Direito Civil Comentado - Art.
1.148, 1.149
Do Estabelecimento - VARGAS,
Paulo S. R.
Parte Especial -
Livro II – (Art. 966 ao 1.195) Capítulo Único –
Disposições
gerais (Art. 1.142 a 1.149) Título III – do estabelecimento
Art. 1.148. Salvo
disposição em contrário, a transferência importa a sub-rogação do adquirente
nos contratos estipulados para exploração do estabelecimento, se não tiverem
caráter pessoal, podendo os terceiros rescindir o contrato em noventa dias a
contar da publicação da transferência, se ocorrer justa causa, ressalvada,
neste caso, a responsabilidade do alienante.
Como esclarece Marcelo Fortes Barbosa Filho, Diante do trespasse ou da doação do
estabelecimento empresarial, os contratos de execução continuada que tiverem sido
celebrados com o fim de viabilizar a exploração adequada e eficiente do
empreendimento organizado são submetidos a uma automática cessão de posições
contratuais, dando-se, assim, continuidade à atividade econômica realizada.
Opera-se uma sub-rogação. Sem a necessidade de qualquer formalidade adicional,
o adquirente toma o lugar do alienante e o substitui inteiramente, tanto em
deveres quanto em direitos decorrentes do antigo negócio jurídico. Essa
substituição abrange todos os contratos de fundo exclusivamente econômico (o de
fornecimento, por exemplo), excluindo-se, em razão da natureza subjetiva do
vínculo obrigacional, aqueles celebrados intuitu personae (o de mandato, por
exemplo). Trata-se, porém, de uma regra geral, de caráter dispositivo, que pode
ser, conforme a conveniência do alienante e do adquirente, revogada
concretamente, mediante cláusula expressa. Em outro sentido, persiste, também,
a possibilidade de o terceiro, cocontratante, promover a pura e simples
denúncia do contrato celebrado. Estabeleceu-se um prazo de noventa dias,
contado da publicação prevista no CC 1.144, dentro do qual o cocontratante pode
manifestar, unilateralmente, sua vontade de extinguir o vínculo contratual já
constituído, devendo, para tanto, expor justa causa. O texto legal não delimita
o que deve ser considerado justa causa e, por ser conceito aberto, submetido a
constante e renovada avaliação casuística, a justa causa não precisa estar
ligada, de toda maneira, à pessoa do adquirente e a sua atuação no lapso
imediatamente posterior à transferência do estabelecimento. Faz-se, por isso,
ressalva expressa, pois, com a denúncia de um contrato, potencializa-se a
diminuição do valor do estabelecimento, causando uma inesperada dificuldade de
exploração da atividade empreendida, e a responsabilidade civil do alienante,
desde que sua pretérita conduta tenha resultado na cessação dos lucros
previstos, pode ser reclamada em juízo. (Marcelo
Fortes Barbosa Filho, apud Código
Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002.
Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.112. Barueri,
SP: Manole, 2010. Acesso 07/08/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).
Em sua doutrina Fiuza menciona os contratos de
obrigações de trato sucessivo vinculados à atividade do estabelecimento, ativos
e passivos, celebrados perante terceiros, são transferidos para o adquirente do
estabelecimento, que se sub-roga em seus direitos e obrigações. Quando esses
contratos tiverem caráter pessoal, ou seja, estiverem vinculados ao aviamento
subjetivo do alienante do estabelecimento, somente por este podendo ser
executados, tais contratos não se transferirão automaticamente. Os terceiros
que contrataram com a empresa antes da alienação poderão, no prazo de noventa
dias a contar da publicação do ato de transferência, denunciar ou rescindir o
contrato, desde que exista justa causa, ficando, neste caso, ressalvada a
responsabilidade do alienante. (Direito
Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 594, apud Maria Helena Diniz Código
Civil Comentado já impresso pdf 16ª
ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 07/08/2020, corrigido e
aplicadas as devidas atualizações VD).
Fazendo
menção à Transferência
dos contratos no trespasse, Marcelo Gazzi Tadde, embora não integrem o
estabelecimento, pois não são bens, o CC 1.148 estabelece que o trespasse
importa a transferência dos contratos para o empresário adquirente, desde que
não tenham caráter pessoal: “Art. 1.148. Salvo disposição em contrário, a
transferência importa a sub-rogação do adquirente nos contratos estipulados
para a exploração do estabelecimento, se não tiverem caráter pessoal, podendo
os terceiros rescindir o contrato em noventa dias a contar da publicação da transferência,
se ocorrer justa causa, ressalvada, neste caso, a responsabilidade do
alienante”. Mais uma vez o Código Civil brasileiro utiliza o Codice
Civile como base para a disciplina da matéria. O art. 2.558 do diploma
italiano trata da transferência dos contratos da seguinte forma: “2558.
Successione nei contratti. – Se non è pattuito diversamente, l’acquirente
dell’azienda subentra nei contratti stipulati per l’esercizio dell’azienda
stessa che non abbiano carattere personale (2112). Il terzo contraente può
tuttavia recedere dal contratto entro ter mesi dalla notizia del
transferimento, se sussiste uma giusta causa, salvo in questo caso la
responsabilià dell’alienante. Lê stesse disposizioni si applicano anche nei
confronti dell’usufruttuario e dell’affitto (2561 s.)” (CODICE CIVILE, 2007, p. 409).
O art. 1.148 do CC 2002, ao estabelecer que “a transferência importa a
sub-rogação do adquirente nos contratos estipulados para exploração do
estabelecimento”, determina a substituição do empresário alienante pelo
empresário adquirente nos contratos que não apresentam caráter pessoal. A
sub-rogação prevista significa a substituição de uma pessoa por outra, no caso,
o empresário alienante pelo empresário adquirente, mantendo-se a relação
anteriormente existente. A lei não prevê a necessidade da anuência do
contratante cedido, entretanto, havendo justa causa os terceiros podem
rescindir o contrato no prazo de 90 dias da publicação do trespasse,
ressalvada, nesse caso, a responsabilidade do alienante.
Marcelo Andrade Féres identifica seis pressupostos simultâneos para a
transferência dos contratos no trespasse: “a) que se trate de
contratos bilaterais com pendências obrigacionais para ambas as partes;
b) que os contratos sejam exploracionais
(‘estipulados para exploração do estabelecimento’ – CC 1.148); c) que os contratos sejam impessoais (‘se não tiverem
caráter pessoal’ – art. 1.148 do CC); d)
que não exista disposição em contrário (‘salvo disposição em contrário’ – CC
1.148); e) que inexista óbice legal;
e f) que não haja justa causa para o
terceiro rescindir o contrato (‘podendo os terceiros rescindir o contrato em
noventa dias a contar da publicação da transferência, se ocorrer justa causa,
ressalvada, neste caso, a responsabilidade do alienante’ – CC 1.148)” (FÉRES, 2007, p. 69).
A identificação da bilateralidade contratual é importante para diferenciar os
efeitos do trespasse em relação às dívidas, contratos e créditos, previstos,
respectivamente nos arts. 1.146, 1.148 e 1.149 do CC 2002. De acordo com
Modesto Carvalhosa, a compreensão correta do CC 1.148 exige que o contrato
esteja em curso de execução, se já houve execução da prestação devida por uma
das partes e aguarda-se a execução devida pela parte contrária, não se verifica
a sub-rogação do contrato, é questão subordinada à aplicação dos arts. 1.146 e
1.149 do CC 2002, que tratam, respectivamente, das dívidas e dos créditos
decorrentes do trespasse (CARVALHOSA, 2003, p. 654). Portanto,
a transferência prevista no CC 1.148 envolve necessariamente contratos
bilaterais que apresentem pendências obrigacionais para ambas as partes do
contrato de trespasse. Na hipótese de contrato em que há prestação a ser
realizada por apenas uma das partes, a questão deve ser tratada no âmbito das
dívidas ou dos créditos.
O CC 1.148 limita a transferência aos contratos estipulados para a
exploração do estabelecimento, limitando-se, assim, aos contratos
exploracionais, que são aqueles celebrados para o desenvolvimento da empresa
por meio do estabelecimento empresarial. São contratos exploracionais os
contratos de fornecimento de energia elétrica, embalagens e matéria-prima;
prestação de serviços de telefonia; contratos de locação; de franquia; de
trabalho; de compra e venda empresarial, entre outros.
Dentre os contratos exploracionais, alguns podem se revestir de caráter
pessoal. Os contratos intuitu personae não são transferidos ao
empresário adquirente. Quando ajustados com base na pessoa do empresário
alienante ou de seus sócios, no caso de sociedade empresária, os contratos
qualificam-se como personalíssimos e estão excluídos da transmissão. As
próprias partes contratantes podem excluir expressamente no trespasse a
transferência de contratos exploracionais, conforme permissão contida no CC
1.148 do Código Civil, em seu início (“Salvo disposição em contrário”).
O CC 1.148 estabelece que os terceiros podem rescindir o contrato no prazo de
90 dias na existência de justa causa. A transferência automática dos contratos
ao empresário adquirente no trespasse pode gerar situações desfavoráveis aos
contratantes cedidos, diante de uma situação nova e diversa da contratada que
pode frustrar a execução das prestações contratuais pendentes. A lei não
estabelece a caracterização da justa causa, trata-se de cláusula geral que
exige a análise do caso concreto. Configurada a justa causa, o direito à
rescisão contratual deve ser exercido no prazo de 90 dias da publicação do
trespasse e, de acordo com a parte final do CC 1.148, o empresário alienante
não se responsabiliza pela rescisão contratual decorrente de justa causa.
O CC 1.148 apresenta disposição genérica, que não prevalece diante de lei
específica. No caso do contrato de locação empresarial, o art. 13 da Lei n°
8.245/1991 exige o consentimento prévio e escrito do locador para a cessão do
contrato locatício. Portanto, o CC 1.148 não importa a transferência automática
do contrato de locação referente ao estabelecimento empresarial negociado, o
empresário alienante (locatário) deverá obter a anuência prévia e expressa do
locador para a viabilização do contrato de trespasse. (Marcelo Gazzi Taddei,
Professor de Direito Empresarial da ESA – Escola Superior de Advocacia de São
José do Rio Preto, SP. A Revista Âmbito Jurídico, publicou
artigo em 01/06/2009, O
Código Civil de 2002 e a disciplina legal do estabelecimento empresarial, Acessado
07/08/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).
Art. 1.149. A cessão dos créditos
referentes ao estabelecimento transferido produzirá efeito em relação aos
respectivos devedores, desde o momento da publicação da transferência, mas o
devedor ficará exonerado se de boa-fé pagar ao cedente.
Encerrando esse Título III, leciona Marcelo Fortes Barbosa Filho que, toda alienação de
um estabelecimento empresarial importa na automática cessão dos créditos já
constituídos e ainda não solvidos, sejam eles vincendos, sejam eles vencidos.
Trata-se de regra especial, semelhante àquela inserta no artigo anterior, por
meio da qual são dispensadas as formalidades peculiares a uma cessão de crédito
comum, em particular a notificação do devedor e a formalização por instrumento
específico (arts. 288 e 290). Com o advento da publicação prevista no CC 1.144,
a cessão dos créditos derivados da atividade empresarial realizada pelo
estabelecimento transmitido restará concretizada imediatamente. Protege-se,
porém, o devedor de boa-fé, que, mediante o desconhecimento efetivo da
alienação operada e do engano gerado por uma falsa aparência, paga a quem não é
mais o titular do crédito. Nessa hipótese, fica o devedor desonerado, cabendo
ao adquirente do estabelecimento, na qualidade de cessionário do crédito,
buscar ressarcimento do alienante, o cedente desse mesmo crédito, que, sem
legitimidade, percebeu valores e forneceu quitação. Identifica-se, aqui, grande
semelhança com o disposto na primeira parte do CC 292. (Marcelo Fortes Barbosa Filho,
apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de
10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.112.
Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 07/08/2020. Revista e atualizada nesta data
por VD).
Fazendo o encerramento do Título,
em sua Doutrina leciona Fiuza que dentre os bens materiais integrantes do
estabelecimento comercial, a transferência implica também a cessão de todos os
créditos contabilizados no ativo da empresa. A partir da publicação do ato de
arquivamento da transferência na Junta Comercial, ocorrerá a produção dos
efeitos jurídicos com relação aos créditos do estabelecimento perante
terceiros, cabendo aos devedores da empresa, a partir desse momento, efetuar os
pagamentos das dívidas vencidas e vincendas perante o adquirente, que se
equipara ao cessionário dos créditos. Se o devedor, de boa-fé, pagar a dívida
ao alienante do estabelecimento, ficará exonerado da obrigação, cabendo, então,
ao adquirente proceder à cobrança contra o cedente. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 594, apud Maria
Helena Diniz Código Civil Comentado
já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 07/08/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Finalizando
o Título com a cooperação de Marcelo Gazzi Taddei, da transferência dos créditos no trespasse: CC
1.149, Em relação aos créditos, eles são transferidos ao adquirente,
produzindo efeitos perante os devedores a partir da publicação do trespasse no
órgão oficial, conforme determina o CC 1.149: “Art. 1.149. A cessão dos
créditos referentes ao estabelecimento transferido produzirá efeito em relação
aos respectivos devedores, desde o momento da publicação da transferência, mas
o devedor ficará exonerado de se boa-fé pagar ao cedente”.
O Código Civil estabelece a
transmissão automática dos créditos no trespasse, transferindo-se de pleno
direito ao empresário adquirente na forma correspondente à escrituração do
empresário alienante, independentemente de qualquer notificação ao cedido.
Trata-se de regra especial, semelhante à prevista no CC 1.148, por meio da qual
são dispensadas as formalidades previstas para a cessão de crédito comum. (Marcelo Gazzi Taddei,
Advogado, Parecerista, Mestre em Direito pela UNESP de Franca, SP, Professor de
Direito Empresarial, Direito do Consumidor e Direito Civil I da UNIP –
Universidade Paulista, de São José do Rio Preto, SP e Professor de Direito
Empresarial da ESA – Escola Superior de Advocacia de São José do Rio Preto, SP.
A
Revista Âmbito Jurídico, publicou artigo em 01/06/2009, O
Código Civil de 2002 e a disciplina legal do estabelecimento empresarial, Acessado
07/08/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).
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