e regulamentada pelo Estado, constituída com o objetivo de constituição de família e baseada num vínculo de afeto”. (Flávio Tartuce).

Natureza jurídica: Existem hoje três teorias acerca do casamento, quais sejam: 1) Teoria contratualista: o Contrato depende da manifestação da vontade das partes; 2) Teoria Institucionalista: Argumentam que as formas de casamento são ditadas pelo Estado, independentemente da vontade das partes; 3) Teoria mista, híbrida ou eclética (corrente majoritária): O casamento não é apenas um contrato nem somente uma instituição, pois no momento da formação é um contrato, visto que depende da manifestação de vontade das partes; quanto ao conteúdo, seria uma instituição posto que sua forma é regida pelo Estado.

São sete as características do casamento: a) Livre: Liberdade quanto à escolha do nubente; b) Solene: Revestido de diversas solenidades estabelecidas por lei que caso não sejam cumpridas incorrem em pena de nulidade; c) Monogâmica: Somente pode se casar com um cônjuge por vez; d) Permanente: Quando da celebração do casamento, não há um prazo para término do casamento; e) Dissolubilidade: É possível dissolver o casamento através do divórcio; f) Finalidade: Estabelecimento da comunhão plena de vida (moral, material, psicológica etc.); g) Natureza jurídica de ordem pública das normas que o regulamentam. 

Da capacidade para o casamento (CC 1.517). A idade núbil no Brasil é de 16 anos, mediante autorização dos pais ou representante legal, com duas exceções à idade mínima (CC 1.520): I. Em caso de gravidez; II. Para evitar imposição ou cumprimento de pena judicial. 

Como apontado no CC 1.518 – a autorização concedida pelos pais, tutores ou curadores poderá ser revogada até a data da celebração da cerimônia. 

Em havendo divergência entre a autorização de um e outro pai, tal situação poderá ser resolvida juridicamente (CC 1.631). Sendo que do suprimento do consentimento dos pais pelo juiz será possível quando a derrogação for injusta (CC 1.519). 

Autorização tácita: CC 1.555, § 2º: 18 anos Sem autorização. 

(...) 

Dr. Tcharlye Guedes Ferreira publicou no site Jus.com.br/artigos, em janeiro de 2016, o artigo “Direito das Famílias: breve abordagem”, acessado em 16.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.512. O casamento é civil e gratuita a sua celebração.

Parágrafo único. A habilitação para o casamento, o registro e a primeira certidão serão isentos de selos, emolumentos e custas, para as pessoas cuja pobreza for declarada, sob as penas da lei.

Segundo o histórico, o presente dispositivo não estava presente no projeto original. Foi acrescentado, durante a tramitação no Senado, por proposta do Senador Nélson Carneiro, com a Seguinte redação: “O casamento será civil e gratuita a. sua celebração. Parágrafo único. A habilitação para o casamento, o registro e a primeira certidão são isentos de selos, emolumentos e custas para as pessoas cuja pobreza for reconhecida pelo juiz”, tendo em vista que a gratuidade na celebração do casamento é assegurado pelo art.  226, IIl, da Constituição Federal. Retornando o projeto à Câmara, o Relator Ricardo Fiuza promoveu alteração no texto, dispensando o reconhecimento da pobreza pela autoridade judiciária, já que, conforme legislação vigente, é suficiente a mera declaração do interessado, firmaria sob as penas da lei, como prova de pobreza (v. Decreto n. 83.936/79, que aboliu a exigência de atestado de pobreza, emitido por autoridade pública). Além disso, conforme apontou o Relator Parcial na Câmara, Deputado Antonio Carlos Biscaia, a exigência de declaração judicial apresentava dois inconvenientes de ordem prática: a) a dificuldade de acesso à justiça, que poderia ser maior do que o pagamento dos emolumentos, e b) a máquina judiciária seria assoberbada com questões para as quais há solução mais racional. Assim, na Câmara foi acolhida a emenda do Senado, mediante subemenda para o seu parágrafo único, permitindo-se que a concessão de gratuidade decorra de mera declaração do estado de pobreza, tal como sucede nos casos de deferimento do benefício da justiça gratuita, previsto pela Lei n. 1.060/50. 

Em sua doutrina, como Ricardo Fiuza afirma, este dispositivo regulamenta o disposto no Art. 226, § 1º , da Constituição Federal, de modo a garantir a gratuidade no casamento civil somente diante de declaração de pobreza, prestada sob as penas da lei.

• Tem também valia este dispositivo ao deixar expresso que o casamento, no âmbito jurídico, é sempre de natureza civil, de modo que, conforme artigos posteriores, o casamento religioso somente tem efeitos civis desde que seguidas as formalidades estabelecidas neste Código (CC 1.515 e 1.516). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 763, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 16/02/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Para Milton Paulo de Carvalho Filho, são espécies de casamento: o civil e o religioso com efeitos civis. Ambos estão previstos também na Constituição Federal, no art. 226, §§ Iº e 2º, respectivamente. Somente o casamento civil é válido entre nós. O casamento religioso (veja comentários aos arts. 1.515 e 1.516), quando único, só tem eficácia se levado a efeito com todas as formalidades impostas pela lei. O casamento civil é aquele realizado segundo as regras estabelecidas pelo Estado, que podem ser encontradas na Constituição Federal, neste Código e na Lei de Registros Públicos, tornando-o um ato solene e formal. O casamento civil será celebrado gratuitamente, como já assegurava o disposto na última parte do § Iº do art. 226 da CF. A gratuidade autorizada pelo legislador envolve os selos, os emolumentos e as custas estabelecidas por lei. O parágrafo único do artigo estende a gratuidade da celebração do casamento para a habilitação, para o registro e para a primeira certidão, quando forem pobres as pessoas interessadas. A pobreza será comprovada mediante a simples declaração do interessado, sob as penas da lei, na forma prevista na Lei n. 1.060/50, de assistência judiciária gratuita. (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.615.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 16/02/2021. Revista e atualizada nesta data por VD). 

Na ciência de Carvalho Rocha, o casamento é civil, quando a regra reproduz, literalmente, o parágrafo 1º do artigo 226 da CF. A proclamação de que o casamento é civil é incompleta ou desnecessária. Ela pode ser tida como referência à forma ou aos efeitos do casamento. Como referência à forma é incompleta, pois a própria Constituição reconhece a possibilidade de o casamento ser celebrado por autoridade religiosa (§ 2º) e resultar de conversão de união estável (§ 3º). Como referência aos efeitos do casamento é desnecessária, pois a tradição impede qualquer dúvida quanto à possibilidade de o casamento, mesmo quando celebrado por entidade religiosa, emanar efeitos civis uma vez que sejam observadas as formalidades próprias.

Quanto à regra da gratuidade do casamento é, igualmente reproduzida pelo dispositivo a partir do parágrafo 1º do art. 226 da CF. Significa isenção de pagamento de taxas, emolumentos ou quaisquer outras despesas relativas ao casamento. Como garantia constitucional deveria ter interpretação que lhe assegurasse a máxima efetividade, i.é, que abrangesse todas as etapas do procedimento do casamento. As práticas cartorárias reduzem-na, no entanto, ao ato próprio da celebração realizado pelo juiz de paz. Todas as demais fases do procedimento matrimonial, habilitação e registro têm sido interpretados como não abrangidos pela regra da gratuidade. O parágrafo único corrige parcialmente a referida interpretação restritiva e permite a isenção da cobrança de emolumentos e de taxas para a habilitação, o registro e a primeira certidão de nubentes que se declarem pobres. (Marco Túlio de Carvalho Rocha Mestre e Doutor em Direito Civil pela FDUFMG, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.512, acessado em 16.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Art. 1.513. É defeso a qualquer pessoa, de direito público ou privado, interferir na comunhão de vida instituída pela família. 

A versão de Carvalho Filho, defende que na família constituída pela comunhão de vida é defesa a interferência de quem quer que seja. O Estado ou qualquer pessoa de direito público ou privado estão proibidos de intervir na comunhão de vida instituída pela família. O Estado deverá sim assegurar a proteção à família. Este artigo tem como corolário o disposto no art. Iº, III, relativo à dignidade da pessoa humana, no art. 5º, X, que se refere à inviolabilidade da intimidade e da vida privada das pessoas, ambos da Constituição Federal, bem como o disposto no art. 226, § 7º, também da Carta Magna, e o disposto no CC 1.565, § 2º, deste Código Civil (veja comentário), que conferem autonomia ao casal sobre o planejamento familiar. (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.620.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 16/02/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Historicamente, o dispositivo em tela não foi alterado na Câmara dos Deputados no período inicial de tramitação do projeto e no Senado Federal. A redação original era a seguinte: “É defeso a qualquer pessoa, de direito público ou privado, interferir na comunhão de vida, instituída pelo matrimonio Quando o texto retornou do Senado Federal à Câmara dos Deputados, o Relator Ricardo Fiuza apresentou emenda substituindo o termo ‘matrimônio” pela palavra “família”, já que em todas as espécies de família deve ser vedada a interferência de qualquer pessoa. de direito público e privado, ou seja, na família oriunda de casamento, de união estável e de matrimonial. 

Na doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, a dignidade da pessoa humana é fundamento da República Federativa do Brasil, na conformidade do art. 1º , inciso III, da Constituição Federal de 1988. Verdadeira “cláusula geral de tutela e promoção da pessoa humana”, a dignidade é o “valor máximo” de nosso ordenamento jurídico, devendo informar todas as relações jurídicas e estando sob seu comando a legislação infraconstitucional (v. Gustavo Tepedino, A tutela da personalidade no ordenamento civil constitucional brasileiro, in Temas de direito civil, Rio de Janeiro, Renovar; 1999, p. 47 e 48). Na família, a tutela da dignidade da pessoa humana, em todo o alcance da expressão, deve ser assegurada tanto no curso das relações familiares como diante de seu rompimento, cabendo ao Direito oferecer instrumentos para impedir a violação a esse valor maior. Assim, a vedação à interferência de qualquer pessoa, de direito público ou privado, na comunhão de vida formada pela família está perfeitamente de acordo com o princípio constitucional de preservação da dignidade. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 764, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 16/02/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No lecionar de Carvalho Rocha, o dispositivo contempla o princípio da subsidiariedade. De origem canônica, este princípio foi definido na Encíclica Quadragesimo anno, de 1931, pelo Papa Pio XI, para fixar que a solução de conflitos locais deve ser confiada à esfera local e a de assuntos gerais, por quem possua competência geral: (...) assim como é injusto subtrair aos indivíduos o que eles podem efetuar com a própria iniciativa e indústria, para o confiar à coletividade, do mesmo modo passar para uma sociedade maior e mais elevada o que sociedades menores e inferiores podiam conseguir, é uma injustiça, um grave dano e perturbação da boa ordem social. O fim natural da sociedade e da sua ação é coadjuvar os seus membros, não destruí-los nem absorvê-los. 

Deixe, pois, a autoridade pública ao cuidado de associações inferiores aqueles negócios de menor importância, que a absorveriam demasiado; poderá então desempenhar mais livre, enérgica e eficazmente o que só a ela compete, porque só ela o pode fazer: dirigir, vigiar e reprimir,, conforme os casos e a necessidade requeiram. Persuadam-se todos os que governam: quanto mais perfeita ordem hierárquica reinar entre as várias agremiações, segundo este princípio da função “supletiva” dos poderes públicos, tanto maior influência e autoridade terão estes, tanto mais feliz e lisonjeiro será o estado da nação. 

A Corte Constitucional alemã consagrou o princípio da subsidiariedade para expressar repúdio à intervenção estatal nos assuntos de família: “O Estado, enquanto comunidade maior, só pode intervir quando meios e possibilidade da família, como unidade menor, não forem suficiente no caso concreto. Ao Estado impõe-se-lhe grande reserva, e a aplicação de seus meios só deve ocorrer quando inevitável. Portanto, se também a ação disponível de outras instituições e grupamentos de nível intermedial for insuficiente. Isso significa, sobretudo, que ao Estado não é lícito imiscuir-se também com as respectivas concepções sociopolíticas na autonomia dos cônjuges e da família” (GIESEN, Dieter. Ehe und Familie in der Ordnung des Grundgesetzes, Juristenzeitung. Tubingen, Nr. 24/24, 10. dez. 1982, S. 826. Apud VILLELA, João B. Casamento e Família na Futura Constituição Brasileira: a Contribuição alemã. Revista de Informação Legislativa, Brasília, n. 96, p. 292, out/dez.1987). 

A capacidade de autotutela dos cônjuges foi exaltada por VILLELA – a proposito da aplicação do princípio da subsidiariedade ao casamento – ao afirmar que: 

“... é só pela atribuição aos nubentes e cônjuges de um poder auto-regulativo primário que se poderá conduzir o instituto a uma idade verdadeiramente adulta.

É da menor tradição da cultura ocidental que o Estado não deve intervir onde as pessoas tenham as condições básicas de agir por si mesmas. Se não se lhes reconhecer a faculdade de auto-organização e autogoverno, elas tenderão a permanecer no estágio que corresponde à interveniência da tutela: o da incapacidade, na sua expressão técnico-jurídica, ou o da menoridade no sentido kantiano.” (FREUDESTEIN, G. Der Pecuniäre Contract in der Ehe. 3. Aufl., Leipzig, Woldemar Urban, 1884, S. 1 apud VILLELA, João Baptista. Liberdade versus Autoridade no Estatuto Patrimonial do Casamento..., p. 91-92).

Em texto posterior, de época marcada pela regulamentação das uniões estáveis no Brasil, VILLELA foi ainda mais enfático:

“Legisla-se sempre, e cada vez mais, sobre o imaginável e o inimaginável, como se a regra do Estado apusesse aos assuntos uma espécie de selo de qualidade. Esta atitude supõe, mas também alimenta a infantilização das pessoas individualmente consideradas e a castração da sociedade civil. É como se uma e outra fossem incapazes de adotar, por si mesmas, regras de convivência e de composição dos seus interesses. E, portanto, devessem estar sob a permanente tutela de uma superorganização, o Estado, supostamente tão sábio, arguto, sensível e prudente, que lhes devesse ditar até mesmo como viver uma experiencia amorosa. Na verdade, o casamento ou qualquer outra forma de associação íntima entre pessoas só interessa ao Estado sob dois estritos aspectos: a proteção dos filhos menores e a adequada liquidação de um eventual patrimônio promíscuo que se tenha formado” (VILLELA, João Baptista. Família hoje. Entrevista por Leonardo de Andrade Mattietto. In: BARRETO, Vicente (coord.). A Nova Família: e Perspectivas. Rio de Janeiro: Renovar. 1997, p. 71-86, espec. p. 80-81). 

Como princípio, a aplicabilidade da norma encontra-se limitada por regras positivadas na própria lei. No direito brasileiro, ele não afasta a possibilidade de recurso ao juiz para a solução de divergências conjugais (CC 1.567, parágrafo único) ou relativamente ao patrimônio dos filhos (CC 1.690, parágrafo único). Afina-se com o princípio da inviolabilidade da intimidade e da privacidade (art. 5º, X, CF), da proteção estatal à família (art. 226, caput, CF) e com o direito ao planejamento familiar (art. 226, § 7º, CF e CC 1.565, § 2º).

O princípio encontra limites na autonomia privada, como expressão da dignidade da pessoa humana. Assim, por exemplo, não impede que o próprio sujeito aceite negócio jurídico com a condição de não ter filhos ou de não se divorciar. (Marco Túlio de Carvalho Rocha Mestre e Doutor em Direito Civil pela FDUFMG, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.513, acessado em 16.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.510-A, B, C, D, E Do Direito de Laje - VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.510-A, B, C, D, E

Do Direito de Laje -  VARGAS, Paulo S. R.

- Parte Especial –  Livro III – Capítulo à parte

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 Art. 1.510-A - O proprietário de uma construção-base poderá ceder a superfície superior ou inferior de sua construção a fim de que o titular da laje mantenha unidade distinta daquela originalmente construída sobre o solo. 

§ 1º O direito real de laje contempla o espaço aéreo ou o subsolo de terrenos públicos ou privados, tomados em projeção vertical, como unidade imobiliária autônoma, não contemplando as demais áreas edificadas ou não pertencentes ao proprietário da construção-base. 

§ 2º O titular do direito real de laje responderá pelos encargos e tributos que incidirem sobre a sua unidade. 

§ 3º Os titulares da laje, unidade imobiliária autônoma constituída em matrícula própria, poderão dela usar, gozar e dispor. 

§ 4º A instituição do direito real de laje não implica a atribuição de fração ideal de terreno ao titular da laje ou a participação proporcional em áreas já edificadas. 

§ 5º Os Municípios e o Distrito Federal poderão dispor sobre posturas edilícias e urbanísticas associadas ao direito real de laje.

§ 6º O Titular da laje poderá ceder a superfície de sua construção para a instituição de um sucessivo direito real de laje, desde que haja autorização expressa dos titulares da construção-base e das demais lajes, respeitadas as posturas edilícias e urbanísticas vigentes.

Art. 1.510-B. É expressamente vedado ao titular da laje prejudicar com obras novas ou com falta de reparação a segurança, a linha arquitetônica ou o arranjo estético do edifício, observadas as posturas previstas em legislação local.

Art. 1.510-C.  Sem prejuízo, no que couber, das normas aplicáveis aos condomínios edilícios, para fins do direito real de laje, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes que sirvam a todo o edifícios e ao pagamento de serviços de interesse comum serão partilhadas entre o proprietário da construção-base e o titular da laje, na proporção que venha a ser estipulada em contrato.

§ 1º São partes que servem a todo o edifício:

I – os alicerces, colunas, pilares, paredes-mestras e todas as partes restantes que constituam a estrutura do prédio;

II -  O telhado ou os terraços de cobertura, ainda que destinados ao uso exclusivo do titular da laje;

III – As instalações gerais de água, esgoto, eletricidade, aquecimento, ar condicionado, gás, comunicações e semelhantes que sirvam a todo o edifício; e

IV- em geral, as coisas que sejam afetadas ao uso de todo o edifício. 

§ 2º É assegurado, em qualquer caso, o direito de qualquer interessado em promover reparações urgentes na construção na forma do parágrafo único do CC 249 deste Código. 

Art. 1510-D. Em caso de alienação de qualquer das unidades sobrepostas, terão direito de preferência, em igualdade de condições com terceiros, os titulares da construção-base e da laje, nessa ordem, que serão cientificados por escrito para que se manifestem no prazo de trinta dias, salvo se o contrato dispuser de modo diverso. 

§ 1º O titular da construção-base ou da laje a quem não se der conhecimento da alienação poderá, mediante depósito do respectivo preço, haver para si a parte alienada a terceiros, se o requerer no prazo decadencial de centro e oitenta dias, contado da data de alienação. 

§ 2º Se houver mais de uma laje, terá preferência, sucessivamente, o titular das lajes ascendentes e o titular das lajes descendentes, assegurada a prioridade para a laje mais próxima à unidade sobreposta a ser alienada.

Art. 1.510-E. A ruína da construção-base implica extinção do direito real de laje, salvo:

I – se este tiver sido instituído sobre o subsolo;

II – se a construção-base não for reconstruída no prazo de cinco anos.

Parágrafo único.  O disposto neste artigo não afasta o direito a eventual reparação civil contra o culpado pela ruína.

Em extensão ao artigo em comento, Kamila Gabriely de Sousa Gomes e Joseval Martins Viana, publicaram no site ambitojuridico.com.br, uma complementação, intitulada “Direito real de laje e as modificações trazidas pela Lei n. 13.465/2017”, como extensão e finalização do assunto até aqui tratado e, abrindo um novo bloco, antes de entrar no próximo Livro, Direito de Família, para que se entenda a Lei 13.465/2017, portanto, posterior ao CC 2002, bem como das modificações feitas com o advento do novo CPC/2015, faz-se necessário uma análise sobre os requisitos necessários para a instituição do direito real de laje, quais sejam, isolamento funcional e acesso independente. Em seguida, passa-se a breve estudo sobre o contrato jurídico como fato gerador e a possibilidade de lajes sucessivas, bem como a realização diferenciada entre o direito real de laje e o condomínio. Foi verificado, também, os aspectos registrais e processuais, com as principais alterações trazidas pela Lei n. 13.465/2017.(Nota VD).

Estes direitos foram “acrescentados”, ao artigo 1.510, independentemente do assunto que tratava sobre penhor, hipoteca e anticrese trazidos até então, parecendo, no entender do autor do Blog VD, como uma invasão de assuntos, mas que tem tudo a ver, o que será comprovado no decorrer do estudo do Direito de Família, a seguir.

O Direito Real de Laje decorre de uma situação histórica e real na vida de muitos brasileiros. Por falta de condições financeiras de adquirir um imóvel próprio, filhos e filhas acabam construindo seus "imóveis" em laje do imóvel de seus pais, conhecido popularmente como "puxadinho". 

Para as famílias que residem ali, é certo que há “duas casas", separadas e individualizadas, dentro de um único imóvel. No entanto, por muito tempo o ordenamento jurídico brasileiro não reconhecia estes direitos. A situação social e jurídica, nestes casos, não tinha solução prática definida em lei.

Buscando regularizar esta situação, em 22/12/2016 foi publicada a Medida Provisória 759, a qual dispunha sobre a regularização fundiária rural e urbana, incluindo o direito real de laje. 

Por sua vez, a Medida Provisória 759 foi convertida na Lei nº 13.465/2017, no qual o instituto do direito real de laje foi aprimorado e introduzido no Código Civil Brasileiro. 

A Lei nº 13.465/2017 introduziu alterações significativas no Código Civil, na Lei de Registros Públicos e no Código de Processo Civil, as quais veremos no decorrer desse artigo.

O direito real de laje trata-se de direito real exercido sobre a unidade imobiliária autônoma sobrelevada, erigida sobre a construção original, de propriedade de outrem, conforme descreve o artigo 1510-A do Código Civil:

Art. 1.510-A. O proprietário de uma construção-base poderá ceder a superfície superior ou inferior de sua construção a fim de que o titular da laje mantenha unidade distinta daquela originalmente construída sobre o solo”.

Neste caso, não se trata de uma propriedade, pois o direito ali exercido não é na coisa própria. Trata-se, portanto, de direito real sobre coisa alheia, uma vez que a laje esta limitada a construção original, de propriedade de outrem.

Assim, este novo direito real somente será admitido se preencher os seguintes requisitos: O isolamento funcional, ou seja, a unidade imobiliária da laje devera estar isolada da construção original. Segundo, o acesso independente, como por exemplo uma escada exclusiva para acesso a unidade imobiliária da laje. Neste caso, a lei refere-se ao acesso independente em face do proprietário da construção original, localizado abaixo.

O contrato como fato jurídico gerador do direito: A parte final do artigo 1.510-C, do Código Civil, incluído pela Lei nº 13.465/17, caput, parte final, faz referência ao “contrato”, como fato jurídico gerador do direito da laje.

Art. 1.510-C. Sem prejuízo, no que couber, das normas aplicáveis aos condomínios edilícios, para fins do direito real de laje, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes que sirvam a todo o edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum serão partilhadas entre o proprietário da construção-base e o titular da laje, na proporção que venha a ser estipulada em contrato.

No entanto, conforme anotou Stolze (2017), o direto da laje também pode ser adquirido por meio da usucapião: Por fim, interessante serão os reflexos do novo regramento no Direito de Família, na medida em que não é incomum o titular da construção original ceder a unidade sobrelevada a um parente, que passa a exercer direito sobre a unidade autônoma.

Dependendo da circunstância, poderá, até mesmo, operar-se a aquisição do direito real de laje por usucapião, observados os requisitos legais da prescrição aquisitiva.

E mesmo que a cessão seja gratuita, a título de comodato, se o cessionário passa a se comportar como titular exclusivo da laje, alterando o seu ‘animus’ e a própria natureza da posse precária até então exercida, poderá, em nosso sentir, consolidar o seu direto sobre a construção sobrelevada (direito real de laje), mediante usucapião, contando-se o prazo de prescrição a partir do momento em que deixa de se comportar como simples comodatário, por aplicação da regra da 'interversio possessionis’.

Desta forma, sendo o contrato omisso quanto a proporção das despesas a serem arcadas pelo proprietário do imóvel e o proprietário da laje, ou então caso a laje tenha sido adquirida por usucapião, caberá ao juiz dirimir tais conflitos, quando não haver composição extrajudicial.

Quanto ao §2º do citado artigo 1510-C, o qual prevê que “É assegurado, em qualquer caso, o direito de qualquer interessado em promover reparações urgentes na construção na forma do parágrafo único do art. 249 deste Código”, escrevem Stolze e Pamplona Filho (2017): Atento a isso, o Código Civil admite a possibilidade de o fato ser executado por terceiro, havendo recusa ou mora do devedor, nos termos do seu art. 249:

“Art. 249. Se o fato puder ser executado por terceiro, será livre ao credor mandá-lo executar à custa do devedor, havendo recusa ou mora deste, sem prejuízo da indenização cabível.

Parágrafo único. Em caso de urgência, pode o credor, independentemente de autorização judicial, executar ou mandar executar o fato, sendo depois ressarcido'.”

Comentando esse dispositivo, concernente às obrigações fungíveis, SILVIO VENOSA pontifica: 'É interessante notar que, no parágrafo único, a novel lei introduz a possibilidade de procedimento de justiça de mão própria, no que andou muito bem. Imagine-se a hipótese de contratação de empresa para fazer a laje de concreto de um prédio, procedimento que requer tempo e época precisos. Caracterizada a recusa e a mora, bem como a urgência, aguardar uma decisão judicial, ainda que liminar, no caso concreto, poderá causar prejuízo de difícil reparação'.

Assim, poderá o credor, independentemente de autorização judicial, contratar terceiro para executar a tarefa, pleiteando, depois, a devida indenização, o que, se já era possível ser admitido no sistema anterior por construção doutrinária, agora se torna norma expressa.

Desta forma, não dúvidas quanto à constituição do direito real de laje por meio de contrato.

Da possibilidade de lajes sucessivas: A Lei nº 13.465/2017 colocou fim a vedação que a Medida Provisória nº 759/2016 trazia em seu texto, referente à abertura de lajes sucessivas, ou seja, que impedia “sobrelevações sucessivas”.

Em estudo sobre o tema, Stolze (2017) criticava a restrição imposta: Além disso, dada a autonomia registral que lhe foi conferida, o § 5º da MP admitiu ainda a alienação da laje: ‘as unidades autônomas constituídas em matrícula própria poderão ser alienadas e gravadas livremente por seus titulares, não podendo o adquirente instituir sobrelevações sucessivas, observadas as posturas previstas em legislação local’.

Um ponto, aqui, desperta atenção: Certa dúvida quanto ao alcance e constitucionalidade deste dispositivo, na perspectiva do princípio da função social, no que tange à vedação de extensões ou lajes sucessivas.

Uma vez que o legislador cuidou de conceder dignidade legal ao direito sobre a laje, desde que as limitações administrativas e o Plano Diretor sejam respeitados, sobrelevações sucessivas, regularmente edificadas, mereceriam, talvez, o amparo da norma.

Fica o convite à reflexão: O artigo 1510-A, em seu § 6º, do Código Civil acolhe expressamente a essa possibilidade, alinhando a legislação brasileira a realidade pratica que de fato ocorre no país.

“Art. 1510-A. […] § 6º O titular da laje poderá ceder a superfície de sua construção para a instituição de um sucessivo direito real de laje, desde que haja autorização expressa dos titulares da construção-base e das demais lajes, respeitadas as posturas edilícias e urbanísticas vigentes.”

O que o §6º consiste em abertura de novo direito real de laje, que pode ocorrer de cessão da superfície da unidade para edificação da laje quanto por cisão. Portanto, não se trata de alienação de um direito real já existente, conforme pactua o artigo 1510-D.

Do direito real de laje e condomínio: O artigo 1.510-C do Código Civil, em seu caput, determina que se apliquem as regras relativa ao condomínio edilício à edificação da laje, no que couber.

Art. 1.510-C. Sem prejuízo, no que couber, das normas aplicáveis aos condomínios edilícios, para fins do direito real de laje, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes que sirvam a todo o edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum serão partilhadas entre o proprietário da construção-base e o titular da laje, na proporção que venha a ser estipulada em contrato.

Com isso, a lei quis estabelecer um conjunto de deveres comuns à todas as edificações ali existente, utilizáveis por todos os habitantes, conforme demonstra o §1º do mesmo artigo.

“Art. 1.510-C. […]

§ Iº São partes que servem a todo o edifício

I – os alicerces, colunas, pilares, paredes-mestras e todas as partes restantes que constituam a estrutura do prédio

II – o telhado ou os terraços de cobertura, ainda que destinados ao uso exclusivo do titular da laje.

III – as instalações gerais de água, esgoto, eletricidade, aquecimento, ar condicionado, gás, comunicações e semelhantes que sirvam a todo o edifício; e

IV – em geral, as coisas que sejam afetadas ao uso de todo o edifício.”

Assim, conclui-se que a laje não se confunda com o regime de condomínio, sendo aplicadas apenas algumas normas deste na medida em que diversas pessoas compartilharão uma mesma estrutura física básica.

Do direito de preferência na alienação da laje: Para as edificações que possuem direito de laje, em caso de alienação, existe o direito de preferencia ao titulares e  demais titulares.

O direito de preferencia esta previsto no artigo 1510-D do Código Civil, o qual estabelece uma ordem preferencial, com o titular da construção-base ocupando a primeira posição.

“Art. 1510-D. Em caso de alienação de qualquer das unidades sobrepostas, terão direito de preferência, em igualdade de condições com terceiros, os titulares da construção-base e da laje, nessa ordem, que serão cientificados por escrito para que se manifestem no prazo de trinta dias, salvo se o contrato dispuser de modo diverso.

§ 1º O titular da construção-base ou da laje a quem não se der conhecimento da alienação poderá, mediante depósito do respectivo preço, haver para si a parte alienada a terceiros, se o requerer no prazo decadencial de cento e oitenta dias, contado da data de alienação.

§ 2º Se houver mais de uma laje, terá preferência, sucessivamente, o titular das lajes ascendentes e o titular das lajes descendentes, assegurada a prioridade para a laje mais próxima à unidade sobreposta a ser alienada. “

Neste caso, o legislador visa estimular que as lajes sejam apropriadas apenas por uma pessoa, por isso a previsão legal de preferência aos titulares da construção base. Já para os casos de expropriação judicial do bem, foi introduzido os incisos X e XI no artigo 799 do Código de Processo Civil, no qual se exige a intimação dos titulares das unidades sobrepostas e da construção-base no caso de penhora.

Da situação do direito de laje em face da ruína da construção-base - O artigo 1.510-E do Código Civil traz a regra quanto a situação de ruína da construção-base e do consequente perecimento do imóvel sobre o qual incide o direito de laje:

“Art. 1.510-E. A ruína da construção-base implica extinção do direito real de laje, salvo:

I – se este tiver sido instituído sobre o subsolo;

II – se a construção-base não for reconstruída no prazo de cinco anos.

Parágrafo único. O disposto neste artigo não afasta o direito a eventual reparação civil contra o culpado pela ruína. “

Portanto, ocorrendo a extinção do direito real de laje havendo a ruína da construção-base sem reedificação em 5 anos, respondendo civilmente os responsáveis pela ruína.

Dos aspectos registrais: Conforme relatado nos tópicos acima, o §3º do artigo 1510-A do Código Civil, prevê que deverá ser aberta uma matricula própria para o direito real de laje.

Neste sentido, foi que a Lei nº 13.465/2017, alterou a redação do artigo 176 da Lei de registro publico para nele incluir-se o § 9º:

“§ 9º A instituição do direito real de laje ocorrerá por meio da abertura de uma matrícula própria no registro de imóveis e por meio da averbação desse fato na matrícula da construção-base e nas matrículas de lajes anteriores, com remissão recíproca. “

A matricula própria consiste em ter uma numeração de registro original, ou seja, é o primeiro número de registro do imóvel. Assim, a cada alienação o imóvel receberá um novo numero de registro, mantendo o numero de registro original.

Gonçalves relate que: “[…] é qualquer anotação feita à margem de um registro, para indicar as alterações ocorridas no imóvel, seja quanto a sua situação física (edificação de uma casa, mudança de nome de rua) seja quanto à situação jurídica do seu proprietário (mudança de solteiro para casado, p. ex.)”

Portanto, se o Direito Real de Laje não fosse um direito real sobre coisa própria, ou seja, fosse um direito real sobre coisa alheia, ele não poderia gerar uma matrícula própria, como de fato está previsto na legislação.

Das aspectos processuais

A Lei nº 13.465/2017 também introduziu os incisos X e XI no artigo 799 do Código de Processo Civil de 2015.

“Art. 799. Incumbe ainda ao exequente:

X – requerer a intimação do titular da construção-base, bem como, se for o caso, do titular de lajes anteriores, quando a penhora recair sobre o direito real de laje;

XI – requerer a intimação do titular das lajes, quando a penhora recair sobre a construção-base.”

O artigo 799 do Código de Processo Civil esta inserido em um conjunto de normas voltadas para a proteção de terceiros, tanto que dele também fazem parte os artigo 804 e 889 do mesmo código.

Diante de todo o exposto, conclui-se o aprimoramento do Direito Real de Laje pela Lei nº 13.465/2017 trouxe uma evolução para o ordenamento jurídico brasileiro, bem como dignidade humana e legal aos milhares de brasileiros viviam num vácuo normativo habitacional. (Kamila Gabriely de Sousa Gomes e Joseval Martins Viana, publicaram no site ambitojuridico.com.br, uma complementação, intitulada “Direito real de laje e as modificações trazidas pela Lei n. 13.465/2017”, acessado em 15.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

O comentário de Maurício Mota, é baseado em seu artigo “O direito real de Laje no Código Civil”, baseado na Lei Federal n. 13.465/2017, em julho de 2017, um novo direito real, a laje (art. 1.225, XIII, do Código Civil). Na sua visão, o direito real de laje representou mudança acentuada daquele que vinha previsto na Medida Provisória n. 759/2016.

Na MP nº 759/2016 havia toda uma lógica que aproximava o direito real da noção de direito de superfície: ali se falava no direito real de laje como “consistindo na possiblidade de coexistência (sic) de unidades imobiliárias autônomas de titularidades distintas situadas em uma mesma área, de maneira a permitir que o proprietário ceda a superfície de sua construção”; ao mesmo tempo em que discorria sobre o “acesso independente qualquer que seja o seu uso” (art. 1510-A, § 3º); e “proibindo-se o adquirente de instituir sobrelevações sucessivas” (art. 1510-A, § 5º), tudo isso levando a se configurar uma “superfície de uma construção, i.é, uma modalidade de direito de superfície que é, na dicção do art. 1.524 do Código Civil português, “a faculdade de construir ou manter, perpétua ou temporariamente uma obra em terreno alheio, ou de nele fazer ou manter plantações, um direito real sobre coisa alheia, que teria sempre uma ligação peremptória com a construção “ceder a superfície de sua construção” e que não configuraria direito autônomo porque proibida de maneira expressa a instituição de sobrelevações sucessivas.

Na nova lei federal nº 13.465/2017, que alterou o CC 1.510-A, criando o novo direito real de laje,, ocorre uma mudança de orientação no Brasil quanto à forma de se conceber a regularização fundiária urbana.

O modelo tradicional de regularização fundiária, aquele derivado da lei federal n. 11.977/2009, importa na forma de garantir a moradia para os que dela precisam com todos os substratos necessários à plena consecução desta (materiais urbanísticos, creditícios, de infraestrutura etc.), pensada a solução de moradia como uma solução ampla, de plena habitabilidade em uma determinada área urbana).

A lei federal n. 13.465/2017 rompe com essa lógica. Ela tem como espirito o atendimento de que esse modelo de regularização fundiária urbana totalizante, que atende todos os anseios da moradia, é inviável, impossível de ser implementada com todas essas condições.

Então, para a lógica da nova lei no Brasil, é a compreensão de que o mais importante é titular as pessoas, dar a elas o direito de propriedade. Tornar essas pessoas proprietárias dos imóveis que habitam, ainda que não se consiga dar a elas as outras condições também necessárias para a moradia (os suportes materiais, urbanísticos, creditícios, de infraestrutura etc.). 

Preconiza-se na nova legislação que é a sociedade civil que, a partir desses meios que foram concedidos, como o reconhecimento da propriedade das lajes, i.é, é a nova legislação que passa a considerar que é melhor que se titule milhões de pessoas do que se garanta moradia integral e digna para apenas aqueles milhares de privilegiados que os recursos escassos do governo logrem atender.

Talvez essa seja do ponto de vista individual, daquele que pleiteia o acesso à moradia plena, uma lógica não satisfatória, porém, em termos sociais, isso é uma concepção inequivocamente mais abrangente. Uma política pragmática e realista para um país de recursos escassos.

Então, tem-se que pensar o direito real de laje, tal qual ele surge da lei federal n. 13.465/2017, dentro desse novo modelo. O modelo de um direito real de laje como uma verdadeira propriedade. Nós estamos falando aqui de uma propriedade sobre coisa própria. Falando de propriedade na sua acepção mais forte, na acepção mais ampla.

Uma propriedade pensada na elasticidade do direito de propriedade. Concebida como uma superação do princípio da acessão, uma superação do princípio do superfies solo cedit. Entendido isso como historicamente a propriedade se transformou, quando a ideia da compressão e da elasticidade do domínio se altera em diversas circunstâncias históricas. Ele era um na propriedade feudal; há uma série de institutos que não existem mais como o morgadio (regime em que os domínios senhoriais das famílias nobres eram inalienáveis e indivisíveis).

A questão dominial se amplia e se reduz consoante as injunções históricas de cada período. Então, temos que pensar contemporaneamente em uma propriedade afastada da ideia de projeção sobre o solo. Assim, é possível doravante ter uma propriedade mesmo que não se tenha uma fração ideal relativa ao solo onde ela está localizada. 

No final do século XIX, quando se apresentou mais candente a questão da propriedade de apartamentos, também essa questão se colocou. Naquela época era uma novidade a ideia de propriedade de apartamento: ser proprietário de uma unidade imobiliária e da fração ideal em um condomínio necessário relativo ao prédio. Também nesse momento se discutiu muito a elasticidade do domínio. 

O direito real de laje, tal como ficou configurado no CC 1.510-A, constitui um verdadeiro direito próprio de propriedade. É uma propriedade distinta daquela do solo (“unidade distinta daquela originalmente construída sobre o solo”, CC 1.510-A, caput). Tem os poderes inerentes ao direito próprio de propriedade (“Os titulares da laje, unidade imobiliária autônoma constituída em matrícula própria, poderão dela usar, gozar e dispor”, CC 1.510-A, § 3º), o aspecto interno, a senhoria do direito de propriedade, e, obviamente, o direito de reavê-la de quem injustamente a possua.

É um direito de propriedade com outra elasticidade dominial. Um feixe de poderes próprio e que se adequa ao escopo desse modelo de regularização fundiária urbana.

No CC 1.510-A, § 4º se observa a separação, a ideia da radicalidade do novo direito: a instituição do direito de laje não implica na atribuição de fração ideal do terreno (“A instituição do direito real de laje não implica a atribuição de fração ideal de terreno ao titular da laje ou a participação proporcional em áreas já edificadas”, CC 1.510-A, § 4º).

Portanto, aqui se trata de uma propriedade em condomínio necessário. Porém, se não é uma propriedade em condomínio, há de se estabelecerem as relações  jurídicas entre o proprietário da construção-base, o titular da laje e os outros titulares das lajes ascendentes ou descendentes. Aqui há uma influência grande do Código Civil português, do direito de construir sobre o edifício alheio (art. 1.526º ), sobretudo no que concerne ao nosso CC 1.510-C. 

I.é, naquilo que são despesas necessárias à conservação e fruição das partes que sirvam a todo o edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum, as partes amalgamadas entre todos, é preciso fazer um rateio de custos. A lei vai disciplinar aquilo que é comum (os alicerces, colunas, pilares, paredes-mestras e todas as partes restantes que constituam a estrutura do prédio; o telhado ou os terraços de cobertura; as instalações gerais de água, esgoto, eletricidade, aquecimento, ar condicionado, gás, comunicações e semelhantes que sirvam a todo o edifício e, em geral, as coisas que sejam afetadas ao uso de todo o edifício) e estabelece que isso será feito mediante um contrato. Ora, esse contrato terá que ser feito regulando essa forma condominial sobre tais instalações. Ao contrário do que dispunha a MP n] 759/2016, não há mais a necessidade de entrada independente para a laje, essas áreas comuns podem nem existir. É uma lei para regular a situação fática que existe para dar propriedade para todo mundo.

Se os mecanismos de compatibilização não puderem ficar perfeitamente delimitados em tal contrato, aplica-se a regra geral, estabelece-se uma servidão de passagem para a laje ou para as lajes ascendentes ou descendentes. A lei estipula o mínimo necessário: os interessados devem regular as suas relações jurídicas em contrato, mas, não chegando esses a um acordo, aplicam-se os princípios gerais da servidão. É melhor que tal contrato esteja averbado na matrícula do imóvel, para que torne certas as relações entre os proprietários e para que esta forma de associação para fins comuns seja uma associação mais segura. 

O direito real de laje no direito brasileiro, ao contrário de direito de superfície, não é temporário. Ele é um direito que tende à perpetuidade, porque ele pode inclusive, ser reconstituído, no caso da construção-base vir a ser arruinada (“A ruína da construção-base implica extinção do direito real de laje, salvo: I – se este tiver sido instituído sobre o subsolo; II – se a construção-base não for reconstruída no prazo de cinco anos”, CC 1.510-E). É possível até que o proprietário da laje reconstrua os pilares da construção-base e aí mantenha a sua laje sobreposta. 

A lei define o direito de preferência (“Em caso de alienação de qualquer das unidades sobrepostas, terão direito de preferência, em igualdade de condições com terceiros, os titulares da construção-base e da laje, nessa ordem, que serão cientificados por escrito para que se manifestem no prazo de trinta dias, salvo se o contrato dispuser de modo diverso” CC 1.510-D) o que também é uma característica do direito próprio de propriedade. Se não se tratasse de propriedade autônoma da laje, não haveria necessidade de direito de preferência. Há preferência porque a lei preconiza e incentiva a consolidação de propriedades diversas, nas mãos de um único proprietário.

Também no que se refere à matrícula do imóvel, se verificam características de que estamos, inequivocamente, diante de um direito próprio de propriedade. O que identifica o direito de propriedade é a existência da matrícula autônoma do imóvel. A partir da configuração base dessa matrícula é possível alienar sucessivamente esse direito e ter o direito de instituir sobrelevações sucessivas, na medida do que for permitido pelas posturas municipais e pelo Código de Obras do município.

Uma questão importante que não podemos deixar de levar em conta é que este é um direito que se forma por atividade negocial, i.é, eu vou constituir o direito de laje, eu tenho uma construção-base, que existe faticamente, que está averbada no registro de imóveis e, a partir daí, eu vou constituir o direito de laje, respeitando todos os regulamentos urbanísticos. Em qualquer circunstância o proprietário da construção-base vai poder juridicamente constituir a laje, ainda que, não seja possível faticamente fazer a nova construção em cima da laje, se os regulamentos urbanísticos assim não o permitirem. 

O que é uma característica de um direito real. Nenhuma legislação municipal pode atingir o meu direito de constituir juridicamente uma laje.

(...)

(Maurício Mota, seus comentários são baseados em seu artigo “O direito real de Laje no Código Civil”, publicado no site emporiododireito.com.br, em 28.02.2018, baseado na Lei Federal n. 13.465/2017, em julho de 2017, um novo direito real, a laje (art. 1.225, XIII, do Código Civil, acessado em 15.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).