quinta-feira, 15 de julho de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.814, 1.815, 1.816 Dos Excluídos da Sucessão - VARGAS, Paulo S. R. vargasdigitador.blogspot.com

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.814, 1.815, 1.816
Dos Excluídos da Sucessão - VARGAS, Paulo S. R.
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Livro V – Do Direito das Sucessões - Título I – Da Sucessão em Geral
– Capítulo V – Dos Excluídos da Sucessão - (Art. 1.814 a 1.818)

 

Art. 1.814. São excluídos da sucessão os herdeiros ou legatários:

I — que houverem sido autores, coautores ou partícipes de homicídio doloso, ou tentativa deste, contra a pessoa de cuja sucessão se tratar, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente;

II — que houverem acusado caluniosamente em juízo o autor da herança ou incorrerem em crime contra a sua honra, ou de seu cônjuge ou companheiro;

III — que, por violência ou meios fraudulentos, inibirem ou obstarem o autor da herança de dispor livremente de seus bens por ato de última vontade.

Nos conhecimentos armazenados, este artigo corresponde ao art. 1.861 do Projeto de Lei n. 634/75. No período inicial de tramitação do projeto, na Câmara, o Relator Parcial, Deputado Celso Barros, apresentou subemenda retirando do inciso I o complemento nominal “crime” de homicídio, e, no inciso II, criticou o emprego do verbo “acusarem” — que podia referir-se a ato posterior à morte do autor da herança —, sugerindo a expressão “houverem acusado”, que ficou, afinal. No Senado, a emenda n. 47 1-R, do Senador Josaphat Marinho, incluiu no inciso I a expressão “coautores ou partícipes” e os termos “companheiro” e “ascendente”; no inciso II, a palavra “companheiro”. Ver art. 1.595 do Código Civil de 1916.

Inserindo as notas do relator, são os excluídos da sucessão os herdeiros e legatários que tiverem praticado atos criminosos, ofensivos e desabonadores, extremamente graves, contra a pessoa, a dignidade ou os interesses do autor da herança ou de membros da família deste.

Os casos em que pode ocorrer a exclusão da sucessão são só os apontados na lei, indicados exaustivamente nos três incisos do CC 1.814. A exclusão é uma pena civil. A interpretação dos dispositivos que a regulam tem de ser restrita — o que não quer dizer que se deva escravizar à letra da norma não se compartindo o tema com analogias e ampliações.

O inciso I trata da hipótese em que o herdeiro ou legatário praticou crime de homicídio doloso, ou tentativa de homicídio, contra a pessoa de cuja sucessão se trata, ou contra pessoas da família do hereditando: cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente.

O Código Civil francês, art. 727, Art. 1, e o português, art. 2.034, exigem a condenação criminal para que o indigno seja excluído da sucessão. Nem o Código Civil brasileiro de 1916, nem o presente, mencionam o pressuposto da condenação criminal. É possível, portanto, no juízo cível, ser verificada a situação e declarada por sentença a exclusão do indigno. Porém, se no juízo criminal ocorrer a absolvição do acusado, recorrendo-se em seu favor uma excludente de responsabilidade, não pode, no cível, pelo mesmo fato, ser excluído da sucessão, podendo invocar-se, inclusive, o CC 935: “A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal” (ver, ainda, CC 188 deste Código e art. 65 do Código de Processo Penal).

Podem ser excluídos, ainda, os herdeiros e legatários que houverem acusado caluniosamente em juízo o autor da herança ou incorrerem em crime contra a sua honra, ou de seu cônjuge ou companheiro.

Finalmente, consideram-se indignos de suceder os que, por violência ou meios fraudulentos, inibirem ou obstarem o autor da herança de dispor livremente de seus bens por ato de última vontade. São atitudes que afrontam um dos princípios do direito sucessório, que é o da liberdade testamentária. Quem usou de violência, física ou moral, pressão, fraude, artifícios maliciosos, impedindo, prejudicando ou obstando o autor da herança de fazer, modificar, revogar o testamento ou codicilo (CC 1.881), deve ser excluído da sucessão. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 937-38, CC 1.814, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 15/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Vinicius Pinheiro Marques e Isa Omena Machado de Freitas, em artigo intitulado Exclusão da sucessão por ato de indignidade – por um redimensionamento ético e hermenêutico do art. 1.814, I, do Código civil – dão ênfase à discriminação a que autores de crimes de infanticídio e induzimento, instigação ou auxílio a suicídio, não deveriam receber as heranças de suas vítimas, sendo necessária alteração no Código Civil.

Segundo os autores, a sucessão hereditária possui fundamento de ordem ética, qual seja, a afetividade real ou presumida do defunto ao herdeiro ou legatário. Tal afeição deve despertar e manter neste o sentimento de gratidão ou, pelo menos, o respeito à pessoa do de cujus. A ruptura dessa afetividade mediante a prática de atos inequívocos de desapreço, reprovável ou até mesmo delituoso para com o autor da herança, torna o herdeiro ou legatário indigno de recolher os bens hereditários.

Pode-se afirmar que o instituto da indignidade tem inspiração num princípio de ordem ética, uma vez que é repugnável à consciência da sociedade que uma pessoa suceda a outra, extraindo vantagem de seu patrimônio, depois de ter cometido contra aquela atos lesivos gravosos. Nesse sentido, é que o CC 1.814 enumera  nos seus respectivos incisos  os atos causadores de exclusão da sucessão por indignidade.

O presente artigo tem como objeto de estudo a norma contida no inciso I do CC1.814 ao dispor que serão excluídos da sucessão o herdeiro ou legatário que houver sido autor, coautor ou partícipe de homicídio doloso, ou tentativa deste,  contra a pessoa de cuja sucessão se tratar, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente.

Depreende-se do artigo em comento que, dos crimes contra a vida previstos no Capítulo I, Título I, da Parte Especial do Código Penal Brasileiro, somente será considerado como ato de indignidade para os fins sucessórios os tipos penais previstos como homicídio simples e o qualificado (vide art. 121, caput e §2º), bem como a tentativa destes. Atualmente, ficam excluídos como atos de indignidade as ações tipificadas pela lei penal como: i) homicídio culposo - art. 121, §3º; ii) induzimento, instigação ou auxílio a suicídio - art. 122; iii) infanticídio - art. 123.

Os manuais doutrinários de direito civil, assim como a jurisprudência dos tribunais brasileiros, têm firmado posição no sentido de que os incisos contidos no CC 1.814 é um rol taxativo, não comportando analogia ou interpretação extensiva, uma vez que representa norma restritiva de direito. Nesse viés, reside o problema central do presente artigo: permitir que autores de crimes de induzimento, instigação ou auxílio a suicídio (art. 122, CP) e de infanticídio (art. 123, CP) recebam heranças de suas vítimas estaria de acordo com o princípio da eticidade do Código Civil Brasileiro. Como hipótese, será sustentado que a regra descrita no inciso I do C 1.814 deste diploma necessita de um esforço hermenêutico para que seu sentido normativo seja de acordo com o princípio da eticidade, proibindo todo aquele que comete crime doloso contra a vida do de cujus receba a herança ou legado que teria direito se não tivesse cometido tal ato de indignidade.

[...]

Considerando que o método científico é a linha de raciocínio adotada no processo de pesquisa, tem-se que o presente artigo fundamenta-se no método dedutivo, pois, concernente com os ensinamentos de Lakatos e Marconi (1993) serão utilizadas premissas para, a partir delas, num processo de silogismo, chegar a uma conclusão logicamente decorrente das premissas. Ademais, a pesquisa desenvolvida será exploratória com abordagem qualitativa, cuja vertente metodológica é de procedimento bibliográfico teórico-documental, inicialmente sob um ângulo dogmático, mas com vistas a alcançar princípios do direito privado

[...]

A indignidade, nas palavras de Oliveira (1987, p. 93), “é a privação do direito hereditário imposta pela lei a quem cometeu certos atos ofensivos à pessoa, à honra e aos interesses do hereditando”.  Nesse sentido, Gama (2003) assevera que a exclusão por indignidade representa uma sanção civil aplicada ao vocacionado à sucessão (legítima ou testamentária), privando o indigno de receber a herança ou legado que teria direito se não houvesse cometido o ato.

Como lembra Monteiro (1998), o Direito de Família exerce influência na sucessão causa mortis, sobretudo no que decorre da afeição que o falecido deveria nutrir pelo herdeiro ou legatário, motivo pelo qual se este, por comportamentos ilícitos, menospreza o falecido, demonstra seu desapreço e ausência de afeto, e praticando atos ilícitos e reprováveis, deve ser privado da herança ou legado que lhe caberia não fosse a imposição da pena civil de exclusão da sucessão.

Não obstante às relações de afeição e presunção de vontade afirmados por diversos autores, Nader (2010) deixa evidente o caráter social e ético ao mencionar que a hipótese do inciso I do CC 1.814 provém do provérbio alemão blutige hand nimmt kein erb (mão ensanguentada não recolhe) e da máxima francesa on n’herite pas de ceux qu’on assassine (ninguém herda dos que assassina).

Hironaka (2007) destaca que na exclusão da sucessão por ato de indignidade há uma razão subjetiva de afastamento, uma vez que o herdeiro é considerado, por sua infeliz atitude praticada, como desprovido de moral para receber a herança, ficando obstaculizado de receber a herança. Desta forma, conforme elucida Gonçalves (2007), a exclusão por indignidade não se confunde com a falta de legitimidade para suceder, já que esta impede que surja o direito à sucessão, sendo, portanto, de ordem objetiva.

A exclusão do herdeiro ou legatário por indignidade não é arbitrária nem se dá ipso jure. É necessário que se tenha ação ordinária (declaratória) para o pronunciamento da indignidade. A decisão judicial proferida, ao que preleciona Diniz (2007), produz os seguintes efeitos. Os descendentes do excluído o sucedem, por representação, como se o indigno já fosse falecido na data da abertura da sucessão, numa clara demonstração dos efeitos ex tunc da sentença que declara a indignidade. Com isto fica enaltecido o princípio constitucional da responsabilidade pessoal (art. 5, inciso XLV, CF/88) e expresso no brocardo latino nullum patris delictum innocenti filio poena est. Ademais, o excluído da sucessão não terá direito ao usufruto e à administração dos bens que a seus sucessores couberem na herança, ou à sucessão eventual desses bens.

Reforçando a natureza jurídica da exclusão por ato de indignidade como presunção de conduta do ofendido ante ao ato de ingratidão cometido pelo herdeiro ofensor, Cahali e Hironaka (2012) reforçam que no direito vigente é possível a reabilitação do indigno se for perdoado pela ofensa praticada. O perdão, todavia, é ato exclusivo do ofendido, único em condições de aferir a intensidade do ato considerado indigno pela lei civil.

Cinge-se a questão se ao inciso I do CC 1.814 caberia uma interpretação no sentido de alcançar outras condutas criminosas que atentem contra a vida do autor da herança, como o auxílio, instigação e induzimento ao suicídio e até mesmo o infanticídio (art. 122 e 123, ambos do CP), uma vez que a lei civil foi clara ao dizer homicídio (art. 121, CP).

Dias (2011), conclui que é uníssona a doutrina em reconhecer como taxativa a enumeração legal do supra citado artigo do Código Civil, constituindo numerus clausus, de modo não ser possível identificar fatos outros como indignos. E mais, destaca a autora que o fundamento para esta interpretação restritiva é porque as condutas que levam à exclusão do direito sucessório são tipificadas no âmbito o direito penal, onde vigora o princípio de proibição da analogia in malam partem, ou seja, contra o autor do delito. Vinicius Pinheiro Marques e Isa Omena Machado de Freitas, em artigo intitulado Exclusão da sucessão por ato de indignidade – por um redimensionamento ético e hermenêutico do art. 1.814, I, do Código civil – publicado no site jus.com.br, em agosto de 2014, acessado em 15/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No lecionar de Guimarães e Mezzalira, todos os filhos nascem com o direito de receber a herança. Eles têm a capacidade sucessória passiva, mas podem perde-la, se praticarem determinados atos previsto na lei.

Embora a herança seja patrimônio, além do vínculo sanguíneo deve prevalecer o respeito, o amor, a convivência harmoniosa. Mas o respeito é o maior deles. Se o herdeiro praticar atos contra a vida, a honra ou a liberdade de testar do autor da herança, poderá perder sua capacidade sucessória, permanecendo, contudo, como herdeiro. Em poucos palavras, tinha a capacidade, mas a perdeu.

Os atos são divididos em três níveis. O mais sério é o homicídio doloso, ou tentativa deste, bem como coautor, idealizador do ato negativo contra o titular do patrimônio, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente. Exige-se o respeito bem amplo.

Contudo, a perda do direito à herança deve ser revestido de dolo. O homicídio doloso, intenção de matar ou preterdoloso, retira do herdeiro o direito de receber a herança. Diz-se que ele tem o direito, mas o perdeu. Sendo o ato simplesmente culposo, o herdeiro não será punido. A vida se reveste da maior importância para o ser humano. (Nesse sentido Enneccerus, Decrecho de Sucesiones, in Enneccerus, Kipp, Wolf, Barcelona, Bosch, 1976, v. 2, Maximiliano, Carlos, Direito das sucessões, rio de Janeiro, Freitas Bastos, 2ª ed., CATEB, Salomão de Araújo, Deserdação e indignidade no Direito Sucessório brasileiro, Belo Horizonte, Del Rey, 2004).

A segunda hipótese prevista na lei é a acusação caluniosa, praticada em juízo bem como todos os crimes contra a honra, quais sejam, calúnia, difamação e injúria. Caracterizada a ação praticada e condenado o herdeiro, será, automaticamente, excluído pelo juízo do inventário.

A outra configuração contida na lei é a soberana vontade do titular do patrimônio de poder fazer, livremente, seu testamento. Se ele é impedido pelo herdeiro ou este evita o seu cumprimento poderá, igualmente, ser excluído do processo sucessório.

Jurisprudência: Indignidade de herdeiro necessário. Homicídio do autor da herança. Ação declaratória. Legitimidade ativa do Ministério Público. Inteligência do art. 1.815 do CC/02. Coerdeiros, ademais, que são menores. Preservação de seus interesses, indisponíveis. Sentença mantida. Recurso desprovido. TJSP – Relator: Cláudio Godoy; Comarca: Theodoro Sampaio; Órgão julgador: 1ª Câmara de Direito Privado; Data do Julgamento: 25/10/2011; DR: 28/10/2011.

Direito de sucessões. Exclusão da sucessão. Herdeiro. Homicídio doloso praticado contra cônjuge. Possibilidade. Exclusão da meação. Impossibilidade. 1. Podem ser excluídos da sucessão por indignidade os herdeiros e legatários, “ex vi” do CC 1.814. 2. A meação pertence ao cônjuge por direito próprio, sendo inviável, portanto, a extensão da pena de exclusão do cônjuge herdeiro, em razão de indignidade (CC 1.814, I), ao direito do réu decorrente do regime de bens adotado no casamento. 3. Recurso parcialmente provido (TJMG – Apelação Cível 1.00240080957264-8/001, Relator: Des. Edgard Penna Amorim, 8ª Câmara Cível, J. 22/07/2010, PS. 29/10/2010). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.814, acessado em 15/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.815. A exclusão do herdeiro ou legatário , em qualquer desses casos de indignidade, será declarada per sentença.

Parágrafo único.  O direito de demandar a exclusão do herdeiro ou legatário extingue-se em quatro anos, contados da abertura da sucessão .

Este artigo corresponde ao art. 1.862 do Projeto de Lei n. 634/75. Ver arts. 1.596 e 178, § 9º , IV, do Código Civil de 1916.

Segundo os comentários do relator, Ricardo Fiuza, apesar de ter praticado algum daqueles atos taxativamente enumerados no artigo anterior — ainda que seja o de maior graveza e que enseja a maior repulsa, o homicídio doloso —, a exclusão do herdeiro não se opera ipso jure, não se dá de pleno direito, não ocorre por força exclusiva da lei. Há necessidade de ser intentada ação, com o objetivo de excluir o prevaricador, e a pena civil, com o reconhecimento da indignidade, tem de ser declarada em sentença judicial.

O Código Civil de 1916, art. 1.596, menciona que a ação só pode ser movida por quem tenha interesse na sucessão — o coerdeiro, o legatário, por exemplo. O Código de 2002 não faz a ressalva. Terá havido mero esquecimento, simples omissão ou mudança de entendimento do legislador. Verdadeira a última hipótese, se o ato praticado é criminoso, estar-se-ia legitimado o Ministério Público.

Observe-se que o Senador Fernando Henrique Cardoso, quando o projeto tramitava no Senado Federal, através da Emenda n. 357, pretendeu acrescentar o § 2º a este artigo, com a redação seguinte: “Não existindo herdeiro legítimo ou testamentário, legitimado para a propositura da ação, a mesma competirá ao Ministério Público”, explicando que não seria justo nem moral que o indigno se aproveitasse, por ausência de quem possa promover a sua exclusão judicial da herança ou legado recebidos, daquele que sofreu o ato de indignidade. Ao relator-geral, Senador Josaphat Marinho, porém, pareceu excessivo conceder tal poder ao Ministério Público, alegando que este teria até dificuldade de obter provas idôneas para o procedimento judicial. A emenda do Senador Fernando Henrique foi rejeitada, lamentavelmente. Ficou o Código sem previsão expressa, o que não exclui, a meu ver, com base nos princípios gerais, a atuação do MP, até por ser este o guardião da ordem jurídica (CF, art. 127), e há, sem dúvida, interesse público e social de evitar que um filho desnaturado que assassinou seu próprio pai, venha a se beneficiar da fortuna que este deixou, por falta de algum outro herdeiro ou interessado em mover a ação para excluir da sucessão o parricida. Eventualmente , essa herança pode até caber ao Poder Público, no caso de não existirem outros parentes, cônjuge ou companheiro do de cujus.

O direito de ingressar com a ação, com vistas à exclusão do herdeiro ou legatário, está submetido a prazo de decadência, de quatro anos, contados da abertura da sucessão. Esgotado esse prazo, a demanda não pode mais ser apresentada, e a situação se consolida. O herdeiro não pode mais ser atacado.

A ação tem de ser proposta em vida do que praticou o ato passível de exclusão da herança. Se ele morrer antes de ter sido iniciada a ação, esta não é mais possível, embora possa prosseguir, se foi apresentada antes de o indigno falecer. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 938-39, CC 1.815, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 15/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Cláudio Pagano, em artigo de 17 agosto de 2009, intitulado “Exclusão da sucessão por indignidade e sua aplicação ao herdeiro ou legatário incapaz”, Trata da possibilidade de aplicação da pena de exclusão da sucessão ao inimputável pela prática das infrações apontadas na legislação civil.

Do preceito supramencionado deduz-se que a exclusão do herdeiro ou do legatário da sucessão tem natureza jurídica de penalidade civil, decorrente de falta grave cometida por aqueles contra o autor da herança ou pessoa de sua família.

Quanto às faltas graves a ensejar a exclusão, tem-se: i) homicídio (doloso) ou sua forma tentada contra o autor da herança, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente; ii) crimes contra a honra: denunciação caluniosa, calúnia, difamação ou injúria contra o autor da herança, seu cônjuge ou companheiro; iii) criação de óbices à efetivação de legado ou testamento pelo autor da herança.

Portanto, tomando como exemplo o inciso I do CC 1.814, indiscutível que se um dos herdeiros for autor de homicídio doloso, ou de tentativa, contra a pessoa de cuja sucessão se tratar, ser-lhe-á imputada, como penalidade, a exclusão da sucessão, após o devido processo legal (já que para a concretização da exclusão, necessária se faz a instauração de processo próprio, na vara de sucessões, ou, na falta dessa, na vara cível (por se tratar de matéria de alta indagação, não se faz possível sua discussão nos autos do processo de inventário), com a propositura da ação no prazo decadencial de 04 anos (art. 1815, Parágrafo único, CC), contados da abertura da sucessão. (Cláudio Pagano, em artigo de 17 agosto de 2009, intitulado “Exclusão da sucessão por indignidade e sua aplicação ao herdeiro ou legatário incapaz”, publicado no site direitonet.com.br,  acessado em 15/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Guimarães e Mezzalira traz maior descrição, comparando a diferença entre indignidade e deserdação. Na primeira suposição podem ser excluídos os herdeiros e os legatários; na segunda, porém, somente os herdeiros e, mais precisamente, os necessários.

Contudo, é imperiosa a ação judicial declaratória, aforada por quem tenha capacidade processual ativa. Assim, por exemplo, se a sucessão se dá entre irmãos, somente um deles ou o filho de um premorto poderá ajuizar o feito. Se o herdeiro a ser excluído for um filho (sem descendentes) outro filho (irmão) deverá ser o autor da ação.

Efectivamente, para que el heredero sea excluido de la herencia por indigno se requiere que el mismo incusa en alguna causa legal de indignidad, lo que significa que tenga de incurrir en alguna de las causas expresas que contiene la ley. Cabe la posibilidad de que incurra en alguna causa legal que lo sea de acuerdo al espirito de aquella y no a su letra. Es obvio que lo óptimo resulta cuando aquel – el espirito de la ley, y esta – su letra – coinciden plenamente.” (Escobar, Maria Jose Mena-Bernal, La indignidad para suceder. Tirant lo bianch, Valencia, 1995, p. 68).

Jurisprudência: Agravo de instrumento. Inventario. Exclusão. Homicídio. A exclusão do herdeiro ou legatário, em caso de indignidade, será declarada por sentença, nos termos do CC 1.815. Recurso provido. (Agravo Instrumental n. 70051505394, 7ª Câmara Cível, TJRS, Relator: Liselena Schifino Robles Ribeiro. DJ 15/10/2012).

Parágrafo único. O direito de demandar a exclusão do herdeiro ou legatário extingue-se em quatro anos, contados da abertura da sucessão.

Interessante notar que o prazo decadencial de 4 (quatro) anos é contado da abertura da sucessão. Pode um filho ter tentado matar seu pai. Processou-se o inventário, com a partilha homologada e pagamento a cada um dos herdeiros. Todos ficaram em silêncio. Após provocação e desarmonia entre dois filhos, aquele que praticou o crime pode sofrer a ação de exclusão, dentro dos quatro anos, por qualquer outro filho, e o juiz do inventário  (se julgada procedente a ação declaratória) mandará que todos os herdeiros devolvam os bens, fazendo-se nova partilha, com exclusão daquele que foi condenado por tentativa de homicídio doloso. (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.815, acessado em 15/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

quarta-feira, 14 de julho de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.810, 1.811, 1.812, 1.813 Da Aceitação e Renúncia da Herança - VARGAS, Paulo S. R. vargasdigitador.blogspot.com

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.810, 1.811, 1.812, 1.813
Da Aceitação e Renúncia da Herança - VARGAS, Paulo S. R.
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Livro V – Do Direito das Sucessões - Título I – Da Sucessão em Geral
– Capítulo IV – Da Aceitação e Renúncia da Herança - (Art. 1.804 a 1.813)

 

Art. 1.810. Na sucessão legitima, a parte do renunciante acresce a dos outros herdeiros da mesma classe e, sendo ele o único desta, devolve-se aos da subsequente.

Este artigo corresponde ao art. 1.587 do Projeto de Lei n. 634/75. Ver art. 1.589 do Código Civil de 1916.

A afirmação do relator é de que, como será visto no artigo seguinte, o herdeiro que renuncia é considerado como se não tivesse sido chamado, como se nunca tivesse sido herdeiro.

Na sucessão legítima, a parte do renunciante acresce à dos outros herdeiros da mesma classe. Se o de cujus tinha quatro filhos, e um deles renuncia à herança, a quota do renunciante vai para os outros três filhos. Porém, se o renunciante era o único herdeiro de sua classe — tratava-se, por exemplo, do único filho do falecido —, a herança se devolve aos herdeiros da classe subsequente — os ascendentes do autor da herança, observado, entretanto, o artigo seguinte.

Na sucessão testamentária, a questão se resolve nos arts. 1.941 e 1.944 (direito de acrescer) ou no CC 1.947 (substituição). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 935, CC 1.810, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 14/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Ana Paula Domingues Garcia, em artigo intitulado “Renúncia de Herança”, publicado em fevereiro de 2021 no site jusbrasil.com.br, fala da renúncia à herança e o direito dos herdeiros do renunciante.

O jurista Veno Veloso traz um caso prático para estudo do tema o que ajuda na compreensão do tema renúncia dentro do direito brasileiro e mais especificadamente no direito de família já abordando o regime da comunhão universal de bens.

 

Antonio Macedo era casado no regime da comunhão universal de bens com Doralice, esta tinha 2 (dois) filhos de um casamento anterior. No fim de 2019, Manoelito Macedo, pai de Antonio, faleceu, deixando 3 (três) filhos: o referido Antonio, Maria das Graças e Reinaldo. Por uma série de problemas, o inventário não foi providenciado.

 

No mês de setembro de 2020, a esposa de Antonio faleceu, deixando 03 (três) filhos: os dois que ela trouxe de leito anterior, e Maria Nazaré, havida de seu casamento com Antonio.

 

Depois de várias reuniões e debates com seus irmãos, Antonio Macedo resolveu abrir mão da herança de seu pai, renunciar à mesma. Conforme lhe foi explicado por um advogado, considera-se o herdeiro renunciante `como se não tivesse existido`, e a quota hereditária que iria para ele acresce aos herdeiros da mesma classe, ou seja, vai para os irmãos dele (CC 1810), que integram, como o renunciante, a classe dos descendentes.

 

Mas os dois filhos do anterior casamento de Doralice tomaram conhecimento dessa negociação e mandaram dizer ao padrasto que não devia consumá-la, porque era ilegal, uma vez que eles, por sua vez, eram herdeiros da mãe, e esta morreu quando o marido já tinha herdado parte dos bens deixados pelo pai – Manoelito -, razão pela qual metade dessa herança era de Doralice, por força do regime da comunhão universal de bens (CC 1667), e por morte desta, seus filhos eram herdeiros da mesma.

 

No final das contas, segundo eles, Antonio Macedo queria renunciar à herança deixado pelo pai dele, Manoelito, mas a meação dessa quota era de Doralice. Finalmente, com a morte desta, o que ocorreu neste ano (2020) parte desses bens são de seus filhos.

 

A renúncia é o exercício de um direito potestativo; representa a perda voluntária da herança, funcionando, na prática, como se o renunciante jamais tivesse sido herdeiro, como se nunca tivesse existido, tanto assim, que ninguém pode suceder, representando herdeiro renunciante (CC  1811, primeira parte).

 

A transmissão hereditária que iria ocorrer, por força da “saisine” (CC art. 1784), tem-se por não verificada quando o herdeiro renuncia à herança (CC 1804, parágrafo único). O herdeiro que renuncia nunca foi herdeiro; quem renuncia deixa de ser herdeiro “ex tunc” ; o renunciante demite-se da qualidade jurídica de sucessor do morto. Neste sentido, o art. 2062 do CC português diz que os efeitos do repúdio da herança retrotraem-se ao momento da abertura da sucessão, considerando-se como não chamado o sucessível que a repudia (cf. art. 521 do CC italiano).

 

Desde que o herdeiro não tenha aceitado a herança – expressa ou tacitamente -, está autorizado a renunciar. A todo o tempo! Porém, se já aceitou, não tem mais como renunciar; e se renunciou, não pode aceitar, depois (CC 1812).

 

Quanto ao caso antes citado – que é complexo, instigante, o jurista Veno Veloso acha que os filhos da falecida esposa do renunciante, com quem este foi casado sob o regime da comunhão universal, não têm razão e nenhum direito a reclamar. Se o herdeiro renuncia, o efeito da renúncia se projeta para a data da abertura da sucessão. O renunciante é considerado como se jamais tivesse herdado, nunca houve transmissão de bens hereditários em favor dele. E se o herdeiro nada adquiriu, patrimonialmente, não sendo dono de nenhuma parte do acervo mortuário, seu cônjuge também não é meeiro. Não há meação do nada...


Fazendo um paralelo ao instituto da representação, se um herdeiro renuncia à herança, é como se nunca tivesse existido. Logo, seus descendentes não podem representá-los. Apenas herdam por direito próprio se não houver outros sucessores do mesmo grau do renunciante. (Ana Paula Domingues Garcia, em artigo intitulado “Renúncia de Herança”, publicado em fevereiro de 2021 no site jusbrasil.com.br.  Acessado em 14/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Lecionando Guimarães e Mezzalira, os herdeiros são chamados para recolher a herança de acordo com sua classe. A explicação é lógica; se todos os descendentes tivessem o direito de receber herança de um ascendente falecido, haveria tumulto na divisão do patrimônio. Dessa forma, primeiro é chamada a classe dos filhos e todos terão o mesmo direito. Não os havendo, serão chamados os netos, parentes em segundo grau e formando outra classe e, assim, sucessivamente.

 

Se o falecido deixou um único filho, com sua morte serão chamados os outros descendente (netos) ou outra classe, como, por exemplo, não havendo descendentes serão chamados os ascendentes. Não os havendo, receberá o cônjuge sobrevivente,    qualquer que seja o regime de bens; não havendo, serão chamados os colaterais até o 4º grau.


Jurisprudência: Agravo de instrumento. Arrolamento. Decisão determinou a juntada da certidão de óbito sob o argumento de que com a renúncia os direitos sucessórios se transmitem aos herdeiros netos e decidiu pela juntada da documentação necessária à habilitação. Herdeiro renunciante não é o único filho e herdeiro legítimo rfb “de cujus”. Existência de mais três herdeiros da mesma classe. Parte atinente ao herdeiro renunciante, portanto deverá ser acrescida à dos demais herdeiros. Exegese do artigo 1.810 do Código Civil. Regularização da documentação necessária a habilitação não deve ser mantida. Determinação que afronta o CC 1.810. recurso provido. (TJSP. Relator: Oldemar Azevedo; Comarca: São Paulo; Órgão julgador: 5ª Câmara de Direito Privado; DJ 09/04/2008; DR: 15/04/2008; outros números: 5645774000). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.810, acessado em 14/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.811. Ninguém pode suceder, representando herdeiro renunciante. Se, porém, ele for o único legitimo da sua classe, ou se todos os outros da mesma classe renunciarem a herança, poderio os filhos vir à sucessão, por direito próprio, e por cabeça.

Este artigo corresponde ao art. 1.858 do Projeto de Lei n. 634/75. Ver art. 1.588 do Código Civil de 1916.

Analogicamente o relator comenta que se o herdeiro renuncia à herança, ninguém pode suceder no lugar dele, pelo direito de representação (CC 1.851). A parte do renunciante acresce à dos outros herdeiros da mesma classe, ou se devolve aos da subsequente, se o que renunciou era o único herdeiro de sua classe (CC 1.810).

Pode ocorrer de o renunciante ser o único legítimo de sua classe, ou de todos os outros da mesma classe renunciarem a herança. Aí, poderão os filhos vir à sucessão, não pelo direito de representação, mas por direito próprio, e por cabeça. Assim, o filho único do de cujus, que renunciou à herança, pode ter filhos, que são netos do falecido. Esses netos virão à sucessão, não como representantes do renunciante, mas por direito próprio, e por cabeça. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 936, CC 1.811, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 14/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No Direito Brasileiro, apresentado no site Jusbrasil.com.br, publicado em dezembro de 2020, Intitulado: Renúncia de Herança – Efeitos, por nada menos Zeno Veloso, Jurista:

Antonio Macedo era casado sob o regime da comunhão universal de bens com Doralice, que tinha dois filhos de um casamento anterior. No fim do ano passado (2019), Manoelito Macedo, pai de Antonio, faleceu, deixando três filhos, o referido Antonio, Maria das Graças e Reinaldo. Por uma série de problemas, com relação a identificação de bens, de contas correntes etc. e por falta de dinheiro para pagar imposto, advogado, custas, o inventário não foi providenciado.

 

No mês de setembro, deste ano, vítima de um infarto, a esposa de Antonio faleceu, deixando três filhos: os dois que ela trouxe de leito anterior, e Maria Nazaré, havida de seu casamento com Antonio. Depois de várias reuniões e debates com seus irmãos, Antonio Macedo resolveu abrir mão da herança de seu pai, renunciar à mesma. Conforme lhe foi explicado por um advogado, considera-se o herdeiro renunciante “como se não tivesse existido”, e a quota hereditária que iria para ele acresce aos herdeiros da mesma classe, ou seja, vai para os irmãos dele (CC 1.810), que integram, como o renunciante, a classe dos descendentes.

 

Mas os dois filhos do anterior casamento de Doralice tomaram conhecimento dessa negociação e mandaram dizer ao padrasto que não devia consumá-la, porque era ilegal, uma vez que eles, por sua vez, eram herdeiros da mãe, e esta morreu quando o marido já tinha herdado parte dos bens deixados pelo pai - Manoelito -, razão pela qual metade dessa herança era de Doralice, por força do regime da comunhão universal de bens (CC 1.667), e por morte desta, seus filhos eram herdeiros da mesma. No final das contas, segundo eles, Antonio Macedo queria renunciar à herança deixada pelo pai dele, Manoelito, mas a meação dessa quota era de Doralice. Finalmente, com a morte desta, o que ocorreu neste ano (2020) parte desses bens são de seus filhos.

 

Uma das normas capitais do Direito das Sucessões brasileiro é o CC 1.784: "Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários". Então, por força de um princípio que se chama "saisine”, a propriedade dos bens deixados pelo falecido transmite-se, desde logo, aos herdeiros. Três fatos de grande importância ocorrem num só e mesmo momento: a morte do autor da herança, a abertura da sucessão e a transmissão aos herdeiros dos bens que compõem o acervo.

 

Mas o Código Civil prevê que, não obstante, a herança tem de ser aceita, o que torna definitiva a sua transmissão ao herdeiro (CC 1.804, caput). Todavia, o herdeiro pode renunciar à herança, abrir mão dela, repudiá-la, e, neste caso, tem-se por não verificada aquela transmissão decorrente do princípio da "saisine", prevista no CC 1.784.

 

A renúncia é o exercício de um direito potestativo; representa a perda voluntária da herança, funcionando, na prática, como se o renunciante jamais tivesse sido herdeiro, como se nunca tivesse existido, tanto assim, que ninguém pode suceder, representando herdeiro renunciante (CC 1.811, primeira parte).

 

A renúncia é negócio jurídico voluntário, unilateral, não receptício, gratuito, solene, incondicional, inatermável, irrevogável. Tem efeito retroativo, "ex tunc”, projeta-se para o passado, vai à data da morte do autor da herança e da abertura da sucessão.

 

A transmissão hereditária que iria ocorrer, por força da saisine (CC 1.784), tem-se por não verificada quando o herdeiro renuncia à herança (CC 1.804, parágrafo único). O herdeiro que renuncia nunca foi herdeiro; quem renuncia deixa de ser herdeiro ex tunc; o renunciante demite-se da qualidade jurídica de sucessor do morto. Neste sentido, o art. 2062º do Código Civil português diz que os efeitos do repúdio da herança retrotraem-se ao momento da abertura da sucessão, considerando-se como não chamado o sucessível que a repudia.

 

Renúncia translativa ou renúncia "em favor de alguém” não existe. Isto seria uma cessão de direitos. A renúncia no sentido jurídico, próprio, é sempre abdicativa. Sobre a mesma não incide imposto de transmissão "mortis causa". Para o lugar do renunciante não vão as pessoas que ele quer ou indica, mas vão os herdeiros que a lei menciona (CC  1.810).

 

Desde que o herdeiro não tenha aceitado a herança - expressa ou tacitamente -, está autorizado a renunciar. A todo o tempo! Porém, se já aceitou, não tem mais como renunciar; e se renunciou, não pode aceitar, depois (CC 1.812).


Quanto ao caso citado neste artigo - que é complexo, instigante, e estou vendo pela primeira vez uma situação dessas -, acho que os filhos da falecida esposa do renunciante, com quem este foi casado sob o regime da comunhão universal, não têm razão e nenhum direito a reclamar. Se o herdeiro renuncia, o efeito da renúncia se projeta para a data da abertura da sucessão. O renunciante é considerado como se jamais tivesse herdado, nunca houve transmissão de bens hereditários em favor dele. E se o herdeiro nada adquiriu, patrimonialmente, não sendo dono de nenhuma parte do acervo mortuário, seu cônjuge também não é meeiro. Não há meação do nada. (No Direito Brasileiro, apresentado no site Jusbrasil.com.br, publicado em dezembro de 2020, Intitulado: Renúncia de Herança – Efeitos, por nada menos Zeno Veloso, Jurista, professor de direito civil e direito constitucional da UFPA; doutor honoris causa da UNAMA; foi tabelião do 1º Ofício de Notas de Belém de 1966 até 2018; direito nacional para região Norte do IBDFAM, advogado e parecerista. Acessado em 14/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Também Guimarães e Mezzalira, contam situação análoga às anteriores, de Zeno Veloso, aqui adaptado, o mais sério efeito da renúncia é que ele não transmite para os seus descendentes. A lei quis dizer, em outras palavras, que o renunciante é como se nunca tivesse existido. Senão existiu, é claro que não poderia gerar e não teria sucessores.

Mas a lei abre uma exceção: quando todo os demais herdeiros da mesma classe são pré-mortos ou renunciarem, nessa hipótese os filhos recolherão a herança. Digamos que são três filhos do Sr. Antonio e Dª Maria, casados no regime de comunhão universal de bens.

Dois dos filhos são pré-mortos, mas não deixaram descendentes. Se o terceiro filho renunciar, serão chamados os seus sucessores (descendentes) e não os ascendentes, que estariam na classe seguinte.

Jurisprudência: Agravo de instrumento. Sucessão. Renúncia ao direito sucessório artigo 1.811 do Código Civil. Renúncia própria de todos os herdeiros de uma mesma classe implica em chamamento à sucessão dos filhos dos renunciantes herdeiros renunciantes que pretendem atribuir todos os bens do acervo hereditário à viúva meeira. Renúncia impropria (translativa). Dupla incidência de impostos. Recurso improvido. (TJSP – AI 2898422720118260000 SP 0289842-27.2011.8.26.0000, relator: Flavio Abramovich, DJ: 31/01/2012, 2ª Câmara de Direito Privado, DP 31/01/2012). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.811, acessado em 14/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.812. São irrevogáveis os atos de aceitação ou de renúncia da herança.

Este artigo corresponde ao art. 1.859 do Projeto de Lei n. 634/75. O Código Civil de 1916, art. 1.590, permite a retratação da aceitação e da renúncia, neste caso, quando proveniente de violência, erro ou dolo.

Seguindo orientação da doutrina do relator, o Código Civil de 1916, art. 1.590, permite a retratação da aceitação “se não resultar prejuízo a credores”, bem como afirmava ser “retratável ” a renúncia, quando proveniente de violência, erro ou dolo, portanto, de vícios do consentimento, e não seria caso de retratação, mas de anulação.

Este Código/2002 modifica a situação, inovando, e prescreve o princípio da irrevogabilidade, tanto da aceitação quanto da renúncia da herança. Parece que assim ficou melhor, atendendo as exigências da certeza e segurança do comércio jurídico (cf. arts. 2.061 e 2.066 do Código Civil português). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 936, CC 1.812, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Texto inspirado em uma consulta feita por um tabelião pernambucano. Acessado em 14/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Daniela Tamberlini Tenente, em artigo de 07 de Janeiro de 2015, publicado no site direitonet.com.br, intitulado “Aceitação e renúncia da herança”, lembra que o surgimento do direito sucessório pressupõe necessidade de dar continuidade, sequencia a uma série de direitos e obrigações que não se findam com a morte, e, apenas se transferem de uma pessoa a outra, resguardando as vontade do de cujus, enquanto vivo.

Segundo a autora, o direito à herança é uma garantia fundamental prevista na Constituição Federal em seu artigo 5º, XXX, e sua regulamentação é tratada pelo Código Civil no Livro V, a partir do artigo 1.784 até o artigo 2.027, dispondo principalmente sobre a renúncia, aceitação e cessão de direitos hereditários, que são os principais temas a seguir explanados.

[...]

A renúncia da herança é o ato em que o herdeiro abre mão de seus direitos como sucessor. Mesmo que feita em momento posterior, a renúncia produz efeitos ex tunc, retroagindo assim, a data da abertura da sucessão. Devida sua importante relevância ao direito sucessório, a renúncia é um ato solene que deve ser feito por escritura pública ou nos autos do processo de inventário, com a ratificação por parte do juiz.

Existem duas hipóteses de renuncia, quais sejam: a-) Renúncia própria: também conhecida como pura e simples, nesta modalidade de renúncia o herdeiro abre mão de seus direito hereditários, não fazendo qualquer menção a aquele que irá se beneficiar do seu direito ali descartado; b-) Renúncia imprópria: pode ser vista também como translativa, e ocorre quando o herdeiro renuncia em favor de alguém, desde que seja pessoa determinada. Pode ser vista propriamente como uma doação, conforme ensinam alguns doutrinadores, mas a lei a equipara ao ato de renunciar.

Na renúncia própria, o quinhão destinado ao herdeiro renunciante seguirá as regras da sucessão legítima ou testamentária, devendo ser analisada no caso concreto.

Pode-se dizer, que apesar de opostas, a aceitação e a renúncia possuem regras comuns entre si, como por exemplo, tanto o termo como a condição não são aceitos na aceitação nem na renúncia, porém terá por não escrito o termo, sendo somente válida a aceitação ou renúncia. Já na hipótese de condição, serão anulados tanto a condição quando a renúncia ou aceitação.

O artigo 1812, do Código Civil, declara que a aceitação e a renúncia são irretratáveis, mas há uma ressalva, pois ambas podem ser anuladas por erro, dolo, coação, desde que comprovados por ação judicial.

Caso haja falecimento do herdeiro antes de declarar se aceita a herança, este direito em aceitar ou renunciar a herança irá se transferir aos seus herdeiros, desde que estes aceitem a herança deixada pelo herdeiro falecido.

Neste compasso, resta considerar que o instituto da renúncia e aceitação são de suma importância ao direito hereditário, em razão de serem o primeiro passo para determinar a quem será atribuída a qualidade de herdeiro e sucessor, bem como para apontar o detentor dos direitos e obrigações na medida da herança, fazendo prevalecer sempre a última vontade do falecido. (Daniela Tamberlini Tenente, em artigo de 07 de Janeiro de 2015, publicado no site direitonet.com.br, intitulado “Aceitação e renúncia da herança”, inspirada em TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. Volume único. Ed. Método. 2014 e no VADE MECUM. Ed. Saraiva. 2013, Acessado em 14/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Em incursão de Guimarães e Mezzalira, essa providência tomada pelo legislador atual tornou mais estável o processo de inventário. Aceita ou renunciada a herança, o herdeiro não pode atrapalhar o andamento do feito, alegando mudança de posição. O ato jurídico é definitivo. “Malgrado a aceitação seja irrevogável e irretratável, não se impede uma eventual anulação judicial do ato jurídico de aceitação, se estiver maculado por algum defeito do negócio jurídico (erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão e fraude contra credores) na exteriorização da vontade – portanto, nos mesmos casos de anulação de qualquer negócio jurídico” (Farias, Cristiano chaves de; Rosenvald Nelson. Curso de Direito Civil, v. 07 – Sucessões. São Paulo: Atlas, 2015, p. 162).

Jurisprudência: Agravo regimental em agravo de instrumento. Aceitação tácita da herança e posterior renúncia em favor do monte. Irrevogabilidade do ato de aceitação da herança (art. 1.812 do CC). Natureza de cessão de direitos hereditários. Incidência do imposto devido (ITCD). Recurso improvido. (TJTJ- Agravo de Instrumento: AI 00169130420138190000 RJ 0016913-04-2013.8.19.0000, Relator: des. Plínio Pinto Coelho Filho. DJ: 11.12.2013. 14ª Câmara Cível). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.812, acessado em 14/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.813.  Quando o herdeiro prejudicar os seus credores, renunciando à herança, poderão eles, com autorização do juiz, aceitá-la em nome do renunciante.

§ 1º A habilitação dos credores se fará no prazo de trinta dias seguintes ao conhecimento do fato.

§ 2º Pagas as dívidas do renunciante, prevalece a renúncia quanto ao remanescente, que será devolvido aos demais herdeiros.

Este artigo corresponde ao art. 1.860 do Projeto de Lei n. 634/75, mas não tinha, originariamente, o § 1º , que foi introduzido por emenda, na Câmara dos Deputados, na fase inicial de tramitação do projeto. Ver art. 1.586 do Código Civil de 1916.

Como esclarece o relator, na forma do art. 391, pelo inadimplemento das obrigações respondem todos os bens do devedor. O CPC/1973, art. 591, correspondendo ao art. 789, Da Responsabilidade Patrimonial – Capítulo V, no CPC/2015, mesma redação,  dispõe que o devedor responde, para o cumprimento de suas obrigações, com todos os seus bens presentes e futuros, salvo as restrições estabelecidas em lei.

Quando o herdeiro prejudicar os seus credores, renunciando à herança, estes poderão, com autorização do juiz, aceitá-la em nome do renunciante. A habilitação dos credores se fará no prazo de trinta dias seguintes ao conhecimento do fato, e esse prazo é decadencial.

A possibilidade da aceitação da herança pelos credores do que renunciou à herança é uma forma de impedir expediente falacioso e fraudulento, garantindo aos credores a possibilidade de serem pagos com os bens da herança. É uma solução que se aproxima da ação pauliana, quando ocorre fraude contra credores (arts. 158 e 159).

Uma vez pagas as dividas do renunciante, se houver remanescente de sua respectiva quota, a sobra não vai beneficiar os credores, obviamente, nem passa para os herdeiros do renunciante, mas será devolvida aos demais herdeiros, observados, conforme ocaso, os arts. 1.810 e 1.811. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 936-37, CC 1.813, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Texto inspirado em uma consulta feita por um tabelião pernambucano. Acessado em 14/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Leandro Fialho publicou em 2020, no site jusbrasil.com.br, artigo intitulado “10 características específicas da Renúncia à herança”, e apresenta-se aqui, parte do artigo, qual diz respeito ao proposto CC 1.813:

[...] Além disso, antes de renunciar à herança, é importante que o herdeiro renunciante tenha ciência das principais características da renúncia: De acordo com o CC  1.808 , não existe renúncia parcial. Assim, ao renunciar, o herdeiro abrirá mão de todos os bens que lhe caberiam na partilha;

Nos termos do CC 1.806, “a renúncia da herança deve constar expressamente de instrumento público ou termo judicial”; Conforme o CC 1.812, a renúncia é um ato jurídico irrevogável, ou seja, o herdeiro não poderá voltar atrás após formalizar a renúncia;

A renúncia é um ato jurídico abdicativo, e, ao renunciar o quinhão hereditário que caberia ao herdeiro renunciante retorna para o montemor, que também é conhecido como monte partilhável ou monte total da herança;

Na renúncia à herança não há incidência de tributos ao herdeiro renunciante, uma vez que não houve a transferência dos bens deixados pelo falecido a ele. Assim, caberá aos demais herdeiros o pagamento do tributo pela transmissão causa mortis (ITCMD);

Só poderão renunciar aqueles herdeiros que se encontrarem em pleno gozo das suas capacidades civis. Caso contrário, ele não poderá renunciar à herança que lhe cabe;

Se o herdeiro renunciante for casado, ele precisará da anuência do seu cônjuge para renunciar. Exceto se forem casados pelo regime da separação de bens;

A renúncia não pode ser utilizada para prejudicar credores, nos termos do CC 1.813 . Assim, caso seja verificado que a renúncia foi feita com esse intuito, o credor poderá aceitá-la em nome do devedor, com autorização do juiz.

A renúncia retroage à data da morte do autor da herança, é como se o renunciante não existisse a partir de então. Dessa forma, caso sejam encontrados mais bens a partilhar, tal herdeiro não participará da sucessão.

Por fim o CC 1.811, estabelece que eventuais herdeiros do renunciante não terão direito de herdar por representação após o registro da renúncia do seu antecedente. Isso porque, como visto no item anterior, a partir da renúncia o renunciante é tido como se nunca fosse herdeiro, o que não gerará, por consequência, o direito de representar. (Leandro Fialho publicou em 2020, no site jusbrasil.com.br, artigo intitulado “10 características específicas da Renúncia à herança”. Acessado em 14/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Fechando o Capítulo IV, Guimarães e Mezzalira, prevalece o princípio da boa fé. Se o herdeiro não quer pagar a obrigação contraída, deixando de aceitar a herança ou renunciando-a, poderá esse credor intervir no processo e aceitar até a satisfação do seu crédito. Adimplida a obrigação,, permanece o remanescente como antes: o herdeiro tem a opção de aceitar ou renunciar.

Indagam alguns se isso é contrário à regra que a aceitação deve ser total. A jurisprudência e os doutrinadores, unanimemente, reafirmam que a força da lei é soberana, protegendo o credor de boa fé, que não pode ser lesado por ação de má fé do devedor-herdeiro.

Esse credor deve ajuizar a ação de cobrança em trinta (30) dias, seguintes ao conhecimento do inventário e o silêncio do devedor-herdeiro. Seu direito é restrito ao seu crédito, não podendo cobrar danos morais ou lucros cessantes anão ser em ação própria. Aqui, no inventário, é a prova ou título do seu crédito, aceitação pelo juiz e habilitação admitida para pagamento na hora certa.

Jurisprudência: Ementa: Apelação cível. Inventário. Herança. Renúncia. Aceitação pelo credor. Fato superveniente. Ineficácia da renúncia. Habilitação de crédito. Espólio. Partilha. Dívida do sucessor. Impossibilidade jurídica. 1. O credor do herdeiro renunciante pode aceitar a herança em nome dele, se a renúncia o prejudica. 2. A superveniência da decisão de ineficácia da renúncia torna juridicamente impossível o pedido de habilitação do inventário por dívida particular do sucessor. 3. Antes da partilha, só é cabível a habilitação dos credores do espólio. V. Apelação cível. Inventário. Aceitação de herança pelo credor em nome de herdeiro renunciante. Artigo 1.813 do Código Civil Brasileiro. Extinção do processo afastada. Recurso provido para determinar o prosseguimento do feito. O art. 1.813 do Código Civil brasileiro tem por finalidade coibir renúncia lesiva aos credores. Se há prejuízo com a renúncia, podem eles (os credores) aceitar a herança, em nome de seus devedores e herdeiros renunciantes, independentemente da verificação do “consilium fraudis”. Basta que, com o ato da renúncia, venha o herdeiro a prejudicar credores. A aceitação independe da propositura de ação revocatória ou pauliana, sendo suficiente que o credor a requeira ao juiz do inventário e que este autorize o ato. (TJMG – Apelação Cível 1.0313.10.025322-5/001, relator: Des. Peixoto Henriques, 7ª Câmara Cível, julgamento em 13/08/2013, publicação da súmula em 21/08/2013). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.813, acessado em 14/07/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).