segunda-feira, 6 de junho de 2022

Código Civil Comentado – Art. 243, 244 Da Obrigação de Dar Coisa Incerta – VARGAS, Paulo S. - digitadorvargas@outlook.com – paulonattvargas@gmail.com - Whatsap: +55 22 98829-9130 Facebook: VARGAS DIGITADOR

 

Código Civil Comentado – Art. 243, 244
Da Obrigação de Dar Coisa Incerta
VARGAS, Paulo S. - digitadorvargas@outlook.com
paulonattvargas@gmail.com - Whatsap: +55 22 98829-9130
Facebook: VARGAS DIGITADOR

Parte Especial Livro I Do Direito Das Obrigações

Título I Das Modalidades Das Obrigações

Capítulo I Das Obrigações de Dar

Seção II - Da Obrigação de Dar Coisa Incerta

(arts. 243 até 246)

 

Art. 243. A coisa incerta será indicada, ao menos, pelo gênero e pela quantidade.

 

A lucidez argumentativa de Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 243, p. 194 do Código Civil Comentado, claramente explica: A obrigação de dar coisa incerta só é possível se o credor e o devedor tiverem condições mínimas de identificar o bem a ser entregue. Essa identificação mínima reside na indicação do gênero e da quantidade. Verifique-se que tanto um quanto outro devem ser indicados, pois não se trata de requisitos alternativos, na medida em que a presença de apenas um deles não permitirá a escolha ou concentração - ato pelo qual se identifica a coisa incerta, que, neste momento, se torna certa e passa a ser regida pelas regras aplicáveis à obrigação de dar coisa certa. Basta imaginar que a obrigação de entregar cem sacas de café é obrigação de dar coisa incerta, pois não há especificação do tipo de café a ser entregue, de modo que diversos deles poderão representar o atendimento da prestação. Não é suficiente afirmar que o objeto da prestação é cem sacas (quantidade), sem especificar o gênero do produto, pois a obrigação será inexequível. Do mesmo modo, não basta dizer que deverão ser entregues sacas de café colombiano (gênero), sem a indicação da quantidade delas. Não sendo a prestação determinável - pelo gênero e pela quantidade -, ao menos haverá que reconhecer a invalidade do negócio nos termos do disposto nos arts. 166, II, c/c 104, II, do Código Civil. A obrigação de dar coisa incerta não se confunde com as obrigações alternativas (arts. 252 a 256 do CC), nas quais as prestações são especificadas e não se identificam apenas pelo gênero e pela quantidade. Essencialmente, nas alternativas, as prestações colocadas à escolha de um dos contratantes são, em si, certas e determinadas, não sendo, necessariamente, do mesmo gênero (Bierambaum , Gustavo, “Classificação: obrigações de dar, fazer e não fazer”. Obrigações: estudos na perspectiva civil-constitucional, coord. Gustavo Tepedino. Rio de Janeiro, Renovar, 2005, p. 133). (Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 243, p. 194 do Código Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406 de 10.01.2002, Coord. Ministro Cezar Peluzo Código Civil Comentado Cópia pdf, vários Autores: contém o Código Civil de 1916 - 4ª ed. Verificada e atual. - Barueri, SP, ed. Manole, 2010. Acessado em 19/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).

 

Na linha de raciocínio da Equipe de Guimarães e Mezzalira, para que as obrigações de dar coisa incerta sejam possíveis, deverão estar, cumulativamente, indicados, no título correspondente, o gênero e a quantidade do bem objeto da obrigação. Sem a presença de qualquer um deles, impossibilita-se o ato de escolha ou concentração, por meio do qual é identificada a coisa incerta, a qual, nesse momento, torna-se certa. Nesse aspecto, Pereira preleciona que “[o] estado de indeterminação é transitório, sob pena de faltar objeto à obrigação. O devedor não pode ser compelido à prestação genérica. Até o momento da execução, a obrigação de gênero deverá converter-se em entrega de coisa certa” (Pereira, Caio Mário da Silva. Teoria Geral das Obrigações, Rio de Janeiro: Forense, p. 56). Assim, nos casos em que não for possível proceder-se com a escolha, deverá ser decretada invalidade do negócio (CC arts. 104, II e 166, II). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 243, acessado em 19/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

No item 1.1.3. – Obrigações de dar coisa incerta, os autores Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, explicitam a caracterização da coisa incerta se dar per falta de individualização. O objeto do registro jurídico deve ser, pelo menos, determinável. Assim, a coisa deve ser determinada, pelo menos, pela sua espécie. No caso de obrigação de dar coisa incerta, costuma-se indicar, ainda, as medidas da coisa, como peso, quantidade e qualidade (ex.: vendo-lhe três sacos de espigas de milho grandes e de primeira). Para Nery Jr e Nery, a coisa incerta “é gênero, e seu objeto vem a ser determinado quando do adimplemento em ato de escolha. Se nada se convencionar, a escolha (ou concentração) cabe ao devedor (ex vi CC, 244), que terá a obrigação de entregar o meio-termo, nem o melhor, nem o pior. Uma vez feita a escolha, pelo devedor ou credor – se assim se tratou -, a coisa individualizada e a obrigação passa a ser de dar coisa certa (CC 245) (2005, p. 314).

 

Por tais razões, o art. 243 disciplina que a coisa incerta será indicada ao menos, pelo gênero e por quantidade. É necessário frisar, no entanto, que não se deve levar ao pé da letra (no sentido gramatical), a palavra gênero, utilizada pelo legislador do art. 243. De fato, o vocábulo gênero, em sentido biológico, ad esempio¸ é muito mais amplo do que o sentido que se quis empregar na norma. Veja-se, a título de esclarecimento, o exemplo citado pela doutrina de Álvaro Villaça de Azevedo:  [...] melhor seria, entretanto, que tivesse dito o legislador:  espécie e quantidade. Não: gênero e quantidade, pois a palavra gênero tem sentido muito mais amplo. Considerando a terminologia do Código, exemplarmente, o cereal é gênero e  o feijão espécie. Se, entretanto, alguém se obrigasse a entregar uma saca de cereal (quantidade: uma saca, gênero: cereal), essa obrigação seria impossível de cumprir-se, pois não se poderia saber qual dos cereais deveria ser o objeto da prestação jurídica. Neste termo, é melhor dizer-se: espécie e quantidade. No exemplo supra, seria: quantidade, (uma saca), espécie (de feijão). De maneira que, aí, o objeto se torna determinável, desde que a qualidade seja posteriormente mostrada (2000, p. 66). (Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, Volume Único. Item 1. Classificação legal das obrigações Item 1.1.3. Obrigações de dar coisa incerta, p. 619-620, Comentários ao CC. 243. Ed. JuspodiVm, 6ª ed., consultado em 19/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 244. Nas coisas determinadas pelo gênero e pela quantidade, a escolha pertence ao devedor, se o contrário não resultar do título da obrigação; mas não poderá dar a coisa pior, nem será obrigado a prestar a melhor.

 

Aqui, na visão do autor Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 244, p. 195 do Código Civil Comentado, esse dispositivo se aplica aos casos em que a coisa a ser entregue é determinada apenas pelo gênero e pela quantidade. Assegura que a escolha deverá ser feita pelo devedor, se o título não dispuser de modo diverso. Trata-se de norma de natureza dispositiva, uma vez que nada impede que as partes decidam atribuir a escolha ao credor ou à terceira pessoa. Nos casos em que o devedor é quem escolhe o bem a ser entregue, i. é, quem decide qual a coisa certa dentre as várias alternativas fixadas pelo gênero e pela quantidade, o dispositivo em exame estabelece que ele deverá optar pelo bem de qualidade intermediária, pois não poderá dar bem da pior qualidade, nem estará obrigado a dar da melhor. No tratamento do legado, no direito das sucessões, o Código Civil, em seu art. 1.929, estabelece que, se o legado foi determinado pelo gênero, a escolha será feita pelo herdeiro, que também deverá optar por bem de qualidade intermediária. O art. 1.930 determina que se aplique a mesma regra quando a escolha do legado for deixada ao arbítrio de terceiro ou, quando esse não quiser ou não puder exercer a escolha, do juiz. O art. 244 deve ser interpretado segundo o princípio de que o devedor deve escolher, entre as várias alternativas possíveis, um bem de qualidade intermediária (Pereira, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil, 20. ed., atualizada por Luiz Roldão de Freitas Gomes. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. II, p. 56). O fato de o artigo indicar que o devedor não pode escolher a coisa pior poderá dar ao intérprete a impressão de que ele está autorizado a entregar o penúltimo bem na ordem de gradação. Ou seja, havendo dez bens, o devedor pode escolher o que estiver em nono lugar em uma hipotética tabela de classificação. A interpretação que melhor atende à finalidade do dispositivo, contudo, é a que considera que ele estará sempre obrigado a entregar um bem de qualidade intermediária. Essa conclusão está adequada à boa-fé objetiva - o dever de agir como homem reto, leal e solidário, atento aos interesses do outro contratante (art. 422 do CC). Nada impede, porém, adverte Caio Mário, que as partes convencionem que será entregue o pior ou o melhor dentre as coisas do gênero (op. cit., p. 56). Gustavo Bierambaum, diz o autor, com razão, discorda de Sílvio Rodrigues e sustenta que também o credor que tiver a opção de escolha não poderá eleger o melhor dos bens disponíveis (“Classificação: obrigações de dar, fazer e não fazer”. Obrigações: estudos na perspectiva civil-constitucional, coord. Gustavo Tepedino. Rio de Janeiro, Renovar, 2005, p. 130). (Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 244, p. 195 do Código Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406 de 10.01.2002, Coord. Ministro Cezar Peluzo Código Civil Comentado Cópia pdf, vários Autores: contém o Código Civil de 1916 - 4ª ed. Verificada e atual. - Barueri, SP, ed. Manole, 2010. Acessado em 19/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).

 

Atente-se na visão da equipe de Guimarães e Mezzalira, facultar-se às partes a escolha tanto de quem deverá escolher, como no momento em que a escolha será realizada. Na falta de indicação precisa, a escolha caberá ao devedor e quedar-se-á concretizada no momento da entrega do bem.

 

Na individualização dos bens a serem entregues, inexistindo qualquer indicação precisa, deve-se escolher os bens que guardem as qualidades médias das coisas de seu gênero. Por questão de boa-fé (CC arts. 133 e 422), não poderá nem o devedor optar pelas piores, nem o credor exigir as melhores. (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 244, acessado em 19/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

No item 1.1.3.1. Concentração, os autores Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, assim se reportam: Concentração é o nome jurídico que se dá ao momento da escolha da coisa a ser entregue pelo devedor. Nesse momento, portanto, ocorre a individualização da coisa, que deixa de ser incerta.

 

O direito de escolha, em regra, pertence ao devedor (art. 244), a não ser que o contrário resulte do título da obrigação. Sendo o direito de escolha do devedor, este não poderá escolher a melhor.

 

Entendem alguns que, dada a proporcionalidade estabelecida pelo art. 244, seria o dispositivo aplicável também quando a escolha couber ao credor, o qual não poderia ser obrigado a receber a pior, tampouco poderia escolher a melhor (regra do gênero médio). Opinou-se, entretanto, em sentido contrário, pois o próprio legislador já cuidou de fixar a regra do gênero médio para os casos em geral, ao destinar a escolha, genericamente, ao devedor.

 

Com efeito, a escolha caberá ao credor somente quando resultar expresso do título da obrigação. Vale dizer, no silêncio do contrato, cabe a escolha ao devedor, que fica obrigado a prestar o gênero médio; se, diversamente, o contrato destina a escolha ao credor, significa que as próprias partes quiseram instituir em favor dele um direito de optar pelo objeto que mais lhe agrade, dentre os vários da espécie convencionada. Entender que o credor, mesmo sendo titular do direito de escolha, teria o dever de optar pelo gênero médio e engessar demasiadamente a autonomia da vontade das partes, pois, em sendo assim, pouco importaria a quem cabe essa escolha, pois a concentração sempre deveria se dar pela coisa média. (Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, Volume Único. Item 1. Classificação legal das obrigações Item 1.1.3.1. Concentração, p. 620, Comentários ao CC. 244. Ed. JuspodiVm, 6ª ed., consultado em 19/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

domingo, 5 de junho de 2022

Código Civil Comentado – Art. 240, 241, 242 Da PROVA - VARGAS, Paulo S. digitadorvargas@outlook.com – paulonattvargas@gmail.com Whatsap: +55 22 98829-9130 –

 

Código Civil Comentado – Art. 240, 241, 242
Da PROVA - VARGAS, Paulo S.
digitadorvargas@outlook.com
paulonattvargas@gmail.com
Whatsap: +55 22 98829-9130 –

Parte Especial Livro I Do Direito Das Obrigações

Título I Das Modalidades Das Obrigações

Capítulo I Das Obrigações de Dar

Seção I - Das Obrigações de Dar Coisa Certa

(arts. 233 até 242)

 

Art. 240. Se a coisa restituível se deteriorar sem culpa do devedor, recebê-la-á o credor, tal qual se ache, sem direito a indenização; se por culpa do devedor, observar-se-á o disposto no art. 239.


Sem qualquer deferência ao artigo em pauta, Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 240, p. 193 do Código Civil Comentado, limita-se à constatação do óbvio, sem desmerecimento. Esse dispositivo tem relação com os arts. 238 e 239, mas, ao contrário destes, não se refere à perda do bem que se está obrigado a restituir, mas sim ao bem danificado – i.é, estragado, mas não integralmente destruído. As soluções são as mesmas dos mencionados dispositivos: se não houver culpa do devedor, o credor recebe o bem deteriorado e não tem direito a perdas e danos. Se houver culpa, pode postular o valor equivalente à desvalorização pela deterioração - ou ao necessário para os reparos -, além da indenização por perdas e danos (pois a segunda parte do dispositivo em exame remete ao art. 239 do Código Civil). O tratamento do tema coincide com o que é dado no art. 235, que se refere à coisa deteriorada. (Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 240, p. 193 do Código Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406 de 10.01.2002, Coord. Ministro Cezar Peluzo Código Civil Comentado Cópia pdf, vários Autores: contém o Código Civil de 1916 - 4ª ed. Verificada e atual. - Barueri, SP, ed. Manole, 2010. Acessado em 18/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).

 

Lecionando às pp. 618, Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, incluem no item b) Deterioração da coisa na obrigação de restituir coisa certa (art. 240): b¹) sem culpa do devedor: se a deterioração ocorrer sem culpa do devedor, o credor receberá a coisa no estado em que se encontrar, sem direito à indenização; b²) com culpa do devedor:  caso a deterioração ocorra com culpa do devedor, este responderá ao credor pelo valor equivalente à coisa, mas perdas e danos. Frise-se que, neste caso, o art. 240 manda aplicar, expressamente, o art. 239. Assim, o credor não é obrigado a aceitar a coisa, acrescida de indenização equivalente ao da coisa em perfeito estado. Esse entendimento é encampado pelo Enunciado 15 da I Jornada de Direito Civil do CJF, que orienta que “as disposições do art. 236 do Novo Código civil também são aplicáveis à hipótese do art. 240, in fine”. Isso revela, portanto, o entendimento de que, em caso de deterioração da coisa na obrigação de restituir, o dono/credor poderá optar entre a sua restituição mais perdas e danos ou pelo pagamento de valor equivalente a ela.

 

Figura-se constantemente essa obrigação de restituir coisa certa em alguns contratos de comodato, locação e depósito. Independentemente da gratuidade (comodato, depósito) ou onerosidade (locação) inerente à natureza de cada uma dessas relações, a teoria dos riscos estabelecida pela regra dos arts. 238 a 240 indicará que, em não havendo culpa do devedor, este não responderá pela perda ou deterioração da coisa.

 

A doutrina e, principalmente, a jurisprudência, no entanto, têm mitigado essa regra, principalmente quando considera, em determinados casos (principalmente nos de depósito), que a responsabilidade pela guarda da coisa é objetiva, como acontece, v.g., da guarda de veículo em estacionamento de grande comercial (shopping centers, supermercados etc.). A respeito, a Súmula nº 130 do STJ prevê: “A empresa responde, perante o cliente, ela reparação de dano ou furto de veículo ocorridos em seu estacionamento”. (Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, Volume Único. Item 1. Classificação legal das obrigações Item 1.1.1.2. Melhoramentos e acréscimos antes da tradição, p. 618, Comentários ao CC. 240. Ed. JuspodiVm, 6ª ed., consulta 18/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

No levantamento de Geraldo Lavigne de Lemos, em artigo publicado há dois anos no site Jusbrasil.com.br., enquanto fato jurídico extraordinário, o coronavírus se enquadra como caso fortuito e força maior, nos termos do artigo 393, parágrafo único, do Código Civil. O caso fortuito é aquele evento imprevisível e inevitável, que se torna em um fato necessário diante das circunstâncias. Para a força maior, a imprevisibilidade é menos relevante, enquanto prevalecem a inevitabilidade e a condição de fato necessário. Ora, é certo que o coronavírus enquadra-se em ambos.

 

Nesse contexto, busca-se saber o momento da conclusão do contrato, o lugar da celebração e o tempo de sua execução. De um lado, os negócios jurídicos celebrados antes do coronavírus podem ser objeto de revisão ou resolução. De outro lado, o atual contexto de incerteza, instabilidade econômica e risco à vida ensejam que negócios jurídicos celebrados após o coronavírus possam estar eivados de defeitos, ressaltando-se o estado de perigo e a lesão.

 

É evidente que a simples disseminação da doença não basta para tornar todo e qualquer negócio jurídico defeituoso, nem passível de revisão ou resolução. Exige-se a presença dos requisitos para modificar ou extinguir as avenças. Nesses termos, o presente artigo pretende apresentar de maneira breve as hipóteses mais claras, na ordem que aparecem no Código Civil vigente.

 

Na seara pessoal, o adoecimento de um ente querido ou a necessidade de isolamento imediato podem forçar qualquer pessoa a contratar em estado de perigo, conforme preceitua o artigo 156 do Código Civil:

 

Art. 156. Configura-se o estado de perigo quando alguém, premido da necessidade de salvar-se, ou a pessoa de sua família, de grave dano conhecido pela outra parte, assume obrigação excessivamente onerosa.

Na seara negocial, o risco de desfalecimento patrimonial pode forçar empresários, comerciantes e investidores a contratar sob lesão, nos termos do artigo 157 do Código Civil:

Art. 157. Ocorre a lesão quando uma pessoa, sob premente necessidade, ou por inexperiência, se obriga a prestação manifestamente desproporcional ao valor da prestação oposta.

 

Esse seria o caso, por exemplo, de locatário de imóvel comercial, que tendo investido no negócio durante os últimos anos, enfrenta a renovação do contrato de locação no presente momento com índice de reajuste superior ao valor de mercado. Ao avaliar a perda do fundo de comércio e demais investimentos já realizados, comparando-os com o prejuízo de um novo valor de locação em prestação manifestamente desproporcional ao mercado diante da instabilidade econômico-financeira atual; nessa situação, o locatário encontra-se sob premente necessidade de evitar a perda patrimonial e, ao mesmo passo, garantir a permanência no imóvel.

 

O negócio não precisa ser anulado, mas pode tão somente ser readequado, como autoriza o artigo 157, § 2º, do Código Civil. De todo modo, seja pela lesão ou pelo estado de perigo, a invalidade do negócio jurídico deve ser arguida por meio da anulabilidade, com fundamento no artigo 171, II, do Código Civil. Se, posteriormente, os contratantes decidirem pela manutenção do negócio, eles poderão a qualquer momento confirmá-lo, por força do artigo 172 do Código Civil.

 

Porém, se a intenção for anular o negócio jurídico eivado de vício, o devedor não pode cumprir sequer em parte a sua obrigação, desde que ciente do vício, pois o cumprimento reflete em confirmação tácita e extingue, inclusive, todas as ações e exceções que tivesse contra o credor. Nesses casos, a medida adequada é renegociar diretamente com o contratante ou buscar a via judicial adequada. A consequência da anulação será o retorno ao status quo ante ou, não sendo possível, a devida indenização pelo equivalente.

 

Para os negócios jurídicos celebrados antes da disseminação mundial do coronavírus, as medidas variam conforme a natureza das obrigações contraídas, mas o resultado atinge finalidades semelhantes. Veja-se uma a uma. Para as obrigações de dar coisa certa, aplicam-se os arts. 234, 235, 238 e 240 do Código Civil:


Art. 234. Se, no caso do artigo antecedente, a coisa se perder, sem culpa do devedor, antes da tradição, ou pendente a condição suspensiva, fica resolvida a obrigação para ambas as partes; se a perda resultar de culpa do devedor, responderá este pelo equivalente e mais perdas e danos.

Art. 235. Deteriorada a coisa, não sendo o devedor culpado, poderá o credor resolver a obrigação, ou aceitar a coisa, abatido de seu preço o valor que perdeu.

Art. 238. Se a obrigação for de restituir coisa certa, e esta, sem culpa do devedor, se perder antes da tradição, sofrerá o credor a perda, e a obrigação se resolverá, ressalvados os seus direitos até o dia da perda.

Art. 240. Se a coisa restituível se deteriorar sem culpa do devedor, recebê-la-á o credor, tal qual se ache, sem direito a indenização; se por culpa do devedor, observar-se-á o disposto no art. 239. O caso fortuito e a força maior são fatos necessários que afastam a culpa do devedor.

A incidência dos citados artigos 234, 235, 238 e 240 do Código Civil é imediata. Por exemplo, para a obrigação de entrega ou restituição de coisa certa, com prazo de validade, que venceu antes da tradição, diante das restrições de movimentação impostas pelo isolamento horizontal, temos a perda sem culpa do devedor. Note-se que se a atividade do devedor foi fechada temporariamente pelo poder público e a obrigação alcançou seu termo naquele período, a obrigação poderá apenas postergada, se ainda exequível, mesmo que deteriorada a coisa; ou fica resolvida, se perdida a coisa. (Geraldo Lavigne de Lemos, em artigo publicado há dois anos no site Jusbrasil.com.br. intitulado: Consequências do coronavírus nos contratos civis: uma avaliação do estado de perigo, da lesão, do caso fortuito, da força maior e da onerosidade excessiva. Brilhante trabalho, consultado em 18/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 241. Se, no caso do art. 238, sobrevier melhoramento ou acréscimo à coisa, sem despesa ou trabalho do devedor, lucrará o credor, desobrigado de indenização.

É uma visão sincrônica a Lei. No caso do artigo 241, em comento, Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 241, p. 193, refere-se aos casos mencionados no art. 238, i.é, à obrigação de restituir. O bem encontra-se em poder do devedor, mas é de propriedade do credor, de modo que tudo o que a ele for acrescido a este pertencerá, pois o acessório segue o principal. No entanto, para que não haja enriquecimento sem causa do credor à custa do devedor, se os melhoramentos ou acréscimos resultarem de despesa ou trabalho do devedor, estará aquele obrigado a indenizá-lo - o que se extrai da norma a contrario sensu - e está disciplinado no artigo seguinte. (Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 241, p. 193 do Código Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406 de 10.01.2002, Coord. Ministro Cezar Peluzo Código Civil Comentado Cópia pdf, vários Autores: contém o Código Civil de 1916 - 4ª ed. Verificada e atual. - Barueri, SP, ed. Manole, 2010. Acessado em 18/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).


É o assunto dos autores Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, no item 1.1.2.1 Melhoramentos e acréscimos antes da restituição. Nos termos do art. 241 - dizem os autores -, ocorrendo melhoramento ou acréscimo à coisa, sem despesa ou trabalho do devedor, lucrará o credor, desobrigado de indenização, atentando-se sempre, todavia, à regra do art. 97: “Não se consideram benfeitorias os melhoramentos os acréscimos sobrevindos ao bem, sem a intervenção do proprietário, possuidor ou detentor”. (Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, Volume Único. Item 1. Classificação legal das obrigações Item 1.1.2.1. Melhoramentos e acréscimos antes da tradição, p. 619, Comentários ao CC. 241. Ed. JuspodiVm, 6ª ed., consultado em 18/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Em artigo de Pâmela Queiroz, publicado há dez meses, no site jusbrasil.com.br., sob o título: As teorias aplicáveis à resolução dos contratos de locação em tempos da pandemia ocasionada pela COVID-19, aproveitando a ocasião de por em prática novas estruturas do conhecimento e variações da Lei, traz “benefícios”, entre os diversos desastres da economia.

 

As transformações sociais, econômicas e políticas ensejam mudanças na sociedade. Tais transformações provocam mudanças no direito; mudam-se os princípios, alteram-se os paradigmas legais, surgem novas formas contratuais. A massificação da sociedade e das relações sociais, provocadas pela intensa intervenção da economia e da sociologia no direito, levou à massificação contratual.

 

Em meados de março de 2020 instalou-se no Brasil a pandemia gerada pelo vírus COVID-19, dentre as medidas adotadas pelas autoridades competentes o (lockdown - isolamento) e consequente fechamento de vários estabelecimentos comerciais que foram “classificados como supérfluos ou de não atividades essenciais”. 

Diante deste fato inevitável a economia sofreu um baque, gerando desemprego, diminuição de renda e ainda, o risco de morte iminente pelo vírus. Diante deste cenário, por óbvio que a diminuição de renda, tanto de pessoa física quanto de empresários, fez com que os negócios jurídicos sofressem consequências graves, dentro eles os pedidos de revisional e resolução dos contratos de locação de imóveis, propiciando aos operadores do direito a aplicação das teorias já existentes no ordenamento jurídico.

Estampado nas leis pátrias, há alguns artigos que trazem soluções para a questão, porém não há uma uniformidade no entendimento jurisprudencial sobre o tema, nem mesmo qualquer precedente, o que gera diversos resultados de acordo com cada julgador.

Observa-se, portanto, que as resoluções e revisões de contratos de locação, levando em consideração a pandemia causada pelo Coronavírus (Covid-19), que acomete o Brasil desde meados de março de 2020, não pode basear-se em uma única teoria, deve se analisar o caso concreto para decidir.

Diante deste cenário, verifica-se que muitos cidadãos e empresas têm tido dificuldades de honrar os compromissos e obrigações assumidos anteriormente à pandemia, notadamente pela queda brusca em seus rendimentos e faturamentos.

A publicação do Código Civil de 2002, em seu art. 421 disciplinou a teoria geral dos contratos, embutido nesse artigo está o princípio da função social do contrato em que o direito a entabular as vontades por meio do contrato, será exercido nos limites do referido princípio.

Os Enunciados do Centro de Estudos Judiciário do Conselho da Justiça Federal direcionam estudos no sentido de que, embora o artigo trate da função social do contrato, este tem como seu pape principal a função econômica.

 

O Superior Tribunal de Justiça pronunciou a respeito: “A função social infligida ao contrato não pode desconsiderar seu papel primário e natural, que é o econômico. Ao assegurar a venda de sua colheita futura, é de se esperar que o produtor inclua nos seus cálculos todos os custos em que poderá incorrer, tanto os decorrentes dos próprios termos do contrato, como aqueles derivados das condições da lavoura”. (STJ-3ª T., REsp 803.481, Min. Nancy Andrighi, j. 28.06.07, DJU 1.8.07).

 

A Lei 8.245/91 disciplina as relações contratuais da locação urbana, e tem como regra geral do contrato de locação em sendo bilateral, oneroso, comutativo, típico e consensual, não-formal e de trato sucessivo.

 

O contrato de locação gera obrigação de restituir, modalidade da obrigação de dar coisa certa, aplicando-se no que couber, quanto à perda e deterioração da coisa, os arts. 238 e 240 e, quanto aos acréscimos e melhoramentos, os arts. 241 e 242 ambos do Código Civil.

 

Em 2009, a Lei de Locação de Imóveis sofreu forte alteração. Com a finalidade de modernizar e alavancar o setor, na tentativa de desburocratizar e facilitar o acesso ao imóvel objeto de locação, a principal alteração foi a previsão expressa de concessão de liminar para o despejo do inquilino inadimplente, cujo contrato não tivesse garantia.

 

A influência estatal neste cenário de crise gerada pela pandemia instalada pelo vírus COVID-19 é um desafio enorme, o risco da omissão quanto da intervenção é alto, pelo que em que pese a urgência com que as decisões hão de ser tomadas, há de se resgatar o passado para solidificar a conduta a ser seguida. (Pâmela Queiroz, em artigo publicado há dez meses, no site jusbrasil.com.br., sob o título As teorias aplicáveis à resolução dos contratos de locação em tempos da pandemia ocasionada pela COVID-19, consultado em 18/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 242. Se para o melhoramento, ou aumento, empregou o devedor trabalho ou dispêndio, o caso se regulará pelas normas deste Código atinentes às benfeitorias realizadas pelo possuidor de boa-fé ou de má-fé.

 

Parágrafo único. Quanto aos frutos percebidos, observar-se-á, do mesmo modo, o disposto neste Código, acerca do possuidor de boa-fé ou de má-fé.

Com a apreciação do artigo em pauta, Hamid Charaf Bdine Jr, comentários às pp. 193-194 do Código Civil Comentado, cuida-se de disciplinar o modo pelo qual se vai apurar o valor da indenização que o credor pagará ao devedor por melhoramentos ou acréscimos decorrentes de seu trabalho ou com despesas suportadas por este. As normas escolhidas pelo legislador são as atinentes às benfeitorias realizadas pelo possuidor, que se encontram disciplinadas nos arts. 1.219 a 1.222 do Código Civil.

Do mesmo modo, no que tange aos frutos do bem a restituir, adotar-se-ão as regras dos arts. 1.214 a 1.216 do Código Civil. Segundo Carlos Roberto Gonçalves, “estando o devedor de boa-fé, tem direito à indenização dos melhoramentos ou aumentos necessários e úteis; quanto aos voluptuários, se não for pago o respectivo valor, [o devedor] pode levantá-los (jus tollendi), quando o puder sem detrimento da coisa e se o credor não preferir ficar com eles, indenizando o seu valor” (Direito civil brasileiro. São Paulo, Saraiva, 2004, v. II, p. 50). (Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 242, p. 193-194 do Código Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406 de 10.01.2002, Coord. Ministro Cezar Peluzo Código Civil Comentado Cópia pdf, vários Autores: contém o Código Civil de 1916 - 4ª ed. Verificada e atual. - Barueri, SP, ed. Manole, 2010. Acessado em 18/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).

 

Seguindo o raciocínio, e a Lei, dizem Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, tratando-se de pertença (bens que, não constituindo partes integrantes, destinam-se, de modo duradouro, ao uso, ao serviço ou ao aformoseamento de outro), sua sorte quanto ao principal dependerá da análise do título (contrato e vontade das partes) e das circunstâncias do caso. Imagine-se, zum Beispiel, a venda de uma residência: seus móveis são considerados, de acordo com o art. 94, pertenças; assim, embora sejam acessórios, não acompanham o principal (a casa), a não ser que resulte da manifestação da vontade das partes ao contrato. Os acessórios que necessariamente acompanhem o principal serão aqueles não previstos pelo art. 94, como as partes integrantes, os frutos e produtos e as benfeitorias que não configuram pertenças. (Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, Volume Único. Item 1. Classificação legal das obrigações Item 1.1.1. Obrigações de dar coisa certa, p. 615, Comentários ao CC. 241. Ed. JuspodiVm, 6ª ed., consultado em 18/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Na crítica apresentada pela Equipe de Guimarães e Mezzalira, o devedor da obrigação de restituir coisa certa poderá pleitear ressarcimento por melhoramentos e acrescidos ao bem somente na hipótese de haver concorrido para eles com seu trabalho ou dispêndios. Tal regra é lógica da vedação do sistema ao enriquecimento sem causa (CC. art. 884). Aplicam-se à hipótese as regras atinentes às benfeitorias realizadas pelo possuidor (CC, arts. 1.219 a 1.222).

 

Comodato de imóvel. Realização de melhorias pelo comodatário. Pleito de ressarcimento de valores. Retomada do bem. Comodatário que, na condição de possuidor de boa-fé, tem direito à indenização pelas benfeitorias ´úteis e necessárias empregadas no imóvel, sob pena de enriquecimento indevido do proprietário. Aplicação dos arts. 242 e 1.219 do CC. Recurso provido para fim de julgar procedente o pedido” (T. Rec. – RS, 3ª T. Rec. Cível, Rel. Eugênio Facchini Neto, j. 27.2.2007).

 

Aplicam-se as regras atinentes à distribuição de frutos aos possuidores, variando conforme esteja o devedor de boa ou de má-fé (CC. arts. 1.214 a 1.216).  (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 242, acessado em 18/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

sábado, 4 de junho de 2022

Código Civil Comentado – Art. 237, 238, 239 Da PROVA - VARGAS, Paulo S. digitadorvargas@outlook.com – paulonattvargas@gmail.com Whatsap: +55 22 98829-9130 –

 

Código Civil Comentado – Art. 237, 238, 239
Da PROVA - VARGAS, Paulo S.
digitadorvargas@outlook.com
paulonattvargas@gmail.com
Whatsap: +55 22 98829-9130 –

Parte Especial Livro I Do Direito Das Obrigações

Título I Das Modalidades Das Obrigações

Capítulo I Das Obrigações de Dar

Seção I - Das Obrigações de Dar Coisa Certa

(arts. 233 até 242)

 

Art. 237. Até a tradição pertence ao devedor a coisa, com os seus melhoramentos e acrescidos, pelos quais poderá exigir aumento no preço; se o credor não anuir, poderá o devedor resolver a obrigação.

 

Parágrafo único. Os frutos percebidos são do devedor, cabendo ao credor os pendentes.

 

Segundo a Doutrina, da mesma forma como, havendo perda ou deterioração da coisa, o prejuízo é do devedor (dono), havendo acréscimo, o lucro deve ser dele, salvo dispondo o contrato de modo diverso. Assim, como a coisa há de ser entregue na sua integralidade, ou seja, com todos os melhoramentos e acrescidos, poderá o devedor exigir aumento no preço ou mesmo resolver a obrigação se o credor não concordar em pagar pela valorização decorrente dos acréscimos.

 

O parágrafo único, por sua vez, dispõe que os acréscimos ainda não percebidos seguem a regra geral de que o acessório acompanha o principal, pertencendo, portanto, ao credor. Quanto a esses não cabe ao devedor exigir aumento no preço, já que os acessórios, em regra, são obtidos naturalmente sem obra ou dispêndio do devedor (v. art. 241). Se já tiverem sido percebidos, pertencem ao devedor, que, antes da tradição, era o dono da coisa principal. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – Art. 237, p. 141-142, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf. Vários Autores 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 17/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).

 

No lecionar de Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 237, p. 190-191 do CC/2002, Doutrina e Jurisprudência, se, até a tradição, a coisa principal receber melhoramentos e acrescidos, pertencerão eles ao devedor, que poderá exigir aumento de preço. Ensina Carlos Roberto Gonçalves que melhoramento é tudo o que opera mudança para melhor na coisa principal; acrescido é o que se acrescenta a ela (Direito civil brasileiro. São Paulo, Saraiva, 2004, v. II, p. 49). Caso o credor não concorde com o aumento do preço que dos melhoramentos e acrescidos resultar, o devedor poderá resolver a obrigação e cada qual das partes retornará à situação anterior sem direito a indenização, pois tratar-se-á de exercício de direito do devedor. Esse artigo parece estar em conflito com o art. 233, pois melhoramentos e acrescidos são acessórios do bem principal, de modo que, nos termos deste último dispositivo, haviam de estar abrangidos pelo principal. A conciliação de ambos é possível se se admitir que os acessórios de que trata o art. 233 são os que já existiam ao tempo da realização do negócio, enquanto os melhoramentos e acrescidos referidos no dispositivo de que ora se trata são os que surgem após a realização do negócio. Identifica-se a aplicação dessa regra na hipótese em que um criador adquire uma vaca em um leilão. De acordo com as regras do estabelecimento, ela lhe será entregue em quinze dias.

 

No entanto, nesta oportunidade, ficou prenha, de modo que o arrematante receberá, além da vaca, a cria que a acompanha. A incidência do art. 237 à hipótese autoriza o alienante a exigir remuneração pela cria, que lhe pertence, pois foi acrescida ao bem principal após a efetivação do negócio. Ruy Rosado de Aguiar Júnior pondera que o devedor não tem direito de acionar o credor pelo aumento, mas lhe é conferida a possibilidade de postular a extinção do contrato diante da recusa ao pagamento (Extinção dos contratos por incumprimento do devedor, Aide, 2003, p. 164).

 

Registre-se, porém, que a solução não deve ser aplicada se ficar evidenciada má-fé do devedor que pode acrescer melhoramentos na coisa para inviabilizar o negócio ou obrigar o devedor a pagar mais pelo bem. Nessa hipótese, a solução poderá ser o reconhecimento culposo do devedor, o que implica mora ou inadimplemento apto a obrigá-lo a indenizar (arts. 389 e 395 desse Código). Somente no caso de acréscimos feitos de boa-fé a disposição poderá incidir. Arnaldo Rizzardo, porém, opina no sentido de que não se incluem nesse dispositivo acessões e obras produzidas pelo homem (Obrigações, Forense, 2004, p. 90).

 

Em relação aos frutos, o parágrafo único estabelece que serão do devedor os percebidos e do credor os pendentes. Vale dizer: aqueles que o devedor colher antes de entregar o bem ao credor lhe pertencerão. Mas os que ainda estiverem ligados ao bem principal quando ocorrer a tradição serão do credor. Reserva de domínio ou venda a contento. Segundo Gustavo Bierambaum, nos casos de venda a contento ou com reserva de domínio, a tradição em favor do adquirente se aperfeiçoa antes da efetiva transmissão do domínio, de maneira que o risco da coisa já lhe é transferido desde logo e ele não ficará livre do dever de pagar o preço estipulado (“Classificação: obrigações de dar, fazer e não fazer”. Obrigações: estudos na perspectiva civil-constitucional, coord. Gustavo Tepedino. Rio de Janeiro, Renovar, 2005, p. 127). (Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 237, p. 190-191 do Código Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406 de 10.01.2002, Coord. Ministro Cezar Peluzo Código Civil Comentado Cópia pdf, vários Autores: contém o Código Civil de 1916 - 4ª ed. Verificada e atual. - Barueri, SP, ed. Manole, 2010. Acessado em 17/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).

 

 No lecionar dos autores Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, Item 1.1.1.2. Melhoramentos e acréscimos antes da tradição, p. 617, seguindo a mesma regra, se a coisa se perde em desfavor do proprietário, é justo que eventuais melhoramentos ou acréscimos da coisa, antes da tradição, também beneficiem o devedor, porque ainda é proprietário.

 

Destarte, sobrevindo melhoramento (benfeitoria) ou acréscimo (acessão, construção) à coisa, o devedor resta beneficiado, podendo, inclusive, exigir aumento no preço já ajustado (art. 237). Se o credor não anuir com o aumento, o devedor tem o direito de resolver a obrigação. Pensando-se, pois, ekzemple, do animal bovino do sexo feminino já vendido e que se torna prenhe antes da tradição, verifica-se, de acordo com a regra ora mencionada, que o vendedor poderá exigir do comprador o aumento do preço e, em não havendo acordo, poderá resolver a obrigação (no mesmo sentido Venosa, 2008, p. 64).

 

Da mesma forma, os frutos já percebidos, ou esmo meramente separados da coisa, pertencem ao devedor. Já os frutos pendentes no momento da tradição pertencem ao credor. Aqui se deve atentar à regra do art. 95 do Código Civil, que prevê a autonomia dos frutos (naturais ou civis) com relação ao bem principal ao que tange à possibilidade de serem objeto de negócios jurídicos independentes: “Apesar de ainda não separas do bem principal, os frutos e produtos podem ser objeto de negócio jurídico”.

 

Por isso, ainda que, via de regra, os frutos já separados antes da tradição sejam do vendedor e os pendentes no momento da entrega sejam do comprador, as partes podem discipliná-lo de maneira diversa, tendo em vista a expressa possibilidade aberta pelo mencionado art. 95. (Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em   Manual de Direito Civil, Volume Único. Item 1. Classificação legal das obrigações Item 1.1.1.2. Melhoramentos e acréscimos antes da tradição, p. 617, Comentários ao CC. 237. Ed. JuspodiVm, 6ª ed., consultado em 17/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 238. Se a obrigação for de restituir coisa certa, e esta, sem culpa do devedor, se perder antes da tradição, sofrerá o credor a perda, e a obrigação se resolverá, ressalvados os seus direitos até o dia da perda.

 

Bem especificado o assunto na doutrina, Obrigação de restituir: Na obrigação de restituir, o dono da coisa é o credor, ao contrário da obrigação de dar, em que a coisa pertence ao devedor até o momento da tradição. A obrigação de dar é gênero e a de restituir, espécie daquela. Na primeira o credor recebe o alheio; na segunda ele é o próprio dono da coisa. No primeiro caso, cujo exemplo típico é a compra e venda, a perda da coisa resolve a obrigação, com prejuízo do devedor, seu possuidor e proprietário; já na obrigação de restituir, a perda da coisa resolve a obrigação, com prejuízo do credor, seu proprietário, salvo, naturalmente, se tiver havido culpa do devedor (v. art. 239 deste Código).

 

Havendo perda, o princípio é, portanto, o mesmo já estudado quanto falado da obrigação de dar, ou seja, o dono, no caso o credor, experimenta o prejuízo. A coisa se perderá à conta do proprietário. O Código ressalva, no entanto, os valores que sejam devidos ao credor até o momento da perda, como ocorre por exemplo no contrato de locação, em que os aluguéis serão devidos até a data do perecimento. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – Art. 238, p. 142, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf. Vários Autores 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 17/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).

 

Na disposição da Lei há muito o que se aprender, como pontua Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 238, p. 191 do Código Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência: A obrigação de dar coisa certa compreende a de restituir. Nesta também há obrigação de dar coisa certa, com a diferença de que aquilo que se deve entregar ao credor já lhe pertencia - é o que ocorre com o comodato de bem móvel. Nesse caso, o devedor não é o proprietário do bem, de maneira que, se a coisa perece em suas mãos, antes da tradição, a perda será do credor - valendo o princípio de que a coisa perece para o dono, na medida em que a coisa lhe pertence e está em mãos do devedor obrigado a restituí-la. Contudo, se até o dia da perda o devedor estava obrigado a pagar pelo bem ao credor, ou se outros direitos lhe eram assegurados, este fará jus ao seu recebimento. Este artigo se aplica, como já se disse, ao comodato, de maneira que o comodatário não está obrigado a indenizar o proprietário se o trator que tomou emprestado para arar a terra for roubado de sua propriedade, ou mesmo furtado de local seguro em que se encontrava, uma vez que nesses casos não haverá culpa do comodatário - devedor da obrigação de restituir. (Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 238, p. 191 do Código Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406 de 10.01.2002, Coord. Ministro Cezar Peluzo Código Civil Comentado Cópia pdf, vários Autores: contém o Código Civil de 1916 - 4ª ed. Verificada e atual. - Barueri, SP, ed. Manole, 2010. Acessado em 17/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).

 

No entendimento dos autores Sebastião de Assis Neto et al, observe-se, por oportuno, que em contratos como o de mútuo (empréstimo de coisas fungíveis ou consumíveis), a coisa a ser restituída pelo devedor (mutuário) é outra e, pela sua natureza, será, geralmente, incerta, daí porque deve ser tratada elas regras das obrigações de dar coisa incerta.

 

No caso da obrigação de restituir coisa certa, portanto, deve-se observar que o credor já é proprietário da coisa antes da restituição pelo devedor, cabendo-lhe apenas o direito de devolução, tratado, no art. 238, também como tradição. Destarte, no caso de perda ou deterioração da coisa, res perit domino, quer dizer, o proprietário (credor) é quem sofre os ônus da perda ou deterioração: no entanto, caso o fato ocorra por culpa do devedor, este responderá pela coisa perante o credor (res perit debitori). (Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em   Manual de Direito Civil, Volume Único. Item 1. Classificação legal das obrigações Item 1.1.1.2. Melhoramentos e acréscimos antes da tradição, p. 618, Comentários ao CC. 238. Ed. JuspodiVm, 6ª ed., consultado em 17/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 239. Se a coisa se perder por culpa do devedor, responderá este pelo equivalente, mais perdas e danos.

 

Segundo o histórico: O presente dispositivo não foi atingido por nenhuma espécie de modificação, seja da parte do Senado Federal, seja da parte da Câmara dos Deputados, no período final de tramitação do projeto. Trata-se de mera repetição do Art. 870 do Código Civil de 1916, com pequena melhoria redacional, passando o dispositivo a mencionar expressamente a obrigação de indenizar, deixando de fazer mera referência a outro artigo, como fazia o texto anterior.

 

Em sua Doutrina o relator afirma que, em havendo culpa do devedor no perecimento, o credor não suportará prejuízo algum. O devedor, além de restituir o equivalente em dinheiro, indenizará o credor pelos danos materiais e imateriais eventualmente suportados. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – Art. 239, p. 142, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf. Vários Autores 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 17/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).

 

No mesmo sentido Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 239, p. 192 do Código Civil Comentado: Diversamente do que consta do art. 238, nesse dispositivo há previsão de perdas e danos, que serão devidos pelo devedor da obrigação de restituir coisa certa se ela se perder por sua culpa. Na obrigação de restituir coisa pertencente ao credor, o devedor será responsabilizado pelo pagamento do equivalente em dinheiro, mais perdas e danos, se agir com negligência, imprudência ou imperícia. A solução prevista nesse dispositivo corresponde à prevista no art. 236 para o caso de deterioração da coisa. (Hamid Charaf Bdine Jr, comentários ao CC art. 239, p. 192 do Código Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406 de 10.01.2002, Coord. Ministro Cezar Peluzo Código Civil Comentado Cópia pdf, vários Autores: contém o Código Civil de 1916 - 4ª ed. Verificada e atual. - Barueri, SP, ed. Manole, 2010. Acessado em 17/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).

 

Assim, Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, Item 1.1.1.2. Melhoramentos e acréscimos antes da tradição, p. 618, Comentários ao CC. 239, a) Perda da coisa na obrigação de restituir coisa certa (arts. 238 e 239): a¹) sem culpa do devedor: se a perda da coisa ocorrer sem culpa do devedor, o credor suportará a perda, ficando resolvida a obrigação. Tem o credor, no entanto, ressalvados seus direitos até o dia da perda, o que engloba o direito dos frutos pendentes, por exemplo; a²) com culpa do devedor: se a perda se der por culpa do devedor, responde ele, perante o credor, pelo valor equivalente ao da coisa, mais eventuais perdas e danos. (Sebastião de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em   Manual de Direito Civil, Volume Único. Item 1. Classificação legal das obrigações Item 1.1.1.2. Melhoramentos e acréscimos antes da tradição, p. 618, Comentários ao CC. 239. Ed. JuspodiVm, 6ª ed., consultado em 17/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).