quarta-feira, 18 de agosto de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.878, 1.879, 1.880 Do Testamento Particular - VARGAS, Paulo S. R. vargasdigitador.blogspot.com

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.878, 1.879, 1.880
Do Testamento Particular - VARGAS, Paulo S. R.
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m.me/DireitoVargas – Parte Especial –Livro V – Do Direito das
Sucessões - Título III – Da Sucessão Testamentária – Capítulo III
– Das Formas Ordinárias do Testamento - Seção IV:
Do Testamento Particular (Art. 1.876 a 1.880)

 

Art. 1.878. Se as testemunhas forem contestes sobre o fato da disposição, ou, ao menos, sobre a sua leitura perante elas, e se reconhecerem as próprias assinaturas, assim como a do testador, o testamento será confirmado.

 

Parágrafo único. Se faltarem testemunhas, por morte ou ausência , e se pelo menos uma delas o reconhecer, o testamento poderá ser confirmado, se, a critério do juiz, houver prova suficiente de sua veracidade.

Em arquivo, este artigo corresponde ao art. 1.930 do Projeto de Lei n. 634/75. O parágrafo único corresponde ao art. 1.931 do mesmo projeto, mas sua localização e redação foram determinadas pela emenda n. 482- r, do Senador Josaphat Marinho. Ver arts. 1.647 e 1.648 do Código Civil de 1916.

As testemunhas do testamento particular são inquiridas pelo juiz. Se forem contestes, acordes, sobre o fato da disposição, ou, ao menos, sobre a sua leitura perante elas, e se reconhecerem as próprias assinaturas, assim como a do testador, o testamento será confirmado.  

O testamento particular é válido, se observados os requisitos do CC 1.876. Mas não é eficaz com a morte do testador, o que ocorre tratando-se das demais formas de testamento. Após a morte do testador, as exigências dos arts. 1.877 e 1.878, caput, têm o objetivo de confirmar o testamento, comprovar sua autenticidade, dar-lhe executoriedade, conferir-lhe eficácia, através do cumpra-se do juiz (cf. arts. 1.130 a 1.133 do CPC/1973 – v. CPC/2015, art. 737, § 2º). Mas as testemunhas podem faltar, por morte ou ausência. Aliás, a falta pode ocorrer por outros motivos, como a doença grave, a perda das faculdades mentais. Porém, se pelo menos uma das testemunhas o reconhecer, o testamento poderá (faculdade!) ser confirmado, se, a critério do juiz, houver prova suficiente de sua veracidade. 

Ora, se há prova suficiente da veracidade do testamento, inquirir as testemunhas para quê? Enfim, esse procedimento judicial, após o falecimento do testador, que pode redundar na ineficácia do testamento, e submeter a sucessão aos ditames da lei, quando o de cujus quis dispor dos seus bens, quiçá beneficiando alguém com sua metade disponível, ou fazendo legados, ou excluindo da herança os colaterais, é um dos maiores inconvenientes, um risco flagrante do testamento hológrafo, residindo aí a razão principal de sua quase nenhuma utilização em nosso pais. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 977-978, CC 1.878, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 18/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Para Silvio Venosa, em artigo publicado, intitulado “O testamento particular no Código Civil de 2002”, site genjuridico.com.br, datado de 29/12/2015, Essa forma de testamento, também denominado hológrafo (admite-se também a grafia ológrafo), prescinde, em sua elaboração, da intervenção do funcionário do Estado. Nunca foi muito utilizado, principalmente porque há sempre o risco de perda ou desaparecimento da cártula, não bastassem a série de formalidades.

O presente Código Civil procurou simplificá-lo, pois no sistema de 1916 foi a modalidade menos utilizada principalmente porque, além de sofrer os mesmos riscos de perda do testamento cerrado, exigia o Código antigo, para sua execução, que pelo menos três testemunhas comparecessem após a morte do testador, para confirmá-lo. Ademais, nesse ato de última vontade, eram mais difíceis de controlar as pressões dos interessados.

Em seu favor, pode ser mencionada sua rapidez de elaboração, facilidade e gratuidade. A nosso ver, no entanto, a simplificação de suas formalidades no Código de 2002 foi em certo aspecto além do que seria de desejar e pode abrir muitos flancos para a fraude.

A atual lei estatui que o testamento pode ser escrito de próprio punho ou mediante processo mecânico. Não é admitida a assinatura a rogo. Vem aqui novamente à baila a possibilidade da utilização de meios eletrônicos para sua redação. Não havia disposição pertinente no Código de 1916.

A jurisprudência, com divergência, admitira o uso da datilografia no testamento particular ao contrário do Código de 2002, que segue o mesmo princípio do Código italiano e do Código suíço, exigindo agora que o testamento particular seja feito de próprio punho ou por meio mecânico. O direito de 1916 exigia apenas que fosse escrito e assinado pelo testador.

Podíamos entender que, provado que fosse o próprio testador quem datilografara ou digitara o documento, o requisito estaria preenchido. Não era a melhor solução, nem a solução pretendida, com certeza, pelo legislador de 1916, quando começavam a surgir as máquinas de escrever. Hoje, com a eletrônica e a informática, outros meios de grafia podem ser utilizados. Desse modo, o novel Código suplanta o problema ao admitir a escrita de próprio punho ou por meio mecânico, com a assinatura do testador. Melhor seria que a lei mencionasse meios eletrônicos, pois estamos muito além dos meios exclusivamente mecânicos.

O testamento particular é presa fácil de falsificações, vícios de vontade e outras fraudes. A perícia técnica para apurar se foi determinada pessoa quem datilografou um documento já era muito difícil. Muito mais se se tratar de modernos equipamentos impressores da informática. A prova testemunhal em matéria testamentária é sujeita mais ainda às instabilidades e incertezas conhecidas. Destarte, se partíssemos da premissa de que a lei não proibia a datilografia no testamento particular, toda a prova seria no sentido de afirmar que fora o próprio testador quem acionara o meio mecânico ou eletrônico.

A doutrina tradicional mais antiga era peremptória no sentido de que esse testamento devia ser manuscrito, não admitindo nem mesmo o manuscrito em letra de imprensa. Deve ser redigido em papel. Materiais estranhos à escrita normal tornam suspeita a disposição. Na época atual, não havia mesmo que se repelir a elaboração desse testamento por meio mecânico, como inclusive dava a entender o projeto original do mais recente Código, embora as garantias maiores de higidez da cédula decorram mesmo do manuscrito.

Se elaborado por meio mecânico, a lei adverte que o testamento particular não pode conter rasuras ou espaços em branco, devendo ser assinado pelo testador, depois de lido na presença de pelo menos três testemunhas, que o subscreverão. Se escrito de próprio punho, entende-se que as entrelinhas e rasuras devem ser devidamente ressalvadas no texto para que o negócio não perca a validade.

Nessa modalidade de testamento, seja de próprio punho, seja por meio mecânico como diz a lei, como se percebe, o Código estabelece o número mínimo de três testemunhas. O testador poderá inserir quantas testemunhas desejar. Como há necessidade de confirmação desse testamento pelas testemunhas, o número maior representa, em tese, maior segurança. Contudo, esse número superior aumenta o risco de serem trazidas testemunhas impedidas, que poderão macular o ato.

O testamento inteiro deve, em princípio, ser redigido pelo testador. Não vicia o ato o fato de ter sido copiado de minuta, rascunho ou anotações. Se não há controle de linguagem, o testador redige como bem quiser, com erros, contradições, linguagem grosseira, borrões, entrelinhas etc. O trabalho depois será do intérprete, do juiz.

O testamento particular pode ser redigido em língua estrangeira, contanto que as testemunhas a compreendam (art. 1.880; antigo, art. 1.649). Todas as testemunhas devem conhecer a língua utilizada pelo testador. Uma única que não o saiba torna o negócio nulo. A data também aqui não é requisito essencial, embora seja útil e deva ser colocada. Em sua ausência, caberá à prova fixá-la. Também a lei não exige o reconhecimento de firma ou de letra do testador, nem o depósito oficial. Não há também como defender-se a necessidade de unidade de tempo e lugar na elaboração do testamento. Há que ser exigido que exista unidade de contexto, com as mesmas testemunhas e mesmas formalidades. A assinatura do testador é essencial. Mesmo manuscrito, sem sua assinatura, não haverá testamento.

Assim, para que o ato tenha validade, exigem-se a redação e a assinatura do testador, a leitura e a assinatura das testemunhas. A leitura, de acordo com o atual Código, será feita pelo testador. Na lei anterior, como não havia especificação, admitia-se a leitura por uma das testemunhas, pelo testador e até mesmo por um estranho ao ato. O vigente Código foi expresso no sentido de que a leitura seja sempre feita pelo disponente, nos parágrafos do art. 1.876.

No sistema de 1916, mesmo válido o documento, para que o testamento ganhasse eficácia, havia necessidade da confirmação do ato por pelo menos três testemunhas (arts. 1.647 e 1.648). Doravante, conforme o CC 1.878 do presente Código, as testemunhas testamentárias devem ser convocadas para confirmar o negócio testamentário ou, pelo menos, sobre sua leitura perante elas, e se reconhecem as próprias assinaturas, assim como a do testador. Pela regra, todas as testemunhas que participaram do ato devem ser convocadas. Contudo, a importante inovação vem expressa no parágrafo único do art. 1.878:

“Se faltarem testemunhas, por morte ou ausência, e se pelo menos uma delas o reconhecer, o testamento poderá ser confirmado, se, a critério do juiz, houver prova suficiente de sua veracidade.

Embora não caiba ao jurista raciocinar sobre fraudes, nesse caso a simplificação, abre larga margem de dúvidas. O testamento, qualquer que seja sua modalidade, é um dos negócios mais suscetíveis a fraudes e a ataques de nulidade. Toda a carga da responsabilidade, nesse caso, é transferida ao juiz, nessa disposição legal aberta, o qual poderá confirmar o testamento perante apenas uma das testemunhas.

Como se tem sempre sustentado, quando há uma cláusula aberta, caberá aos interessados apontar os caminhos ao magistrado. Melhor seria que a lei simplesmente dispensasse essa formalidade das testemunhas confirmatórias. Por outro lado, devem ser esgotadas as possibilidades de localização das testemunhas não encontradas.

Nesses processos avulta de importância o papel do Ministério Público. Não há que se entender a ausência das testemunhas mencionada na lei como a ausência técnica, definida nos arts. 22 e seguintes, mas como impossibilidade de sua localização.

É conveniente que o testador descreva todos os atos realizados. As testemunhas devem ouvir a leitura. Suas assinaturas devem ser lançadas na presença do testador. Se houver mais de uma folha, é conveniente que testador e testemunhas assinem todas as folhas, com numeração. As testemunhas não necessitam recordar com particularidades as disposições, mas delas terão conhecimento. Tal é importante para o ato de confirmação após a morte do disponente. Perante tantos óbices impostos pela lei, nada impede que o testador faça várias vias de igual teor do testamento, todas com assinatura, sua e das testemunhas. Se houver diferença entre os exemplares, haverá mais que um documento e portanto testamentos plúrimos. Caberá o exame à prova, altamente complexa nessa seara. (Silvio Venosa, em artigo publicado, intitulado “O testamento particular no Código Civil de 2002”, site genjuridico.com.br, datado de 29/12/2015, Juiz aposentando do Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, Membro da Academia Paulista de Magistrados, comentários ao CC 1.878, acessado em 18/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na versão de Guimarães e Mezzalira, o juiz ouvirá as testemunhas, perguntando-lhe se o testador cumpriu as solenidades legais, i.é, redigiu o texto e o leu para as três testemunhas ao mesmo tempo. Reconhecendo suas assinaturas, mesmo que somente uma só esteja viva, o juiz aprovará o testamento, mandando-o registrar da forma usual. Note-se que somente o testamento particular exige três (3) testemunhas.

Destaca-se sempre ser preciso chamar testemunhas idôneas, que provavelmente, estarão vivas nos próximos anos. Fazer testamento e não serem encontradas as testemunhas instrumentárias para poderem depor em juízo, é perda de tempo.

Jurisprudência: Civil e processual civil. Testamento particular. Assinado por quatro testemunhas e confirmado em audiência por três delas. Validade do ato. interpretação consentânea com a doutrina e com o novo Código Civil, art. 1.876, §§ 1º e 2º. Recurso Especial conhecido e provido. 1. Testamento particular. Artigo 1.645, II do CPC. Interpretação: Ainda que seja imprescindível o cumprimento das formalidades legais a fim de preservar a segurança, a veracidade e legitimidade do ato praticado, deve se interpretar o texto legal com vistas à finalidade por ele colimada. Na hipótese vertente, o testamento particular foi digitado e assinado por quatro testemunhas, das quais três o confirmaram em audiência de instrução e julgamento. Não há, pois, motivo para tê-lo por inválido. 2. Interpretação consentânea com a doutrina e como  o novo código civil artigo 1.876, §§ 1º e 2º. A leitura dos preceitos insertos nos artigos 1.133 do CPC e 1.648 CC/1916 deve conduzir a uma exegese mais flexível do artigo 1.645 do CC/1916, confirmada inclusive, pelo Novo Código civil cujo artigo 1.876, §§ 1º e 2º, dispõe: “O testamento, ato de disposição de última vontade, não pode ser invalidade sob alegativa de preterição de formalidade essencial, pois não pairam dúvidas que o documento foi firmado pela testadora de forma consciente e no uso pleno de sua capacidade mental”. Precedentes deste STJ. 3. Recurso especial conhecido e provido. (STJ – REsp 701.917/SP, rel. Ministro Luís Felipe Salomão, 4ª T, J 02/02/2010, DJe 01/03/2010). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.878, acessado em 18/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.879. Em circunstâncias excepcionais declaradas na cédula, o testamento particular de próprio punho e assinado pelo testador, sem testemunhas, poderá ser confirmado, a critério do juiz.

Segundo histórico, este artigo, sugerido pelo Prof. Miguel Reale, foi introduzido pela emenda n. 483-R, do Senador Josaphat Marinho. Não há preceito correspondente no Projeto de Lei n. 634/75, nem no Código Civil de 1916.

Atento à doutrina o relator, este artigo traz uma inovação, e muito importante. O que regula, na verdade, é uma outra forma de testamento especial. Trata-se de um testamento elaborado “em circunstâncias excepcionais”, que impedem ou dificultam extremamente o testador de se utilizar de outra forma de testar, ou do próprio testamento particular em sua configuração normal. Essas circunstâncias excepcionais, extraordinárias, de emergência, precisam estar mencionadas na cédula. Se o documento foi redigido de próprio punho e está assinado pelo testador, embora não tenha testemunhas, poderá ser confirmado, a critério do juiz.

As circunstâncias excepcionais, que justificam essa forma simplificada de testamento particular, podem ser as mais diversas: o testador está num prédio que se incendeia, e escreve o testamento, jogando o papel pela janela; o testador está sem comunicação, num Lugar isolado, perdido; o testador foi sequestrado, e, temendo que seja assassinado, escreve e assina o testamento; o testador está internado na UTI do hospital e, sentindo a proximidade da morte, redige o testamento.

O direito alemão prevê o Nottestament — testamento de emergência —, quando há o perigo de o testador morrer antes que seja possível realizar um testamento perante o notário, ou se a pessoa está em local isolado, em consequência de circunstâncias extraordinárias (13GB, arts. 2.449 e 2450). O Código Civil francês, art. 985; o suíço, art. 506; o espanhol, arts. 700 e 701; o italiano, art. 609; o português, art. 2.220; o chileno, art. 1.035; o paraguaio, art. 2.666; o mexicano, art. 1.565; e o argentino, art. 3.689, admitem, igualmente, testamentos com redução de formalidades, se o testador se acha em risco iminente de morte ou submetido a situações anormais, de calamidade pública (como terremoto, inundação, seca, epidemia, desastre, conturbação popular, revolução), enfim, diante de motivos de força maior, que impedem ou dificultam extremamente a utilização de alguma forma ordinária de testamento. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 978, CC 1.879, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 18/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na continuação Silvio Venosa, no item 2 Testamento Particular Excepcional - Nosso Código de 1916 não admitia o testamento nuncupativo, a não ser como modalidade do testamento militar. O direito anterior a 1916 admitia o testamento nuncupativo como forma ordinária. Nessa modalidade, chegava-se mesmo a possibilitar o testamento oral, quando o testador, em perigo de vida, não tinha tempo de fazer testamento escrito. Exigia-se, no entanto, a presença de seis testemunhas.


Em disposição surpreendente que certamente trará celeumas doutrinárias e infindáveis contendas, o Código de 2002 introduz modalidade de testamento que açambarca a hipótese do testamento nuncupativo e outras situações extremas. Trata-se, realmente, de outra modalidade de testamento. Dispõe o art. 1.879:

“Em circunstâncias excepcionais declaradas na cédula, o testamento particular de próprio punho e assinado pelo testador, sem testemunhas, poderá ser confirmado, a critério do juiz.

Esse dispositivo não constava originalmente no Projeto do atual Código. O artigo foi sugerido pelo Professor Miguel Reale, tendo sido introduzido pela Emenda nº 483-r, do Senador Josaphat Marinho. Mais uma vez, a carga de responsabilidade pela confirmação desse testamento excepcionalíssimo será do juiz, com tudo aquilo que se sustenta em torno das chamadas disposições abertas.

A primeira questão que aflora é definir quais seriam essas circunstâncias excepcionais que podem ensejar forma tão simplificada de testamento. Exige também a lei que essa excepcionalidade seja declarada na cédula. Não se admite que essa cédula testamentária seja redigida por meios mecânicos. Nem há que se pensar, portanto, na possibilidade de utilização de meios eletrônicos. Esse testamento, mais do que qualquer outro, há de obedecer à legalidade, ou seja, à tipicidade estrita.

A primeira situação excepcional que vem à mente é justamente a proximidade da morte do disponente e a impossibilidade de ele recorrer às formas ordinárias. Alerte-se, contudo, que esse testamento não se confunde com os testamentos especiais. Em princípio, quando estiver aberta a possibilidade de testar sob a forma de testamento marítimo, aeronáutico ou militar, não é de ser admitido o testamento excepcional.

Outra questão que deve ser lembrada diz respeito à cessação das condições excepcionais e à possibilidade de o testador ratificar o testamento anterior ou elaborar novo testamento pelas vias ordinárias. Se o disponente usa da faculdade do art. 1.879 por entender que está à beira da morte, mas depois sobrevive dias, meses ou outro período que lhe permitia testar sob a forma ordinária, não pode ser dada validade ao testamento excepcional. Toda essa série de aspectos fáticos deve ser examinada pelo juiz.

O Código deveria ter previsto um prazo após a cessação da excepcionalidade para que novo testamento fosse elaborado sob pena de caducidade do excepcional, como faz no testamento marítimo (art. 1.891). Nesse caso, se o testador não morrer na viagem, nem nos 90 dias subsequentes a seu desembarque em terra, onde possa fazer, na forma ordinária, outro testamento, o testamento marítimo e o aeronáutico caducarão.

O ordenamento italiano, em situação semelhante, no testamento lavrado em estado de calamidade pública, assina um prazo de eficácia de três meses depois da cessação da causa, para que o testamento perca sua eficácia. Parece que a lacuna em nossa lei a esse respeito é injustificável e nem o Projeto nº 6.960, se apercebeu da falha. Uma das principais características do testamento excepcional é a efemeridade, sua curta eficácia temporal. O exame desse importante aspecto nesse testamento, como se nota, ficará relegado ao critério da jurisprudência no caso concreto, mas não pode ser dispensado.

Aliás, o testamento aeronáutico parece ser um paradoxo, pois não é crível que, numa aeronave em perigo, tenha seu comandante tempo e disponibilidade de preocupar-se com o testamento de um passageiro ou tripulante (art. 1.889). No entanto, aqui, sem dúvida, poderá estar presente uma situação excepcional que autorize o testamento de próprio punho, assim declarado pelo testador, conforme o art. 1.879.

Tomando exemplos da legislação comparada, pode-se imaginar outras circunstâncias excepcionais, como estar o disponente tomado de moléstia considerada contagiosa, impedindo o contato com terceiros; em local isolado por inundação ou outra intempérie, ou ainda, local em estado de calamidade pública. Em algumas dessas situações excepcionais, revive-se, de certa forma, o testamento tempore pestis do passado remoto. Em todas as situações, porém, o que deve ser analisado pelo juiz é o fato de o testador estar impossibilitado de se utilizar das formas ordinárias ou mesmo especiais de testamento. Essa deve ser a primeira preocupação do juiz. De qualquer forma, o testamento em estado de necessidade ou em circunstâncias excepcionais, como diz a lei, encontrará seu espaço, nas hipóteses nas quais os testamentos especiais não são aplicáveis. Somente o futuro dirá se andou bem o legislador ao quebrar o sistema formalista e introduzir essa modalidade tão simplificada de testamento. (Silvio Venosa, em artigo publicado, intitulado “O testamento particular no Código Civil de 2002”, site genjuridico.com.br, datado de 29/12/2015, Juiz aposentando do Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, Membro da Academia Paulista de Magistrados, comentários ao CC 1.879, acessado em 18/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na toada de Guimarães e Mezzalira, o artigo visa proteger pessoas que tenham sido sequestradas, que estejam presas em ferragens, por desmoronamento de prédio, que, acidentadas, fiquem impossibilitados de ser transportadas e receio de morrer de fome etc., enfim, uma circunstância não regular ou normal, sem condições de pedir a presença de testemunhas para a sua manifestação de vontade.

De um modo geral, todos os testamentos devem ter testemunhas, ser lido para elas e assinado em seguida. Ocorre que, em circunstâncias excepcionais, como, em caso de sequestro, naufrágio, isolado no meio de uma estrada deserta, sem tráfego e ferido no acidente do seu veículo, refém em mãos de criminosos, i.é, sempre em circunstâncias excepcionais, a pessoa pode redigir seu testamento, de próprio punho, declarando o momento difícil que atravessa de excepcionalidade, e redige seu testamento.

Com sua morte, encontrado o corpo e o testamento, alguém deve apresenta-lo para o juiz, que analisará os fatos, a comprovação do isolamento e exceção. Considerando correto o procedimento do testador, o magistrado poderá aprovar o testamento, mandando registra-lo.

"Convém lembrar que esse testamento, por ser especial, terá sua eficácia afastada se a morte do testador não se der até 90 dias após a sua elaboração, aplicando-se por interpretação extensiva, às normas atinentes à caducidade dos testamentos especiais”. (Diniz, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, v. 6:  direito das sucessões. 28 ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p 255).

Jurisprudência: Ementa: Apelação cível. Reconhecimento de declaração de última vontade. Testamento particular. Art. 1.876, § 1º, do Código Civil formalidades legais não atendidas. Ausência de testemunhas. Situação excepcional. Não configurada. Art. 1.879, Código Civil. Recurso improvido. I. Nos termos do art. 1.876, § 1º, do Código Civil, o testamento particular escrito de próprio punho, para ser válido, deve ser lido na presença de pelo menos três testemunhas e por elas assinado. Apenas em situações excepcionais podem ser dispensadas as formalidades previstas no art. 1.876, do Código Civil. II. A condição especial prevista no art. 1.879, do Código Civil, de impossibilidade de convocação de testemunhas, deve ser cabalmente demonstrada nos autos, hipótese que não se verifica no presente caso, o que impede o reconhecimento da carta dispondo sobre a divisão dos bens da falecida, como testamento particular excepcional. (TJMG – AC 1.0290.13.005724-0/001, Relator: Des. Washington Ferreira, 7ª CV, J 25/08/2015. P de Súmula em 31/08/2015). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.879, acessado em 18/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Art. 1880. O testamento particular pode ser escrito em língua estrangeira, contanto que as testemunhas a compreendam.

Segundo o histórico, este artigo corresponde ao art. 1.932 do Projeto de Lei n. 634/75. Ver art. 1.649 do Código Civil de 1916.

Atento o Relator em sua doutrina, este artigo está deslocado. Devia ser um parágrafo do art. 1.876, ou vir depois dele.

Todas as testemunhas devem entender a língua em que está redigido o testamento, sob pena de nulidade, por vício de forma. O requisito da leitura perante as testemunhas é substancial (art. 1.876), e, se elas não compreendem a língua em que o documento foi escrito, não entendem o que se redigiu, não haveria nenhuma utilidade de a leitura ser feita, porque ouvir o que outra pessoa está dizendo em língua estrangeira, se o interlocutor não sabe falar essa língua, é a mesma coisa que não ouvir. E nem poderiam as testemunhas, na fase de confirmação do testamento, após a morte do testador (art. 1.878), certificar ao juiz todo o ocorrido. Não se precisava dizer, tão óbvio é, que o próprio testador deve conhecer a língua estrangeira em que escreve o seu testamento.

Bibliografia  ao Capítulo III: Miguel Reale, O projeto do novo Código Civil, 2. ed., São Paulo, Saraiva, 1999; Zeno Veloso, Testamentos, 2. ed., Belém. Cejup. 1993. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 979, CC 1.880, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 18/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No item 3 de seu artigo, “Publicação e confirmação do Testamento Particular (Disposições Processuais), Silvio Venosa, O testamento particular, seja ordinário ou excepcional, só pode ser executado, ainda que formalmente válido, após sua publicação em juízo, com citação dos herdeiros legítimos (art. 1.877; antigo, art. 1.646).


O art. 1.130 do CPC dá legitimidade ao herdeiro, legatário ou testamenteiro para requerer, depois da morte do testador, a publicação do testamento. Serão inquiridas as testemunhas do instrumento.

As testemunhas devem comparecer e reconhecer a autenticidade do documento (art. 1.878; antigo, art. 1.648 do Código Civil e art. 1.133 do CPC/1973 cf. CPC/2015, art. 737, § 2º). Veja o que foi dito a respeito da confirmação do testamento por uma única testemunha. Assim, o juiz ouve o Ministério Público e confirma o testamento, aplicando os arts. 1.126 e 1.127 do CPC/1973 atinentes às demais modalidades. Nesse procedimento, deverão ser intimados para a inquirição das testemunhas (art. 1.131 do CPC/1973): “I – aqueles a quem caberia a sucessão legítima; II – o testamenteiro, os herdeiros e os legatários que não tiverem requerido a publicação; III – O Ministério Público.”

Há que se entender que o convivente deve também ser intimado, pois concorrerá na herança. Os não encontrados serão intimados por edital. A oitiva é tão-só das testemunhas instrumentárias. Após a audiência, os interessados terão cinco dias para manifestarem-se sobre o testamento (art. 1.132 do CPC/1973). Os depoimentos das testemunhas é que convencerão o juiz da autenticidade ou não do documento. No sistema de 1916, como enfatizamos, se não localizadas pelo menos três testemunhas, o testamento não podia ser executado. Devem-se esgotar, como visto, os meios de localização. O cuidado do magistrado, quando se tratar da oitiva de apenas uma testemunha no atual sistema, deve ser redobrado, como reiteramos.

A matéria pode também ser discutida pelos meios processuais ordinários. Se o juiz tiver dúvidas, deve remeter as partes às vias ordinárias, extinguindo o processo.

A exigência das três testemunhas confirmatórias era o grande inconveniente do testamento particular no Código de 1916. Se mais de duas tivessem falecido ou desaparecido, tornava-se impossível executar o testamento. A possibilidade de confirmação por uma única testemunha no Código de 2002 facilita e incentiva a elaboração desse testamento, mas abre brechas de nulidade, conforme comentado. Além disso, o depoimento testemunhal é falho, embora as testemunhas não devam se recordar das disposições testamentárias, mas das formalidades do ato. Melhor seria, perante essas premissas, que simplesmente fosse abolida a necessidade das testemunhas confirmatórias.

O Anteprojeto de 1972 havia inovado bastante no tocante a essa modalidade, tendo ocorrido profundas alterações no Projeto de 1975, que se converteu no corrente Código Civil. Além da redução das testemunhas de cinco para duas, o anteprojeto determinava o reconhecimento da firma e da letra do testador e da firma das testemunhas, conforme direitos estrangeiros. O oficial público lançaria nota de “apresentação” do testamento. De qualquer forma, esse procedimento tornaria mais complexo o testamento particular. (Silvio Venosa, em artigo publicado, intitulado “O testamento particular no Código Civil de 2002”, site genjuridico.com.br, datado de 29/12/2015, Juiz aposentando do Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, Membro da Academia Paulista de Magistrados, comentários ao CC 1.880, acessado em 18/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na sequência de Guimarães e Mezzalira, et al, o testamento particular pode ser escrito em qualquer língua estrangeira, desde que as testemunhas tenham completo domínio desse idioma. Portanto, o italiano poderá redigi-lo em sua língua natal, tendo como testemunhas pessoas de nacionalidade italiana ou que dominem esse idioma. A escolha do idioma é, às vezes, importante, para o estrangeiro, desejoso de fazer seu testamento longe de sua “terrinha”.

Jurisprudência: Testamento particular elaborado no exterior. Cumprimento no brasil. Determinação de remessa dos autos ao STF. Aplicabilidade dos arts. 1.871 e 1.875 do CC. A legislação permite que o testamento seja escrito em língua estrangeira, sem distinção quanto ao seu cumprimento, desde que não se ache vício externo. Decisão reformada, para cumprimento dos artigos 1.126 do CPC/1973. Agravo provido. (TJSP- 0201011-03.2011.8.26.0000 – AI – Relator: Miguel Brandi; Comarca: Atibaia. Órgão Julgador: 7ª CDP, DJ 08/02/2012/ DJe 14/02/2012). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.880, acessado em 18/08/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

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