quinta-feira, 8 de abril de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.612, 1.613, 1.614 Do Reconhecimento dos Filhos - VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.612, 1.613, 1.614
Do Reconhecimento dos Filhos - VARGAS, Paulo S. R.
- Parte Especial – Livro IV – Do Direito de Família –
Subtítulo II – Das Relações de Parentesco – Capítulo III
Do Reconhecimento dos Filhos - (Art. 1.607 a 1.617) –
digitadorvargas@outlook.com - vargasdigitador.blogspot.com
Whatsap: +55 22 98829-9130 Phone Number: +55 22 98847-3044
fb.me/DireitoVargasm.me/DireitoVargas

 

Art. 1.612. 0 filho reconhecido, enquanto menor, ficará sob a guarda do genitor que o reconheceu, e, se ambos o reconheceram e não houver acordo, sob a de quem melhor atender aos interesses do menor.

No lecionar dos autores Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o dispositivo é excessivo. A guarda cabe aos pais. Enquanto não há reconhecimento da filiação não há o vínculo de filiação. A guarda cabe aos pais. Devem ser observados na sua fixação o princípio do maior interesse da criança e as regras relativas a ela, o disposto nos CC 1.583 e seguintes. (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.612, acessado em 08.04.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Historicamente, o texto original do projeto era o seguinte: “O filho reconhecido, enquanto menor, ficará sob o poder do genitor que o reconheceu, e, se ambos o reconhecerem e não houver acordo, sob o de quem demonstrar melhores condições para educá-lo”. Durante o período inicial de tramitação o artigo foi alterado pela Câmara dos Deputados, passando a redigir-se: “O filho reconhecido, enquanto menor, ficará sob o poder do genitor que o reconheceu, e, se ambos o reconhecerem e não houver acordo, sob o de quem melhor atender aos interesses do menor”. Durante a passagem pelo Senado Federal foi novamente emendado, passando a dispor: “O filho reconhecido, enquanto menor, ficará sob a autoridade do genitor que o reconheceu, e, se ambos o reconheceram e não houver acordo, sob a de quem melhor atender aos interesses do menor”. Retomando, em seguida, o projeto à Câmara, promoveu o Deputado Ricardo Fiuza a substituição da palavra “autoridade” por “guarda”, proposta que restou acolhida em definitivo. 

Então, ficando dessa forma a Doutrina de Ricardo Fiuza: • O Código Civil anterior estabelecia no Art. 360 que “O filho reconhecido, enquanto menor, ficará sob poder do progenitor que o reconheceu, e, se ambos o reconheceram, sob o do pai”. O Decreto Lei n. 5.582/70 estabeleceu que “O filho natural enquanto menor ficará sob o poder do genitor que o reconheceu e, se ambos o reconheceram, sob o poder da mãe, salvo se de tal solução advier prejuízo ao menor”.

• A redação original do projeto já corrigia o erro da legislação anterior, consistente na prefixação do genitor com o qual deveria permanecer o filho se reconhecido por ambos os genitores. Descabe à lei prever qual é o genitor mais adequado à prestação dos cuidados de que o filho necessita, se o pai ou a mãe, sendo necessário verificar, caso a caso, quem deve permanecer com o filho, conforme os seus elevados interesses. 

• A modificação operada pela Câmara dos Deputados na fase final de tramitação do projeto foi também relevante porque corrigiu outra falha da legislação anterior, substituindo a palavra “pode?’ ou “autoridade” por “guarda”. Na hipótese de ambos os genitores reconhecerem o menor, aquele que não detiver a guarda não deixará de ter o “poder familiar” de que tratam os ais. 1.630 e ss. deste Código, cabendo-lhe o direito-dever de visitar e ter o filho em sua companhia, fiscalizar sua educação e demais direitos e deveres daí decorrentes. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 823, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 08/04/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Luiz Jorge Valente Pontes Costa, em artigo publicado no site Jus.com.br, em dezembro de 2009, como título: Guarda conjunta: em busca do maior interesse do menor, assim dispõe: A guarda no Direito brasileiro segue, desde suas origens, duas linhas: a primeira, é aquela proveniente da quebra do vínculo conjugal, e a segunda é regulada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (para fins de colocação em família substituta). A guarda visa primordialmente dar proteção ao menor indefeso. A seguir, veremos o conceito desse instituto. 

O conceito de guarda não é dos mais simples. Waldyr Grisard Filho oferece a seguinte disposição: A guarda não se define por si mesma, senão através dos elementos que a asseguram. (...) surge, através dos artigos 231, IV e 379 a 383 do CC, como um direito-dever natural e originário dos pais, que consiste na convivência com seus filhos, previsto no art. 384, II do CC e é o pressuposto que possibilita o exercício de todas as funções paternas,.. . 

Guilherme Gonçalves Strenger assim a conceitua: Guarda de filhos ou menores é o poder-dever submetido a um regime jurídico legal, de modo a facultar a quem de direito prerrogativas para o exercício da proteção e amparo daquele que a lei considerar nessa condição. 

Já para Edgard de Moura Bittencourt, “Não se pode dizer que constitua apenas um munus, num sentido exclusivo de obrigação, cuidado, proteção e zelo. Pois é certo que envolve, em contraposição aos deveres que acarreta, algumas vantagens materiais e imateriais em favor de quem a exerce, que podem ser erigidas na qualificação de direitos. Direitos morais, como o desfrute da companhia da criança, mantendo-a ou integrando-a na própria família, orientando-lhe a educação; direitos materiais, com proveitos patrimoniais diretos ou indiretos, como, em alguns casos, o usufruto dos bens do menor, a faculdade de reclamar restituição de gastos da pessoa que deva alimentos àquele. Quanto aos proveitos materiais indiretos, poderão ser lembrados os serviços que o menor venha a prestar, no lar ou no trabalho, aos quais nem sempre deva corresponder uma pretensão salarial.”

J. M. Leoni Lopes de Oliveira oferece o seguinte conceito: Em nosso entender, a guarda é um conjunto de direitos e deveres que certas pessoas exercem, por determinação legal, ou pelo juiz, de cuidado pessoal e educação de um menor de idade. A guarda para os genitores, é um direito e um dever.

[...]

A guarda, no Direito brasileiro, é prevista desde o final do século XIX, através do Decreto 181, de 1.890, art. 90, segundo o qual: A sentença do divórcio mandará entregar os filhos comuns e menores ao cônjuge inocente e fixará a cota com que o culpado deverá concorrer para a educação deles, assim como a contribuição do marido para a sustentação da mulher, se esta for inocente e pobre.

O Código Civil de 1916 cuidou dos casos de separação judicial consensual, caso em que o juiz observará o que os separandos decidiram a respeito da guarda de filhos, e separação judicial litigiosa, caso em que surgiam três hipóteses:

a) havendo cônjuge inocente, a ele era deferida a guarda;

b) se ambos os cônjuges eram considerados culpados, então a guarda das filhas e dos filhos até os seis anos era concedida à mãe, e os filhos após a idade de 6 anos ficavam com o pai;

c) havendo motivos graves, o juiz regulava de maneira diferente, sempre a bem dos filhos.

A próxima espécie legislativa a tratar do assunto foi o Decreto-lei nº 3.200, de 19-4-1941, que dispõe sobre a organização e proteção da família, sendo que em seu art. 16 mandava que o filho ficasse sob o poder do genitor que o reconheceu ou se ambos o reconheceram, sob o poder do pai. 

A Lei nº 4.121/62 (Estatuto da Mulher Casada) introduziu algumas modificações no que diz respeito à dissolução litigiosa, mantendo inalterado o regramento sobre a dissolução consensual. Assim, o Código Civil passou a reger o assunto da seguinte maneira:

a) havendo cônjuge inocente, sob o poder deste ficariam os filhos;

b) se ambos os cônjuges fossem culpados, a prole ficaria sob a guarda da mãe, não mais persistindo a determinação pelos critérios da idade e do sexo;

c) verificando que os menores não poderão ficar sob a guarda do pai nem da mãe, pois nesse caso aqueles incorreriam em sérios prejuízos, então a guarda seria deferida a terceira pessoa da família ou não dos pais.

Em seguida, a Lei nº 5.582, de 16 de junho de 1970, introduziu algumas alterações no Decreto-lei nº 3.200/41, mais especificamente em relação ao art. 16, acrescentando-lhe dois parágrafos. Destarte, a redação ficou assim:

Art. 16. O filho natural enquanto menor ficará sob o poder do genitor que o reconheceu e, se ambos o reconheceram, sob o poder da mãe, salvo se de tal solução advier prejuízo ao menor.

§ 1º. Verificado que não deve o filho permanecer em poder da mãe ou do pai, deferirá o juiz a sua guarda a pessoa notoriamente idônea, de preferência da família de qualquer dos genitores.

§ 2º. Havendo motivos graves, devidamente comprovados, poderá o juiz, a qualquer tempo e caso, decidir de outro modo, no interesse do menor.

A próxima criação legislativa foi a Lei nº 6.515, de 26 de dezembro de 1977, conhecida como Lei do Divórcio, que além de manter as disposições acrescentadas pela Lei nº 5.582/70, ainda previu novas situações. Assim é que:

a) em caso de dissolução da sociedade conjugal consensual, observar-se-á o que os cônjuges acordaram a respeito da guarda de filhos (art. 9º); 

b) no caso de dissolução litigiosa, em que existe apenas um cônjuge responsável, ao outro será dada a guarda dos filhos (art. 10, caput); 

c) se ambos forem responsáveis pela dissolução conjugal, então a guarda será dada preferencialmente à mãe, salvo se de tal solução advier prejuízo para os menores (art. 10, § 1º); 

d) verificando o juiz que os filhos não devam ficar sob o poder da mãe nem do pai, a guarda será concedida a terceiro parente ou não (art. 10, § 2º);

e) em caso de separação fática há mais de um ano, a guarda será concedida àquele dos pais com quem já estava quando da separação (o legislador houver por bem manter o status quo – art. 11);

f) finalmente, na hipótese de separação ou divórcio consequente a doença mental de um dos cônjuges, os filhos ficarão sob a guarda daquele dos pais que estiver em condições normais de exercê-la (art. 12). 

Não se pode deixar de salientar que o art. 13 reforçou o poder discricionário e moderador do juiz que deverá atuar sempre em busca do maior interesse do menor, pois de acordo com aquele dispositivo, o juiz poderá regular a situação dos pais para com os filhos de maneira diferente da estabelecida nos artigos anteriores, caso haja motivos graves que o autorizem a tanto, sempre no interesse dos filhos. 

[...] 

A guarda de filhos é um fenômeno em constante crescimento, dado o aumento de cisões dos vínculos conjugais que a desencadeiam. É fato comprovado por pesquisas [25] científicas que o divórcio e as separações judiciais, em consonância com as mudanças de comportamento, cresceram bastante nos últimos tempos, especialmente a partir da segunda metade do século XX, dando origem a famílias monoparentais e a segundos casamentos, e até mesmo a uniões livres de qualquer contrato ou vínculos matrimoniais como é característico do casamento.

Diante desse crescimento vertiginoso do problema da guarda, não nos podem passar despercebidos as consequências que esta sugere, as suas causas, os seus efeitos e deveres correlatos como alimentos e visitas.

A guarda de filhos oferece as mais variegadas facetas, principalmente nas últimas décadas, com o surgimento de novas espécies de famílias nas sociedades, dentre as quais podemos citar as uniões homossexuais, as quais não têm o condão de gerar descendentes, porém ainda assim não podem ser desprezadas, em virtude da possibilidade de adoção ou mesmo reprodução livre (sem compromissos) de filhos que poderão ser colocados em meio familiar homossexual (quem não se lembra do caso do menino "Chicão", que vivia com a cantora Cássia Eller e sua companheira Eugênia), gerando novas situações que a orientação jurisprudencial custa aceitar, mas que com o tempo, tendem a ter seus direitos reconhecidos.

A guarda não levanta dúvidas quando o casal se encontra unido, pois nesse caso ela é exercida em comum. Aliás, oportuno trazer ao papel o interessante paralelo que existe entre a guarda e o pátrio poder, de um lado, e a posse e a propriedade, de outro.

Enquanto a coisa não está sendo disputada, a posse não levanta questões relevantes. É somente quando alguém alega ser possuidor de uma coisa ou bem que surgirão disputas em torno deste. Da mesma forma, acontece com a guarda. A guarda não apresenta maiores problemas quando o casal se encontra unido. É somente quando ocorre a ruptura da vida em comum, que a guarda adquire relevo para ser disputada entre os ex-cônjuges.

Podemos ir além, afirmando que da mesma forma que a posse se destaca da propriedade, podendo ter sujeitos ativos diferentes, a guarda também é destacável em relação ao pátrio poder, um não interferindo na existência do outro. Assim, é perfeitamente possível que o pai, de um lado, conserve seu pátrio poder, enquanto um terceiro (avô materno, por exemplo) detenha a guarda.

Já afirmara Grisard Filho: A guarda não é da essência do pátrio poder, sendo apenas de sua natureza, podendo ambos conviverem pacificamente, ou seja, a primeira (a guarda) não exclui o segundo (o pátrio-poder). A guarda é dos elementos do pátrio poder o mais destacável, independentizando-se e ganhando desdobramento próprio. 

Vale transcrever o reluzente ensinamento de Strenger, segundo o qual: A guarda de filhos ou menores ocorre sempre que se põem em confronto duas pretensões antagônicas, ou quando a intervenção do Estado se faz necessária, como é o caso do menor abandonado.

Daí poder afirmar-se que o fato consoante da guarda é de natureza anômala, pois as situações normais desconsideram o problema visto que a família constituída, seja ela legítima ou natural, não comporta tais incidentes, enquanto assim permanece. 

Portanto, como se vê, podemos resumir a questão em poucas palavras: o problema da guarda somente surge com o conflito em família que causa a separação dos pais.

Já para o ECA, a guarda serve para colocação do menor em situação irregular em família substituta, i.e., em família que não é a originária, ascendente. Há posições que entendem que a guarda estatutária não se limita a menor em situação irregular, sendo mais abrangente, mas sobre isso discorreremos mais adiante (v. 2.8 infra).

Os critérios de determinação da guarda são os instrumentos que nortearão o juiz a tomar uma decisão tão importante quanto é a guarda. São eles o interesse do menor, idade e sexo, irmãos juntos ou separados, audiência do menor, e comportamento dos pais.

O menor tem interesse em viver em uma família saudável, em ser educado, alimentado física e psicologicamente, em ter acesso à cultura, à dignidade, ao convívio familiar, ao lazer, à saúde, enfim (art. 227, CF/88 e art. 4º do ECA).

O conceito de melhor (ou maior) interesse do menor, embora necessário, não é tarefa fácil. Alguns afirmam que ele deve ser verificado caso a caso, não podendo, pois, ser definido em fórmulas estanques como se fosse uma forma de bolo ou de gelo.

Juridicamente há dois níveis a considerar: o interesse do menor serve antes de mais nada de critério de controle, isto é, de instrumento que permita fiscalizar o exercício da autoridade dos pais, sem colocar em causa a existência dos seus direitos. Assim, na família unida, o interesse presumido do menor é ser criado por seus pais, mas se um deles abusa ou mal usa suas prerrogativas, o mesmo critério permitirá tirar-lhe essa autoridade ou controlar o seu exercício. Um segundo nível será identificado como critério de solução, no sentido de que, em caso de divórcio ou separação, a atribuição da autoridade dos pais e, pois, o exercício de suas prerrogativas, irá depender da apreciação que faça o juiz do interesse do menor. 

Ainda assim, o conceito de interesse do menor não resta formulado. Eduardo de Oliveira Leite tenta fazê-lo demonstrando critérios a serem observados pelo juiz, tais como: o desenvolvimento físico e moral da criança, a qualidade de suas relações afetivas e sua inserção no grupo social, a idade, o sexo, a irmandade, o apego ou a indiferença manifestada pela criança a um de seus pais, a estabilidade da criança, como também as condições que cercam os pais, materiais e morais. 

Para Grisard Filho, “... existem interesses individuais e concretos sobre os quais se procede a uma avaliação individualizada. É desses interesses concretos que se cuida na determinação da guarda de filhos, sendo o juiz o intérprete dos particulares interesses materiais, morais, emocionais, mentais e espirituais de filho menor, intervindo segundo o princípio de que cada caso é um caso, o da máxima singularidade.”

Conclui-se, pois, que tal interesse constitui mais uma questão de fato (quaestio facti) mesmo, longe de ser uma fórmula pronta a decidir as mais particulares demandas sobre guarda.

No estágio atual de evolução da legislação brasileira, não cabe mais fazer distinção de idade e sexo para a concessão da guarda, pois foi revogado o dispositivo do antigo Código Civil que disciplinava a matéria, mandando que as filhas e os filhos até seis anos de idade ficassem com a mãe, e os filhos, após a idade dos 6 anos, ficassem com o pai.

No que se refere à idade, é consentâneo que a guarda de crianças novas (até 4 anos mais ou menos) e mais precisamente de bebês (até 24 meses) seja concedida à mãe, dado o caráter psicofisiológico que rege a relação mãe-filho. (Luiz Jorge Valente Pontes Costa, em artigo publicado no site Jus.com.br, em dezembro de 2009, como título: Guarda conjunta: em busca do maior interesse do menor, acessado em 08.04.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Art. 1.613. São ineficazes a condição e o termo apostos ao ato de reconhecimento do filho.

Em sua Doutrina, Ricardo Fiuza explica que o ato de reconhecimento do filho, além de ser irrevogável, conforme o Art. 1.610, não pode estar sujeito a condições ou a prazo, ou seja, não se subordina a qualquer cláusula que tenha o condão de restringir ou alterar os efeitos da relação de filiação (v. Maria Helena Diniz, Código Civil anotado, São Paulo, Saraiva, 1995, p. 298). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 823, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 08/04/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

No mesmo sentido Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, quando reflete ser o reconhecimento do ato jurídico em sentido estrito, cujos efeitos são demarcados pela lei. Não negócio jurídico e, portanto, não cabem disposições de vontade que modifiquem sua eficácia. (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.613, acessado em 08.04.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Iaci Gomes da Silva Ramos Filha, em defesa de sua tese, com o título: “Paternidade socioafetiva e a impossibilidade de sua desconstituição posterior”, no Centro de Ensino Superior do Amapá, ano de 2008, já no item 3.5.2. “Do erro e o reconhecimento da paternidade” - Além da paternidade decorrente da incidência da presunção pater is est tem-se, ainda, a possibilidade de que o estado de filiação origine-se do reconhecimento voluntário.  

Em muitos casos esse ato registral é realizado de boa-fé, ou seja, acreditando-se na existência do vínculo genético entre aquele que declara a paternidade e o perfilhado. Nessa situação, considerando-se a descoberta posterior de que a paternidade fora formalizada com base em uma situação irreal, não conhecida por quem fizera o registro, torna-se, em tese, juridicamente possível à propositura de ação de desconstituição, ainda que tenha decorrido lapso temporal considerável de convivência entre o pai registral e o filho. 

Tal fato impõe uma certa consideração, tanto nos casos de filiação pela presunção como também nos casos de reconhecimento voluntário, porquanto deva ser explicitado se o vínculo criado entre os interessados deve ou não ser levado em conta para fins de solução do caso. Percebe-se, nessas hipóteses, que o direito do pai à desconstituição deriva do fato de o reconhecimento da paternidade ter decorrido de verdadeiro engano, constatando-se que, uma vez conhecida à realidade, não teria o pai procedido ao referido ato jurídico. No entanto, infelizmente, nenhuma atenção costuma ser dada pelos operadores do direito, neste mesmo

caso, à situação do filho, como se este fosse obrigado a sofrer todas as consequências do engano alheio. Assim é que verificado o erro, busca-se a anulação do reconhecimento, fato que diante das circunstâncias pode acarretar uma série de transtornos para o filho, que sofre a desconstituição do vínculo que o unia formalmente a seu pai. A solução desses problemas sempre foi vista através da ótica que protege os interesses do pai, bem ao gosto do Código Civil de 1916.

Analisando-se, a jurisprudência aos poucos foi inserindo em seu contexto o fenômeno da posse de estado de filho. De forma tímida em um primeiro momento, utilizava-a como prova subsidiária para o estabelecimento da filiação, introduzindo aos poucos no mundo jurídico a posse de estado de filho como prova autônoma e determinante para a determinação dos vínculos familiares.

Na atualidade, a expressão do estado de filiação é totalmente respaldada pelos julgadores pátrios, sua expressão é a que recebe maior valoração nos casos em que a determinação das relações paterno-filiais se mostra obscura. 

Para uma melhor verificação da aplicação da teoria da paternidade socioafetiva nas decisões atuais, serão analisados alguns julgados dotados de características peculiares ao tema, buscando-se destacar a evidenciação dos elementos expostos no decorrer da averiguação científica. 

Quando do ajuizamento de uma ação que contemple a ocorrência da paternidade socioafetiva, deve-se buscar o reconhecimento do vínculo afetivo existente entre o pai e o filho, na qual deve haver a comprovação (por quaisquer meio de prova admitidos pelo Direito) dos elementos constitutivos da posse de estado de filho. Senão veja-se:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. PREVALÊNCIA DA PATERNIDADE SOCIOAFETIVA SOBRE O VÍNCULO BIOLÓGICO. DEMONSTRADA A PATERNIDADE SOCIOAFETIVA, PELO PRÓPRIO DEPOIMENTO DA INVESTIGANTE, POSSÍVEL O JULGAMENTO DO FEITO NO ESTADO EM QUE SE ENCONTRA, SENDO DESNECESSÁRIA A REALIZAÇÃO DE EXAME DE DNA OU INQUIRIÇÃO DE OUTRAS TESTEMUNHAS, QUE NÃO PODERÃO CONDUZIR À OUTRA CONCLUSÃO SENÃO DA IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO. PRELIMINARES REJEITADAS E RECURSO DESPROVIDO, POR MAIORIA. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Apelação Cível Nº 70015562689, Sétima Câmara Cível, Relator: Ricardo Raupp Ruschel, Julgado em 28/02/2007. Como se pode observar no referido acórdão, o próprio depoimento da parte apelante serviu de elemento convincente para que seu pedido fosse julgado procedente, tendo os julgadores se utilizado inclusive das declarações do próprio investigado para fundamentarem seus votos. 

Em outra análise das decisões proferidas pelo 4º Grupo de Câmaras Cíveis do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, extraiu-se a certeza de que em momento algum é promovida a banalização do instituto da paternidade socioafetiva. Uma vez não identificados os elementos caracterizadores do estado de filiação, os julgadores não demonstram dúvidas em expressar a realidade dos fatos em seus votos. Observe-se: 

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE SOCIOAFETIVA CUMULADA COM PETIÇÃO DE HERANÇA E ANULAÇÃO DE PARTILHA. AUSÊNCIA DE PROVA DO DIREITO ALEGADO. INTERESSE MERAMENTE PATRIMONIAL. Embora admitida pela jurisprudência em determinados casos, o acolhimento da tese da filiação socioafetiva, justamente por não estar regida pela lei, não prescinde da comprovação de requisitos próprios como a posse do estado de filho, representada pela tríade nome, trato e fama, o que não se verifica no presente caso, onde o que se percebe é um nítido propósito de obter vantagem patrimonial indevida, já rechaçada perante a Justiça do Trabalho. NEGARAM  PROVIMENTO. UNÂNIME.RIOGRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça, Apelação Cível Nº 70016362469, Sétima Câmara Cível, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em 13/09/2006. 

EMENTA:AÇÃO ANULATÓRIA DE RECONHECIMENTO. PARENTALIDADE SOCIOAFETIVA NÃO CONFIGURADA. A paternidade não é apenas um mero fato, um dado biológico, e sim, uma relação construída na vida pelos vínculos que se formam entre o filho e seu genitor. Caso em que as evidências levam à conclusão de que o reconhecimento da paternidade foi decorrente de erro, e não de decisão consciente do autor, o que o levou a afastar-se da criança, tão logo soube que não era seu filho, entre ambos não se formando a relação socioafetiva que deve ser preservada. Negaram provimento, por maioria, vencido o Relator. RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça, Apelação Cível Nº 70000849349, Sétima Câmara Cível, Relator: José Carlos Teixeira Giorgis, Julgado em 20/08/2003. 

Para um melhor conhecimento da realidade fática referente ao convívio das partes integrantes de uma apelação, não ousaram os Desembargadores da Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul em abrir mão de uma avaliação social, conforme podemos acompanhar nesta ementa. 

EMENTA: APELAÇÃO. NEGATÓRIA DE PATERNIDADE. DESCONSTITUIÇÃO DO REGISTRO. ADEQUAÇÃO. Dois exames de DNA deixaram certo que não existe filiação biológica. O laudo de avaliação social concluiu que inexiste filiação socioafetiva. Ficou demonstrada a existência de erro substancial por ocasião do registro. Tudo isso leva à conclusão de que, no caso, a desconstituição da paternidade é mesmo de rigor. NEGARAM PROVIMENTO.RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça, Apelação Cível Nº 70016771370, Oitava Câmara Cível, Relator: Rui Portanova, Julgado em 23/11/2006.

Aspecto destacado quando da apreciação dos elementos constitutivos da paternidade socioafetiva, se faz necessária à incidência de um lapso temporal razoável para que possa se solidificar a relação de afeto. Respalda-se a alternativa através de duas decisões em grau de apelação. 

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. NEGATÓRIA DE PATERNIDADE. Não obstante ter o exame de DNA afastado a paternidade, deve prevalecer a realidade socioafetiva sobre a biológica, diante da relação formada entre pai e filha ao longo de anos. RECURSO DESPROVIDO.58 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça, Apelação Cível Nº 70007706799, Oitava Câmara Cível, Relator: Alfredo Guilherme Englert, Julgado em 18/03/2004. 

O afeto sobressai ao vínculo genético, veja-se: EMENTA: APELAÇÃO. INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE CUMULADA COM ANULAÇÃO DE REGISTRO. PREVALÊNCIA DA PATERNIDADE SOCIOAFETIVA. Embora filho biológico do investigado, o investigante foi criado pelo pai registral por mais de 30 anos, criando verdadeira paternidade socioafetiva, que prevalece sobre o vínculo genético. NEGARAM PROVIMENTO. RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça, Apelação Cível Nº 70017016908, Oitava Câmara Cível, Relator: Rui Portanova, Julgado em 30/11/2006.

Ao contrário da grande maioria das demandas que pretendem reconhecer a existência do vínculo socioafetivo, em que a relação afetiva alegada envolve o pai e uma criança, nos casos em tela são postulados liames afetivos por idosos em relação aos pais já falecidos.

EMENTA: INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. APELAÇÃO CÍVEL. IMPOSSIBILIDADE DE REALIZAÇÃO DE PERÍCIA GENÉTICA. PROVA DO VÍNCULO AFETIVO. Falecido o investigado, a ação dever ser movida contra todos os seus herdeiros. Inexistência de falta de comprovação da maternidade da investigante e irregularidade das informações constantes nas certidões de seu nascimento e casamento. Inviabilidade de realização de prova pericial, por meio de exame de DNA, uma vez que o material genético dos sucessores mais próximos do investigado não serve ao fim

pretendido. Caso em que assume especial importância a prova documental e testemunhal produzida. Posto que a paternidade biológica não seja certa, a prova carreada assegura a confirmação da declaração da paternidade, porquanto revela ter a investigante assumido o estado de filha do de cujus. Consagração da paternidade socioafetiva, prestigiando a situação que preserva o elo da afetividade. NEGADO PROVIMENTO. RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça, Apelação Cível Nº 70016585754, Sétima Câmara Cível, Relator: Maria Berenice Dias, Julgado em 29/11/2006. 

EMENTA: AÇÃO DECLARATÓRIA. ADOÇÃO INFORMAL. PRETENSÃO AO RECONHECIMENTO. PATERNIDADE AFETIVA. POSSE DO ESTADO DE FILHO. PRINCÍPIO DA APARÊNCIA. ESTADO DE FILHO AFETIVO. INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE SOCIOAFETIVA. PRINCÍPIOS DA SOLIDARIEDADE HUMANA E DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. ATIVISMO JUDICIAL. JUIZ DE FAMÍLIA. DECLARAÇÃO DA PATERNIDADE. REGISTRO. A paternidade sociológica é um ato de opção, fundando-se na liberdade de escolha de quem ama e tem afeto, o que não acontece, às vezes, com quem apenas é a fonte geratriz. Embora o ideal seja a concentração entre as paternidades jurídica, biológica e socioafetiva, o reconhecimento da última não significa o desapreço a biologização, mas atenção aos novos paradigmas oriundos  da instituição das entidades familiares. Uma de suas formas é a "posse do estado de filho", que é a exteriorização da condição filial, seja por levar o nome, seja por ser aceito como tal pela sociedade, com visibilidade notória e pública. Liga-se ao princípio da aparência, que corresponde a uma situação que se associa a um direito ou estado, e que dá segurança jurídica, imprimindo um caráter de seriedade à relação aparente. Isso ainda ocorre com o "estado de filho afetivo", que além do nome, que não é decisivo, ressalta o tratamento e a reputação, eis que a pessoa é amparada, cuidada e atendida pelo indigitado pai, como se filho fosse. O ativismo judicial e a peculiar atuação do juiz de família impõe, em afago à solidariedade humana e veneração respeitosa ao princípio da dignidade da pessoa, que se supere a formalidade processual, determinando o registro da filiação do autor, com veredicto declaratório nesta investigação de paternidade socioafetiva, e todos os seus consectários. APELAÇÃO PROVIDA, POR MAIORIA.RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça, Apelação Cível Nº 70008795775, Sétima Câmara Cível, Relator: José Carlos Teixeira Giorgis, Julgado em 23/06/2004. 

Como se vê, na decisão acima, se pode comprovar a evolução operada pelos nossos tribunais no que diz respeito ao instituto da filiação, ao admitir expressamente a “posse de estado de filho” como elemento constitutivo da filiação. Evidentemente, que em nenhum momento é afastada totalmente a filiação jurídica e biológica, e sim, em casos e situações especiais, hierarquizada a relação socioafetiva, por ser a mais relevante na formação e socialização do ser humano.

Encerrando este capítulo, cujo propósito foi a análise da incidência da paternidade socioafetiva na jurisprudência nacional, destaca-se o importante papel desempenhado pelos operadores do direito na valorização da teoria da paternidade socioafetiva. 

Os elementos fundamentais recebidos pelos filhos enquanto membros de uma família são a fonte de formação e desenvolvimento de suas personalidades. Assim, uma criança fora do seu meio familiar não terá condições psicológicas de se desenvolver plenamente. Verifica-se que o conceito de família sofreu inúmeras mudanças, diante de uma sociedade desvinculada de apelos sociais.

A entidade familiar tanto pode ser constituída pelo casamento, pela união estável ou pela comunidade formada por qualquer um dos pais e seus descendentes, sobretudo construída pelo afeto.  Modernamente e o mais aceitável na sociedade atual, é que a família deve valorizar o sentimento, uma vez que traduz a noção de afeto, elemento propulsor da atual relação de convivência, com a demonstração do desejo de estar junto a outrem, constituindo, pois, o alicerce de uma entidade familiar.

Na presente pesquisa averiguou-se que a perspectiva hierarquizada da família sofreu ao longo do tempo uma profunda metamorfose. Além de ter havido uma sintomática redução de seus componentes, alternou ainda algumas atribuições.

A emancipação feminina e o ingresso no mercado de trabalho levaram a mulher para fora do lar. A inversão de prerrogativas fez com que o homem deixasse de ser o provedor exclusivo da família, no entanto, passou a ser partícipe nas atividades domésticas.

Dessa forma, a família patriarcal de concepção romana foi cedendo espaço a outros tipos de organizações familiares. A família moderna mudou. Hoje seu principal papel é de suporte emocional do indivíduo, em que há flexibilidade e, sem dúvida, mais intensidade no que diz respeito a laços afetivos. 

O referido tema é relevante pois as relações de família devem ser decididas com base, principalmente, no valor constitucional da dignidade da pessoa humana, da proteção integral de crianças e adolescentes e também no princípio da igualdade. 

Não se deve considerar tão somente a repercussão da paternidade sobre a pessoa do pai, seja essa figura decorrente da presunção pater is est ou da própria

manifestação de vontade em registrar alguém como seu filho. 

De todo o trabalho ficou claro que a paternidade não é um dado puramente biológico, ela é vista atualmente como exercício de uma função, na qual se inclui o tratamento, a convivência familiar e tem o escopo de propiciar ao filho um desenvolvimento sadio. Neste aspecto, a identidade de um para com o outro é mais relevante do que a descendência genética. 

Num exercício de cognição é plausível concluir que o conflito levado a juízo acerca da paternidade alusivo a relação originária de reconhecimento voluntário,

exercitado por cônscio de geração biológica alheia, deve ser solucionado levando-se em conta que a criança não é um instrumento do qual dispõe o pai para consecução dos seus objetivos e que essa conduta não se coaduna com o princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988).

A paternidade socioafetiva é irretratável, sobretudo quando a relação já se consolidou, tendo a criança, em relação ao pai, a posse de estado de filho; demonstrando trazer o patronímico do pai, ter no seio da família o tratamento dispensado a um filho e o reconhecimento pela família e da sociedade na qual esta se insere, da existência do vínculo de filiação. Aliás, essa paternidade é a verdade da filiação, sem a qual não há que se falar em pleno desenvolvimento dos filhos, é o elemento mais importante da relação paterno-filial, e a permissão dessa ruptura importa em grave afronta ao Princípio da Dignidade da Pessoa Humana.

Todavia, depreende-se que a filiação socioafetiva possui lastro legal que se encontra na Constituição Federal de 1988, quando preceitua que todos os filhos são iguais independentemente de sua origem (art. 227,§ 6º); quando elege adoção como escolha afetiva, colocando-a no plano de igualdade de direitos (art. 227, §§ 5º e 6º); quando legitima como família a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes, bem como os filhos adotivos (art. 226 § 4º); quando garante o direito à convivência familiar, e não a origem genética, quando constitui prioridade absoluta da criança e do adolescente (art. 227, caput), bem como quando impõe aos membros da família o dever de solidariedade, uns com os outros, dos pais com os filhos. Essa base legal não fica restrita ao texto Constitucional. Está também presente no atual Código Civil, no artigo 1.596 que reproduziu o disposto na Constituição, indicando que não deve haver nenhuma designação discriminatória em relação às espécies de filiação. De sorte que se não é possível revogar a filiação biológica e a adotiva, não é também permitida a revogação da socioafetiva amparada pelo art. 1.593, do Código Civil.

Então, falar-se em ação negatória de paternidade ou anulatória de registro civil, pressupõe a existência de um vício de consentimento que macula o ato da perfilhação. Assim, impossível visualizar tal circunstância quando alguém reconhece como seu, voluntariamente, o filho de outrem. As ações para desconstituição da paternidade socioafetiva não devem ser exitosas, principalmente quando a paternidade foi estabelecida por ato volitivo, não maculado por vício. 

Entretanto, há situações em que o homem é induzido ao erro pela mulher, porém na hipótese de existir convivência familiar criando laços afetivos entre o pai e o filho reconhecido não se deve anular o registro desconstituindo a paternidade, sob essa alegação, pois o vínculo que se criou entre o pai e o filho reconhecido é indissolúvel, tendo no registro de nascimento apenas a exteriorização dessa união de laços afetivos, este, por sua vez, é base de toda a família e deve sempre prevalecer o princípio do melhor interesse da criança. (art. 27 ECA). Não é pela separação da mulher que o homem deve desconstituir a paternidade do filho reconhecido, sob a alegação de que ensejará o pagamento de pensão alimentícia, direito sucessório e outros.

Os conteúdos apresentados não esgotam inteiramente o assunto relativo à impossibilidade da desconstituição posterior da paternidade socioafetiva, mas certamente contribuirão para ampliar o debate acerca da problemática, formando uma síntese dessa questão, extremamente atual em nosso cotidiano. (Iaci Gomes da Silva Ramos Filha, em defesa de sua tese, com o título: “Paternidade socioafetiva e a impossibilidade de sua desconstituição posterior”, no Centro de Ensino Superior do Amapá, ano de 2008, postado no site mpam.mp.br/, acessado em 08.04.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Art. 1.614. 0 filho maior não pode ser reconhecido sem o seu consentimento, e o menor pode impugnar o reconhecimento, nos quatro anos que se seguirem à maioridade, ou à emancipação. 

Em rápidos comentários, Luiz Fernando Valladão Nogueira, publicou no site daniloborgescouto.jusbrasil.com.br/artigos, artigo a respeito do CC 1.614, sobre Exclusão da Paternidade. Segundo o autor,  filho maior, para ser reconhecido eficazmente pelo pai, precisa manifestar seu consentimento, o que torna tal ato bilateral. Essa exigência já constava do art.  da Lei 8560/92.

 

Vale registrar que, no caso de adoção, até por conta das exigências legais e procedimentais que lhes são próprias, a exemplo do “estágio de convivência” (art. 46 ECA), impõe-se, por opção legislativa, o consentimento também daquele que já for maior de 12 anos de idade (art. 45 § 2º ECA – Lei 8069/90).

 

O filho menor poderá ser reconhecido, independentemente de seu consentimento. Isso acontece em virtude de sua ausência de compreensão, e mesmo porque, a princípio, esse ato vem em seu benefício. Acontece que o reconhecimento voluntário do filho menor – e que, portanto, não precisou ser ouvido – pode não lhe ser mais interessante, após atingida a maioridade.

Nessa hipótese poderá o filho impugnar o anterior reconhecimento espontâneo. E a referida impugnação não se lastreará no erro ou falsidade do registro, aludidos no CC 1604. Na verdade, por mera vontade do filho que atingiu a maioridade, poderá ser impugnado o reconhecimento.

A fim de que haja segurança jurídica nas relações de parentesco e mesmo em consideração aos vínculos socioafetivos que são criados, o legislador estabeleceu o prazo de 4 anos após a maioridade para o ajuizamento dessa ação impugnatória.

 

Naturalmente que o referido prazo só se aplica para a impugnação pelo filho ao reconhecimento voluntário. Diferente disso, se o filho quiser não só recusar o pai registral, mas reconhecer o real vínculo biológico e parental com outro cidadão, aí sim sua pretensão será imprescritível, a teor do CC 1606  e do art. 27 ECA (Lei 8069/90).

 

Vale conferir o entendimento do STJ, já pacificado, sobre o tema: “ … – A regra que impõe o prazo de quatro anos para impugnar o reconhecimento da paternidade constante do registro civil só é aplicável ao filho natural que pretende afastar a paternidade por mero ato de vontade, com o objetivo único de desconstituir o reconhecimento da filiação, sem contudo buscar constituir nova relação. – A decadência, portanto, não atinge o direito do filho que busca o reconhecimento da verdade biológica em investigação de paternidade e a consequente anulação do registro com base na falsidade deste. …”.


Em síntese, a pretensão de ver reconhecida a ancestralidade continua imprescritível; contudo, submete-se ao prazo de quatro anos após a maioridade a pretensão do filho de afastar, apenas e tão só, o reconhecimento manifestado espontaneamente pelo pai. (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 987987/SP. Rel. (a). Ministra Nancy Andrighi, julgamento em 21/08/2008, Terceira Turma, Diário de Justiça, Brasília, 05 setembro 2008). (Luiz Fernando Valladão Nogueira, publicou no site daniloborgescouto.jusbrasil.com.br/artigos, artigo a respeito do CC 1.614, sobre Exclusão da Paternidade. acessado em 08.04.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

O entendimento de Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, esta regra homenageia, com absoluta razão, o respeito às determinações pessoais que deriva do princípio da dignidade da pessoa humana. Eles sublinham, igualmente, o fato de ser a filiação um fenômeno normativo, da ordem do deve ser (sollen). Se a filiação fosse inerente a dados da ordem do mundo natural (sein), ela estaria inevitavelmente ligada ao vínculo genético ou ao vínculo socioafetivo e o suposto filho não poderia negá-la. 

Como a filiação é fenômeno normativo, regulado pelo direito, sua determinação depende da incidência de princípios. Valores importantes incidem na matéria. Assim, é absolutamente jurídico e conforme o princípio da dignidade da pessoa humana que uma pessoa que tenha atingido a maioridade possa recusar o reconhecimento que um de seus genitores queira realizar.

Desde o nascimento até o atingimento da maioridade ou da emancipação um longo intervalo de tempo transcorre. Durante todo esse intervalo, pode o genitor manifestar sua vontade de reconhecer o suposto filho sem a interferência de qualquer pessoa. O fim desse prazo ocorre quando, o sistema jurídico, presumivelmente, passa a reconhecer a plena capacidade da pessoa para reger os seus interesses, quando, então, deverá ser consultada. A recusa é personalíssima. Assim, se a maioridade é atingida por alguém que não possua o necessário discernimento para os atos da vida civil, sua manifestação é desnecessária. 

A segunda parte do dispositivo estabelece prazo para que o filho possa impugnar o reconhecimento do seu estado de filiação. O Direito Civil brasileiro usou a técnica da decadência para estabilizar os vínculos de filiação. A técnica mais adequada é a da posse de estado, moldada no direito francês, que impede a impugnação do vínculo se o reconhecimento tiver sido corroborado pela posse de estado de filho. É mais adequada, porque é mais realista. Impediria que o vínculo fosse impugnado em alguns casos, mas permitiria que o fosse além do prazo demarcado pelo CC 1.614, caso a posse de estado não tivesse existido. (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.613, acessado em 08.04.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Segundo Helom Nunes – Meu mundo sem limites, no site helomnunes.com/artigos em 10/04/2018, ocorre que o prazo decadencial estipulado pelo dispositivo sobredito não pode ser fatal, uma vez que a limitação temporal – quatro anos – entra em rota de colisão com o art. 27 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Veja-se: Art. 27. O reconhecimento do estado de filiação é direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, podendo ser exercitado contra os pais ou seus herdeiros, sem qualquer restrição, observado o segredo de Justiça.

Ora, sendo a ação de impugnação uma ação negatória de paternidade invertida, não pode haver limitação temporal ao filho, quando o ordenamento estabelece imprescritibilidade ao direito do pai (CC 1601).

Como se vê, a leitura concatenada dos dispositivos afasta qualquer lapso temporal, sobretudo quando estamos diante da identidade do indivíduo. A doutrina brasileira orienta o afastamento do lapso decadencial para a impugnação da paternidade.

Francismar Lamenza considera “odiosa a discriminação entre os filhos, de forma contrária ao estabelecido pelo artigo 227, §6º, da Constituição da República”.

Na mesma toada, Maria Berenice Dias afirma que “não há porque limitar o direito de investigar a paternidade ao exíguo prazo da impugnação da filiação. Não cabem dois pesos e duas medidas, uma vez que é imprescritível a ação negatória de paternidade (CC 1601). O lapso decadencial não se amolda ao novo de direito de filiação e não pode subsistir”

Por derradeiro, Cristiano Chaves diz que “não se deve perceber o prazo de 4 anos como absolutamente peremptório”.

Sobre o afastamento da limitação temporal, o Superior Tribunal de Justiça já se manifestou:

STJ – RESP 987.987/SP – 3ª Turma – Julgado em 21/08/2008 – Direito civil e processual civil. Recurso especial. Ação de investigação de paternidade. Decisão interlocutória que rejeita preliminares arguidas pelo investigado. Agravo de instrumento que mantém a decisão. Decadência do direito do investigante. Não ocorrência. Litisconsórcio passivo necessário. Demais herdeiros do pai registral falecido. Imposição sob pena de nulidade processual – A regra que impõe o prazo de quatro anos para impugnar o reconhecimento da paternidade constante do registro civil só é aplicável ao filho natural que pretende afastar a paternidade por mero ato de vontade, com o objetivo único de desconstituir o reconhecimento da filiação, sem contudo buscar constituir nova relação. – A decadência, portanto, não atinge o direito do filho que busca o reconhecimento da verdade biológica em investigação de paternidade e a consequente anulação do registro com base na falsidade deste. – Em investigatória de paternidade, a ausência de citação do pai registral ou, na hipótese de seu falecimento, de seus demais herdeiros, para a consequente formação de litisconsórcio passivo necessário, implica em nulidade processual, nos termos do art. 47, parágrafo único, do CPC. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido. STJ RESP 222.782-MG, 3ª Turma, 20/08/2001. CIVIL. 

Investigação de Paternidade. Ação proposta por quem, registrada como filha legítima do marido de sua mãe, quer a declaração de que o pai é outrem. Inaplicabilidade do artigo 178, §9º, VI e do artigo 362 do Código Civil, que se referem à hipótese diversa: a de quem, nascido como filho natural, i.é, fora do casamento, foi reconhecido. Prescrição afastada. Recurso especial conhecido e provido. Como se percebe, diante de uma ação de estado, na qual o indivíduo deseja manifestar o seu direito de identidade, não deve haver qualquer limitação temporal, sobre tudo em razão da ação existencial em comento ser imprescritível. Por oportuno, imperioso ressaltar que é desnecessária qualquer prova de erro, inexistência ou falsidade biológica. Vale dizer, a impugnação é possível diante de uma denúncia vazia, em apreço ao direito constitucional da liberdade.

Assim, o fato de ter havido o reconhecimento voluntário da paternidade, não pode afetar o direito do filho de impugná-lo, pois trata-se do direito de não ter como genitor quem o reconheceu como filho, demonstrando-se assim flagrantemente inconstitucional a limitação temporal do art. 1.614 do Código Civil. (Helom Nunes – Meu mundo sem limites, no site helomnunes.com/artigos em 10/04/2018. Acessado em 08/04/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

quarta-feira, 7 de abril de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.609, 1.610, 1.611 Do Reconhecimento dos Filhos - VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.609, 1.610, 1.611
Do Reconhecimento dos Filhos - VARGAS, Paulo S. R.
- Parte Especial – Livro IV – Do Direito de Família –
Subtítulo II – Das Relações de Parentesco – Capítulo
Do Reconhecimento dos Filhos - (Art. 1.607 a 1.617) –
digitadorvargas@outlook.com - vargasdigitador.blogspot.com
fb.me/DireitoVargasm.me/DireitoVargas
 Whatsap: +55 22 98829-9130 Phone Number: +55 22 98847-3044

 Art. 1.609. 0 reconhecimento dos filhos havidos fora do casamento é irrevogável e será feito: 

I — no registro do nascimento;

II — por escritura pública ou escrito particular, a ser arquivado em cartório;

III — por testamento, ainda que incidentalmente manifestado;

IV — por manifestação direta e expressa perante o juiz, ainda que o reconhecimento não haja sido o objeto único e principal do ato que o contém. 

Parágrafo único. O reconhecimento pode preceder o nascimento do filho ou ser posterior ao seu falecimento, se ele deixar descendentes.

No entendimento dos autores Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o vínculo de filiação é essencial para a pessoa a ser reconhecida, para os pais e, igualmente, para a sociedade. A lei facilita ao máximo o reconhecimento e, a rigor, permite que seja feito por qualquer meio escrito: público, particular, em vida, em negócio jurídico causa mortis, em juízo ainda que a ação não verse sobre o reconhecimento.

O parágrafo único do artigo em comento permite, inclusive, que o reconhecimento ocorra após o falecimento do filho. Condiciona-o, no entanto, ao fato de o suposto filho deixar descendentes. A restrição visa a afastar reconhecimento feito somente com o propósito de participação na herança. Se o suposto filho falecido deixar descendentes, sua herança a estes pertencerá.

Há um propósito ético na restrição que consagra a boa-fé objetiva, razão pela qual a restrição é conforme a Constituição. (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.609, acessado em 07.04.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Expõe o histórico do artigo em comento que a primeira versão deste artigo aprovada pela Câmara dos Deputados, mantinha o mesmo texto do projeto, e dizia: “O reconhecimento voluntário do filho ilegítimo pode fazer-se no próprio termo de nascimento, ou mediante escritura pública, ou por testamento”. Durante a tramitação no Senado, o dispositivo foi emendado, passando a redigir-se: “O reconhecimento voluntário do filho havido fora do casamento pode fazer-se no próprio termo de nascimento, ou mediante escritura pública, ou por testamento”. Retornando, em seguida, o projeto à Câmara, promoveu o Deputado Ricardo Fiuza completa reformulação no dispositivo.  

Logo, a doutrina em referência apoiar-se nestes termos: A emenda senatorial suprimiu, inicialmente, do texto original a expressão “ilegítimo”, ajustando-o à Constituição Federal.

• O caput do artigo do projeto recebeu nova redação, de modo a estabelecer a irrevogabilidade do reconhecimento, consoante disposto na Lei n. 8.069/90.

• O reconhecimento voluntário se achava disciplinado pela Lei n. 8.560, de 29 de dezembro de 1992. exigindo-se, daí, que o artigo em exame fosse revisto para sua adequação à legislação superveniente. Referida lei deu maior amplitude às formas de reconhecimento da paternidade, vindo ao encontro do princípio da proteção integral da criança e do adolescente, consagrado pela Constituição Federal e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n. 8.069/90).

•Assim, há duas espécies de reconhecimento da filiação: voluntário e forçado. O reconhecimento voluntário é aquele que ocorre no registro de nascimento, por escritura pública ou escrito particular, por testamento, ainda que incidentalmente manifestado, e por manifestação expressa e direta perante o juiz, mesmo que o reconhecimento não tenha sido o objeto único e principal do ato que o contém. O reconhecimento forçado dá-se em face da ausência de reconhecimento voluntário, por meio da ação de investigação da paternidade ou maternidade.

• Deve-se fazer referência à homologação judicial da manifestação de vontade, no inciso IV, em razão da instituição do juizado informal de família, onde houver, a exemplo do Estado de Pernambuco.

• Além disso, há omissão do reconhecimento oficioso, que é subespécie do reconhecimento voluntário, o qual não tem a característica da espontaneidade, ocorrendo quando o pai confirma o vínculo de parentesco, diante de sua notificação judicial, após a remessa de certidão do registro, pelo Oficial do Registro Civil ao Juízo competente, apenas com a maternidade reconhecida e a qualificação do suposto pai. Essa espécie de reconhecimento foi prevista no art. 2º da Lei n. 8.560/92 e não consta deste artigo, devendo nele ser inserida.

• Sugestão legislativa: Pelas razões expostas, ofereceu-se ao Deputado Ricardo Fiuza a seguinte sugestão: Art. 1.609. O reconhecimento dos filhos havidos fora do casamento é irrevogável e será feito: 1 — no registro do nascimento; II — por escritura pública ou escrito particular; a ser arquivado em cartório; III — por testamento, ainda que incidentalmente manifestado; IV — por manifestação direta e expressa perante o juiz ou por este homologada, ainda que o reconhecimento não haja sido o objeto único e principal do ato que o contém. 

1º O reconhecimento pode preceder o nascimento do filho ou ser posterior a seu falecimento, se ele deixar descendentes.

2º O Em registro de nascimento de menor apenas com a maternidade estabelecida, o Oficial remeterá ao juiz certidão integral do registro e a qualificação do suposto pai, a fim de ser averiguada a procedência da alegação. Se confirmada a paternidade, será lavrado termo de reconhecimento e remetida certidão ao oficial do registro para a devida averbação. Negada a paternidade, inclusive por falta de comparecimento do suposto pai em Juízo, o juiz remeterá os autos ao representante do Ministério Público ou ao órgão competente para que promova, havendo elementos suficientes a ação de investigação de paternidade.

3º No caso do parágrafo anterior, a iniciativa conferida ao Ministério Público ou órgão competente não impede a quem tenha legítimo interesse de intentar a ação investigatória. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 821-22, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 07/04/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Encontrado no site revistaunar.com.br/jurídica artigo intitulado “Reconhecimento de Paternidade e suas implicações”, publicado por Jorge Roberto Vieira Aguiar Filho et al, [...] Os filhos são o resultado comum do relacionamento entre os sexos opostos. Ao gerar sua prole, o homem sofre consequências ao âmbito do direito. O nascimento de uma criança reflete uma série de obrigações para seus genitores. É dever constitucionalmente imposto aos pais o de assistir, criar e educar os filhos menores. A relação existente entre o filho e as pessoas que o conceberam é chamada de filiação.

Para Sílvio Rodrigues (2002, p. 323), “Filiação é a relação de parentesco consanguíneo, em primeiro grau e em linha reta, que liga uma pessoa àquelas que a geraram, ou receberam como se as tivesse gerado”. Pontes de Miranda (1971, p. 367) “A relação que o fato da procriação estabeleceu entre duas pessoas, uma das quais nascidas da outra, chama-se paternidade, ou maternidade, quando considerada com respeito ao pai, ou mãe, e filiação quando do filho para com qualquer dos genitores”.

Conforme Lôbo (2009, p. 165) “Filiação procede do Latim filiatio, que significa procedência, laço de parentesco dos filhos com os pais, dependência, enlace”, sendo assim, filiação é a relação de parentesco como se estabelece entre duas pessoas, uma das quais nascida da outra, ou adotada, ou vinculada mediante posse de estado de filiação ou por concepção derivada de inseminação artificial heteróloga, quando a relação é considerada em face do pai é paternidade. 

Seguindo a mesma temática Lôbo (2009, p. 197) continua a dizer “no Brasil os pais são livres para planejar sua filiação, quando, como ou na quantidade que desejarem não podendo o Estado ou a sociedade estabelecer limites ou condição”, ou seja, os filhos podem provir de origem genética conhecida ou desconhecida, de escolha afetiva, do casamento, de união estável, entre outros. 

O art. 226, parágrafo 7º, da Constituição estabelece que fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é de livre decisão do casal, sendo vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas, todavia, a Lei n. 9.263/96 prevê que o planejamento familiar é direito de todo cidadão e não apenas do casal, como prevê a Constituição.

Segundo Caio Mario (1979, p. 271), “Filiação é o vínculo existente entre pais e filhos, vem a ser a relação de parentesco consanguíneo em linha reta, ou aqueles que lhe concederam a vida”. Toda pessoa, especialmente quando em formação, tem direito à paternidade, existindo uma série de normas gerais que evoluem o interesse da filiação sob aspecto da indisponibilidade de direitos.

Pelo justo ou injusto, o § 6º do artigo da Carta de Outubro, garante que “os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação”. 

O Código Civil de 1916 elencava que os filhos legítimos eram os que procedem de casamento e ilegítimos os que nascido fora dele. Paternidade é uma experiencia humana profundamente implicada com propósitos sociais e institucionais que a legítima, ou seja, uma construção que deve ser compreendida face ao contexto sociocultural de um tempo. 

A lei n. 6.515 de 1977, reguladora dos casos de dissolução da sociedade conjugal e do casamento, a qual trouxe avanços expressivos, pois considerou legítimos os filhos havidos em casamento nulo ou anulável, ainda que ambos os contraentes o tivesse realizado de má-fé, constituiu um importante passo para o fim da discriminação entre os filhos.

O advento da Constituição Federal de 1988, a qual seguidora da tendência liberal dos pensadores do Direito ampliou-se, sensivelmente o conceito de família acabando-se de vez com a distinção existência entre os filhos, extinguindo ainda qualquer denominação discriminatória quanto ao tratamento de filhos.

A Constituição Federal de 1988 em seu art. 227, parágrafo 6º, estabeleceu absoluta igualdade entre todos os filhos, não admitindo mais distinção entre filiação legítima e ilegítima, conforme os pais fossem casados ou não, e adotiva, que existia no Código Civil de 1916, segundo Gonçalves (2008, p. 38) atualmente todos são apenas filhos, uns havidos fora do casamento, outros em sua constância, mas com direitos e qualificações. O Enunciado do CC 1.596 atual reitera o princípio da igualde dos filhos, que diz que os filhos de origem biológica e não biológica têm todos os direitos e qualificações, proibindo qualquer discriminação.

No Direito brasileiro a filiação é provada mediante certidão do Registro de Nascimento, o CC 1.603 dispõe que “a filiação prova-se pela certidão de termo de nascimento registrada no Registro Civil”, devendo conter os dados exigidos no art. 54 da Lei n. 6.015/73, que versa sobre os Registro Públicos, discriminados em nove itens, que prova não só o nascimento como também a filiação, a citada Lei nos arts. 50 e 52, preveem que todo nascimento ocorrido no território nacional seja levado a registro, no lugar em que tiver ocorrido o parto ou no lugar da residência dos pais, dentro do prazo de quinze dias. 

A paternidade é menos assumido voluntariamente ou imposto por lei no interesse da formação integral da criança e do adolescente e que se consolida na convivência familiar duradoura. O estado brasileiro, de modo a assegurar as garantias mínimas e os direitos fundamentais do cidadão, com maior interesse aos menores, exigiu a elaboração de normas.

O direito à paternidade está à luz do Estatuto da Criança e do Adolescente que no seu artigo 3º ressalta os direitos inerentes às crianças e adolescentes: “Art. 3º. A criança e o adolescentes gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei. Assegurando-se, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições deliberadas e de dignidade.

[...] 

De modo que, ao conceder o direito de conhecer sua verdadeira identidade genética, tem-se o exercício pleno do direito de personalidade, direito personalíssimo do filho, sendo impossível de obstacularização dos pais. Segundo Domingos Filho (2012, p. 203), “a filiação é um direito público subjetivo indisponível, em relação aos quais os titulares não têm qualquer poder de disposição’.

O reconhecimento dos filhos havidos fora do casamento é irrevogável e pode ser feito no registro de nascimento por escritura pública ou particular, a ser arquivado na serventia por testamento ainda que incidentalmente manifestado, ou por manifestação direta e expressa perante o juiz, ainda que o reconhecimento não haja sido o objeto único e principal de ato que o contém (CC 1.609).

[...]

São diversas as formas pelas quais esse negócio jurídico pode se apresentar, expressamente   previstas   no   CC  1.609,   quais   sejam,  o  registro   do nascimento;  a  escritura  pública  ou  escrito  particular,  a  ser  arquivado  em  cartório;  o testamento,   ainda   que   incidentalmente   manifestado;   a   manifestação   direta   e expressa perante o juiz, ainda que o reconhecimento não haja sido o objeto único e principal do ato que o contém. Dentre  os  diversos  meios  de  reconhecimento  de  filho,  que  os  Provimentos n. 12/2010  e  26/2012  da  Corregedoria  Nacional  de  Justiça  instituíram  o  Projeto  Pai Presente,  uma  campanha  nacional  que  mobilizou  o  Poder  Judiciário  para,  em convênio com rede de ensino, inserir o nome dos pais nos registros das crianças, da maneira  inteligente,  o  meio  utilizado  para  descobrir  quais  são  as  crianças  sem  o nome do pai e como encontrá-las foi a matrícula escolar delas. O  CC  menciona  que o  reconhecimento  tem  por  objeto filhos  havidos fora  do casamento,  no  entanto,  essa  expressão  legal  não  exclui  a  possibilidade  de  se reconhecer os filhos havidos no casamento, pois ela deve ser interpretada em conformidade com o comando constitucional de igualdade entre os filhos.

[...]

São diversas as formas pelas quais esse negócio jurídico pode se apresentar, expressamente   previstas   no   artigo   1.609   do   CC,   quais   sejam,  o  registro   do nascimento;  a  escritura  pública  ou  escrito  particular,  a  ser  arquivado  em  cartório;  o testamento,   ainda   que   incidentalmente   manifestado;  a  manifestação  direta  e expressa perante o juiz, ainda que o reconhecimento não haja sido o objeto único e principal do ato que o contém.

Dentre  os  diversos  meios  de  reconhecimento  de  filho,  que  os  Provimentos n.12/2010  e  26/2012  da  Corregedoria  Nacional  de  Justiça  instituíram  o Projeto  Pai Presente,  uma  campanha  nacional  que  mobilizou  o  Poder  Judiciário  para,  em convênio com rede de ensino, inserir o nome dos pais nos registros das crianças, da maneira  inteligente,  o  meio  utilizado  para  descobrir  quais  são  as  crianças  sem  o nome do pai e como encontrá-las foi a matrícula escolar delas. 

O  CC  menciona  que o  reconhecimento  tem  por  objeto filhos  havidos fora do casamento,  no  entanto,  essa  expressão  legal  não  exclui  a  possibilidade  de  se reconhecer  os  filhos  havidos  no  casamento,  pois  ela  deve  ser  interpretada  em conformidade com o comando constitucional de igualdade entre os filhos. Compreende-se  facilmente  a  razão  pela  qual  consta  da  lei  essa expressão - filhos havidos fora do casamento - quando se toma conhecimento da história recente da família brasileira e a origem do reconhecimento de filho.

A simples leitura do CC de 1916,   em   sua   redação   original,   demonstra   a importância   do instituto   do casamento,  como  único  meio  de  se  constituir  uma  família:  a  família  legítima,  com suas nítidas feições patriarcais, então predominantes. Os  filhos  havidos  fora  do  casamento  eram  discriminados,  considerados ilegítimos e não tinham os mesmos direitos que os filhos legítimos. Nessa época, a forma  mais  comum  de  se  lançar  o  nome  do  pai  no  registro  de  nascimento  era  por meio da certidão de casamento, documento essencial para comprovar a legitimidade da família, situação inconcebível e inconstitucional nos dias de hoje, para filhos que não tiveram a graça de nascer de pais casados, vigorava então o que o CC de 1916, artigo 355, denominava "reconhecimento de filho ilegítimo".

O  CC  vigente  trocou  a  expressão  "ilegítimo"  por  filho  "havido  fora  do casamento" (CC 1.607), usando a mesma expressão que já constava da Lei   Federal n. 8.560/92. Essa substituição da expressão soa como um eufemismo, pois mantém a discriminação, apenas utilizando-se de outra nomenclatura, desde a CF de 1988 a discriminação  entre  filhos  não  pode  substituir  no  ordenamento  jurídico,    que  seu artigo   227,   parágrafo   6º,   veda   categoricamente  designações   discriminatórias relativas à filiação, assegurado aos filhos os mesmo direitos e qualificações. 

Por outro lado, ao dizer filhos havidos fora do casamento, a lei tem um efeito didático,  tornando  clara  a  possibilidade  de  que  todos  os  filhos,  independentemente do  estado  civil  dos  pais,  possam  ser  reconhecidos.  Em  virtude  do  método  de interpretação  da  Lei  conforme  a  Constituição,  não  pode  se  ver,  nesta  dicção  legal, uma vedação ao reconhecimento de filhos havidos no casamento. O dispositivo legal visou   à   Inclusão   social   e   tem   um   caráter   igualitário,   não   poderia   agora   ser interpretado para excluir e discriminar.

É  possível  reconhecimento  de  filho já  falecido,  no  entanto,  é  necessário  que esse  filho  tenha  deixado  descendentes  (CC 1.609,  parágrafo  único).  Se  o  filho falecido não deixou descendentes, há uma forte  suspeita de que o reconhecimento de que o filho  seja fraudulento, pois aquele  que  o reconhecera   será herdeiro do falecido  que não  tenha  deixado  descendentes,  mas  apenas  a  ação  judicial  de  investigação  de paternidade ou declaratória de filiação. 

Também  é  possível  que  o  reconhecimento  de  filho  preceda  o  nascimento (CC 1.609, parágrafo único). A hipótese é importante para os pais que não são casados, já que, na eventualidade de o pai falecer antes do registro de nascimento,  a mãe terá como comprovar a paternidade ao Oficial de Registro Civil, mesmo que vivam em união estável, só lhe restará providenciar o registro de nascimento em seu nome  para,  posteriormente,  comprovar  a  paternidade  ou  a  união  estável  em processo judicial e, então, averbá-la no registro de nascimento.

Por  outro  lado,  ainda  que  seja  possível  reconhecer  o  filho,  é  possível reconhecer o filho antes de seu nascimento, não é possível reconhecer o filho antes do concebido. Ou seja, o ato de reconhecimento do filho deverá recair sobre um filho determinado, o que se faz pela indicação do nome da mãe e da data época provável do parto. Por  reconhecimento  de  filho,  é  possível  acrescentar  o  sobrenome  da  família paterna no sobrenome do filho reconhecido. O fundamento dessa alteração é que o sobrenome  é  direito  fundamental  da  pessoa  humana  que  identifica  o  ramo  familiar  do qual a pessoa descende, como no momento do registro de nascimento a pessoa teve esse direito negado, já que não havia paternidade estabelecida, por ocasião do reconhecimento abre-

se a possibilidade de adotar os sobrenomes paternos. No  entanto,  importante  atentar  que  não  é  possível  alterar  o  pronome,  nem excluir   sobrenomes,   é   possível   apenas   acrescentar   o   sobrenome   paterno.   É  possível,  também,  o  reconhecimento  de  filho  que    completou  a  maioridade,  no entanto, é necessário que o filho maior manifeste expressamente seu consentimento com o reconhecimento. (Jorge Roberto Vieira Aguiar Filho, Meriane Guedes Vieira e Carlos Alberto Ferri, Publicado no site: revistaunar.com.br/jurídica, artigo intitulado “Reconhecimento de Paternidade e suas implicações”, mencionando Revista Jurídica do Centro Universitário “Dr. Edmundo Ulson” – UNAR, Araras, v. 17, n. 01, p. 189-214, dez. 2017. DOI:10.18762/1983-5019.20170011 referente ao CC 1.609, acessado em 07.04.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.610.  O reconhecimento não pode ser revogado, nem mesmo quando feito em testamento. 

Na toada de Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, revogação é a retratação de manifestação de vontade. Uma vez declarada a filiação, não pode mais o próprio declarante arrepender-se do ato, i.é, não pode retirar a manifestação, por mero arbítrio, por mera vontade. A irrevocabilidade não exclui, no entanto, a possibilidade de anulação do reconhecimento com base em nulidade absoluta ou relativa. O caso mais frequente é o do erro, daquele que declara a paternidade na crença de que está vinculado geneticamente ao suposto filho. A descoberta posterior da inexistência de liame biológico pode, obedecidas certas condições, justificar a impugnação do vínculo. (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.610, acessado em 07.04.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Veja-se o Projeto de Lei n. 6613, de 2002, do Deputado Virgílio Guimarães, que

altera o CC 1.601 do novo Código Civil brasileiro, Lei n° 10.406, de 11 de janeiro de 2002. (A Comissão de Constituição e Justiça e de Redação - art. 24, II.):

O Congresso Nacional decreta: Art. 1º O art. 1.601 do novo Código Civil brasileiro, Lei n° 10.406, de 11 de janeiro de 2002, passa a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 1.601. Cabe ao marido o direito de contestar a paternidade dos filhos nascidos de sua mulher.

§ 1 ° Decai o direito a que se refere este artigo se o marido não ajuizar a ação no prazo de 4 anos a contar do dia em que tomou ciência do nascimento.

§ 2° Ajuizada a ação, os herdeiros do impugnante tem direito de prossegui-la."

Justificativa

Apesar de ter sido aprovado recentemente pelo Congresso Nacional, o novo Código Civil brasileiro, em razão da extensão e complexidade da matéria de que trata, não esta imune a criticas e sugestões.

Este fato foi reconhecido, inclusive, pelo próprio Relator, deputado Ricardo Fiuza, em diversas oportunidades, tal como na audiência pública, realizada em 13 de setembro de 2000, convocada especialmente para ouvir a ilustre Desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Maria Berenice Dias, e o Professor Titular de Direito Civil e Direito Romano da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, Álvaro Vilaça de Azevedo:

"(...) Ocorre que temos uma vocatio legis de doze meses, que trabalha favoravelmente. O entendimento da Comissão, dos Sub-Relatores é que, tão logo aprove-se o Código, devem apresentar os vários projetos que tramitam regimentalmente - não na forma de código - e aprová-los em caráter de urgência. 0 objetivo e que eles entrem em vigor concomitantemente ao encerramento da vacatio do novo Código.” 

A presente proposição visa alterar o art. 1.601 do novo Código Civil brasileiro que, contrariando a tradição do Direito Civil, revogou os prazos para o pai impugnar a paternidade do filho nascido do casamento.

0 código Civil de 1916 determina que o prazo para o marido contestar a paternidade dos filhos nascidos de sua mulher é de 2 meses, contados do nascimento, se estiver presente (art. 178, § 3°), ou de 3 meses, se estiver ausente do lar ou se Ihe for ocultado o nascimento, contados, respectivamente, do dia de seu retorno ou do que tomou conhecimento do fato (art. 178, § 40, I).

No projeto original, os prazos para o marido impugnar a paternidade dos filhos havidos de sua mulher eram os mesmos existentes no Código Civil de 1916, conforme os §§ 1 ° e 2°, do art. 1.610, do Projeto de Lei n° 634/75.

A atual redação, que proclama a imprescritibilidade da ação do marido para contestar a paternidade do filho matrimonial, resultou de emenda do relator, Deputado Ricardo Fiuza, que entendeu ser o prazo decadencial incompatível com a "imprescritibilidade das ações de estado" proclamada no art. 27, do Estatuto da Criança e do Adolescente".

Ocorre, que, em Direito, "prescrição" e "decadência" são institutos diferentes. As ações de estado, de fato, nunca foram suscetíveis de prescrição. Contudo, o direito de impugnar a paternidade sempre foi sujeito a prazos decadenciais.

Assim a em todos os países de cultura jurídica romano-germânica, nos quais há sempre prazos para o pai contestar a paternidade dos filhos matrimoniais. Em Portugal, por exemplo, o prazo e de 2 anos (Código Civil, art. 1.842), na Espanha, de 1 ano (Código Civil, art. 136), na Argentina, de 1 ano (Código Civil, art. 259), na Franca de 6 meses (Código Civil, art. 326).

Além disso, ao deixar de submeter a prazo o direito de contestar a paternidade dos filhos matrimoniais, discrimina-se estes frente aos não-matrimoniais e adotivos, que, na vigência do novo Código Civil não poderão ter a paternidade contestada, seja: a) por terem a paternidade reconhecida judicialmente, pela imutabilidade da coisa julgada; b) por terem sido reconhecidos voluntariamente, sendo irrevogável o reconhecimento (CC 1.609 e 1.610); c) em caso de adoção, por ser esta, logicamente, irrevogável (Lei n° 8.069, art. 48).

Ou seja, a vitaliciedade do direito, do pai, de impugnar a paternidade será ameaça exclusivamente voltada aos filhos matrimoniais, situado, obviamente, discriminatória e injusta.

E imperioso estabelecer limite temporal ao direito de impugnar a paternidade, como demonstrado pelo Professor Titular de Direito Civil da Faculdade de Direito da UFMG, João Baptista Villela: 'Todos os argumentos que militam em favor da prescrição - estabilidade das relações jurídicas, os limites da memória, a segurança, a certeza etc., - ganham aqui um especial e extremo relevo. Se a uma situação patrimonial modesta e reles já convém beneficiar com os favores da indisputabilidade prescricional, tornando-a preclusa e, portanto, imune a questionamentos, o que não dizer da paternidade, ela própria a encarnação do sólido e do permanente no universo afetivo de cada um?! Pai é o contraponto da fragilidade e da insegurança em que está irremediavelmente imersa a criança, com seus medos e desvalias. Pai é ainda o porto aonde ocorrem os adultos nas crises que o destino lhes propõe e de que nenhuma alma está livre. Morto, a imagem do pai continua a ser evocada e a cumprir seu misterioso destino de pensar as feridas do tempo. As ciências e as artes ditas da alma - psicologia, psiquiatria, psicanálise etc., - já insistiram ad nauseam na indispensabilidade de uma figura referencial permanente (Bezugsperson) a partir de cuja intervenção a criança constitui suas estruturas e se afirma em relação ao mundo"'.

A ausência de prazo para impugnar a filiação de filhos matrimoniais propiciará que pessoas em idade avançada possam ter sua filiação negada, por ausência de vinculo biológico, ainda que presentes os demais elementos da vida que caracterizam o rico e complexo fenômeno da paternidade. A certeza sobre a paternidade dos filhos matrimoniais somente estará assegurada após a morte do pai (e somente se ocorrida sem que esta tenha iniciado a ação, porque, caso contrario, os herdeiros do impugnante poderão continuá-la)!

A prazo decadencial de 4 anos , como propõe o autor, é mais longo do que o previsto no direito estrangeiro. Justifica-se, contudo, a ampliação do prazo, pela maior segurança aferição da "verdade biológica" que as modernas técnicas de "DNA" permitem e pela uniformização da matéria, sendo este o prazo previsto no novo Código Civil para a anulação do reconhecimento voluntário de filhos não-matrimoniais (art. 178) e, igualmente, o que tem o filho para impugnar o reconhecimento da filiação realizado quando de sua menoridade (art. 1.614).

Por tais motivos, propõe-se seja alterado o art. 1.601 do novo Código Civil brasileiro, Lei n° 10.406, de 11 de janeiro de 2002. (Deputado Virgílio Guimarães, extraído do site ghente.org/doc jurídico, Sala das Sessões, 23 de abril de 2002, acessado em 07.04.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Historicamente, o dispositivo não foi modificado no Senado Federal e na Câmara dos Deputados no período final de tramitação do projeto. A redação atual é a mesma do projeto. 

Em sua doutrina, para Ricardo Fiuza, a irrevogabilidade do reconhecimento da filiação decorre da importância desse ato jurídico, que não deve estar sujeito a mudanças, salvo por meio de decisão judicial a respeito. A irrevogabilidade do reconhecimento não obsta a declaração de sua anulação ou nulidade diante de falsidade ou erro da declaração, conforme dispõe o art. 1.604. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 822, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 07/04/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Art. 1.611. O filho havido fora do casamento, reconhecido por um dos cônjuges, não poderá residir no lar conjugal sem o consentimento do outro.

Seguindo com a iluminação dos autores Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o reconhecimento de filho não matrimonial pode gerar choque de interesses quanto à fixação do seu domicílio. A lei opta pelo interesse do cônjuge com o objetivo claro de evitar conflitos. A regulação estatal, no caso, no entanto, é excessiva. A uma, porque a irresignação de um dos cônjuges em receber o filho do outro suscita questionamentos sobre variedade de direitos de difícil composição em abstrato. Há colisão de princípios, pois a Constituição determina a proteção da família ao mesmo tempo em que determina sejam observados com prioridade os interesses de crianças e de adolescentes. Importa saber, no caso, se se trata de criança ou de adolescente. Importa o direito de propriedade: quem é proprietário do lar conjugal? A segunda, porque a restrição legal em análise não aponta para a solução da divergência.

A rigor, o referido questionamento, segundo o princípio da subsidiariedade, que protege as questões familiares de interferências do Estado e de particulares, deve ser deixada ao arbítrio dos interessados que estará atentos às consequências legais da opção que adotarem. (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.611, acessado em 07.04.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Seguindo o histórico • O presente dispositivo foi emendado no Senado Federal, substituindo-se a palavra “ilegítimo” pela expressão “havido fora do casamento, em obediência ao princípio constitucional que veda as designações discriminatórias no âmbito da filiação (Art. 227, § 6º ), não sofrendo, a partir dali, qualquer outra modificação.

Na dicção de Ricardo Fiuza em sua Doutrina • Em prol da harmonia nas relações conjugais, este dispositivo, que repete a regra constante do art. 359 do Código Civil anterior, condiciona a residência do filho havido fora do casamento e reconhecido por um dos cônjuges ao consentimento do outro, embora lhe devam ser prestados alimentos pelo respectivo genitor. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 822, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 07/04/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).