quarta-feira, 10 de março de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.560, 1.561, 1.562 Da Invalidade do Casamento - VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.560, 1.561, 1.562

Da Invalidade do Casamento - VARGAS, Paulo S. R.

 -  Parte Especial –  Livro IV – Do Direito de Família –

Título I – Do Direito Pessoal – Subtítulo I – Do casamento –

Capítulo VIII – Da Invalidade do Casamento – (Art. 1.548 a 1.564) -  

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 Art. 1.560. O prazo para ser intentada a ação de anulação do casamento, a contar da data da celebração, é de:

 

I - cento e oitenta dias, no caso do inciso IV do art. 1.550;

 

II - dois anos, se incompetente a autoridade celebrante;

 

III - três anos, nos casos dos incisos I a IV do art. 1.557;

 

IV - quatro anos, se houver coação.

 

§ 1º Extingue-se, em cento e oitenta dias, o direito de anular o casamento dos menores de dezesseis anos, contado o prazo para o menor do dia em que perfez essa idade; e da data do casamento, para seus representantes legais ou ascendentes.

 

§ 2º Na hipótese do inciso V do art. 1.550, o prazo para anulação do casamento é de cento e oitenta dias, a partir da data em que o mandante tiver conhecimento da celebração.

Na visão de Milton Paulo de Carvalho Filho, este artigo estabelece os prazos para a propositura da ação de anulação de casamento, segundo as causas, já comentadas, que podem gerar sua invalidade. Os prazos fixados pelo legislador são de decadência, e todos aqueles previstos nos incisos terão como marco inicial a data da celebração do casamento. O inciso I estabelece o prazo de cento e oitenta dias para anular o casamento do incapaz de consentir (v. comentário ao CC 1.550, IV). O inciso II fixa em dois anos o prazo para o direito de anular o casamento no caso de incompetência da autoridade celebrante (v. comentário aos CC 1.550, VI, e 1.554). O inciso III impõe o prazo de três anos para o direito de anular o casamento decorrente de erro do nubente (v. comentários aos CC 1.556, 1.557, I a IV, e 1.559). Já o inciso IV fixa o prazo de quatro anos para anular o casamento decorrente de coação (v. comentários aos CC 1.558 e 1.559). Os §§ 1º e 2o do artigo estabelecem prazos decadenciais que têm outro marco inicial. Será de 180 dias o prazo para o direito de anular o casamento dos menores de dezesseis anos, sendo que este prazo passará a fluir, para o menor, do dia em que perfez essa idade, e, para seus representantes legais ou ascendentes, da data do casamento (v. comentários aos CC 1.517 e 1.552). O prazo será também de 180 dias para a anulação do casamento celebrado mediante procuração cujo mandato já havia sido revogado, a partir da data cm que o mandante tiver conhecimento da celebração (v. comentário ao CC 1.550, V e parágrafo único). (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.676-77.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 10/03/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Historicamente, esta era a redação original do caput no Projeto de Lei n. 634, de 1975, Mensagem n. 160/75, publicado no Diário do Congresso Nacional de 13-6-1975: “O prazo para a anulação do casamento, a contar da data da celebração, é: 1 — De seis meses, no caso do CC 1.583, inciso IV. II— De dois anos, se incompetente a autoridade celebrante. III — De três anos, nos casos do CC 1.590, incisos I a IV. LV — De quatro anos, se houver coação”. O dispositivo não havia inicialmente sido alterado pela Câmara. No Senado, a partir de Emenda de n. 178, de autoria do eminente Senador Nélson Carneiro, recebeu a seguinte alteração: “O prazo para ser intentada a ação de anulação do casamento é de: I — cento e oitenta dias, no caso do inciso IV do CC 1.549; II — dois anos, se incompetente a autoridade celebrante; III — três anos, nos casos dos incisos I a IV do CC 1.556; IV — quatro anos, se houver coação”, substituindo-se a alusão a “prazo para a anulação do casamento”, por “prazo para ser intentada a ação de anulação do casamento”. Também foi alterado o inciso I, mudando-se a expressão “seis meses” para “cento e oitenta dias”, por ser de melhor técnica. Retornando o texto à Câmara para votação final, emenda da lavra do Relator Geral Ricardo Fiuza fez retornar, ao caput, a expressão “a contar da data da celebração”, atualizou no § W a idade núbil, que é de 16 anos, independentemente de sexo, e as remissões a outros artigos, que ao longo do processo legislativo mudaram a numeração. Também substituiu-se o termo “matrimônio” por “casamento”. 

O comentário ao artigo em comento, de Ricardo Fiuza em sua doutrina, alardeia, com sua visão de relator, que:

• A emenda senatorial havia retirado do caput do artigo a expressão “a contar da data da celebração”. Entretanto, a supressão era suscetível de causar controvérsias ao intérprete quanto ao termo inicial dos prazos previstos. Manifesta é a necessidade de definição do termo inicial para a contagem do prazo, pelo que deveria ser mantida a redação original, nesse específico fim, razão pela qual foi apresentada a emenda Fiuza.

• O prazo prescricional aqui exposto atende à política legislativa. Em face da natureza e das peculiaridades da matéria, a prescrição e tratada no próprio capítulo da invalidade do casamento, e não mais na parte referente à prescrição em geral.  (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 787, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 10/03/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na orientação de Marco Túlio de Carvalho Rocha, partindo do direito anterior: art. 178, §§ 5º e 7º e art. 208 do Código Civil de 1916. Referências normativas: Hipóteses de anulabilidade: CC 1.550 e 1.558.

 

1. Hipóteses de anulabilidade do casamento. Os casos de anulabilidade do casamento estão elencados no CC 1.550. O presente dispositivo estabelece os prazos para o ajuizamento da ação anulatória nos diversos casos. O termo inicial é sempre o da data da celebração do casamento.

 

2. prazo para anulação de casamento de relativamente incapaz. O inciso IV do CC 1.550 refere-se à anulabilidade do casamento do incapaz de consentir ou de manifestar o consentimento. O incapaz de consentir ou de manifestar, de modo inequívoco o consentimento é relativamente incapaz (art. 4º). O art. 6º, inciso I, da Lei n. 13.146/2015 e o § 2º do CC 1.550 reconheceram a todos os deficientes o direito de se casar. Não obstante, podem ocorrer as seguintes situações:

 

a) se o nubente não é apto a expressar sua vontade para o casamento, este será inexistente ou nulo, por ausência de consentimento, conforme se adote ou não a teoria da inexistência dos atos jurídicos (cf. comentários ao CC 1.548). A ação declaratória de nulidade absoluta não está sujeita a prazo;

 

b) se o relativamente incapaz de consentir não tiver sido interditado e tenha manifestado vontade sem possuir plena capacidade de compreensão das consequências de seu ato, o casamento é passível de anulação, com base no inciso IV do CC 1.550, aplicando-se o prazo decadencial previsto no dispositivo em comento;

 

c) se o relativamente incapaz tiver sido interditado e o casamento tiver sido realizado sem a devida autorização do curador ou do juiz ele será anulável com base no inciso IV do CC 1.550, aplicando-se o presente dispositivo relativamente ao prazo para o ajuizamento da ação.

 

3. Prazo para a anulação de casamento por incompetência da autoridade celebrante. A autoridade celebrante deve possuir competência em razão da matéria (ratione materiae), em razão do lugar (ratione loci) e em razão das pessoas (ratione personarum).

 

É anulável o casamento por incompetência ratione loci, por estar o celebrante fora de sua circunscrição ou ratione personarum, por estarem os nubentes fora do domicílio de qualquer deles. O registro, no entanto, convalida o ato, conforme o CC 1.554, razão pela qual a anulação por tais motivos é rara.

 

O casamento celebrado por pessoa que não tenha competência para o ato é nulo ou inexistente (cf. comentários ao CC 1.548).

 

4. Prazo para anulação de casamento por erro essencial sobre a pessoa do cônjuge. O CC 1.557 enumera as hipóteses de anulação do casamento por erro quanto à pessoa do cônjuge: erro sobre sua identidade, honra e boa fama, desde que seu conhecimento posterior torne insuportável a vida em comum; ignorância de crime anterior ao casamento de defeito físico irremediável ou de moléstia grave e transmissível pelo contágio ou herança, capaz de por em risco a saúde do cônjuge ou de sua descendência.

 

5. Prazo para anulação de casamento em virtude de coação. A anulação do casamento em virtude de coação está prevista nos artigos 1.550, III e 1.558 do Código civil.

 

6. prazo para anulação do casamento de menor de 16 anos. O referido prazo refere-se à hipótese de anulabilidade prevista no inciso I do CC 1.550.

 

7. Prazo para anulação do casamento realizado mediante mandato revogado. O § 1º do CC 1.542 confere eficácia à revogação do mandato antes de sua notificação ao mandatário. O inciso V do CC 1.550 torna anulável o casamento realizado nessa condição. Nos termos do referido inciso, a coabitação dos cônjuges sana a anulabilidade do casamento realizado por meio de mandato revogado. (Marco Túlio de Carvalho Rocha Mestre e Doutor em Direito Civil pela FDUFMG, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.560, acessado em 10.03.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 1.561. Embora anulável ou mesmo nulo, se contraído de boa-fé por ambos os cônjuges, o casamento, em relação a estes como aos filhos, produz todos os efeitos até o dia da sentença anulatória.

 

§ 1º Se um dos cônjuges estava de boa-fé ao celebrar o casamento, os seus efeitos civis só a ele e aos filhos aproveitarão.

 

§ 2º Se ambos os cônjuges estavam de má-fé ao celebrar o casamento, os seus efeitos civis só aos filhos aproveitarão.

 

Seguindo com a orientação de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o direito anterior: art. 221 do Código civil de 1916; art. 75 do Dec. 181/1890; art. 13, parágrafo único da Lei n. 6515/77. Referências normativas: Causas de anulabilidade do casamento: CC 1.550; causas de nulidade do casamento: CC 1.548.

 

1. Efeitos do casamento putativo. O casamento nulo ou anulável, contraído de boa-fé por ambos ou somente por um dos cônjuges é o casamento putativo. Considera-se de boa-fé o cônjuge que ao se casar desconhece a causa que torna o casamento inválido ou que é vítima de coação quando a anulabilidade resulta desta.

 

Embora nulo ou anulável, a lei assegura o respeito aos efeitos do casamento putativo. Ao estabelecer que o casamento produz todos os efeitos até o dia da sentença anulatória o dispositivo não impede a propagação dos efeitos produzidos após a anulação. Se, v.g., um dos cônjuges tiver adquirido um bem por efeito do regime de bens do casamento, terá o direito de receber o respectivo quinhão na partilha que sobrevier à anulação. Os bens adquiridos após o trânsito em julgado da sentença anulatória não estarão mais sujeitos à partilha segundo o regime de bens adotado.

 

2. Putatividade de apenas um dos cônjuges. No casamento putativo há chances de o cônjuge inocente ter direito a alimentos, ao nome ou à herança. Relativamente ao nome de casado e à pensão por morte há precedente jurisprudencial em sentido positivo: 

 

Direito Civil. Ação anulatória de casamento. Bigamia. 1. (...) 2. Casamento putativo é ‘que se presume ser, mas não é...’. Boa-fé da mulher que casou com bígamo. Reconhecido pela sentença o direito de a ré de continuar com o nome de casada e perceber na sua integralidade a pensão deixada pelo falecido. Decisões que não afrontam a lei, a primeira porque os filhos da ré passaram a utilizar nos seus nomes os patronímicos do falecido e ela também, o que é admitido pela lei para não desvincular o nome da mãe aos dos filhos (artigo 14, parágrafo segundo, Lei n. 6.515/77; a segunda, porque a pensão foi atribuída à ré por força de transação. 3. (...)” (TJDF, RMO 88.897-DF, Rel. Campos Amaral, p. DJU 12.11.1997). No mesmo sentido: TJPR, RE 117.667-8, Rel. Des. Ivan Bortoleto, DJ 10.06.2002.

 

O Superior Tribunal de Justiça limitou o direito à percepção da prestação alimentícia à data do trânsito em julgado da sentença anulatória do casamento:

 

Casamento putativo. Boa-fé. Direito a alimentos. Reclamação da mulher. 1 – Ao cônjuge de boa-fé aproveitam os efeitos civis do casamento, embora anulável, ou mesmo nulo (CC 221, parágrafo único). 2 – A mulher que reclama alimentos a eles tem direito, mas até a data da sentença (CC 221, parte final). Anulado ou declarado nulo o casamento, desaparece a condição de cônjuges. 3 – Direito a alimentos “ate o dia da sentença anulatória”. 4 – Recurso especial conhecido pelas alíneas a e c e provido. (STJ, REsp. n. 69.108-PR, Rel. Min. Nilson Naves, J. 16.12.1999).

 

Há o direito de herança se a morte antecede a sentença anulatória (Pereira , Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil, v. V. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, p. 157).

 

Finalmente, o eventual direito do cônjuge de boa-fé à indenização pela anulação do casamento não se extingue com a anulação da sentença anulatória:

 

Quanto ao fato de estabelecer a lei que o casamento putativo produz efeitos até sentença que o anula, é evidente que não constitui prejudicial à reparação ampla por ato ilícito. A lei se refere aos efeitos específicos do casamento, como contrato, que se considera, até esse momento, como válido. Não se refere aos efeitos do ato ilícito praticado, que subsistem (DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil, v. I, p. 134).

 

3. Má-fé de ambos os cônjuges. Se ao se casar, ambos os nubentes tinham conhecimento da causa de invalidação do matrimonio, o casamento não é putativo. É nulo ou anulável, simplesmente. Esse fato, por si só, já justificaria a supressão do parágrafo 2º.

A regra correspondia ao parágrafo unido do art. 14 da Lei n. 6.515/77, posto em vigor numa época em que o direito dos filhos em relação aos pais era influenciada pela situação jurídica que havia entre estes. A Constituição de 1988, ao estabelecer a igualdade de direito dos filhos (CC 227, § 6º) tornou ineficaz a regra. A reprodução dela no dispositivo em comento é, assim, absolutamente ineficaz pois, os direitos dos filhos, em nada são influenciados pela validade ou pela invalidade do casamento dos pais. Não há proveito ou prejuízo aos filhos pelo fato de os pais serem considerados de boa-fé ou não ao contrair o casamento inválido. (Marco Túlio de Carvalho Rocha Mestre e Doutor em Direito Civil pela FDUFMG, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.561, acessado em 10.03.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Dirimindo dúvidas, para Milton Paulo de Carvalho Filho este artigo dispõe sobre o casamento putativo e seus efeitos. Casamento putativo é aquele contraído de boa-fé pelos cônjuges, que ignoram circunstância que o torna nulo ou anulável. Em razão da boa-fé dos contraentes, o casamento aparenta ser verdadeiro, válido, mas não o é. Em homenagem a essa boa-fé dos contratantes ou de apenas um deles, a lei assegura que o casamento nulo ou anulável produzirá os efeitos do casamento válido até a data da sentença que decretar a sua invalidação. Desse modo, protegem-se a família e os filhos.

 

A boa-fé necessária para que se tenha como putativo o casamento significa ignorância do impedimento ou da causa de anulabilidade prevista na lei.

 

O erro capaz de autorizar o reconhecimento do casamento putativo deve ser escusável. Pode ser de fato (pessoa que se casou sem saber que o cônjuge já era casado; casamento de cônjuges sem que soubessem que eram irmãos) ou de direito (tios e sobrinhos que casaram sem saber da necessidade de exame pré-nupcial). O erro de direito está disciplinado neste Código, precisamente no art. 139, III, em que a lei dispõe sobre esse defeito do negócio jurídico. O erro de direito não é arguido para que os cônjuges se escusem de cumprir a lei que alegaram desconhecer (art. 3º da LIC C ), pois o casamento será declarado nulo ou anulado de qualquer modo, como no exemplo: genro e sogra viúvos que decidem casar, descuidando do fato de que o parentesco na linha ascendente não se desfaz com o óbito do cônjuge.

 

O casamento putativo produzirá efeitos de casamento válido até a data da sentença que reconhecer sua invalidade, o que representa exceção à regra do CC 1.563, segundo a qual os efeitos da sentença que decretar nulidade do casamento retroagem à data da celebração. Os efeitos do reconhecimento do casamento putativo variam segundo a boa-fé dos cônjuges. Estando ambos os cônjuges de boa-fé (CC 1.561, caput), porque desconheciam o motivo que os impedia de casar, poderão obter o reconhecimento dos efeitos do casamento válido até a data da sentença. Nessa hipótese, as convenções antenupciais deverão ser observadas por ocasião da partilha dos bens. Se a dissolução for decretada após a morte de um dos cônjuges, o outro figura na ordem da vocação hereditária, e se a morte ocorrer após a anulação não haverá direito sucessório, pois não haverá que falar em cônjuge sobrevivente. As doações feitas em razão do matrimônio não deverão ser devolvidas, pois o negócio jurídico (casamento) terá ocorrido.

 

Caso apenas um dos cônjuges esteja de boa-fé (§ Iº), nenhum efeito do casamento válido beneficia o que estiver de má-fé, que, no entanto, suportará todos os ônus dele decorrentes. O cônjuge de boa-fé poderá optar entre invocar ou não a existência do matrimônio, valendo-se daquilo que o beneficiar. O cônjuge de boa-fé receberá a meação a que teria direito pelo regime de bens; o culpado terá direito aos bens adquiridos com esforço comum durante o casamento, para que não haja enriquecimento ilícito; mas perderá todas as vantagens havidas do inocente, além de ser obrigado a cumprir o que prometeu no pacto antenupcial (CC 1.564, I e II). O inocente que se emancipou com o casamento permanece emancipado. Pode manter o nome de casado, se o alterou com o casamento.

Quando ambos os cônjuges estiverem de má-fé (§ 2º), os efeitos civis só beneficiarão os filhos, para os quais a boa-fé dos pais será irrelevante, pois sua posição não se alterará. Ao cônjuge coacto, por força da equidade, deve ser dado o mesmo tratamento que ao cônjuge de boa-fé que casou por erro, pois foi vítima da vis compulsiva, não representando o seu ato a sua real intenção ou vontade. Nesse sentido também são as disposições legais encontradas nos Códigos alemão, italiano e português. Há proposta de inclusão nesse sentido no Projeto de Lei n. 276/2007. (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.677-78.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 10/03/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Em sua doutrina, o Relator Ricardo Fiuza menciona do acréscimo do § 2º, inspirado no parágrafo único da Lei n. 6.515, de 26-12-1977, que prevê igual disposição.

• O artigo em exame tem correspondência com o art. 221 do Código Civil de 1916. Trata-se de casamento putativo. Diz-se casamento putativo aquele que é contraído de boa-fé, por um ou ambos os cônjuges, que ignoram circunstância que o faz nulo ou anulável.

Em prestígio ao princípio da boa-fé, o casamento produzirá todos os efeitos do casamento válido, até a data da decretação da sua nulidade, no caso de boa-fé de ambos os contraentes. Se a boa-fé for de apenas um deles, os efeitos civis só a ele e aos filhos aproveitarão. E, ainda, se ambos estiverem de má-fé, os efeitos civis só aos filhos beneficiarão. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 787, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 10/03/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Art. 1.562. Antes de mover a ação de nulidade do casamento, a de anulação, a de separação judicial, a de divórcio direto ou a de dissolução de união estável, poderá requerer a parte, comprovando sua necessidade, a separação de corpos, que será concedida pelo juiz com a possível brevidade.

No entender de Milton Paulo de Carvalho Filho, a parte que, antes de mover ação de nulidade do casamento, de anulação, de separação judicial, de divórcio direto ou de dissolução de união estável, portanto, previamente, pretender a separação de corpos, poderá fazê-lo desde que comprove a sua necessidade. Trata-se de medida cautelar preparatória, que tem por fundamento legal também o disposto nos arts. 796 e seguintes do Código de Processo Civil/1973, que admite ainda medida incidental no mesmo sentido, (cf. com o CPC/2015: v. arts 294, 295, 297, 299 e parágrafo único, 300, 301, 304, 1.059 relacionados, Relacionados no Livro V – Da Tutela Provisória – Título I – Disposições Gerais. (Nota VD). 

A medida cautelar autorizada pela lei tem por finalidade a segurança (integridade física e psicológica) e a dignidade das pessoas dos cônjuges que não mais conseguem conviver pacificamente sob o mesmo teto. Tem como pressuposto uma situação tática de emergência. 

A medida cautelar implicará a suspensão do dever de coabitação e fidelidade recíproca e poderá ser requerida por um ou por ambos os cônjuges. Destina-se a obter autorização judicial para que o cônjuge ou companheiro deixe o lar conjugal ou o lar comum, ou para que o outro cônjuge ou companheiro o faça obrigatoriamente. Nesse último caso, os motivos graves retratados no pedido de separação de corpos podem importar o afastamento temporário de um dos cônjuges ou companheiros da moradia do casal (CPC, art. 888, VI), correspondendo no CPC/2015 ao Art. 301. A tutela de urgência de natureza cautelar pode ser efetivada mediante arresto, sequestro, arrolamento de bens, registro de protesto contra alienação de bem e qualquer outra medida idônea para asseguração do direito. [V. arts. 300 a 302, 305 a 310, relacionados], sendo considerado um plus em relação ao pedido de separação de corpos, previsto neste artigo.

A jurisprudência também consolidou entendimento no sentido de que a separação de corpos pode ser formulada conjunta e consensualmente pelos cônjuges, antes mesmo de completado o prazo de um ano para ser requerida a separação consensual, a fim de que seja solucionado imediatamente o problema da impossibilidade da vida em comum, bem como fiquem suspensos os deveres de coabitação e fidelidade recíproca e o regime de bens. A medida produzirá efeitos até que os cônjuges atinjam o lapso temporal necessário para que requeiram a separação consensual. Com o advento da Lei n. 11.441/2007, que instituiu a separação consensual extrajudicial, é possível vislumbrar a possibilidade de que a medida de separação de corpos tratada no artigo também seja estabelecida por escritura pública para marcar o início da contagem do prazo para o divórcio (CC 1.580), desde que as partes sejam maiores e capazes e o pedido seja consensual, tendo em vista a simplicidade da medida e o objetivo por ela buscado, incidindo aqui a regra de quem pode o mais (separação consensual) pode o menos (separação de corpos).

O “afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a mulher ofendida” também é medida que a nova Lei n. 11.340, de 07.08.2006 (art. 22, II), a qual dispõe sobre os mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, entre eles a criação dos “Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher”, prevê como protetiva de urgência imposta ao agressor, estabelecendo ainda outras “protetivas de urgência à ofendida”, tais como a recondução dela e a de seus dependentes ao respectivo domicílio, após afastamento do agressor (art. 23, II) e afastamento dela do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos e alimentos (art. 23, III), além da própria separação de corpos (art. 23, IV) aqui tratada, mas fundamentada em qualquer das formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, previstas no art. 7º do novo diploma legal citado. Lembre-se de que tais medidas, embora de competência cível, deverão ser conhecidas e julgadas pelos juízes das varas criminais, enquanto ainda não estruturados os juizados especiais estabelecidos pela lei, conforme determina o disposto no seu art. 33.

A providência cautelar prevista neste artigo terá relevância para a contagem do prazo exigido pelo CC 1.580, pois será o marco inicial para a conversão da separação em divórcio. A separação de fato não impedirá o ingresso do processo cautelar, que, em verdade, dará força cogente a uma situação de fato preexistente.

Na separação de corpos cautelar poderá o juiz dispor sobre a guarda dos filhos, como autoriza o CC 1.585, observando o disposto no CC 1.584 e seu parágrafo único (v. comentário). (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.679-80.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 10/03/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Historicamente, a redação do Projeto de Lei n. 634, de 1975, era a seguinte: “Antes de mover a ação de nulidade do casamento, a de anulação ou a de desquite, requererá o autor, com documentos que a autorizem, a separação de corpos, que será concedida pelo juiz com a possível brevidade”. Logo no período inicial de tramitação, a Câmara aprovou emenda substituindo “desquite” por “separação judicial” e “autor” por “parte”. Durante a tramitação no Senado, não houve emendas. Retomando o projeto à Câmara, foi apresentada emenda pelo Deputado Ricardo Fiuza, e já na fase final de tramitação acrescentou-se a expressão “a de divórcio direto”.

Em sua Doutrina, então, a emenda do Deputado Ricardo Fiuza incluiu a possibilidade de separação de corpos na dissolução da união estável, e retirou a imperatividade do dispositivo, quando mudou a palavra “requererá” pela locução “poderá requerer”.

• A redação final do dispositivo trouxe-o à atualidade. A separação de corpos é uma possibilidade colocada à disposição dos cônjuges, quando existe um estado de semidissolução da sociedade conjugal com acirramento de ânimos. É medida protetiva à integridade física e psicológica do casal. Não há obrigatoriedade.

• A comprovação da necessidade poderá ser feita por qualquer meio de prova em direito admitido. Foi retirada do texto a referência expressa a “documentos”, pois poderia haver interpretação equivocada de que só documentalmente poderia ser provada a necessidade da separação de corpos. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 788, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 10/03/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Seguindo na dissertação de Marco Túlio de Carvalho Rocha, partindo do direito anterior: art. 223 do Código Civil de 1916; art. 77 do Dec. 181/1890. Referencias normativas: Arts 300 a 310 do Código de Processo Civil; art. 7º da Lei n. 6.515/77:

Para prevenir o agravamento do litígio entre as partes quando dos pedidos de anulação de casamento, de separação judicial, de divórcio ou de dissolução de união estável o legislador põe à disposição das partes instrumento processuais que visam ao distanciamento físico de ambos mediante a retirada de um deles do lar comum.

Embora na linguagem forense o termo utilizado seja sempre “separação de corpos”, os fundamentos legais e os termos utilizados eram, até há pouco tempo, dois: 

a) separação de corpos (cautelar inominada; art. 7º, § 1º, Lei n. 6.515/77);

b) afastamento do lar (cautelar nominada; art. 888, inciso VI do Código de Processo Civil/1973, correspondendo no CPC/2015 ao Art. 301. A tutela de urgência de natureza cautelar pode ser efetivada mediante arresto, sequestro, arrolamento de bens, registro de protesto contra alienação de bem e qualquer outra medida idônea para asseguração do direito. [V. arts. 300 a 302, 305 a 310, relacionados] (Nota VD).

A separação de corpos era, em sentido estrito, a autorização para que o cônjuge ou companheiro pudesse deixar o lar conjugal e visava a evitar a acusação de abandono de lar. O referido pedido perdeu a relevância prática na medida em que a perquirição da culpa deixou de ser necessária ao pedido de separação, deixando igualmente de produzir qualquer efeito na situação jurídica das partes.

Um tal pedido de autorização para a própria retirada do lar pode ser útil, no entanto, para demarcar com clareza o momento em que se estingue a comunhão de vida, com relevo para a dissolução do regime de bens, embora o referido fato possa ser provado por qualquer ou meio.

O afastamento do lar era medida cautelar típica para a retirada do cônjuge ou companheiro do lar conjugal (art. 888, inciso VI do Código de Processo Civil de 1973, correspondendo no CPC/2015 ao Art. 301. A tutela de urgência de natureza cautelar pode ser efetivada mediante arresto, sequestro, arrolamento de bens, registro de protesto contra alienação de bem e qualquer outra medida idônea para asseguração do direito. [V. arts. 300 a 302, 305 a 310, relacionados] (Nota VD), como medida cautelar típica, exigia a presença do fumus boni iuris e do periculum in mora.

Diz o autor Doutor Carvalho Rocha, não haver o Código de Processo Civil de 2015, contemplado a ação cautelar de afastamento do lar, pois excluiu a tipificação legal dos diversos procedimentos cautelares. Regulou a tutela de urgência nos artigos 300 a 310 que se aplicam ao pedido de separação de corpos tanto para o requerimento de retirada do outro cônjuge do lar, quanto para o de autorização de retirada do próprio requerente se, por algum motivo, entender-se necessário. Como tutela de urgência, a lei exige do requerente que apresente evidências da probabilidade do direito (fumus boni iuris) e do perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo (periculum in mora). 

Conforme a legislação processual, o juiz pode exigir caução do requerente para garantir o ressarcimento de eventuais danos que o requerido vier a sofrer, bem como pode condicionar o deferimento do pedido à justificação prévia.

Finalmente, em caso de violência doméstica contra a mulher ou contra os filhos, o cônjuge agressor pode ser afastado do lar com base no art. 22, inciso II, da Lei n. 11.340 (Lei Maria da Penha), sendo competente para a apreciação do pedido o Juizado de Violência doméstica e Familiar contra a Mulher, nas comarcas em que existir:

Proposta a demanda, de natureza cível, na vara criminal, com pedido das medidas protetivas e procedimentos elencados na Lei n. 11.340/06, compete ao juízo criminal, o processamento da ação cautelar de separação de corpos, atendendo ao preceito constitucional e à organização judiciária do Estado de Minas Gerais, que disciplinam as atribuições e competências das varas especializadas. (TJMG, Agravo de Instrumento n. 1.0245.09.165786-7/001, Rel. Des. Mauro soares de Freitas, 5ª Câmara Cível, j. 26/11/2009. No mesmo sentido: TJMG, Conflito de Jurisdição n. 1.0000.10.034641-0/000, Rel. des. Rubens Gabriel Soares, 6ª Câmara. Criminal, j. em 28/09/2010). (Marco Túlio de Carvalho Rocha Mestre e Doutor em Direito Civil pela FDUFMG, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.562, acessado em 10.03.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

terça-feira, 9 de março de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.557, 1.558, 1.559 Da Invalidade do Casamento - VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.557, 1.558, 1.559

Da Invalidade do Casamento - VARGAS, Paulo S. R.

 -  Parte Especial –  Livro IV – Do Direito de Família –

Título I – Do Direito Pessoal – Subtítulo I – Do casamento –

Capítulo VIII – Da Invalidade do Casamento – (Art. 1.548 a 1.564) -  

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 Art. 1.557. Considera-se erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge: 

I - o que diz respeito à sua identidade, sua honra e boa fama, sendo esse erro tal que o seu conhecimento ulterior torne insuportável a vida em comum ao cônjuge enganado; 

II - a ignorância de crime, anterior ao casamento, que, por sua natureza, torne insuportável a vida conjugal; 

III - a ignorância, anterior ao casamento, de defeito físico irremediável, ou de moléstia grave e transmissível, pelo contágio ou herança, capaz de pôr em risco a saúde do outro cônjuge ou de sua descendência;

IV - a ignorância, anterior ao casamento, de doença mental grave que, por sua natureza, torne insuportável a vida em comum ao cônjuge enganado.

E continua Milton Paulo de Carvalho Filho, como afirmado no artigo antecedente, o presente dispositivo estabelece quais são os erros essenciais quanto à pessoa do consorte que possibilitam ou autorizam a propositura da ação anulatória do casamento. Para que seja reconhecido o erro essencial alegado pelo nubente, é necessário o preenchimento dos requisitos descritos no artigo antecedente, aplicáveis a todas as hipóteses enumeradas neste artigo.

• inciso I: sobre o erro a respeito da identidade do outro cônjuge (error in persona), pode ele ser verificado quanto à identidade física e a civil ou social. Ocorrerá o erro sobre a identidade física do cônjuge quando, pretendendo casar-se com certa pessoa, se contraem núpcias com outra. Diz respeito ao engano na representação física da pessoa. Exemplo: gêmeos. A hipótese é de difícil ocorrência. O erro sobre a identidade civil ou social da pessoa do outro cônjuge ocorrerá “quando alguém descobre em seu consorte, após a boda, algum atributo inesperado (a identidade civil, segundo Clóvis Bevilaqua, é o conjunto de atributos ou qualidades essenciais com que a pessoa aparece na sociedade) e inadmitido, alguma qualidade repulsiva, capaz de, ante seus olhos, transformar-lhe a personalidade, fazê-lo pessoa diferente daquela querida”. Silvio Rodrigues ainda complementa dizendo que é nesse conceito de identidade civil que se alarga o arbítrio do juiz, porque nele caberá qualquer espécie de engano sério sobre a qualidade do outro cônjuge e estará porventura caracterizado o erro referente à pessoa (Comentários ao Código Civil. São Paulo, Saraiva, 2003, v. X VII).

Ainda nesse inciso encontra-se o erro sobre a honra e a boa fama. Não se pode perder de vista as noções de honra e boa fama ensinadas por Clóvis Bevilaqua (“honra é a dignidade da pessoa, que vive honestamente, que pauta o seu proceder pelos ditames da moral; boa fama é a estima social de que a pessoa goza, por se conduzir segundo os bons costumes”), contudo, o conteúdo de tais conceitos será verificado e considerado pelo juiz diante de cada caso concreto, segundo os valores vigentes no momento de sua aplicação, sempre em consonância com os princípios constitucionais, especialmente os da dignidade da pessoa humana e da igualdade. São exemplos desse inciso: marido que descobre que a esposa é prostituta; mulher que descobre que o marido é homossexual; mulher que descobre que o marido já era casado.

• inciso II: a ignorância de crime anterior ao casamento também pode gerar a anulabilidade deste. A lei não exige que o crime seja inafiançável ou mesmo que tenha havido condenação criminal, transitada em julgado, para o ingresso da ação. Contudo, o crime deve ser de tal modo grave, que torne intolerável a vida conjugal, diante do repúdio gerado para o cônjuge enganado. Consoante já afirmado em comentário ao CC 1.556, a sólida convivência do casal evidencia a falta do requisito da insuportabilidade da vida comum, para autorizar o pedido de anulação do casamento, razão pela qual se infere que nos casos dos incisos I e II ora comentados a coabitação, com ciência do vício, convalida o casamento, conforme dispõe o CC 1.559, segunda parte. 

• inciso III: a existência de defeito físico ou moléstia grave e transmissível ignorada pelo nubente também é motivo para que o casamento seja anulado, pois pode pôr em risco a saúde do cônjuge enganado ou a da descendência das partes envolvidas. O defeito físico referido pela lei é a impotência coeundi ou instrumental, física ou psicológica, quer do homem, quer da mulher, que impede o débito conjugal. A esterilidade de um dos cônjuges (impotência generandi) não é motivo para que se possa invalidar o casamento. Nem a impotência concipiendi (da mulher, para conceber). Contudo, a esterilidade voluntária, dolosamente omitida, autoriza o pedido de anulação de casamento. Entre as moléstias graves ignoradas, podem-se indicar aquelas sexualmente transmissíveis, como a Aids. 

• inciso IV: a doença mental grave ignorada por um dos nubentes é também causa de anulabilidade do casamento, quando tornar insuportável a vida em comum. A doença há de ser grave - não incurável -, pois será decorrente dela a impossibilidade da manutenção do casamento. São casos de doença mental para os fins dispostos neste artigo, entre outros, a paranoia, a neurose traumática, a psicose maníaco-depressiva e a esquizofrenia. (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.671-72.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 09/03/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

• Por sua vez, Ricardo Fiuza aponta que já o Código Civil de 1916 explicitava os casos que considerava erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge, no art. 219. Os incisos I e III não sofreram modificação de conteúdo. O inciso I recebeu melhoria redacional. No inciso II, foi retirada a qualificação de inafiançável ao crime, bem como a circunstância de estar o outro cônjuge com sentença condenatória transitada em julgado. Passou a referir crime que, por sua natureza, torne a vida em comum insuportável ao cônjuge enganado. O inciso IV, que dispunha sobre o defloramento da mulher, ignorado pelo marido, foi substituído por defeito físico irremediável, ou moléstia grave e transmissível, por contágio ou herança, capaz de pôr em risco a saúde do outro cônjuge ou de sua descendência, ignorados antes do casamento. A substituição procedida leva em consideração a mudança dos costumes, refletida na liberação sexual, bem como é um prestigio ao principio constitucional de igualdade entre o homem e a mulher (art. 5º ,I) uma vez que tal circunstância não é verificável no homem. 

• O erro essencial capaz de provocar a anulação do casamento deve estar revestido dos requisitos da anterioridade e da insuportabilidade da vida em comum para o cônjuge enganado. A circunstância ignorada deve preexistir ao casamento e sua revelação ou descoberta deverá provocar tanta indignação que tome insuportável a vida em comum. 

• O erro a respeito da identidade do outro cônjuge pode-se verificar sobre a identidade física ou civil. O primeiro, muito difícil de acontecer, trata-se de engano na representação física da pessoa, e ocorre quando o nubente é substituído por outro, no ato da celebração do casamento. O segundo, quanto à identidade civil ou social, ocorre quando o nubente está iludido sobre o “conjunto de atributos ou qualidades essenciais, com que a pessoa aparece na sociedade” (cf. Clóvis Beviláqua, Código Civil dos Estados Unidos do Brasil commentado, Rio de Janeiro, Livr. Francisco Alves, 1917, v. 2, p. 86). 

• Ainda no inciso I, o Código manteve, como indutores da anulação do casamento, o erro sobre a honra e a boa fama. A previsão é adequada, uma vez que seu conteúdo se verificará a cada momento da aplicação, não perdendo atualidade. “Honra é a dignidade da pessoa, que vive honestamente, que pauta o seu proceder pelos ditames da moral... Boa fama é a estima social, de que a pessoa goza, por se conduzir segundo os bons costumes” (cf. Clóvis Beviláqua, Código Civil dos Estados Unidos do Brasil commentado, Rio de Janeiro, Livr Francisco Alves, 1917, v. 2, p. 87). 

• Resolveu o legislador introduzir, no inciso IV, referência específica à doença mental grave, vez que não há identidade absoluta com a previsão do inciso III (moléstia grave e transmissível). Disposição semelhante está no § 2º do CC 1.572, que trata das causas de dissolução da sociedade, com a peculiaridade do surgimento de tal doença, posterior ao casamento, duração de dois anos e cura reconhecidamente improvável. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 785, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 09/03/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Direito anterior: Art. 219 do Código Civil de 1916; art. 72 do Dec. n. 181/1890. Referências normativas: Conceito de erro: CC 138 do Código Civil. Marco Túlio de Carvalho Rocha, bem como os demais comentários de diversos autores parte da enumeração dos incisos.

1. Enumeração taxativa dos casos de erro que possibilitam a anulação do casamento. O princípio da conservação do casamento leva à restrição das hipóteses de erro capazes de ensejar a anulação do ato. Diferentemente do que ocorre em relação aos negócios jurídicos em geral, o casamento somente pode ser anulado se o erro se relacionar com as situações enumeradas no CC 1.557. Assim, por exemplo, se alguém se casa em razão de estar convencido da fortuna patrimonial do cônjuge que vem a descobrir ser inexistente, tal fato não poderá ser alegado como causa de anulação, porque não se encontra previsto nas hipóteses restritas do artigo, do mesmo modo não mais é possível à anulação em razão de erro sobre a virgindade do cônjuge (error virginitatis), pois o Código Civil não reproduziu o texto do Código anterior.

2. As duas espécies de erro essencial. O inciso I do CC 1.557 dispõe sobre as duas espécies de erro essencial que possibilitam a anulação do casamento: a) o erro sobre a identidade do cônjuge (error in persona); b) o erro sobre as qualidades essenciais do cônjuge (error qualitatis). 

O erro quanto à identidade pode incidir sobre a identidade física ou sobre a identidade civil. Há erro sobre a identidade física se alguém vem a se casar com uma pessoa, julgando ser outra. Por exemplo, se, num casamento por procuração, o representado vem a ser pessoa diferente daquela com quem a vítima pensa se casar. Há erro sobre a identidade civil quando ocorra desconformidade em relação à condição jurídica do cônjuge, p. exe., quando se supõe ser solteira uma pessoa que seja divorciada.

O erro quanto às qualidades essenciais do cônjuge refere-se a elementos morais e físicos.

A segunda parte do inciso I do CC 1.557, ao mencionar o erro sobre a honra e a boa-fama, estabelece uma cláusula geral na qual a jurisprudência já enquadrou o cônjuge que era ladrão contumaz (RT 184/224), o que utilizava documento falso para se passar por almirante reformado (RT 438/217) e o que era homossexual (151/634).

3. Crime ignorado. O inciso II especifica uma condição moral do cônjuge que permite a anulação: o cometimento de crime anterior ao casamento. Para tanto, é essencial a condenação, que pode ser anterior ou posterior ao próprio casamento. É necessário por óbvio, a ignorância da vítima do erro quando do casamento e que, segundo as circunstâncias do caso, o conhecimento do crime torne insuportável a vida em comum. O convívio harmonioso após o conhecimento do crime exclui a insuportabilidade da vida em comum.

4. Defeito físico irremediável ou moléstia grave. Por último o inciso III faz referência a erro quanto à saúde do cônjuge, excluindo-se elementos que caracterizem deficiências. Refere-se a defeitos físicos irremediáveis, como a impotência sexual (impotentia coeundi) e a moléstias graves que possam colocar em risco a saúde do outro cônjuge ou da prole. (Marco Túlio de Carvalho Rocha Mestre e Doutor em Direito Civil pela FDUFMG, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.557, acessado em 09.03.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.558. É anulável o casamento em virtude de coação, quando o consentimento de um ou de ambos os cônjuges houver sido captado mediante fundado temor de mal considerável e iminente para a vida, a saúde e a honra, sua ou de seus familiares.

 

Sem correspondência no Código Civil de 1916. Referências normativas: Caracterização da coação CC 151 a 155; consensus facit núpcias: CC 1.514; prazo para o ajuizamento da ação: CC 1.560, inciso IV.

Segundo Milton Paulo de Carvalho Filho, a manifestação de vontade viciada pela coação também é causa de anulabilidade do casamento. O casamento, como já se disse, deve decorrer da vontade livre e espontânea dos nubentes de contrair núpcias (CC 1.535). Essa liberdade para consentir deixa de existir quando há coação. Ela vicia o ato praticado, por não representar a real intenção ou vontade do agente. Para sua configuração, ao contrário do que se observa para os contratos, a lei exige apenas o temor de mal genérico, e não de dano, motivo pelo qual o juiz pode verificar a presença da coação com maior facilidade. A coação pode ser física ou moral. Na primeira há a vis absoluta, que é a violência ou força física, que torna nulo o ato cometido. Na segunda há a vis compulsiva, que torna o ato anulável. Ao contrário da primeira, nesta a vítima tem a escolha de praticar o ato ou sofrer as consequências previstas. O temor será qualificado como fundado quando decorrente de ameaça grave (promessa de morte, de escândalo, do ridículo, da denunciação às autoridades), embasada em elementos sólidos capazes de impressionar o nubente. Já o critério de aferição dessa persuasão leva em conta a condição pessoal do coacto, apurável segundo as circunstân­cias enumeradas no CC 152 deste Código. Determina ainda a lei que o mal seja atual ou iminente (próximo, irremediável e não remoto), capaz de ocasionar o fundado receio de que se produza dano à vida, à saúde ou à honra do coacto ou de seus familiares. A coação pode ser efetivada tanto pelo outro cônjuge como por terceiro. “ Não se considera coação a ameaça do exercício normal de um direito, nem o simples temor reverenciai” (CC 153). (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.674-75.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 09/03/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Espelhando-se na Doutrina de Ricardo Fiuza, o artigo em comento guarda relação com o art. 210 do Código Civil de 1916. Diferentemente deste, explicita qual o tipo de coação capaz de provocar a anulação do casamento. A coação aqui prevista distancia-se da referida no CC 151, porque não há referência a dano, e sim a “mal” cuja significação pode ter maior alcance. O mal considerável e iminente é contra a vida, saúde e honra do nubente coato ou de seus familiares; não há menção a bens. Clóvis Beviláqua define a coação como “um estado de espírito, em que o agente, perdendo a energia moral e a espontaneidade do querer, realiza o acto, que lhe é exigido” (Theoria geral de direito civil. 2. ed., Rio de Janeiro, Livr. Francisco Alves, 1924, p. 283). A coação que torna o ato anulável é a moral, a vis compulsiva; nesse caso a vítima tem “a escolha” de praticar o ato ou sofrer as consequências anunciadas. Já na coação, vis absoluta, o ato é praticado mediante o emprego da força física; não resta escolha ao paciente. Nesse caso, o ato é nulo, pois faltou o elemento essencial, que é o consentimento.

• Dois aspectos, ainda, merecem registro. O primeiro é em relação ao temor, medo, que deve ser fundado, i.é, baseado em elementos sólidos capazes de impressionar o cônjuge, levando-se em consideração as circunstâncias elencadas no CC 153. O segundo é a necessidade de o mal ser considerável e iminente para a vida, a saúde e a honra do nubente coato e de seus familiares. A redação do dispositivo dá ao juiz liberdade para aferir, no caso concreto, se o temor é fundado e se o mal é considerável e iminente. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 785, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 09/03/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No parecer do Mestre Marco Túlio de Carvalho Rocha, o casamento, como ato jurídico lícito, resulta da livre manifestação de vontade dos nubentes, razão pela qual admite-se que seja anulado se a anuência for provocada por ameaças.

 

A ameaça que configura coação é a vis relativa, ou seja, a que deixa margem de opção ao coacto. Se o meio utilizado for forte ao ponto de retirar qualquer opção ao coacto, senão a realização do ato a que é coagido (vis absoluta), o caso é de inexistência de consentimento e, portanto, de nulidade ou de inexistência do casamento.

 

Relativamente à previsão da Parte Geral, o dispositivo que regula a coação como causa de anulabilidade do casamento não abrange a ameaça aos bens do coacto.

 

A ameaça deve ser injusta. A averiguação do “fundado temor” deve tomar por base a condição pessoal do coacto (CC 152). O exercício regular de direito e o mero temor reverencial não configuram coação (CC 152). A coação praticada por terceiro somente pode ser arguida como causa de anulabilidade se fosse de conhecimento do cônjuge que não foi coagido (CC 154 e CC 155). (Marco Túlio de Carvalho Rocha Mestre e Doutor em Direito Civil pela FDUFMG, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.558, acessado em 09.03.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 1.559. Somente o cônjuge que incidiu em erro, ou sofreu coação, pode demandar a anulação do casamento; mas a coabitação, havendo ciência do vício, valida o ato, ressalvadas as hipóteses dos incisos III e IV do CC 1.557.

 

Direito anterior: Art. 210 do Código Civil de 1916; arts. 64 e 65 do Dec. n. 181/1890. Continuando com os comentários do artigo anterior, CC 1.558, de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o dispositivo restringe à vítima a legitimidade ativa para as ações de anulação de casamento por erro ou coação. Exclui,, portanto, a legitimidade dos representantes legais e dos herdeiros do cônjuge legitimado. Estes podem, no entanto, continuar a ação iniciada pela vítima.

Convalida o casamento a coabitação dos cônjuges após a vítima do erro dele tomar conhecimento – salvo em caso de erro quanto à saúde do outro cônjuge, nos termos do inciso IV do CC 1.557 – ou após cessar a ameaça à vítima da coação. (Marco Túlio de Carvalho Rocha Mestre e Doutor em Direito Civil pela FDUFMG, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.559, acessado em 09.03.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Historicamente,  na redação original do Projeto de Lei n. 634, de 1975, o artigo utilizava a forma “Somente o cônjuge... pode anular o casamento”. Emenda de autoria do Deputado Cantídio Sampaio, apresentada na Câmara dos Deputados no período inicial de tramitação, substituiu a expressão ‘pode anular” por “pode demandar a anulação”. Foi a única notificação que sofreu o dispositivo.

Segundo a Doutrina de Ricardo Fiuza,  a alteração introduzida, ou seja, a permuta da expressão “pode anular” por “pode demandas a anulação”, trouxe melhor técnica ao texto, uma vez que não é o cônjuge quem anula o casamento, e sim o juiz mediante sentença. A parte apenas propõe a ação anulatória.

• O artigo em foco indica o cônjuge que incidiu em erro ou sofreu coação como detentor da legitimação para a propositura da ação ordinária de anulação do casamento. Faz, no final, a ressalva de que a coabitação após a ciência do vício valida o ato, exceto nos casos de defeito físico irremediável, moléstia grave e transmissível e doença mental grave, hipóteses estas indicadas nos incisos III e IV do Art. 1.557. A validação do casamento pela coabitação é inovação ao Código de 1916. 

• A exclusão das hipóteses dos incisos III e IV para validação do casamento pela coabitação posterior ao conhecimento do defeito físico ou doença, é providência protetiva ao cônjuge deficiente ou enfermo. Caso contrário, sabedor da situação, teria o cônjuge sadio que se separar imediatamente, sob pena de ter o seu casamento validado. A separação brusca poderá agravar a situação do cônjuge doente. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 786, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 09/03/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

No mesmo sentido Milton Paulo de Carvalho Filho.  A lei limita ao cônjuge que incidiu em erro ou sofreu coação a legitimidade para ajuizar a ação de anulação de casamento fundamentada nos vícios de consentimento descritos nos arts. 1.556 e 1.558, antes comentados. O que significa que apenas o cônjuge tem legitimidade para a ação, não o tendo aquele que se beneficiou do ato ou o seu representante legal. Assim, preferindo o cônjuge que sofreu a coação ou que incidiu em erro manter o casamento, ninguém poderá impedir ou solicitar a decretação de sua invalidade. A segunda parte do artigo dispõe sobre a convalidação do casamento quando, ocorrendo quaisquer das hipóteses previstas nos CC 1.557, I (erro quanto à identidade, à honra e à boa fama do outro cônjuge) e II (erro decorrente de ignorância acerca de crime anterior ao casamento), e 1.558 (coação), houver coabitação dos cônjuges após a ciência de algum dos vícios enumerados nos citados dispositivos legais. Como já afirmado em comentário ao CC 1.557, a sólida convivência do casal evidencia a falta do requisito da insuportabilidade da vida comum para autorizar o pedido de anulação do casamento, de onde se infere que, nos casos dos incisos I e II do CC 1.557, a coabitação, com ciência do vício, convalida o casamento, diante do que se poderia considerar perdão da vítima. Já nas hipóteses previstas nos incisos III e IV do CC 1.557 - erro quanto a defeito físico irremediável, moléstia grave e transmissível ao cônjuge e aos herdeiros e doença mental grave -, o fato da coabitação dos cônjuges não tem por consequência a regularização da invalidade descoberta. Com relação à coabitação decorrente de casamento realizado mediante coação, deverá ser ela voluntária, pois a derivada de violência não gera o efeito de convalidar o casamento que, a qualquer momento, poderá ser declarado nulo. (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.674-75.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 09/03/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

segunda-feira, 8 de março de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.554, 1.555, 1.556 Da Invalidade do Casamento - VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.554, 1.555, 1.556

Da Invalidade do Casamento - VARGAS, Paulo S. R.

 -  Parte Especial –  Livro IV – Do Direito de Família –

Título I – Do Direito Pessoal – Subtítulo I – Do casamento –

Capítulo VIII – Da Invalidade do Casamento

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 Art. 1.554. Subsiste o casamento celebrado por aquele que, sem possuir a competência exigida na lei, exercer publicamente as funções de juiz de casamentos e, nessa qualidade, tiver registrado o ato no registro Civil. 

De forma taxativa, explica Milton Paulo de Carvalho Filho, o casamento realizado por quem não recebeu poderes de autoridade celebrante é inexistente. Trata-se de incompetência ratione materiae. Contudo, o reconhecimento da existência e da validade do casamento celebrado por quem não tem competência para fazê-lo está expressamente autorizado pela lei, que exige a satisfação de alguns requisitos, dado seu caráter excepcional. Necessário se faz que as pessoas que o contraíram tenham atendido às formalidades legais, tenham agido de boa-fé, tenham praticado erro escusável, que o ato tenha sido registrado no livro competente e que a pessoa que o celebrou, o juiz de casamento, reconhecido como tal no meio social, já exercesse publicamente essa função. Presentes tais requisitos, o interessado poderá invocar ao caso a aplicação da teoria da aparência, para obter a convalidação do casamento, pois, como observa Luiz Edson Fachin (Código Civil comentado. São Paulo, Atlas, 2003, v. XV ), o reconhecimento de inexistência de casamento celebrado por alguém que é socialmente reconhecido como autoridade celebrante - a ponto de conseguir levar a efeito o próprio registro do ato - implica repercussão particularmente grave para os cônjuges ludibriados pelo falso celebrante. Daí o motivo da sua proteção legal. (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.669.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 08/03/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

No comentário referente ao CC 1554, a Doutrina de Ricardo Fiuza explica que o artigo em foco trata do casamento celebrado por pessoa sem competência legal para a prática do ato, mas que, a despeito disso, exerce publicamente as funções de juiz de casamentos e, utilizando-se domo nua ais, registra o casamento perante o Registro Civil competente.

• O Código Civil de 1916, no seu art. 208, reservava a nulidade para os casamentos celebrados por autoridade incompetente. A nova orientação representa abrandamento da regra ao reconhecer válido o casamento celebrado por quem de costume, seguindo-se o registro no Registro Civil competente.

• A autoridade com competência para a celebração do casamento é aquela definida pelas normas de organização judiciária de cada Estado e do Distrito Federal. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 783, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 08/03/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Sob o enfoque de Carvalho Rocha, a competência da autoridade celebrante desdobra-se em três aspectos: ratione materiae, ratione loci e ratione personarum. Vale dizer que o celebrante deve ser juiz de paz ou autoridade religiosa (autoridades com competência em razão da matéria) que atue dentro de sua circunscrição e no domicílio e no domicílio de qualquer dos nubentes.

 

O dispositivo exige, para a validade do casamento, que ele seja realizado perante autoridade competente em razão da matéria. Desde que tal competência seja atendida, mesmo que falte a competência em razão do local ou a competência em razão das pessoas dos nubentes, será válido o casamento desde que devidamente autorizados o termo da celebração no Registro civil. Em outras palavras, o registro do termo de celebração convalida o casamento realizado por autoridade fora de sua circunscrição ou fora do domicílio dos nubente. 

Do mesmo modo e em consonância com a teoria do funcionário de fato do Direito Administrativo, se o ato vier a ser registrado, a eventual irregularidade da investidura ou do exercício do cargo de juiz de paz não invalida o casamento. (Marco Túlio de Carvalho Rocha Mestre e Doutor em Direito Civil pela FDUFMG, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.554, acessado em 08.03.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.555. O casamento do menor em idade núbil, quando não autorizado por seu representante legal, só poderá ser anulado se a ação for proposta em cento e oitenta dias, por iniciativa do incapaz, ao deixar de sê-lo, de seus representantes legais ou de seus herdeiros necessários.

§ 1º. O prazo estabelecido neste artigo será contado do dia em que cessou a incapacidade, no primeiro caso; a partir do casamento, no segundo; e, no terceiro, da morte do incapaz. 

§ 2º. Não se anulará o casamento quando à sua celebração houverem assistido os representantes legais do incapaz, ou tiverem, por qualquer modo, manifestado sua aprovação. 

Direito anterior: Art. 178, § 5º, III, do Código Civil de 1916. Referencias normativas: ambos os pais detentores do poder familiar têm de autorizar o casamento: CC 1.517; a autorização deve ter a forma de escritura pública: CC 1.537; anulabilidade do casamento de menor em idade núbil por falta de autorização do representante legal: CC 1.550, II. 

Na orientação de Milton Paulo de Carvalho Filho, o dispositivo trata da legitimação e do prazo de caducidade - portanto decadencial - para propor ação de anulação do casamento realizado por menor em idade núbil, sem autorização de seu representante legal. Estarão legitimados para a ação o próprio incapaz, seus representantes legais e seus herdeiros necessários. Quanto ao primeiro, estabelece a lei o prazo de cento e oitenta dias para ingressar com a ação anulatória, contados da data em que atingiu dezoito anos de idade. Os representantes legais do menor terão o mesmo prazo para ajuizar a ação, contudo, esse prazo terá início na data da celebração do casamento. Todavia, esse termo inicial pode ser superado com certa facilidade em razão do desconhecimento pelos representantes legais do ato realizado. Surtiria maior efeito o disposto no artigo caso tivesse o legislador estabelecido como marco inicial do prazo a data do conhecimento pelos responsáveis da celebração do casamento. Por fim, poderão ainda ajuizar a ação anulatória de casamento os herdeiros necessários do incapaz, sendo que o prazo (180 dias) para a sua propositura passa a fluir a partir da morte deste, momento em que lhe sucedem. O interesse dos herdeiros é manifestamente patrimonial e acaba por se sobrepor à relação de afeto con­solidada entre os cônjuges. O § 2º do artigo prevê situação impeditiva de anulação do casamento. Estando presentes na cerimônia do casamento os representantes legais do menor e não se opondo à sua realização, mediante manifestação inequívoca de sua discordância, ao contrário, permanecendo silentes, não se poderá oportunamente pretender a nulidade do casamento porque para a celebração anuíram as pessoas a quem a lei conferiu tal encargo. Trata-se de anuência tácita. O casamento realizado sob essas circunstâncias é de difícil ocorrência. (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.669-70.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 08/03/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Historicamente o artigo sofreu alterações na fase inicial de tramitação do projeto na Câmara dos Deputados e, também, no senado Federal. Da forma como estava o projeto, qualquer herdeiro poderia promover a ação anulatória, vindo a emenda da Câmara limitar a legitimação apenas aos herdeiros necessários. A emenda senatorial contribuiu na melhoria da redação do dispositivo, mantendo inalterado o caput.

Houve a substituição da expressão “seis meses” por “cento e oitenta dias”, mais técnica em seu fim de controle de prazo. No § 2º, foi suprimida a sua parte final, “quando esta ocorrer durante a incapacidade”, e, no § 2º, é aperfeiçoada a redação, suprimindo-se, após o vocábulo “anulará”, a palavra “porém”. e acrescentando-se a palavra “quando” antecedendo a expressão “à sua celebração houverem assistido...”.  A alteração do Senado não atingiu o contado da norma, também merecendo parecer do Relator Ricardo Fiuza pela integral aprovação.

Na observância da doutrina de Ricardo Fiuza, o menor aos 16 anos atinge a idade núbil, mas até os 18 anos é relativamente incapaz (CC 42, I). Desse modo, necessita de autorização do seu representante legal para o casamento. Caso o casamento se realize sem essa autorização, pode ser anulável por iniciativa do menor, ao deixar de sê-lo, de seus representantes legais ou de herdeiros necessários. O prazo para a propositura da ação anulatória é de cento e oitenta dias contados, no primeiro caso, do dia em que cessou a incapacidade; no segundo, a partir do casamento; e, no terceiro, da morte do incapaz. 

• O § 2º estabelece cláusula impeditiva, ou seja, se à celebração do casamento houverem assistido os representantes legais, ou de qualquer modo tenham eles manifestado aprovação, não se anulará o casamento.  (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 783-84, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 08/03/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Subdividido em 3 (três) partes, o comentário do Doutor e Mestre Marco Túlio de Carvalho Rocha, da seguinte forma:

1. Legitimidade ativa para requerer a anulação de casamento de menor em idade núbil por falta de autorização do representante legal. O inciso II do CC 1.550, estabelece a anulabilidade do casamento do menor em idade núbil por fata de autorização de seu representante legal. Se o menor estiver submetido ao poder familiar do pai e da mãe, ambos devem anuir. O dispositivo permite, portanto, a anulação do casamento mesmo que a falta de autorização seja parcial, i.é, mesmo que tenha faltado apenas a anuência de um dos detentores do poder familiar.

O caput do CC 1.555 limita a legitimidade para a ação anulatória baseada na falta de autorização ao próprio incapaz, a seus representantes legais e a seus herdeiros necessários (CC 1.845).

2. Qual é o termo inicial do prazo na ação a ser proposta pelo próprio menor? O caput estabelece o prazo de 180 dias para o ajuizamento da ação anulatória do casamento de menor em idade núbil por ausência de autorização de representante legal. O parágrafo 1º determina que a contagem se inicie quando do término da incapacidade. A determinação é dúbia, porque o CC 5º, parágrafo único, II, impõe a emancipação por ocasião do casamento. O legislador parece ter-se esquecido desta causa de emancipação ao estabelecer que o prazo deveria ser contado a partir do casamento nas ações propostas pelos representantes legais, distinguindo esta hipótese daquela em que a inciativa é do menor. Assim, presume-se que o prazo decadencial para a propositura da ação anulatória pelo menor somente começa a correr no dia em que completar 18 anos, pois, do contrário, a lei não precisaria distinguir as duas hipóteses.

3. Autorização tácita. A autorização do representante legal para o casamento do menor em idade núbil deve adotar a forma de escritura pública, como se infere a partir do CC 1.537. O parágrafo 2º impede, no entanto, a anulação se autorização puder ser presumida, o que ocorrerá quando a forma particular for adotada ou mesmo mediante o mero comparecimento do representante legal ao ato de celebração sem que manifeste desacordo. (Marco Túlio de Carvalho Rocha Mestre e Doutor em Direito Civil pela FDUFMG, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.555, acessado em 08.03.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Art. 1.556. O casamento pode ser anulado por vício da vontade, se houve por parte de um dos nubentes, ao consentir, erro essencial quanto à pessoa do outro. 

Direito anterior: Art. 218 do Código Civil de 1916; art. 71 do Dec. n. 181/1890. Referências normativas: crime de induzimento a erro essencial e de ocultação de impedimento: art. 236 do Código Penal; enumeração dos casos de erro essencial quanto à pessoa do outro cônjuge: CC1.557; legitimidade ativa: CC 1.559; prazo para ajuizar a ação: CC 1.560, III. 

No dizer de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o dispositivo estabelece a anulabilidade do casamento por erro essencial quanto à pessoa do outro cônjuge. A contrario sensu, o dispositivo exclui a anulabilidade do casamento por erro que verse sobre outros fatores que a lei não repute essenciais. A enumeração dos casos considerados como erro essencial é taxativamente estabelecida no CC 1.557.  (Marco Túlio de Carvalho Rocha Mestre e Doutor em Direito Civil pela FDUFMG, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.556, acessado em 08.03.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

O artigo em comento mantém a analogia de redação, segundo a Doutrina do Relator Ricardo Fiuza, o mesmo conteúdo do art. 218 do Código Civil de 1916, com pequena mudança redacional.

• É anulável o casamento celebrado quando um dos nubentes, ao consentir, incorre em erro essencial quanto à pessoa do outro cônjuge. O artigo subsequente (1.557) explicita o que é considerado erro essencial sobre a pessoa do cônjuge.

• Erro é defeito no ato jurídico capaz de invalidá-lo. Insere-se na categoria de vícios do consentimento. Leciona Silvio Rodrigues que “ocorre erro quando o autor da declaração a emitiu inspirado num engano, ou na ignorância da realidade” (Direito civil, 18. ed., São Paulo. Saraiva. v. 1, p. 192). É o próprio consentimento que está viciado, cuja manifestação seria diversa caso conhecidas as circunstâncias do negócio. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 784, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 08/03/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

No mesmo sentido o comentário de Milton Paulo de Carvalho Filho, o artigo trata da anulação do casamento celebrado por erro quanto à pessoa do outro nubente. O erro é defeito no ato jurídico. É vício relativo ao consentimento. O casamento celebrado com vício de vontade de um dos nubentes deve ser anulado. A teoria do erro no matrimônio, pela sua índole, pela característica sui generis do contrato e pelos interesses sociais que a ele se ligam, é totalmente diversa da teoria do erro nos atos jurídicos ordinários, ensina Paulo Lins e Silva (Direito de família e o novo Código Civil. Belo Horizonte, Del Rey, 2002). O erro que anula o casamento é o essencial ou substancial. Consiste, segundo Silvio Rodrigues, no engano de tal modo relevante que, se fosse conhecida a realidade, o consentimento não se externaria pela forma por que se deu. O artigo seguinte (CC 1.557) estabelece quais são os erros essenciais que autorizam a anulação do casamento, cujos requisitos a ser atendidos são: 

a) a preexistência do fato ao casamento, ou simplesmente anterioridade; b) o desconhecimento desse fato pelo cônjuge enganado; e c) a intolerabilidade ou insuportabilidade da vida em comum para o cônjuge enganado após a descoberta da verdade, não passada por irrelevante após sólida convivência conjugal, pois não se pode pretender promover a anulação do casamento por causa de posteriores desentendimentos entre os cônjuges, a pretexto de sancionar pretensa invalidade decorrente de erro essencial, como observa Luiz Edson Fachin (Código Civil comentado. São Paulo, Atlas, 2003, v. XV). (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.670.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 08/03/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).