quinta-feira, 18 de fevereiro de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.517, 1.518, 1.519, 1.520 Da Capacidade para o Casamento - VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.517, 1.518, 1.519, 1.520

Da Capacidade para o Casamento - VARGAS, Paulo S. R.

- Parte Especial –  Livro IV –Do Direito de Família –

Título I – Do Direito Pessoal – Subtítulo I – Do casamento

 Capítulo II – Da Capacidade para o Casamento

– (Art. 1.517 a 1.520) - digitadorvargas@outlook.com  

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 Art. 1.517. O homem e a mulher com dezesseis anos podem casar, exigindo-se autorização de ambos os pais, ou de seus representantes legais, enquanto não atingida a maioridade ci- vil.

Parágrafo único. Se houver divergência entre os pais, aplica-se o disposto no parágrafo único do art. 1.631.

Inicia-se o Capítulo II, com a doutrina de Ricardo Fiuza, lembrando que a capacidade para o casamento, independentemente de autorização dos pais é atingida aos dezoito anos, quando cessa a menoridade, estando a pessoa habilitada à prática de todos os atos da vida civil, conforme o art. 9 deste Código.  A idade núbil para o casamento, com autorização dos pais, é de dezesseis anos.

No projeto de Código Civil, em sua redação anterior, havia desigualdade entre os sexos, sendo, então, a idade núbil de dezesseis anos para a mulher e de dezoito para o homem. Em sugestões anteriormente feitas, à época da tramitação do projeto no Senado Federal (Sugestões ao projeto de Código Civil. Direito de família, cit., RT 730/15), bem como naquelas feitas à Câmara dos Deputados, mostramos a necessidade de fixação do mesmo limite de idade para o casamento de homens e mulheres, em face da igualdade entre os sexos, imposta pelo Art. 9, inciso 1, da Constituição Federal.

No regramento anterior, do Código Civil de 1916, embora fosse necessário o consentimento de ambos os pais para o casamento de menores (art. 185), em caso de divergência prevalecia a vontade paterna (Art. 186).

O artigo em análise está adequado ao princípio da plena igualdade entre homens e mulheres, estabelecido pela Constituição Federal de 1988 inclusive nas relações de casamento (ad. 52, inciso 1, e Art. 226, § 52), já que, em caso de divergência entre os pais, faz referência ao CC 1.631, pelo qual, se houver discordância no exercício do poder familiar, não prevalece a vontade de qualquer deles, sendo-lhes assegurado recorrer ao juiz para a solução do desacordo. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 766, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 18/02/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No lecionar de Carvalho Filho, a capacidade para o casamento se comprova pela habilitação a que estão sujeitos os nubentes. Por intermédio dela, os nubentes demonstram que estão aptos a se casar. Comprovada a capacidade, bastará a diversidade de sexo entre os cônjuges (v. comentário ao art. 1.514) e a idade mínima de dezesseis anos para que se possa contrair o casamento. Aos dezesseis anos a pessoa atinge a idade núbil. Antes dessa idade, o casamento só será autorizado diante das situações excepcionais tratadas no art. 1.520. A lei exige que a pessoa tenha atingido a maioridade (dezoito anos) para que possa casar-se sem autorização dos pais ou representantes legais. Os nubentes dependerão de autorização de seus responsáveis, portanto, durante o período de dois anos que medeia os dezesseis e os dezoito anos. O casamento contraído por menor de dezesseis anos é anulável.

O parágrafo único do artigo dispõe que, havendo divergência entre os pais quanto à autorização, caberá ao juiz decidir o conflito, na forma do disposto no parágrafo único do CC 1.631 (v. comentário), observando sempre o que for de melhor interesse da família a ser constituída. Do mesmo modo, sendo injusta, arbitrária e imotivada a recusa ao consentimento, poderá o juiz supri-la, segundo o CC 1.519 (v. comentário). O casamento realizado com autorização judicial estará sujeito, necessariamente, ao regime de separação de bens, conforme determina o CC 1.641, III. Já o casamento de menores que receberam autorização de seus pais ou de seus representantes para se casar pode ser realizado sem que seja celebrado pacto antenupcial, casando-se eles pelo regime de comunhão parcial de bens e reduzindo a termo essa opção (v. comentários aos arts. 1.537 e 1.640). (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.625-26.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 18/02/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Seguindo as orientações de Marco Túlio de Carvalho Rocha, parte-se das referências normativas: Igualdade jurídica dos cônjuges: arts. 5º, I e 226, §5º, CF; e artigos 1.520, 1.551, 1.553, 1.555, 1.560, § 1º, e 1.641 todos do Código Civil. 

Mirem o sistema das interdições para o casamento no Código Civil de 2002. Este distinguiu as causas de “incapacidade matrimonial” dos “impedimentos” e das “causas suspensivas”, interdições que eram tratadas no Código Civil de 1916 conjuntamente como “impedimentos matrimoniais”,

A distinção dos impedimentos em 3 grupos justifica-se pelas diferenças de causa e pelas consequências da violação de cada qual.

As incapacidades matrimoniais tornam anulável o casamento. A infração a impedimentos considerada mais grave, torna o casamento nulo. O casamento realizado com violação das causas suspensivas apenas impõe o regime da separação de bens.

Eis a correspondência entre os institutos no Código Civil de 2002 em relação ao Código Civil de 1916:

Código Civil de 2002

Código Civil de 1916

Capacidade para o casamento (art. 1.517):

·       Anulabilidade do casamento (CC 1.550, IV)

Impedimentos dirimentes relativos (art. 183, IX-XII)

Impedimentos (CC 1.521):

·       Nulidade do casamento (CC 1.548, II, 1.549)

Impedimentos dirimentes absolutos (art. 183, I-VIII)

Causas suspensivas (CC 1.523):

·      Imposição do regime legal obrigatório da separação de bens (CC 1.641, I)

Impedimentos impedientes (art. 183, XIII – XVI)

As causas de incapacidade proíbem o casamento com qualquer pessoa e se referem ao grau de maturidade intelectual presumível do nubente para o casamento.

A incapacidade matrimonial pode advir de três causas: a) falta de idade núbil de 16 anos; b) falta do consentimento dos pais ou do representante legal de menor de 18 anos não-emancipado; (CC 1.517 e 1.555; incapacidade de fato); c) incapacidade de consentir (CC 1.550, IV).

Idade núbil é aquela que confere a pessoa o direito de se casar. O Código Civil de 2002 fixou-a em 16 anos, igualmente, para o homem e para a mulher, como resultado do princípio da igualdade dos cônjuges, posto que na ordem jurídica anterior era de 18 e 16 anos, respectivamente.

A capacidade de se casar é de direito ou de gozo, i.é, antes de atingi-la a pessoa não tem o direito de se casar, salvo, excepcionalmente, em caso de gravidez (CC 1.520). 

Do consentimento do representante legal. O maior de 16 e menor de 18 anos não-emancipado é relativamente incapaz e, como tal, está habilitado a exercer os atos da vida civil desde que assistido pelos detentores do poder familiar, o pai e a mãe, ou, na falta destes, por tutor ou pelo curador de um ou de ambos os pais, se for o caso, pois a autoridade do curador estende-se à pessoa dos filhos incapazes do curatelado (CC 1.778). 

O dispositivo estabelece que ambos os pais devam manifestar aquiescência, uma vez que sejam detentores do poder familiar. Não poderia ser de outro modo, desde que o casamento de menor de 18 anos é uma das causas de emancipação, i.é, de extinção do poder familiar para quem o detenha, refletindo na esfera jurídica de ambos os pais se ambos forem dele detentores. 

O dispositivo não cuida da autorização do curador do nubente, se este for interditado. A omissão supostamente advém do fato de o núcleo do dispositivo ser a idade núbil ao qual o legislador atrelou as disposições relativas à autorização dos representantes legais. No Código de 1916, o impedimento estava previsto no inciso IX do art. 183, o que mais evidencia o equivoco de não ter sido lembrado no capítulo que o Código Civil de 2002 reservou às incapacidades matrimoniais.

Se o nubente for incapaz, também seu curador deverá anuir, pois o CC 1.781 estabelece que as regras relativas ao exercício da tutela aplicam-se à curatela. Vale lembrar que o art. 6º, inciso I, da Lei 13.146/2015 assegura o direito de se casarem os deficientes e que o art. 2º da mesma inclui sob essa denominação os deficientes físicos e os deficientes mentais. A falta de anuência do curador é o que justifica a anulabilidade a que se refere o CC 1.550, IV. Sem esta referência, este último dispositivo ficaria, aliás, sem sentido. 

Quanto à forma da autorização, o CC 1.537 exige que “o instrumento da autorização para casar” deva ser transcrito “na escritura antenupcial”,

O dispositivo correspondente ao CC 1.537, do Código Civil de 1916 era o art. 196, que foi objeto de forte crítica por parte de Beviláqua, por não vislumbrar motivo para a exigência da referida transcrição, uma vez que autorização para o casamento deveria ser cobrada na celebração casamento (Beviláqua, Clóvis. Código civil dos Estados Unidos do Brasil Comentado, v. II. 4. ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1933, p. 50).

Além dessa crítica, deve-se acrescer a dificuldade hermenêutica em relação a casamentos realizados sob regimes de bens legais – supletivo ou obrigatório – que não são necessariamente antecedidos por escritura de pacto antenupcial. A exigência de transcrição da autorização acaba, por via transversa, por forçar que a autorização para o casamento adote a forma de instrumento público, ainda que a lei expressamente não a exija e que o CC 1.525, inciso II, somente faça referência à forma meramente escrita.

A lei não contém outras exigências formais, notadamente quanto ao conteúdo da declaração. Não há prazo de validade nem a necessidade de indicação da pessoa com quem o relativamente incapaz deverá se casar.

A incapacidade do menor de 18 anos e a dos interditados é meramente de fato ou de exercício, uma vez que a capacidade de se casar, como já visto, é adquirida aos 16 anos.

Qualquer pessoa capaz pode alegar a incapacidade matrimonial dos nubentes até a celebração do casamento.

Do suprimento judicial do consentimento. O parágrafo único do CC 1.517 prevê a possibilidade de recurso ao juiz em caso de divergência entre os pais detentores do poder familiar. Neste caso, caberá ao juiz arbitrar o conflito segundo o maior interesse do adolescente. O suprimento judicial do consentimento de um ou de ambos os pais impõe o regime da separação obrigatória de bens conforme o CC 1.641, inciso III. (Marco Túlio de Carvalho Rocha Mestre e Doutor em Direito Civil pela FDUFMG, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.517, acessado em 18.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.518. Até à celebração do casamento podem os pais, tutores ou curadores revogar a autorização.

No lecionar de Carvalho Filho, até o momento da celebração do casamento, a autorização de que trata o artigo antecedente poderá ser revogada. A regra é cogente, de ordem pública, não podendo ser renunciada pelos legitimados em circunstância alguma. Caso ocorra, ter-se-á por não escrita. A retratação terá em vista o interesse do incapaz, devendo o motivo surgir de fato novo, de grande gravidade, como a presença de doença transmissível e periculosidade do nubente. Aquele que suceder ao outorgante falecido no poder familiar poderá valer-se da faculdade concedida pela lei, sempre que convier ao incapaz. Ocorrendo a revogação da autorização, o nubente poderá ingressar com o pedido de suprimento judicial a que se refere o art. 1.519. A revogação, “que será entregue ao oficial do registro, deverá ser feita por escrito, indicando o motivo justo e superveniente à anuência anteriormente dada, constatando o erro que o levou a consentir. Se, no entanto, essa retratação for feita no instante da celebração do ato nupcial, poderá, então, ser feita verbalmente, constando do termo do casamento, que deverá ser assinado pelo juiz, pelos nubentes, pelo representante legal que se retratou, pelas testemunhas e pelo oficial do registro” (Diniz, Maria Helena. Código Civil anotado. São Paulo, Saraiva, 1995). (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.627.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 18/02/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Nas anotações de Carvalho Rocha constam: art. 1.518. Até à celebração do casamento podem os pais ou tutores revogar a autorização (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015) (vigência).

Direito anterior: art. 187 do Código Civil de 1916.

Referências normativas: forma, CC 1.537; possibilidade de revogação da autorização pelo curador: CC 1.781.

A anuência dos representantes legais é requisito para o casamento dos menores incapazes maiores de 16 anos e dos curatelados e, conforme salientado nos comentários ao CC 1.517, deve adotar a forma de escritura pública.

A revogação deve seguir a mesma forma, por força do CC 472, que possui natureza principiológica. A lei não exige que a revogação seja fundamentada. O representante responde por danos se agir abusivamente, sem motivo justo e sem a prudência compatível com a seriedade do ato. 

O Código Civil deixou de regular neste capítulo a situação do nubente interditado submetido à curatela, tal como o fazia o Código Civil de 1916 no inciso IX do art. 183. O CC 1.781 estabelece que as regras relativas ao exercício da tutela aplicam-se à curatela. Desse modo, se o tutor deve autorizar o casamento do menor, o mesmo ocorre entre curador e curatelado.

Se o nubente tiver sido interditado, é anulável o casamento que vier a contrair sem as devidas autorizações do curador e do juiz da curatela, conforme o inciso IV do CC 1.550. 

A Lei n. 13.146/15 deveria ter corrigido o Código Civil de 2002 e incluído, expressamente, os curatelados no rol dos que dependem de autorização para se casar. Ao invés, agravou a omissão retirando do CC 1.518 a menção que este fazia aos curadores, ao lado de pais e tutores, como aptos a revogar a autorização até a celebração do casamento. 

A derrogação fica, contudo, sem efeito prático, por força do já citado CC 1.781 que manda aplicar ao exercício da curatela as disposições relativas ao exercício da tutela. Uma vez que o tutor pode revogar a autorização até a celebração do casamento, o mesmo ode o curador, com base no CC 1.781. o que era expresso ficou implícito.

Se o casamento for realizado em que os nubentes tenham tido conhecimento da revogação da autorização do representante legal o casamento será putativo. 

A revogação da autorização para o casamento equivale à denegação do consentimento, aplicando-se ao caso o CC 1.519.  (Marco Túlio de Carvalho Rocha Mestre e Doutor em Direito Civil pela FDUFMG, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.518, acessado em 18.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No artigo de Felipe Leonardo Rodrigues (Tabelião substituto em São Paulo), intitulado “Nova lei reforma capacidade no Código civil”, publicado em 30 de julho de 2015 no Blog do 26: 26notas.com.br, escreve: 

No dia 7.7.2015 foi publicada no Diário Oficial da União a Lei nº 13.146, de 6 de Julho de 2015, que instituiu a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, chamada de Estatuto da Pessoa com Deficiência.

 

O Estatuto da Pessoa com Deficiência visa a assegurar e a promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando à sua inclusão social e cidadania.

 

Segundo a nova lei, pessoa com deficiência é aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, a qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas (art. 2º).  A lei não faz mais distinção em deficiência física ou psíquica.

 

No geral, sua vigência está prevista para 180 (cento e oitenta) dias após a sua publicação. O § 1º do art. 2º da referida Lei entrará em vigor em até 2 (dois) anos, contados da entrada em vigor. Já os incisos I e II do § 2º do art. 28, o § 6º do art. 44, o art. 49, em 48 (quarenta e oito) meses e o art. 45, em 24 (vinte e quatro) meses.

 

Prorrogou-se a vigência da Lei nº 8.989, de 24 de fevereiro de 1995 até 31 de dezembro de 2021, que dispõe sobre a Isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI, na aquisição de automóveis para utilização no transporte autônomo de passageiros, bem como por pessoas portadoras de deficiência física.

 

Foram revogados os seguintes dispositivos do Código Civil:

– os incisos I, II e III do art. 3º da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil);

– os incisos II e III do art. 228 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil);

– o inciso I do art. 1.548 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil);

– o inciso IV do art. 1.557 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil);

– os incisos II e IV do art. 1.767 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil);

– os arts. 1.776 e 1.780 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil).

Aqui, o grande impacto para a atividade notarial e de registro. Ao modificar as regras sobre capacidade civil, temos mudanças fundamentais nas relações familiares e negociais, especialmente sobre a curatela.

 

Exigirá, dos profissionais do Direito, estudo sobre a nova teoria da incapacidade em harmonia com os princípios da dignidade da pessoa humana. E mais, a sensibilidade e lucidez para mudar velhas fórmulas sobre a capacidade civil.

 

Como a doutrina e os tribunais tratarão doravante o art. 166, I (é nulo o negócio jurídico quando celebrado por pessoa absolutamente incapaz), o art. 171, I (além dos casos expressamente declarados na lei, é anulável o negócio jurídico por incapacidade relativa do agente) ou ainda o art. 1.860 (além dos incapazes, não podem testar os que, no ato de fazê-lo, não tiverem pleno discernimento) sob a perspectiva do Estatuto da Pessoa com Deficiência.

 

O art. 6o da Lei nº 13.146/2015 disciplina que a deficiência não afetará a plena capacidade civil da pessoa, inclusive para:

 

I – casar-se e constituir união estável;

II – exercer direitos sexuais e reprodutivos;

III – exercer o direito de decidir sobre o número de filhos e de ter acesso a informações adequadas sobre reprodução e planejamento familiar;

IV – conservar sua fertilidade, sendo vedada a esterilização compulsória;

V – exercer o direito à família e à convivência familiar e comunitária; e

VI – exercer o direito à guarda, à tutela, à curatela e à adoção, como adotante ou adotando, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas.

 

A pessoa com deficiência terá direito a receber atendimento prioritário, sobretudo com a finalidade de atendimento em todas as instituições e serviços de atendimento ao público (art. 9º), incluindo os serviços notariais e de registro.

 

Os serviços notariais e de registro não poderão negar ou criar óbices ou condições diferenciadas à prestação dos serviços notariais e registrais em razão de deficiência do solicitante, devendo reconhecer sua capacidade legal plena, garantida a acessibilidade (art. 83).

 

O descumprimento do disposto acima constituirá discriminação em razão de deficiência, e as penalidades estão tipificadas no art. 88 e seguintes.

 

A pessoa com deficiência terá assegurado o direito ao exercício de sua capacidade legal em igualdade de condições com as demais pessoas (art. 84).

 

Quando necessário, a pessoa com deficiência será submetida à curatela, conforme a lei. Será facultado à pessoa com deficiência a adoção de processo de tomada de decisão apoiada.

 

O art. 85, por sua vez, menciona que a curatela afetará tão somente os atos relacionados aos direitos de natureza patrimonial e negocial.

 

A curatela não alcança o direito ao próprio corpo, à sexualidade, ao matrimônio, à privacidade, à educação, à saúde, ao trabalho e ao voto. E constitui medida extraordinária, devendo constar da sentença as razões e motivações de sua definição, preservados os interesses do curatelado.

 

Numa interpretação sistêmica, arts. 83, 84, §§ 1º e 2º, 85, §§ 1º e 2º, do Estatuto da Pessoa com Deficiência c/c os arts. 3º, 4º, 215 e art. 1.767, I, do Código Civil, os notários e registradores deverão reconhecer capacidade plena às pessoas com deficiência (física ou psíquica) quando elas puderem exprimir sua vontade sobre o ato notarial ou de registro solicitado.

 

Assim, se a pessoa com deficiência exprimir sua vontade os atos em geral deverão ser praticados. Contudo, se a pessoa não exprimir sua vontade ou não estiver acompanhada de curador (CC 1.767) ou de pessoa para a tomada de decisão apoiada prevista no CC 1.783-A, o ato deverá ser negado (art. 5º, do Estatuto e CC 1.767, I).

 

Repisamos! Se a pessoa não expressar sua vontade diretamente sobre os atos relacionados aos direitos de natureza patrimonial e negocial, deverá comparecer curador (CC 1.767, I) ou pessoa para a tomada de decisão apoiada (CC 1.783-A), desde que no termo de curatela (ou alvará), ou de acordo de decisão apoiada, conste os poderes necessários para a consecução do ato, inclusive os atos notariais e de registro.

 

A seguir, transcreve o autor as alterações, inclusões e revogações de dispositivos do Código Civil, fazendo comentários específicos:

 

CAPÍTULO I - DA PERSONALIDADE E DA CAPACIDADE

 

Art. 3º São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil os menores de 16 (dezesseis) anos.

 

Art. 3o São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil:  

I – os menores de dezesseis anos; 

II – os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos; 

III – os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade. 

 

O artigo revoga parcialmente a capacidade absoluta. Só teremos uma hipótese de incapacidade absoluta: o menor de 16 anos. Não mais subsistirão as hipóteses de incapacidade absoluta por motivos psíquicos. Se a gravidade é de tal grandeza que a pessoa enferma ou com deficiência não possa exprimir sua vontade sobre o objeto de deliberação, não poderá praticar o ato. Deverá ser nomeado curador. As pessoas que, nas causas transitórias puderem exprimir sua vontade, poderão praticar os atos da vida civil, desde que possam deliberar diretamente sobre o ato.  Em suma, não há mais presunção de absoluta incapacidade para os que, por enfermidade ou deficiência mental, tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos e os que, mesmo por causa transitória, puderem exprimir a sua vontade.


Art. 4º São incapazes, relativamente a certos atos ou à maneira de os exercer:

I – os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;

II – os ébrios habituais e os viciados em tóxico;

III – aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade;

IV – os pródigos.

Parágrafo único. A capacidade dos indígenas será regulada por legislação especial.

 

Art. 4o São incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de os exercer: 

I – os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;

II – os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido;

III – os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo;

IV – os pródigos.

Parágrafo único. A capacidade dos índios será regulada por legislação especial.

 

Em relação aos relativamente incapazes, revogou-se a hipótese das pessoas com deficiência mental com discernimento reduzido e dos excepcionais sem desenvolvimento completo.

 

Tais situações foram substituídas pela nova redação do inciso III, ou seja, considerar-se-ão relativamente incapazes aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir a sua vontade. Isso significa que, não podendo exprimir a sua vontade, não poderão praticar os atos da vida civil (ver art. 6º Lei nº 13.146/2015).

 

As pessoas com discernimento reduzido e com desenvolvimento mental incompleto ou completo que puderem exprimir a sua vontade poderão praticar os atos da vida civil.

 

Em suma, não há mais a presunção de relativa incapacidade para os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido e os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo, mas que possam exprimir a sua vontade.

 

TÍTULO V - Da Prova

 

Art. 228. Não podem ser admitidos como testemunhas:

I – os menores de dezesseis anos;

II – (Revogado)

III- (Revogado)

IV – o interessado no litígio, o amigo íntimo ou o inimigo capital das partes;

V – os cônjuges, os ascendentes, os descendentes e os colaterais, até o terceiro grau de alguma das partes, por consanguinidade, ou afinidade.

 

§ 1º Para a prova de fatos que só elas conheçam, pode o juiz admitir o depoimento das pessoas a que se refere este artigo.

 

§ 2º A pessoa com deficiência poderá testemunhar em igualdade de condições com as demais pessoas, sendo-lhe assegurados todos os recursos de tecnologia assistiva.

 

Art. 228. Não podem ser admitidos como testemunhas:  

I – os menores de dezesseis anos;

II – aqueles que, por enfermidade ou retardamento mental, não tiverem discernimento para a prática dos atos da vida civil;

III – os cegos e surdos, quando a ciência do fato que se quer provar dependa dos sentidos que lhes faltam;

IV – o interessado no litígio, o amigo íntimo ou o inimigo capital das partes;

V – os cônjuges, os ascendentes, os descendentes e os colaterais, até o terceiro grau de alguma das partes, por consanguinidade, ou afinidade.

 

Parágrafo único. Para a prova de fatos que só elas conheçam, pode o juiz admitir o depoimento das pessoas a que se refere este artigo.

 

No campo da prova, poderão testemunhar aqueles que, por enfermidade ou retardamento mental, puderem exprimir a sua vontade e os cegos e surdos, quando a ciência do fato que se quer provar dependa dos sentidos que lhes faltam, desde que a tecnologia assistiva permita-os testemunhar.

 

Renumerou-se o parágrafo único e incluiu-se o paragrafo 2º, segundo os quais a pessoa com deficiência, física ou psíquica, poderá testemunhar em igualdade de condições com as demais pessoas, sendo assegurados todos os recursos de tecnologia assistiva (tecnologia assistiva é um termo ainda novo, utilizado para identificar todo o arsenal de recursos e serviços que contribuem para proporcionar ou ampliar habilidades funcionais de pessoas com deficiência e consequentemente promover vida independente e inclusão).

 

CAPÍTULO II - Da Capacidade para o Casamento

 

Art. 1.518.  Até a celebração do casamento podem os pais ou tutores revogar a autorização.

 

Art. 1.518. Até à celebração do casamento podem os pais, tutores ou curadores revogar a autorização.

 

O legislador revogou a legitimidade do curador para revogar a autorização de casamento.

 

CAPÍTULO VIII - Da Invalidade do Casamento

 

Art. 1.548. É nulo o casamento contraído:

I – (Revogado)

II – por infringência de impedimento.

 

Art. 1.548. É nulo o casamento contraído:

I – pelo enfermo mental sem o necessário discernimento para os atos da vida civil;

II – por infringência de impedimento.

 

O casamento contraído por enfermo mental, desde que possa emitir sua vontade ou por meio de seu curador ou responsável, não será hipótese de nulidade.

 

Art. 1.550.  É anulável o casamento

I – de quem não completou a idade mínima para casar;

II – do menor em idade núbil, quando não autorizado por seu representante legal;

III – por vício da vontade, nos termos dos arts. 1.556 a 1.558;

IV – do incapaz de consentir ou manifestar, de modo inequívoco, o consentimento;

V – realizado pelo mandatário, sem que ele ou o outro contraente soubesse da revogação do mandato, e não sobrevindo coabitação entre os cônjuges;

VI – por incompetência da autoridade celebrante.

§ 1º Equipara-se à revogação a invalidade do mandato judicialmente decretada.

§ 2º  A pessoa com deficiência mental ou intelectual em idade núbia poderá contrair matrimônio, expressando sua vontade diretamente ou por meio de seu responsável ou curador.

 

Art. 1.550. É anulável o casamento:

I – de quem não completou a idade mínima para casar;

II – do menor em idade núbil, quando não autorizado por seu representante legal;

III – por vício da vontade, nos termos dos arts. 1.556 a 1.558;

IV – do incapaz de consentir ou manifestar, de modo inequívoco, o consentimento;

V – realizado pelo mandatário, sem que ele ou o outro contraente soubesse da revogação do mandato, e não sobrevindo coabitação entre os cônjuges;

VI – por incompetência da autoridade celebrante.

 

Parágrafo único. Equipara-se à revogação a invalidade do mandato judicialmente decretada.

 

Renumerou-se o parágrafo único e incluiu-se o paragrafo 2º, segundo os quais a pessoa com deficiência mental ou intelectual em idade núbil poderá contrair matrimônio, expressando sua vontade diretamente ou por meio de seu responsável ou curador.

 

Art. 1.557. Considera-se erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge:

 

I – o que diz respeito à sua identidade, sua honra e boa fama, sendo esse erro tal que o seu conhecimento ulterior torne insuportável a vida em comum ao cônjuge enganado;

II – a ignorância de crime, anterior ao casamento, que, por sua natureza, torne insuportável a vida conjugal;

III – a ignorância, anterior ao casamento, de defeito físico irremediável que não caracterize deficiência ou de moléstia grave e transmissível, por contágio ou por herança, capaz de pôr em risco a saúde do outro cônjuge ou de sua descendência;

IV – (Revogado);

 

Art. 1.557. Considera-se erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge:

I – o que diz respeito à sua identidade, sua honra e boa fama, sendo esse erro tal que o seu conhecimento ulterior torne insuportável a vida em comum ao cônjuge enganado;

II – a ignorância de crime, anterior ao casamento, que, por sua natureza, torne insuportável a vida conjugal;

 

III – a ignorância, anterior ao casamento, de defeito físico irremediável, ou de moléstia grave e transmissível, pelo contágio ou herança, capaz de pôr em risco a saúde do outro cônjuge ou de sua descendência;

IV – a ignorância, anterior ao casamento, de doença mental grave que, por sua natureza, torne insuportável a vida em comum ao cônjuge enganado.

 

Não será mais considerado erro essencial o defeito físico irremediável que não caracterize deficiência ou de doença mental que o cônjuge não tinha conhecimento.

 

CAPÍTULO II - Da Curatela - Seção I - Dos Interditos

 

Art. 1.767. Estão sujeitos a curatela:

I – aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade;

II – (Revogado);

III – os ébrios habituais e os viciados em tóxico;

IV – (Revogado)

V – os pródigos.

 

Art. 1.767. Estão sujeitos a curatela:

I – aqueles que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para os atos da vida civil;

II – aqueles que, por outra causa duradoura, não puderem exprimir a sua vontade;

III – os deficientes mentais, os ébrios habituais e os viciados em tóxicos;

IV – os excepcionais sem completo desenvolvimento mental;

V – os pródigos.

 

Não subsistirá a hipótese de sujeição à curatela daqueles que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para os atos da vida civil. Doravante, se sujeitão à curatela aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir a sua vontade.

 

A hipótese dos excepcionais sem completo desenvolvimento mental e dos deficientes mentais também foi revogada.

 

Art. 1.768.  O processo que define os termos da curatela deve ser promovido:

I – pelos pais ou tutores;

II – pelo cônjuge, ou por qualquer parente;

III – pelo Ministério Público;

IV – pela própria pessoa.

 

Art. 1.768. A interdição deve ser promovida:

I – pelos pais ou tutores;

II – pelo cônjuge, ou por qualquer parente;

III – pelo Ministério Público.

 

Alterou-se a redação do caput e incluiu-se o parágrafo IV, pelos quais a interdição também poderá ser promovida pela própria pessoa com deficiência.

 

Art. 1.769.  O Ministério Público somente promoverá o processo que define os termos da curatela:

 

I – nos casos de deficiência mental ou intelectual;

II – se não existir ou não promover a interdição alguma das pessoas designadas nos incisos I e II do artigo antecedente;

III – se, existindo, forem menores ou incapazes as pessoas mencionadas no inciso II.

 

Art. 1.769. O Ministério Público só promoverá interdição:

I – em caso de doença mental grave;

II – se não existir ou não promover a interdição alguma das pessoas designadas nos incisos I e II do artigo antecedente;

III – se, existindo, forem incapazes as pessoas mencionadas no inciso antecedente.

 

Alterou-se a redação do caput. O inciso I também foi alterado para os casos de deficiência mental ou intelectual e no inciso III foram incluídos os menores.

 

Art. 1.771.  Antes de se pronunciar acerca dos termos da curatela, o juiz, que deverá ser assistido por equipe multidisciplinar, entrevistará pessoalmente o interditando.

 

Art. 1.771. Antes de pronunciar-se acerca da interdição, o juiz, assistido por especialistas, examinará pessoalmente o argüido de incapacidade.

 

O legislador alterou o termo “interdição” para curatela, “especialistas” para equipe multidisciplinar e “examinar pessoalmente o arguido de incapacidade” para entrevistar pessoalmente o interditando.

 

Art. 1.772.  O juiz determinará, segundo as potencialidades da pessoa, os limites da curatela, circunscritos às restrições constantes do art. 1.782, e indicará curador.

 

Parágrafo único.  Para a escolha do curador, o juiz levará em conta a vontade e as preferências do interditando, a ausência de conflito de interesses e de influência indevida, a proporcionalidade e a adequação às circunstâncias da pessoa.

 

Art. 1.772. Pronunciada a interdição das pessoas a que se referem os incisos III e IV do art. 1.767, o juiz assinará, segundo o estado ou o desenvolvimento mental do interdito, os limites da curatela, que poderão circunscrever-se às restrições constantes do art. 1.782.

Alterou-se o caput: os limites da curatela se darão segundo as potencialidades da pessoa sujeita às restrições do art. 1.782 e o juiz indicará o curador.

 

Incluiu-se o parágrafo único: para a escolha do curador, o juiz levará em conta a vontade e as preferências do interditando, a ausência de conflito de interesses e de influência indevida, a proporcionalidade e a adequação às circunstâncias da pessoa.

 

Art. 1.775-A.  Na nomeação de curador para a pessoa com deficiência, o juiz poderá estabelecer curatela compartilhada a mais de uma pessoa.

 

Art. 1.775. O cônjuge ou companheiro, não separado judicialmente ou de fato, é, de direito, curador do outro, quando interdito.

 

§1o Na falta do cônjuge ou companheiro, é curador legítimo o pai ou a mãe; na falta destes, o descendente que se demonstrar mais apto.

 

§ 2o Entre os descendentes, os mais próximos precedem aos mais remotos.

 

§ 3o Na falta das pessoas mencionadas neste artigo, compete ao juiz a escolha do curador.

 

O legislador incluiu o art. 1.775-A, pelo qual a nomeação de curador poderá ser compartilhada a mais de uma pessoa.

 

Art. 1.777.  As pessoas referidas no inciso I do art. 1.767 receberão todo o apoio necessário para ter preservado o direito à convivência familiar e comunitária, sendo evitado o seu recolhimento em estabelecimento que os afaste desse convívio.

 

Art. 1.777. Os interditos referidos nos incisos I, III e IV do art. 1.767 serão recolhidos em estabelecimentos adequados, quando não se adaptarem ao convívio doméstico.

 

O legislador estabeleceu que as pessoas que por causa transitória ou permanente não puderem exprimir sua vontade receberão todo o apoio necessário para ter preservado o direito à convivência familiar e comunitária, sendo evitado o seu recolhimento em estabelecimento que os afaste desse convívio. Bem o contrário da previsão atual do Código.

 

Seção III - Do Exercício da Curatela

 

Art. 1.783. Quando o curador for o cônjuge e o regime de bens do casamento for de comunhão universal, não será obrigado à prestação de contas, salvo determinação judicial.

 

O Título IV do Livro IV da Parte Especial da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), passa a vigorar com a seguinte redação:

 

TÍTULO IV - Da Tutela, da Curatela e da Tomada de Decisão Apoiada

O Título IV do Livro IV da Parte Especial da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), passa a vigorar acrescido do seguinte Capítulo III:

 

CAPÍTULO III - Da Tomada de Decisão Apoiada

 

Art. 1.783-A. A tomada de decisão apoiada é o processo pelo qual a pessoa com deficiência elege pelo menos 2 (duas) pessoas idôneas, com as quais mantenha vínculos e que gozem de sua confiança, para prestar-lhe apoio na tomada de decisão sobre atos da vida civil, fornecendo-lhes os elementos e informações necessários para que possa exercer sua capacidade.

 

§ 1o  Para formular pedido de tomada de decisão apoiada, a pessoa com deficiência e os apoiadores devem apresentar termo em que constem os limites do apoio a ser oferecido e os compromissos dos apoiadores, inclusive o prazo de vigência do acordo e o respeito à vontade, aos direitos e aos interesses da pessoa que devem apoiar.

 

§ 2o  O pedido de tomada de decisão apoiada será requerido pela pessoa a ser apoiada, com indicação expressa das pessoas aptas a prestarem o apoio previsto no caput deste artigo.

 

§ 3o  Antes de se pronunciar sobre o pedido de tomada de decisão apoiada, o juiz, assistido por equipe multidisciplinar, após oitiva do Ministério Público, ouvirá pessoalmente o requerente e as pessoas que lhe prestarão apoio.

 

§ 4o  A decisão tomada por pessoa apoiada terá validade e efeitos sobre terceiros, sem restrições, desde que esteja inserida nos limites do apoio acordado.

 

§ 5o  Terceiro com quem a pessoa apoiada mantenha relação negocial pode solicitar que os apoiadores contra assinem o contrato ou acordo, especificando, por escrito, sua função em relação ao apoiado.

 

§ 6o  Em caso de negócio jurídico que possa trazer risco ou prejuízo relevante, havendo divergência de opiniões entre a pessoa apoiada e um dos apoiadores, deverá o juiz, ouvido o Ministério Público, decidir sobre a questão.

 

§ 7o  Se o apoiador agir com negligência, exercer pressão indevida ou não adimplir as obrigações assumidas, poderá a pessoa apoiada ou qualquer pessoa apresentar denúncia ao Ministério Público ou ao juiz.

 

§ 8o  Se procedente a denúncia, o juiz destituirá o apoiador e nomeará, ouvida a pessoa apoiada e se for de seu interesse, outra pessoa para prestação de apoio.

§ 9o  A pessoa apoiada pode, a qualquer tempo, solicitar o término de acordo firmado em processo de tomada de decisão apoiada.

 

§ 10.  O apoiador pode solicitar ao juiz a exclusão de sua participação do processo de tomada de decisão apoiada, sendo seu desligamento condicionado à manifestação do juiz sobre a matéria.

 

§ 11.  Aplicam-se à tomada de decisão apoiada, no que couber, as disposições referentes à prestação de contas na curatela.

 

O legislador definiu que a tomada de decisão apoiada é o processo pelo qual a pessoa com deficiência elege pelo menos 2 pessoas idôneas para prestar-lhe apoio na tomada de decisão sobre atos da vida civil, fornecendo-lhes os elementos e informações necessários para que possa exercer a sua capacidade.

 

Para formular o pedido, a pessoa com deficiência e os apoiadores devem apresentar termo em que constem os limites do apoio a ser oferecido e os compromissos dos apoiadores, inclusive o prazo de vigência do acordo e o respeito à vontade, aos direitos e aos interesses da pessoa que vão apoiar.

 

Deferido o pedido pelo juiz, a decisão tomada por pessoa apoiada terá validade e efeitos sobre terceiros, sem restrições, desde que esteja inserida nos limites do apoio acordado.

 

As pessoas com quem a pessoa apoiada mantenha relação negocial podem solicitar que os apoiadores assinem o contrato ou acordo, especificando, por escrito, sua função em relação ao apoiado.

Em caso de negócio jurídico que possa trazer risco ou prejuízo relevante, havendo divergência de opiniões entre a pessoa apoiada e um dos apoiadores, deverá o juiz, ouvido o Ministério Público, decidir sobre a questão. (Felipe Leonardo Rodrigues (Tabelião substituto em São Paulo), no artigo intitulado “Nova lei reforma capacidade no Código civil”, publicado em 30 de julho de 2015 no Blog do 26: 26notas.com.br, acessado em 18.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.519. A denegação do consentimento, quando injusta, pode ser suprida pelo juiz. 

Notas de Marco Túlio de Carvalho Rocha: Direito anterior: art. 188 do Código Civil de 1916; Dec. n. 181/1890, art. 7º, § 7º.

Referências normativas: competência da justiça da infância e da juventude: art. 148, parágrafo único, c, da Lei n. 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente); procedimento: arts. 719 a 725, da Lei n. 13.105/15 (Código de Processo Civil); regime obrigatório da separação de bens: CC 1.641, inciso III.

O poder de autorizar o casamento dos representados insere-se no âmbito do poder familiar, no da tutela e no da curatela. Tais institutos são considerados funções, pois possuem as características de dever e de direito dos representantes. São exercidos em benefício dos incapazes. O juiz pode suprir o consentimento sempre que verificar que a recusa do representante legal não se baseia em motivo justo. (Marco Túlio de Carvalho Rocha Mestre e Doutor em Direito Civil pela FDUFMG, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.519, acessado em 18.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Na doutrina de Ricardo Fiuza apresenta-se este dispositivo tratando do suprimento judicial de consentimento dos pais para o casamento de filhos em idade núbil. Realmente era desnecessária a referência ao cabimento de recurso à instância superior, que também constava do Código Civil de 1916, em seu art. 188. O recurso cabível, de natureza voluntária e não necessária, independentemente dessa referência, é de apelação (CPC/1973, Art. 513, representado hoje, CPC/2015, ao art. 1.009, §§ 1º, 2º e 3º).

Conforme o art. 888. inciso IV. do Código de Processo Civil/1973, (com correspondência ao art. 301 no CPC/2015) pode ser ordenado, em medida cautelar preparatória ou incidental o afastamento do menor autorizado a contrair casamento contra a vontade dos pais”. 

Sobre o procedimento a ser utilizado, embora não exista regramento expresso, é cabível o de jurisdição voluntária (CPC/1973. arts. 1.103 a 1.111, correspondendo atualmente no CPC/2015 aos arts. 719 ao 724). 

Na conformidade do CC 1.641, III, o regime de bens que obrigatoriamente será adotado pelos cônjuges que obtêm suprimento judicial para o casamento é o da separação de bens (CC 1.687 e 1.688). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 767, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 18/02/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Lembra Milton Paulo de Carvalho Filho, como já ressaltado em comentários ao CC 1.517, a denegação dos pais ou responsáveis de consentimento ao casamento não poderá ser arbitrária, imotivada ou injusta. Caberá ao juiz, diante das circunstâncias peculiares de cada caso concreto, examinar a injustiça da denegação que fere direito subjetivo dos nubentes. Capricho, autoritarismo, preconceito e antipatia dos pais contrapõem-se a costumes desregrados, inaptidão para o sustento da família e grave risco para a saúde e para a integridade física e moral do outro nubente, que são, indubitavelmente, motivos que justificam a recusa da autorização. Repita-se que o casamento realizado com autorização judicial estará sujeito, necessariamente, ao regime de separação de bens, conforme determina o CC 1.641, III. Apesar de suprimida pelo legislador a referência ao cabimento de recurso que constava do art. 188 do CC/1916, o certo é que a possibilidade de sua interposição está assegurada pelo diploma processual civil (arts. 496 e segs. do CPC/1973, correspondendo ao artigo 994 e ss. do CPC/2015). (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.628.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 18/02/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Art. 1.520. Excepcionalmente, será permitido o casamento de quem ainda não alcançou a idade núbil (art. 1.517), para evitar imposição ou cumprimento de pena criminal ou em caso de gravidez.

No entendimento de Marco Túlio de Carvalho Rocha, a exceção ligada à imposição de pena tornou-se ineficaz com a revogação do inciso VII do art. 107, do Código Penal (que cuidava da isenção de pena se o acusado de estupro viesse a se casar com a vítima, pela Lei n. 11.106, de 2005. Desse modo, somente a gravidez autoriza o casamento de menores de 16 anos. O dispositivo não distingue: pode-se casar a mulher grávida, menor de 16 anos, o o homem menor de 16 cuja parceira tenha ficado grávida. A indiferenciação justifica-se uma vez que os costumes não mais impõem o casamento da mulher grávida. (Marco Túlio de Carvalho Rocha Mestre e Doutor em Direito Civil pela FDUFMG, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.520, acessado em 18.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No comentário de Carvalho Filho, este dispositivo estabelece as situações excepcionais em que será admitido o casamento a quem não contar com a idade núbil. A lei autoriza o casamento dos menores impúberes quando tiver por fim evitar a imposição de pena criminal ao nubente (maior de dezoito anos), autor de crime (estupro, atentado violento ao pudor, posse sexual mediante fraude, atentado ao pudor mediante fraude, corrupção de menores, rapto), bastando que com ele concorde a vítima, independentemente da anuência do seu representante legal, embora este possa ser ouvido por ordem judicial. Com o casamento, estaria extinta a punibilidade penal (art. 107, V II, do CP). Contudo, a Lei n. 11.106, de 28.03.2005, houve por bem revogar o inciso VII do art. 107 do Código Penal, ficando, assim, revogada tacitamente essa parte do presente artigo. Consoante ensina Gustavo Filipe Barbosa Garcia, com a nova lei o casamento deixou de evitar a imposição ou o cumprimento de pena criminal, somente nos crimes contra os costumes de ação penal pública, não podendo a alteração legislativa operar retroativamente. Segundo o autor, nos crimes contra os costumes de ação penal privada persiste a possibilidade de extinção da punibilidade pela renúncia do direito de queixa ou pelo perdão do ofendido aceito (art. 107, V, do CP), pois, como o casamento da vítima com o agente pode ser visto como renúncia tácita, ou perdão tácito (conforme exercido antes ou depois da propositura da ação penal privada, respectivamente), mesmo que a aplicabilidade desta parte inicial do art. 1.520 do Código Civil tenha sido reduzida, ainda persiste (Casamento anulável no Código Civil de 2002 e repercussões da Lei 11.106/2005, em RT 840/143).

A outra situação autorizada pela lei e a gravidez da menor de dezesseis anos que teve origem em relacionamento sexual consentido ou em inseminação artificial autorizada pelo nubente. O casamento nessa hipótese tem por finalidade estabelecer um lar, já constituído, para a criança que irá nascer, visando com isso protegê-la. Ambas as situações exigem a intervenção judicial, visando ao suprimento da idade do menor. Embora nulo o casamento de menores de dezesseis anos, o que se realizou como resultante de gravidez estará isento dessa consequência, conforme determina o CC 1.551. 

Como a intenção do legislador foi a de conferir maior proteção à família, em especial no sentido de facilitar o casamento, outras situações, além das enumeradas neste artigo, poderão surgir, a justificar o suprimento judicial para o casamento, como a da menor que, mesmo não estando grávida, viva em união estável, mantendo com seu companheiro vida sexual ativa, conte com a aprovação dos pais em relação à união e tenha aptidão física e psicológica para o casamento. Ao julgador, com prudência, bom senso e tendo em vista o propósito buscado pelo legislador, competirá o exame de cada caso concreto. 

Também nas hipóteses referidas nesse artigo, o casamento realizado com autorização judicial estará sujeito, necessariamente, ao regime de separação de bens, conforme determina o CC 1.641, III. (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.628-29.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 18/02/2021. Revista e atualizada nesta data por VD). 

Na visão de Ricardo Fiuza, este dispositivo trata do suprimento judicial de idade para o casamento. No Código Civil de 1916, o suprimento judicial de idade somente era possível para evitar a imposição ou o cumprimento de pena criminal, podendo o juiz ordenar a separação de corpos até o alcance da idade núbil (Art. 214, caput e parágrafo único), sendo que a gravidez somente impedia a anulação do casamento por defeito de idade.  

Neste artigo é estabelecida, além da imposição ou cumprimento de pena criminal, a gravidez, como causa de suprimento judicial de idade, bem como eliminada a possibilidade de ordem judicial para a separação de corpos do casal. 

Exemplos de crimes cuja imposição ou cumprimento de pena podem ser evitados pelo casamento entre a vítima e o agente, conforme o Art. 107, VII, do Código Penal: estupro — Art. 213; atentado violento ao pudor— art. 214; posse sexual mediante fraude — Art. 215; atentado ao pudor mediante fraude — Art. 216; corrupção de menores — Art. 218; rapto —arts. 219 e 220. • Álvaro Villaça Azevedo e Regina Beatriz Lavares da Silva Papa dos Santos, Sugestões ao projeto de Código Civil. Direito de família, RiS 730/15. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 767, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 18/02/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.514, 1.515, 1.516 Do Casamento – Disposições Gerais - VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.514, 1.515, 1.516

Do Casamento – Disposições Gerais - VARGAS, Paulo S. R.

- Parte Especial –  Livro IV –Do Direito de Família –

Título I – Do Direito Pessoal – Subtítulo I – Do casamento

 Capítulo I – Disposições Gerais

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 Art. 1.514. 0 casamento se realiza no momento em que o homem e a mulher manifestam, perante o juiz, a sua vontade de estabelecer vínculo conjugal, e o juiz os declara casados. 

Na forma de ver de Carvalho Filho, o casamento é ato solene e formal e sua celebração exige o cumprimento das formalidades do processo de habilitação (v. comentários aos arts. 1.525 a 1.532). Para que seja consumado o casamento, o homem e a mulher deverão inicialmente manifestar ao juiz, um após o outro, sua vontade de estabelecer o vínculo conjugal. A vontade dos nubentes, por determinação legal (CC 1.535, v. comentário), deve ser livre e espontânea. A ausência de completa liberdade do querer casar-se e a vontade viciada, sujeita a constrangimentos, impõem a suspensão da celebração e impedem a consumação do casamento (v. comentário ao CC 1.538). Diante da resposta positiva (sem nenhuma condição ou termo), clara e consciente dos nubentes, o celebrante declarará formalizado o casamento, pronunciando os dizeres contidos no CC 1.535 (v. comentário). Só haverá casamento após essa declaração do celebrante. A diversidade de sexo dos nubentes é pressuposto para a realização do casamento válido. Será inexistente o casamento convolado entre duas pessoas do mesmo sexo e, por consequência, não produzirá nenhum efeito jurídico (ver comentários aos arts. 1510 A, B, C, D e E – nota de VD). Maria Helena Diniz ensina que, se porventura o magistrado deparar com caso dessa espécie, deverá tão somente pronunciar sua inexistência, negando a tal união o caráter matrimonial. Deve, é óbvio, distinguir prudentemente a identidade do sexo dos vícios congênitos de conformação, da dubiedade de sexo, da malformação dos órgãos genitais ou da disfunção sexual, que apenas acarretam anulabilidade (Curso de direito civil brasileiro - direito de família. São Paulo, Saraiva, 2002, v. V). (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.620.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 17/02/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Historicamente, o dispositivo em tela recebeu alteração, por meio de emenda de redação na Câmara dos Deputados, no período final de tramitação do projeto, de modo a substituir a expressão que qualifica o vínculo. A redação atual, no restante, é a mesma do projeto, cujo Livro IV, referente ao direito de família, ficou a cargo de Clóvis do Couto e Silva.

Na doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, a substituição da expressão que qualifica o vínculo (“matrimonial” por “conjugal”) está adequada à nomenclatura utilizada na Constituição Federal e no Código Civil, que sempre se referem a casamento e não a matrimônio. Anteriormente à celebração do casamento deve ser realizado o processo de habilitação, conforme o disposto nos CC 1.525 a 1.532. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 764, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 17/02/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Sob a visão de Carvalho Rocha, estende-se o assunto da diversidade de sexos no casamento. Embora não seja o núcleo do dispositivo, que cuida do momento em que se considera estabelecido o vínculo matrimonial, destaca-se a referência ao homem e à mulher como a primeira e única do direito brasileiro relativa à heterossexualidade do casamento.

A omissão dos textos anteriores sobre a necessidade de diversidade de gêneros na formação do casamento não significava permissão para as uniões conjugais homoafetivas. Ao contrário, na tradição judaico-cristã a heterossexualidade era considerada exigência do próprio conceito de casamento. Desse modo, o casamento entre pessoas do mesmo sexo, mais do que ato jurídico nulo era considerado ato jurídico inexistente, por faltar-lhe base material e tampouco possuir a aparência de ato jurídico válido. Foi essa a tese formulada por Zachariae Von Lingenthal no final do Século XIX, para justificar a inexistência de efeitos jurídicos do casamento entre pessoas do mesmo sexo no direito francês mesmo sem norma proibitiva, que se espraiou para outros ramos do direito.

Ao julgar procedente a Arguição de Descumprimento Fundamental n. 132, o Supremo Tribunal Federal admitiu a possibilidade jurídica da união estável homoafetiva. O referido entendimento vem sendo interpretado, por analogia, no sentido de se permitir o próprio casamento entre pessoas do mesmo sexo. Neste sentido, o Superior Tribunal de Justiça decidiu inexistir óbices legais ao casamento entre pessoas do mesmo sexo (REsp 1.183.378/RS, j. 25.10.2011; e que a vedação implícita seria constitucionalmente inaceitável. 

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) proibiu a recusa de habilitação, celebração de casamento civil ou de conversão de união estável entre pessoas do mesmo sexo por meio da resolução n. 175, de 14.05.2013.

A questão ainda não foi decidida pelo Supremo Tribunal Federal, que deve se pronunciar sobre a constitucionalidade da Resolução n. 175 do CNJ no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 4.966 ajuizada pelo Partido Social Cristão (PSC) em 2013. 

A Holanda foi o primeiro país do mundo a legalizar o casamento entre pessoas do mesmo sexo, em 2001. Seguiram-na, Bélgica (2003), Canadá e Espanha (2005), África do Sul (2006), Noruega e Suécia (2009), Argentina, Islândia e Portugal (2010), Dinamarca (2012), França, Nova Zelândia e Uruguai (2013), Escócia, Inglaterra, Luxemburgo e País de Gales (2014), Irlanda, Finlândia e Colômbia (2016), Alemanha, Taiwan e Malta (2017).

Todos esses países valeram-se de procedimento legislativo para a aprovação do casamento homoafetivo, sublinhando que, por força do princípio da separação dos poderes, a matéria se encontra sujeita à regra da maioria e representa escolha da sociedade. 

Em sentido contrário, as supremas cortes dos EUA e do México declararam o direito ao casamento entre pessoas do mesmo sexo em 2015 fazendo-o prevalecer sobre lei locais. O Congresso mexicano rejeitou a aprovação do casamento homoafetivo em 2016.

O artigo em comento, CC 1.514 – Momento da realização do casamento – cuida somente de uma das formas de celebração do casamento: o casamento civil. Além desta de casamento, outras duas existes: o casamento religioso, previsto no parágrafo 2º do art. 226 da Constituição e o casamento por conversão de união estável, nos termos do CC 1.726.

O juiz que trata o dispositivo é o juiz de paz, que passou a ter competência para a celebração do casamento civil com a proclamação da República e a mantém conforme o art. 98, inciso II, da Constituição. A regra não exclui o casamento nuncupativo que constitui forma excepcional de casamento civil e que dispensa a presença do juiz de paz.

O casamento entende-se realizado no exato momento em que os nubentes manifestam sua anuência. Desse modo, o registro do termo de casamento que se segue à celebração tem, para esse efeito, função meramente declaratória. Dessa regra resulta que o casamento terá sido realizado ainda que um dos cônjuges venha a falecer após a aceitação e antes do registro do termo de casamento. (Marco Túlio de Carvalho Rocha, Mestre e Doutor em Direito Civil pela FDUFMG, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.514, acessado em 17.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 Art. 1.515. O casamento religioso, que atender às exigências da lei para a validade do casamento civil, equipara-se a este, desde que registrado no registro próprio, produzindo efeitos a partir da data de sua celebração.

Há um histórico. O presente dispositivo recebeu alteração, por meio de emenda de redação na Câmara dos Deputados, no período final de tramitação do projeto, de modo a substituir a expressão “matrimônio” por “casamento”, tendo em vista que a Constituição Federal de 1988 utiliza a primeira expressão e não a segunda (CF. Art. 226, §~ P e 2~). E também houve emenda de redação para substituir o verbo no particípio passado “inscrito” pelo particípio passado “registrado”, em face das expressões consagradas pela Lei de Registros Públicos — Lei n. 6.015/73.

Em sua Doutrina, para o relator Ricardo Fiuza não havia regulamentação no Código Civil anterior do casamento religioso com efeitos civis. Tal regramento era realizado pela Lei n. 6.015 fls., arts. 71 a 75, revogados pelo atual Código Civil. • Na conformidade deste artigo e do artigo seguinte, o casamento religioso, para que gere efeitos civis, deve seguir as mesmas formalidades do casamento civil, tendo iguais impedimentos. Desse modo, o casamento religioso que não atende ao disposto nestes artigos configura-se juridicamente como união estável (arts. 1.723 a 1.727) (v. Maria Helena Diniz, Curso de direito civil brasileiro, 16. ed., São Paulo, Saraiva, 2001, v. 5, p. 46-9). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 765, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 17/02/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

De acordo com os ensinamentos de Carvalho Rocha, até a Proclamação da República a única forma de realização do casamento era a religiosa. A atribuição de efeitos civis ao casamento religioso foi revogada pela República. A Constituição de 1934 a reintroduziu, com a condição de serem observadas as disposições legais no tocante a impedimentos, habilitação, processo de oposição e registro (art. 146). A Constituição de 1988 a manteve (art. 226, § 2º). A Lei n. 1.110/50 regula o reconhecimento dos efeitos civis ao casamento religioso. Os artigos 71 a 75 da Lei n. 6.015/73 estabelecem o procedimento.

O art. 72 da Lei n. 6.015/73 exige que o termo do casamento religioso seja subscrito pela autoridade religiosa que o celebrar, pelos nubentes, por duas testemunhas, devendo constar do mesmo as informações enumeradas no art. 70 da mesma lei. 

Por força do disposto no art. 5º, inciso VI, da Constituição, “autoridade religiosa” é qualquer pessoa como tal socialmente aceita. O casamento religioso pode se dar com habilitação prévia ou com habilitação posterior. (Marco Túlio de Carvalho Rocha Mestre e Doutor em Direito Civil pela FDUFMG, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.515, acessado em 17.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No entendimento de Carvalho Filho, como já salientado (v. comentário ao art. 1.512), outra espécie de casamento, além do civil, autorizada pela Constituição federal é o religioso com efeitos civis, referido neste artigo e no seguinte. O casamento religioso realizado perante autoridade religiosa ou ministro religioso tem sua validade sujeita a uma condição: de que seja ele inscrito no livro de registro civil das Pessoas Naturais, após cumpridas as formalidade do processo de habilitação, antes ou depois da celebração religiosa (v. comentário ao CC 1.516), produzindo efeitos civis, contudo, a partir de tal data. (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.620.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 17/02/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Art. 1.516. O registro do casamento religioso submete-se aos mesmos requisitos exigidos para o casamento civil.

§ Iº O registro civil do casamento religioso deverá ser promovido dentro de noventa dias de sua realização, mediante comunicação do celebrante ao ofício competente, ou por iniciativa de qualquer interessado, desde que haja sido homologada previamente a habilitação regulada neste Código. Após o referido prazo, o registro dependerá de nova habilitação.

§ 2º O casamento religioso, celebrado sem as formalidades exigidas neste Código, terá efeitos civis se, a requerimento do casal, for registrado, a qualquer tempo, no registro civil, mediante prévia habilitação perante a autoridade competente e observado o prazo do art. 1.532.

§ 3º Será nulo o registro civil do casamento religioso se, antes dele, qualquer dos consorciados houver contraído com outrem casamento civil. 

No lecionar de Carvalho Filho, a lei impõe que, para ter validade o casamento religioso, devem ser atendidas as mesmas exigências legais de validade do casamento civil. Os efeitos civis do casamento religioso serão alcançados após o regular processo de habilitação exigido pela lei, que poderá ser prévio ou posterior à celebração religiosa do casamento. A regra é que a habilitação seja prévia, ou seja, os nubentes deverão inicialmente apresentar-se perante o oficial do registro civil e solicitar que sejam habilitados para o casamento posterior. Esse procedimento de habilitação é o previsto nos arts. 1.525 a 1.532 (v. comentários). Ao final, será extraída uma certidão de habilitação que deverá ser apresentada à autoridade religiosa. Excepcionalmente, a lei autoriza que a habilitação para o casamento seja efetivada pelos nubentes após a realização da celebração do ato religioso. Nessa hipótese, a validade do casamento ficará condicionada ao registro posterior, mediante a comprovação da capacitação dos nubentes para o casamento.

O § Iº do presente artigo trata do casamento religioso com habilitação prévia. Estabelece o legislador o prazo decadencial de noventa dias para que seja feito o registro civil do casamento religioso, período esse superior àquele fixado pela Lei de Registros Públicos (art. 73). Decorrido esse prazo, que é contado a partir da data da celebração, o registro do casamento religioso dependerá de nova habilitação, permanecendo válida, contudo, a celebração religiosa já efetivada. O prazo da comunicação ao registro civil é para o celebrante ou para qualquer interessado. A morte de um dos cônjuges não impedirá o registro civil do casamento religioso realizado validamente, quando o pedido de registro for encaminhado dentro do prazo estabelecido pela lei.

O §2° do artigo trata do casamento religioso com habilitação posterior. Não estabelece a lei prazo para que seja inscrito no registro civil o casamento religioso, o que poderá ser feito a qualquer tempo, desde que seja efetivada pelos nubentes a habilitação perante a autoridade competente. Os efeitos do casamento religioso retroagirão, em qualquer dos casos, à data da celebração, como estabelece o art. 1.515, parte final.

Será considerado nulo, por força do que dispõe o §3° deste artigo, o registro do casamento civil realizado por qualquer dos cônjuges exatamente no período que intermedeia a data da celebração e do registro do casamento religioso. Igualmente será nulo o registro civil do casamento religioso quando já registrado anteriormente o casamento civil de algum dos cônjuges. (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.623-24.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 17/02/2021. Revista e atualizada nesta data por VD). 

Buscando o histórico, tal era a redação original do dispositivo constante do projeto: “O registro do casamento religioso submete-se aos mesmos requisitos exigidos para o do civil. § lº O registro civil do casamento religioso deverá ser feito logo após a celebração, por comunicação do celebrante ao oficial do registro civil, quando os consorciados se houverem habilitado para o casamento, nos termos do Capítulo V deste Livro, e pelos consorciados; e, a qualquer tempo, se assim o requerer, qualquer interessado. § 2º Será ineficaz o registro civil do casamento religioso, se, antes dele, qualquer dos consorciados houver contraído com outrem matrimônio civil. § 3º O casamento religioso, celebrado sem a observância das exigências da lei civil, só produz efeitos civis se, a requerimento do casal, for inscrito no registro publico , mediante prévia habilitação perante a autoridade competente”. Durante a tramitação no Senado Federal o dispositivo ganhou a seguinte redação: “O registro do casamento religioso submete-se aos mesmos requisitos exigidos para o casamento civil. § lº O registro civil do casamento religioso deverá ser promovido nos noventa dias após a sua realização, mediante comunicação do celebrante ao oficio competente, ou por iniciativa de qualquer interessado, desde que haja sido julgada previamente a habilitação regulada neste Código. § 2º O casamento religioso, celebrado sem as formalidades exigidas neste Código, terá efeitos civis se, a requerimento do casal, for inscrito, a qualquer tempo, no registro civil, mediante prévia habilitação perante a autoridade competente e observado o prazo do CC 1.531. § 3º Será nulo o registro civil do casamento religioso se, antes dele, qualquer dos cônjuges houver contraído com outrem casamento civil”. Retomando o projeto à Câmara, houve nova alteração, procedida pelo Deputado Ricardo Fiuza e que restou aprovada em definitivo, dando origem ao texto atual. Segundo justificativa do Senador Nélson Carneiro, quando fez a primeira modificação neste artigo, “somente na hipótese do § lº, o registro poderá ser requerido por qualquer interessado, já que houve habilitação prévia. Mas é necessário fixar um prazo máximo para essa providência, tanto mais quando a habilitação civil tem eficácia apenas em três meses. A redação dos §§ lº e 2º reproduziu, em parte, os textos constitucionais de 1946 e 1969”. Havia, todavia, necessidade de aprimoramento técnico no novo texto proposto, assim considerando: a) no § 2º, impôs-se a substituição do termo ‘julgada” Por “homologada”, uma vez que a habilitação não está sujeita a sentença judicial; b) no § 3º foi necessária a substituição da expressão “cônjuges” por “consorciados”, já que diante de nulidade do casamento não pode ser utilizada a primeira expressão.

Concluindo o capítulo em sua doutrina, Ricardo Fiuza aponta a distinção entre o regramento do casamento religioso com efeitos civis que constava da Lei n. 6.015/73 (arts. 71 a 75) e a regulamentação do novo Código, conforme o Art. 1.516, reside no prazo para a realização do registro do casamento religioso, com prévia habilitação, que era de trinta dias e passou a ser de noventa dias. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 765-66, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 17/02/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

terça-feira, 16 de fevereiro de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.511, 1.512, 1.513 Do Casamento – Disposições Gerais - VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.511, 1.512, 1.513

Do Casamento – Disposições Gerais - VARGAS, Paulo S. R.

- Parte Especial –  Livro IV –Do Direito de Família –

Título I – Do Direito Pessoal – Subtítulo I – Do casamento

 Capítulo I – Disposições Gerais

– (Art. 1.511 a 1.516) - digitadorvargas@outlook.com  

- vargasdigitador.blogpot.com

 Art. 1.511. O casamento estabelece comunhão plena devida, com base na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges. 

Inaugurando o Direito de Família em sua forma real de iniciar seu comentário, Milton Paulo de Carvalho Filho deve fazer casais repensarem antes de tomarem a decisão final, a não ser aqueles que têm a certeza de viverem como Rato-silvestre-da-pradaria, animais reconhecidos como exemplos de monogamia. Diz ele: O direito de família é o complexo dos princípios que regulam a celebração do casamento, sua validade, seus efeitos, a dissolução, a união estável, os vínculos de parentesco e os institutos complementares da tutela e da curatela. O direito de família cuida, pois, das relações que envolvem o indivíduo dentro do núcleo social em que ele nasce, cresce e se desenvolve.

Os princípios constitucionais relativos à família estão no art. 226 da Constituição Federal. As principais modificações decorrentes de tais princípios foram a admissão da pluralidade de famílias (a união estável e a família monoparental passaram a ter também a proteção do Estado); a igualdade entre os cônjuges (a direção da família passou a ser exercida por ambos os cônjuges em igualdade); e, por fim, a igualdade entre filhos, advindos ou não do casamento, biológicos ou resultantes de adoção (proibição de toda distinção entre os filhos).

O direito de família previsto no Código Civil é dividido em quatro títulos. O primeiro, relativo ao direito pessoal, encampa o casamento e as relações de parentesco (arts. 1.511 a 1.638). Disciplina as regras de ambos os institutos. O segundo, o direito patrimonial, compreende o regime de bens no casamento, o usufruto e a administração dos bens de filhos menores, alimentos e bem de família (arts. 1.639 a 1.722). Cuida, portanto, do aspecto patrimonial que resulta do casamento. O terceiro, a união estável (arts. 1.723 a 1.727), encontra-se deslocado, pois deveria ser tratado nos títulos do direito pessoal e patrimonial. O quarto e último refere-se ao direito protetivo e envolve a tutela e a curatela (arts. 1.728 a 1.783).

Em um sentido mais amplo, a família pode ser definida como a comunidade dos parentes consanguíneos, civis ou por afinidade. Em sentido estrito, como a comunidade formada pelos pais ou um deles e os filhos (LOTUFO, Maria Alice Zaratin. Curso avançado de direito civil - direito de família. São Paulo, RT, v. V ). Segundo a doutrina mais avançada em direito de família, a ideia de família é imortal, como a do núcleo básico ao qual nos integramos ao nascer, um ponto de referência central do indivíduo na sociedade, de solidariedade, que lhe dá segurança, transmite-lhe valores e o torna apto a perseguir um projeto para sua realização pessoal e para alcançar a felicidade (Oliveira, Euclides de & Hironaka, Giselda Maria Fernandes Novaes. “ Do direito de família” . In: Direito de família e o novo Código Civil. Belo Horizonte, Del Rey - IBDFam , 2002).

A família pode ser constituída por órfãos ou pelos avós e netos, por exemplo, pois eles se enquadram no conceito de núcleo básico de afeto e amor que caracteriza a família. Em consequência, merecem proteção jurídica.

A família pode ser encarada sob o aspecto individual, que tem em vista a pessoa em relação a seus pais, colaterais, cônjuges e descendentes. Pode também ser compreendida a partir do interesse do Estado em sua sólida organização e na segurança das relações humanas. A família constitui a célula básica da sociedade. Representa o alicerce de toda a organização social, sendo compreensível, portanto, que o Estado a queira preservar e fortalecer. Na família se fundam a vida econômica e as raízes morais. Os interesses individuais da família refletem nos interesses da sociedade e, reciprocamente, esses últimos correspondem aos primeiros, garantindo condições de desenvolvimento e sobrevivência.

O direito de família é extrapatrimonial ou personalíssimo. É irrenunciável e intransmissível, não admitindo condição ou termo ou o seu exercício por meio de procurador. Apesar de esse direito sofrer a intervenção estatal, entende-se que a ingerência não pode ser tal que tolha substancialmente a liberdade individual, preservando-se, assim, os interesses individuais que dão o caráter privado ao direito de família.

Da Constituição Federal é possível extrair os princípios que norteiam o direito de família. Segundo Maria Helena Diniz, são eles: a) o princípio da ratio do matrimônio (a afeição entre os cônjuges e a necessidade de que perdure completa comunhão de vida); b) o princípio da igualdade jurídica dos cônjuges, já referido anteriormente; c) o princípio da igualdade jurídica de todos os filhos, também apontado anteriormente; d) o princípio do pluralismo familiar, já mencionado; e) o princípio da consagração do poder familiar, que pode ser incluído no da igualdade entre os cônjuges; f) o princípio da liberdade do casal no desenvolvimento das atividades destinadas à família; e, por fim, g) o princípio do respeito à dignidade da pessoa humana, garantia do pleno desenvolvimento dos membros da comunidade familiar (Curso de direito civil brasileiro - direito de família. São Paulo, Saraiva, 2002, v. V).

Por força do disposto nos §§ 3º e 4º do art. 226 da Constituição Federal, a família passou a ser tanto aquela constituída pelo casamento como pela união estável, ou ainda por um dos genitores e sua prole. O casamento deixou, portanto, de ser a única forma de constituição da família. O casamento é a união legal, formal e solene entre homem e mulher, em que ambos buscam a constituição de família - propósito da comunhão plena de vida e de interesses, assentada na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges -, para auxílio mútuo, material e espiritual, e também da prole advinda dessa união. Pelo casamento, homem e mulher assumem mutuamente a condição de consortes, companheiros e responsáveis pelos encargos da família (art. 1.565). O objetivo de estabelecer comunhão plena de vida e a igualdade de direitos e deveres dos cônjuges são pressupostos de existência e validade do casamento. A comunhão plena de vida pressupõe a existência de amor e afeto entre o casal, a dedicação exclusiva ao outro cônjuge e aos filhos. A relação matrimonial impõe a mútua convivência, a reciprocidade de interesses na organização da vida e nas atitudes ou condutas individuais e, por fim, uma gama de direitos e deveres iguais, que irão disciplinar a vida em comum. “A comunhão de vida é a nota fulcral que marca o casamento. Sem esta, desaparecem seu sentido e sua finalidade. O enlace envolve a comunhão de afetos e dos demais componentes de uma vida em comum, como a ajuda mútua, a dedicação recíproca e a colaboração pessoal, doméstica e econômica. Mas o elo espiritual que une os cônjuges é que torna realidade a comunhão material” (RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família. Rio de Janeiro, Forense, 2004). A ausência de comunhão plena de vida pode gerar a separação do casal, fundamentada na insuportabilidade da manutenção da vida em comum (vide comentário ao art. 1.573).

A igualdade de direitos entre marido e mulher, já ressaltada, decorre do disposto no art. 226, § 5º, da Constituição Federal, originário do princípio da igualdade previsto no art. 5º da Carta. Dispõe o citado parágrafo que “os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher”. Neste Código, a igualdade entre ambos os cônjuges vem bem retratada no disposto dos arts. 1.565 a 1.570, para os quais remete-se o leitor. Desse princípio decorrem, por exemplo, o direito de ambos os cônjuges dirigirem a sociedade conjugal e o direito de ambos de acrescer o sobrenome do outro (sobre a subsistência do privilégio conferido à mulher relativo à propriedade exclusiva dos bens reservados, vide comentários ao art. 1.642). O disposto no art. 1.584 também retrata o princípio da igualdade entre os cônjuges ao definir que a guarda dos filhos poderá ser atribuída tanto ao pai quanto à mãe, segundo as condições de cada um para exercê-la. A isonomia tratada neste artigo procura evitar que pessoas em situação essencialmente igual tenham tratamento diferente. Cláudia Lima Marques assevera que “esta isonomia de tratamento jurídico é aquela que, em abstrato, permite que se considerem iguais marido e mulher em relação ao papel que desempenham na chefia da sociedade conjugal. É também a isonomia que se busca na identificação dos filhos de uma mesma mãe ou de um mesmo pai. É ainda a isonomia que protege o patrimônio entre personagens que disponham do mesmo status familiae”. (“ Igualdade entre filhos no direito brasileiro atual - direito pós-moderno?” In: Revista dos Tribunais, n. 764, p. 19). 

São três as correntes que controvertem a natureza do casamento. Para a corrente clássica ou individualista, ou de concepção contratualista, o casamento é um contrato. Contudo, a razão preponderante do casamento não é econômica, nem ele pode ser desfeito pelo simples consentimento mútuo das partes. Para a institucional ou de concepção institucionalista, é uma instituição social. Às regras impostas pelo Estado as partes têm a faculdade de aderir, mas a vontade dos cônjuges tornar-se-á impotente para alterar os efeitos da instituição que se produzem automaticamente. Por fim, para a corrente eclética ou mista, o casamento é um contrato e uma instituição. É exatamente a dificuldade de identificar a natureza jurídica do casamento que faz com que ele seja tratado como ato complexo, no qual estão presentes elementos volitivos, típicos dos contratos e elementos institucionais. Silvio Rodrigues se refere ao casamento como contrato de direito de família, desejando diferenciar o contrato de casamento dos outros contratos de direito privado.

Podem ser resumidas a três as finalidades do casamento: a) disciplinar as relações sexuais entre os cônjuges; b) proteger a prole; e c) assegurar a mútua assistência entre os cônjuges. São princípios norteadores do casamento: a) liberdade da união; b) solenidade do ato nupcial; c) monogamia; d) indissolubilidade; e e) convivência ou vida em comunidade. (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.615.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 16/02/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Conhecendo o histórico, o texto original deste artigo, aprovado pela Câmara no período inicial de tramitação do projeto, era o seguinte: “O casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade dos cônjuges e família legítima”. Durante a tramitação no Senado Federal, o dispositivo foi alterado nos seguintes termos: “O casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade dos cônjuges e institui a família”. O Relator Josaphat Marinho, no Senado, promoveu essa modificação em face da vedação constitucional às designações discriminatórias na família (CF, art. 226, caput e §~ P, 32 e ‘P, cart. 227, § 9). Retornando o projeto à Câmara, o Relator Ricardo Fiuza apresentou a emenda que deu ao dispositivo a redação atual, em que foi suprimida a seguinte parte: “e institui a família”, porque a permanência dessa expressão ainda trazia a ideia da constituição da família exclusivamente pelo casamento, com “nítido caráter discriminatório a outras formas de sua existência”, conforme assinalado nos debates pelo Desembargador Jones Figueiredo Alves, do Tribunal de Justiça de Pernambuco, dentre outros ouvidos. Assim, foi aprovada subemenda supressiva, para a devida adequação constitucional. Fez-se necessário, também, modificar a redação para a compreensão do texto e adequação aos ditames constitucionais, no tocante à denominada “igualdade dos cônjuges”, já que, a rigor, tal igualdade diz respeito aos direitos e deveres, como dispõe o Art. 226, § 5~, da Constituição Federal, e não às pessoas em si mesmas.

Então, em sua doutrina, Ricardo Fiuza aprovou como relator final: nas disposições gerais sobre casamento, foram eliminadas todas as referências à legitimidade da família oriunda de casamento civil, em respeito à Constituição Federal de 1988. Enquanto a Constituição anterior previa, em seu art. 175, que “A família é constituída pelo casamento”, a atual Lei Maior estatui, no caput do Art. 226, que “A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado”, e o mesmo artigo, em seus §~ 1~ e trata do casamento civil e religioso, reconhecendo, no § IV, a união estável como entidade familiar para efeito de tutela do Estado, e considerando, também como tal, a família monoparental, em seu § 4~. Dessa forma, tanto a união estável como a família monoparental perderam o caráter da ilegitimidade, em face do que a criação da família deve ser havida como efeito do casamento, sem qualquer qualificação. Além disso, o Art. 227, § 62, da atual Constituição da República veda as designações discriminatórias no âmbito da filiação, atribuindo iguais direitos e qualificações aos filhos, oriundos ou não da relação matrimonial. Assim, não pode mais haver na família a qualificação de legítima ou ilegítima. A família tanto pode ser constituída pelo casamento como pela união estável; ou, ainda por um dos genitores e sua prole (a propósito da modificação operada no Senado Federal, com o fito de eliminar a qualificação de legítima na família oriunda de casamento, v. Álvaro Villaça Azevedo e Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos, Sugestões ao projeto de Código Civil. Direito de família, RIS 730/13).

A consagração da igualdade entre os cônjuges é indispensável para que se garanta o cumprimento do princípio fundamental da preservação da dignidade da pessoa humana. Embora nossas Constituições sempre tenham reconhecido o princípio de que a lei deve ser igual para todos, a legislação ordinária, por longos anos, estabeleceu regras marcadas pela desigualdade entre os cônjuges, na matéria do casamento. Verifica-se, assim, a relevância da Constituição da República, de 1988, que, além dos princípios gerais de que “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza...”, e que “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações...”, estatuídos no ar. 52, caput e inciso 1, estabeleceu, expressamente, no art. 226, ~ 5~, que “Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher”. No entanto, passados vários anos da promulgação da Constituição Federal. as disparidades ainda constavam da legislação ordinária, que não havia recebido as alterações necessárias, criando perplexidades e a necessidade de interpretações constantes sobre a autoaplicabilidade do princípio constitucional em tela (v. Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos, Reparação civil na separação e no divórcio, São Paulo, Saraiva, 1999. p. 63-70). O novo Código Civil está adequado ao princípio constitucional da absoluta igualdade de direitos e deveres entre os cônjuges, com a consequente preservação da dignidade das pessoas casadas. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 762-63, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 16/02/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Em seu artigo “Direito das Famílias: breve abordagem”, o Dr. Tcharlye Guedes publicou no site Jus.com.br/artigos, em janeiro de 2016, inicia o tema assim: “Definir Direito de família como um ramo seria uma forma resumida de tratar do assunto, destarte, doutrinadores em suas concordâncias e discordâncias afirmam ser o ramo do direito que contém normas jurídicas relacionadas com a estrutura.

E continua: Muitas são as indagações sobre o tema, e, de certa forma, novos operadores do Direito têm mostrado cada vez mais interesse no assunto em pauta.

Para o autor, definir Direito de Família com um ramo seria uma forma resumida de tratar do assunto, destarte, o resumo inicial sobre estrutura, organização e proteção da família. Trata-se de ramo das relações familiares, direta e indiretamente, e das obrigações e direitos decorrentes dessas relações, ou seja, é o ramo do direito que regula e estabelece as normas de convivência familiar.

Com a crescente diversificação de conceito de família, este conceito geral com o fim de tentar classificar Direito de Família, para muitos parece ultrapassado, todavia na abordagem destas classes familiares, pode-se brevemente adentrar no Direito propriamente dito.

Em breve evolução histórica, Família pré Constituição de 1988, diz-se da Família hierarquizada: Com o pátrio poder pertencendo ao varão (as decisões não eram tomadas em conjunto, quem decidia era somente o homem, inclusive sobre o trabalho da mulher).

Na família matrimonializada, a família era formada exclusivamente com o casamento, qualquer união que não fosse dessa forma era tratada como concubinato. O Estado não protegia nem mesmo os filhos havidos fora do casamento. O vínculo matrimonial era indissolúvel, apenas se admitia o desquite (não estar quite com as obrigações matrimoniais) liberando tão somente o dever de fidelidade e coabitação, porém não sendo possível outro casamento, considerando inclusive uma vergonha para a mulher desquitada.

Família patrimonializada: o objetivo da família à essa época era somente acumular riqueza, explicando-se assim o grande número de filhos para aumentar a mão de obra para amealhar patrimônio.

Esse cenário começa a se mudar com o advento da lei n. 6.515/1977, chamada lei do divórcio, culminado na emenda à CF/88 em 2010, que extinguiu a separação e permitiu que o casamento fosse terminado simplesmente pelo divórcio.

Família pós Constituição de 1988: Art. 5º, CF/88 à isonomia (homem e mulher passam a ser iguais perante a lei) e art. 226 e 227, CF/88 (isonomia entre homem e mulher no casamento “isonomia conjugal), bem como isonomia entre os filhos “isonomia filial”, independentemente da constância ou não no casamento.

Família isonômica: Não há mais o Pátrio Poder, a partir de então existe o Poder Familiar, em que as decisões são tomadas em conjunto, caso não haja consenso, estas deverão ser suprimidas pelo judiciário.

Família plural: Hoje existem várias formas das famílias serem constituídas além do casamento (art. 226 § 2º e 3º), inclusive com a união estável (CC 1.723). 

São tipos de famílias:

Família monoparental: art. 226 § 4º, Comunhão entre qualquer dos pais com filhos, recebendo todas as garantias das famílias. 

Família anaparental: Família formada somente por irmãos, sem os pais. (Ana = falta; parental = parentes, ou seja, falta de parentes, ou falta dos pais).

Família personalizada: A partir da CF/88, visa-se a promoção da dignidade da pessoa humana, valorizando muito mais o SER que o TER, diferentemente da família patrimonialista. O direito de família atualmente é analisado muito mais pelo lado afetivo do que na ótica estritamente legal. Sai de cena o patrimônio e entra a personalidade.

Atualmente para que seja considerada entidade familiar, com todas as proteções estatais, serão analisadas três características: 1) afetividade; 2) publicidade; 3) continuidade. Veja-se a disposição do direito das famílias no Código Civil: a) do direito pessoal (CC 1.511 a 1.638); b) do direito patrimonial (CC 1.639 a 1.722); c) da união estável (CC 1.723 a 1.727); d) da tutela e curatela (CC 1.728 a 1.783), todos do Código Civil de 2002.

O autor define como “Conceito” em seu item 3: “É um conjunto de normas, princípios e regras jurídicas que regulam as relações decorrentes do vínculo afetivo, mesmo sem casamento, tendentes à promoção da personalidade humana, através de efeitos pessoais, patrimoniais e assistenciais.” 

Relação de parentesco (CC 1.591 a 1.595) –  a) vínculos: Matrimonial (casamento, união estável etc.); b) de parentesco; c) natural (consanguíneo); d) civil (adoção, inseminação artificial heteróloga (quando se utiliza material genético de um dos cônjuges e terceiro) e socioafetividade); e) afinidade: vínculo que liga o cônjuge ou companheiro aos parentes do outro (não resultando obrigações no mundo jurídico).

Dos grados de parentesco: Linha reta: são provenientes do mesmo tronco descendendo uma das outras. Podem ser ascendentes (pais, avós, bisavós...) e descendentes (filhos, netos, bisnetos), não existindo limitação de grau de parentesco em linha reta, sendo contados os graus de acordo com o número de gerações. 

Na linha colateral, transversal ou oblíquo, CC 1.592: são provenientes do mesmo tronco, porém não descendendo umas das outras.

Atenção (1): a) O parentesco na linha colateral se limita ao 4º grau; b) não existe parentesco colateral de 1º grau.

2º Grau: Irmãos somente (não importando se são de pai e mãe em comum (chamados bilaterais) ou de somente de um dos pais (“unilaterais uterinos” da mesma mãe e “unilaterais consanguíneos” do mesmo pai);

3º Grau: Tios e sobrinhos;

4º Grau: Tios avós, sobrinhos netos e primos.

Atenção (2): a) Em se tratando de parentesco por afinidade em linha colateral, a contagem se limita ao segundo grau (CC 1.595, § 1º). A contagem de grau é feita da mesma forma que no parentesco consanguíneo; b) o parentesco por afinidade em linha reta jamais se extingue, nem mesmo com a morte ou dissolução do casamento, não havendo, pois, casamento entre, por exemplo, genro e sogra (concubinato, CC 1.521). Diferentemente dos afins colaterais que desde que o casamento haja se dissolvido, não mais existe parentesco. 

Casamento (CC 1.511 a 1.565) – Conceito: “É a união de duas pessoas independentemente do sexo) reconhecida e regulamentada pelo Estado, constituída com o objetivo de constituição de família e baseada num vínculo de afeto”. (Flávio Tartuce).

Natureza jurídica: Existem hoje três teorias acerca do casamento, quais sejam: 1) Teoria contratualista: o Contrato depende da manifestação da vontade das partes; 2) Teoria Institucionalista: Argumentam que as formas de casamento são ditadas pelo Estado, independentemente da vontade das partes; 3) Teoria mista, híbrida ou eclética (corrente majoritária): O casamento não é apenas um contrato nem somente uma instituição, pois no momento da formação é um contrato, visto que depende da manifestação de vontade das partes; quanto ao conteúdo, seria uma instituição posto que sua forma é regida pelo Estado.

São sete as características do casamento: a) Livre: Liberdade quanto à escolha do nubente; b) Solene: Revestido de diversas solenidades estabelecidas por lei que caso não sejam cumpridas incorrem em pena de nulidade; c) Monogâmica: Somente pode se casar com um cônjuge por vez; d) Permanente: Quando da celebração do casamento, não há um prazo para término do casamento; e) Dissolubilidade: É possível dissolver o casamento através do divórcio; f) Finalidade: Estabelecimento da comunhão plena de vida (moral, material, psicológica etc.); g) Natureza jurídica de ordem pública das normas que o regulamentam. 

Da capacidade para o casamento (CC 1.517). A idade núbil no Brasil é de 16 anos, mediante autorização dos pais ou representante legal, com duas exceções à idade mínima (CC 1.520): I. Em caso de gravidez; II. Para evitar imposição ou cumprimento de pena judicial. 

Como apontado no CC 1.518 – a autorização concedida pelos pais, tutores ou curadores poderá ser revogada até a data da celebração da cerimônia. 

Em havendo divergência entre a autorização de um e outro pai, tal situação poderá ser resolvida juridicamente (CC 1.631). Sendo que do suprimento do consentimento dos pais pelo juiz será possível quando a derrogação for injusta (CC 1.519). 

Autorização tácita: CC 1.555, § 2º: 18 anos Sem autorização. 

(...) 

Dr. Tcharlye Guedes Ferreira publicou no site Jus.com.br/artigos, em janeiro de 2016, o artigo “Direito das Famílias: breve abordagem”, acessado em 16.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.512. O casamento é civil e gratuita a sua celebração.

Parágrafo único. A habilitação para o casamento, o registro e a primeira certidão serão isentos de selos, emolumentos e custas, para as pessoas cuja pobreza for declarada, sob as penas da lei.

Segundo o histórico, o presente dispositivo não estava presente no projeto original. Foi acrescentado, durante a tramitação no Senado, por proposta do Senador Nélson Carneiro, com a Seguinte redação: “O casamento será civil e gratuita a. sua celebração. Parágrafo único. A habilitação para o casamento, o registro e a primeira certidão são isentos de selos, emolumentos e custas para as pessoas cuja pobreza for reconhecida pelo juiz”, tendo em vista que a gratuidade na celebração do casamento é assegurado pelo art.  226, IIl, da Constituição Federal. Retornando o projeto à Câmara, o Relator Ricardo Fiuza promoveu alteração no texto, dispensando o reconhecimento da pobreza pela autoridade judiciária, já que, conforme legislação vigente, é suficiente a mera declaração do interessado, firmaria sob as penas da lei, como prova de pobreza (v. Decreto n. 83.936/79, que aboliu a exigência de atestado de pobreza, emitido por autoridade pública). Além disso, conforme apontou o Relator Parcial na Câmara, Deputado Antonio Carlos Biscaia, a exigência de declaração judicial apresentava dois inconvenientes de ordem prática: a) a dificuldade de acesso à justiça, que poderia ser maior do que o pagamento dos emolumentos, e b) a máquina judiciária seria assoberbada com questões para as quais há solução mais racional. Assim, na Câmara foi acolhida a emenda do Senado, mediante subemenda para o seu parágrafo único, permitindo-se que a concessão de gratuidade decorra de mera declaração do estado de pobreza, tal como sucede nos casos de deferimento do benefício da justiça gratuita, previsto pela Lei n. 1.060/50. 

Em sua doutrina, como Ricardo Fiuza afirma, este dispositivo regulamenta o disposto no Art. 226, § 1º , da Constituição Federal, de modo a garantir a gratuidade no casamento civil somente diante de declaração de pobreza, prestada sob as penas da lei.

• Tem também valia este dispositivo ao deixar expresso que o casamento, no âmbito jurídico, é sempre de natureza civil, de modo que, conforme artigos posteriores, o casamento religioso somente tem efeitos civis desde que seguidas as formalidades estabelecidas neste Código (CC 1.515 e 1.516). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 763, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 16/02/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Para Milton Paulo de Carvalho Filho, são espécies de casamento: o civil e o religioso com efeitos civis. Ambos estão previstos também na Constituição Federal, no art. 226, §§ Iº e 2º, respectivamente. Somente o casamento civil é válido entre nós. O casamento religioso (veja comentários aos arts. 1.515 e 1.516), quando único, só tem eficácia se levado a efeito com todas as formalidades impostas pela lei. O casamento civil é aquele realizado segundo as regras estabelecidas pelo Estado, que podem ser encontradas na Constituição Federal, neste Código e na Lei de Registros Públicos, tornando-o um ato solene e formal. O casamento civil será celebrado gratuitamente, como já assegurava o disposto na última parte do § Iº do art. 226 da CF. A gratuidade autorizada pelo legislador envolve os selos, os emolumentos e as custas estabelecidas por lei. O parágrafo único do artigo estende a gratuidade da celebração do casamento para a habilitação, para o registro e para a primeira certidão, quando forem pobres as pessoas interessadas. A pobreza será comprovada mediante a simples declaração do interessado, sob as penas da lei, na forma prevista na Lei n. 1.060/50, de assistência judiciária gratuita. (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.615.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 16/02/2021. Revista e atualizada nesta data por VD). 

Na ciência de Carvalho Rocha, o casamento é civil, quando a regra reproduz, literalmente, o parágrafo 1º do artigo 226 da CF. A proclamação de que o casamento é civil é incompleta ou desnecessária. Ela pode ser tida como referência à forma ou aos efeitos do casamento. Como referência à forma é incompleta, pois a própria Constituição reconhece a possibilidade de o casamento ser celebrado por autoridade religiosa (§ 2º) e resultar de conversão de união estável (§ 3º). Como referência aos efeitos do casamento é desnecessária, pois a tradição impede qualquer dúvida quanto à possibilidade de o casamento, mesmo quando celebrado por entidade religiosa, emanar efeitos civis uma vez que sejam observadas as formalidades próprias.

Quanto à regra da gratuidade do casamento é, igualmente reproduzida pelo dispositivo a partir do parágrafo 1º do art. 226 da CF. Significa isenção de pagamento de taxas, emolumentos ou quaisquer outras despesas relativas ao casamento. Como garantia constitucional deveria ter interpretação que lhe assegurasse a máxima efetividade, i.é, que abrangesse todas as etapas do procedimento do casamento. As práticas cartorárias reduzem-na, no entanto, ao ato próprio da celebração realizado pelo juiz de paz. Todas as demais fases do procedimento matrimonial, habilitação e registro têm sido interpretados como não abrangidos pela regra da gratuidade. O parágrafo único corrige parcialmente a referida interpretação restritiva e permite a isenção da cobrança de emolumentos e de taxas para a habilitação, o registro e a primeira certidão de nubentes que se declarem pobres. (Marco Túlio de Carvalho Rocha Mestre e Doutor em Direito Civil pela FDUFMG, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.512, acessado em 16.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Art. 1.513. É defeso a qualquer pessoa, de direito público ou privado, interferir na comunhão de vida instituída pela família. 

A versão de Carvalho Filho, defende que na família constituída pela comunhão de vida é defesa a interferência de quem quer que seja. O Estado ou qualquer pessoa de direito público ou privado estão proibidos de intervir na comunhão de vida instituída pela família. O Estado deverá sim assegurar a proteção à família. Este artigo tem como corolário o disposto no art. Iº, III, relativo à dignidade da pessoa humana, no art. 5º, X, que se refere à inviolabilidade da intimidade e da vida privada das pessoas, ambos da Constituição Federal, bem como o disposto no art. 226, § 7º, também da Carta Magna, e o disposto no CC 1.565, § 2º, deste Código Civil (veja comentário), que conferem autonomia ao casal sobre o planejamento familiar. (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.620.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 16/02/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Historicamente, o dispositivo em tela não foi alterado na Câmara dos Deputados no período inicial de tramitação do projeto e no Senado Federal. A redação original era a seguinte: “É defeso a qualquer pessoa, de direito público ou privado, interferir na comunhão de vida, instituída pelo matrimonio Quando o texto retornou do Senado Federal à Câmara dos Deputados, o Relator Ricardo Fiuza apresentou emenda substituindo o termo ‘matrimônio” pela palavra “família”, já que em todas as espécies de família deve ser vedada a interferência de qualquer pessoa. de direito público e privado, ou seja, na família oriunda de casamento, de união estável e de matrimonial. 

Na doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, a dignidade da pessoa humana é fundamento da República Federativa do Brasil, na conformidade do art. 1º , inciso III, da Constituição Federal de 1988. Verdadeira “cláusula geral de tutela e promoção da pessoa humana”, a dignidade é o “valor máximo” de nosso ordenamento jurídico, devendo informar todas as relações jurídicas e estando sob seu comando a legislação infraconstitucional (v. Gustavo Tepedino, A tutela da personalidade no ordenamento civil constitucional brasileiro, in Temas de direito civil, Rio de Janeiro, Renovar; 1999, p. 47 e 48). Na família, a tutela da dignidade da pessoa humana, em todo o alcance da expressão, deve ser assegurada tanto no curso das relações familiares como diante de seu rompimento, cabendo ao Direito oferecer instrumentos para impedir a violação a esse valor maior. Assim, a vedação à interferência de qualquer pessoa, de direito público ou privado, na comunhão de vida formada pela família está perfeitamente de acordo com o princípio constitucional de preservação da dignidade. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 764, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 16/02/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No lecionar de Carvalho Rocha, o dispositivo contempla o princípio da subsidiariedade. De origem canônica, este princípio foi definido na Encíclica Quadragesimo anno, de 1931, pelo Papa Pio XI, para fixar que a solução de conflitos locais deve ser confiada à esfera local e a de assuntos gerais, por quem possua competência geral: (...) assim como é injusto subtrair aos indivíduos o que eles podem efetuar com a própria iniciativa e indústria, para o confiar à coletividade, do mesmo modo passar para uma sociedade maior e mais elevada o que sociedades menores e inferiores podiam conseguir, é uma injustiça, um grave dano e perturbação da boa ordem social. O fim natural da sociedade e da sua ação é coadjuvar os seus membros, não destruí-los nem absorvê-los. 

Deixe, pois, a autoridade pública ao cuidado de associações inferiores aqueles negócios de menor importância, que a absorveriam demasiado; poderá então desempenhar mais livre, enérgica e eficazmente o que só a ela compete, porque só ela o pode fazer: dirigir, vigiar e reprimir,, conforme os casos e a necessidade requeiram. Persuadam-se todos os que governam: quanto mais perfeita ordem hierárquica reinar entre as várias agremiações, segundo este princípio da função “supletiva” dos poderes públicos, tanto maior influência e autoridade terão estes, tanto mais feliz e lisonjeiro será o estado da nação. 

A Corte Constitucional alemã consagrou o princípio da subsidiariedade para expressar repúdio à intervenção estatal nos assuntos de família: “O Estado, enquanto comunidade maior, só pode intervir quando meios e possibilidade da família, como unidade menor, não forem suficiente no caso concreto. Ao Estado impõe-se-lhe grande reserva, e a aplicação de seus meios só deve ocorrer quando inevitável. Portanto, se também a ação disponível de outras instituições e grupamentos de nível intermedial for insuficiente. Isso significa, sobretudo, que ao Estado não é lícito imiscuir-se também com as respectivas concepções sociopolíticas na autonomia dos cônjuges e da família” (GIESEN, Dieter. Ehe und Familie in der Ordnung des Grundgesetzes, Juristenzeitung. Tubingen, Nr. 24/24, 10. dez. 1982, S. 826. Apud VILLELA, João B. Casamento e Família na Futura Constituição Brasileira: a Contribuição alemã. Revista de Informação Legislativa, Brasília, n. 96, p. 292, out/dez.1987). 

A capacidade de autotutela dos cônjuges foi exaltada por VILLELA – a proposito da aplicação do princípio da subsidiariedade ao casamento – ao afirmar que: 

“... é só pela atribuição aos nubentes e cônjuges de um poder auto-regulativo primário que se poderá conduzir o instituto a uma idade verdadeiramente adulta.

É da menor tradição da cultura ocidental que o Estado não deve intervir onde as pessoas tenham as condições básicas de agir por si mesmas. Se não se lhes reconhecer a faculdade de auto-organização e autogoverno, elas tenderão a permanecer no estágio que corresponde à interveniência da tutela: o da incapacidade, na sua expressão técnico-jurídica, ou o da menoridade no sentido kantiano.” (FREUDESTEIN, G. Der Pecuniäre Contract in der Ehe. 3. Aufl., Leipzig, Woldemar Urban, 1884, S. 1 apud VILLELA, João Baptista. Liberdade versus Autoridade no Estatuto Patrimonial do Casamento..., p. 91-92).

Em texto posterior, de época marcada pela regulamentação das uniões estáveis no Brasil, VILLELA foi ainda mais enfático:

“Legisla-se sempre, e cada vez mais, sobre o imaginável e o inimaginável, como se a regra do Estado apusesse aos assuntos uma espécie de selo de qualidade. Esta atitude supõe, mas também alimenta a infantilização das pessoas individualmente consideradas e a castração da sociedade civil. É como se uma e outra fossem incapazes de adotar, por si mesmas, regras de convivência e de composição dos seus interesses. E, portanto, devessem estar sob a permanente tutela de uma superorganização, o Estado, supostamente tão sábio, arguto, sensível e prudente, que lhes devesse ditar até mesmo como viver uma experiencia amorosa. Na verdade, o casamento ou qualquer outra forma de associação íntima entre pessoas só interessa ao Estado sob dois estritos aspectos: a proteção dos filhos menores e a adequada liquidação de um eventual patrimônio promíscuo que se tenha formado” (VILLELA, João Baptista. Família hoje. Entrevista por Leonardo de Andrade Mattietto. In: BARRETO, Vicente (coord.). A Nova Família: e Perspectivas. Rio de Janeiro: Renovar. 1997, p. 71-86, espec. p. 80-81). 

Como princípio, a aplicabilidade da norma encontra-se limitada por regras positivadas na própria lei. No direito brasileiro, ele não afasta a possibilidade de recurso ao juiz para a solução de divergências conjugais (CC 1.567, parágrafo único) ou relativamente ao patrimônio dos filhos (CC 1.690, parágrafo único). Afina-se com o princípio da inviolabilidade da intimidade e da privacidade (art. 5º, X, CF), da proteção estatal à família (art. 226, caput, CF) e com o direito ao planejamento familiar (art. 226, § 7º, CF e CC 1.565, § 2º).

O princípio encontra limites na autonomia privada, como expressão da dignidade da pessoa humana. Assim, por exemplo, não impede que o próprio sujeito aceite negócio jurídico com a condição de não ter filhos ou de não se divorciar. (Marco Túlio de Carvalho Rocha Mestre e Doutor em Direito Civil pela FDUFMG, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.513, acessado em 16.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).