Direito Civil Comentado - Art. 541,
542, 543
- Da Doação – VARGAS, Paulo S. R.
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Parte
Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI
– Das Várias Espécies de Contrato
(art. 481
a 853) Capítulo IV – Da Doação
Seção I –
Disposições Gerais
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Art.
541. A
doação far-se-á por escritura pública ou instrumento particular.
Parágrafo
único. A doação verbal será válida se, versando sobre bens móveis e de pequeno
valor, se lhe seguir incontinenti a tradição.
Como alerta
Nelson Rosenvald, o caput do artigo demonstra que a doação é contrato
forma, não sendo aperfeiçoado apenas por manifestação verbal, sendo
indispensável a forma escrita, como de substância do ato, sob pena de
invalidação por nulidade da doação que lese o ora preceituado (CC 166, V).
A forma escrita
será da essência da doação de bens móveis, exceto no tocante a bens de pequeno
valor, em que excepcionalmente se admitirá a forma verbal pela própria
exigência de dinamicidade no tráfego jurídico. Justamente por isso, qualquer
outro negócio jurídico que envolva a transmissão da posse ou propriedade de
bens moveis de pequeno valor será realizado por escrito, sob pena de se
presumir a doação na ausência de retribuição imediata (v.g., penhor,
locação).
A chamada doação manual torna o contrato real, pois
a tradição se torna elemento apto à própria configuração do contrato. Como a
expressão pequeno valor é um conceito jurídico indeterminado,
interpretar-se-á o seu significado à luz da diretriz da concretude. Ou seja, as
circunstâncias do caso e as condições econômicas das partes determinarão o
critério de razoabilidade para aferir se é ou não possível dispensar a forma
escrita.
Tratando-se de
doação de bens imóveis, aplica-se o CC 108, impondo o teto de trinta
salários-mínimos como limite para a válida realização de uma doação por
instrumento particular. Acima de tal valor, a escritura pública é de forma ad
substantiam. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n.
10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e
atual., p. 595 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 01/10/2019. Revista e
atualizada nesta data por VD).
No comentário de Ricardo Fiuza, há um histórico cujo texto
refere-se Relatório Ernani Satyro, apenas uma alteração para acrescer o
parágrafo único ao art. 541, tratando sobre a doação verbal. O objetivo da
emenda foi restabelecer a redação do art. 1.168 do CC de 1916, cujo parágrafo
único fora injustificadamente suprimido do texto do anteprojeto.
A doutrina mostra que o contrato de doação deve
revestir-se, de regra, da forma solene (caput do artigo), como essencial
à validade do negócio jurídico, visto que prescrita pela dicção legal do
artigo. É celebrado por escritura pública, se a coisa doada for bem imóvel, de
valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente do País (art.
108), dependendo do registro imobiliário para a translatividade dominial
(aquisição da propriedade), prevalecendo, daí, o registro sobre qualquer outro
negócio (REsp 260.051-SP) ou por instrumento particular, em caso de imóveis
abaixo daquele valor ou de móveis de valor expressivo apenas alcançar bens
moveis de pequeno valor e se lhe seguir incontinente a tradição. A
jurisprudência tem, todavia, temperado a norma, como observamos: “Doação à
namorada. Empréstimo. Matéria de prova. O pequeno valor a que se refere o art.
1.168 do Código Civil há de ser considerado em relação à fortuna do doador: se
se trata de pessoa abastada, mesmo as coisas de valor elevado podem ser doadas
mediante simples doação manual (Washington de Barros Monteiro) (...)” (STF, 3’
II, REsp 155.240-Ri, rei. Mm. Antonio de Pádua Ribeiro, DI de 5-2-2001).
(Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 288 apud
Maria Helena Diniz Código Civil
Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf,
Microsoft Word. Acesso em 01/10/2019,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Nos apontamentos de Marco Túlio de Carvalho Rocha, a forma
de doação é: a) livre, se tiver por objeto bem móvel de pequeno valor transferido
imediatamente; b) por escritura pública, se de imóvel de valor superior a 30
salários mínimos (CC, 108); c) por escrito particular, nos demais casos (CC
541, caput). A exigência de forma escrita é da substância do ato, i.é, o
negócio é nulo se desatendida (CC 166, IV).
Desse
modo, se ocorre divergência entre herdeiro e terceiro que se diz donatário de
bem pertencente ao de cujus, cabe ao pretenso donatário realizar a prova
da doação mediante a apresentação de escrito de autoria do de cujus, sob
pena de não poder se considerar realizada doação válida. (Marco Túlio de
Carvalho Rocha apud Direito.com acesso
em 01.10.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art. 542. A doação feita ao nascituro valerá,
sendo aceita pelo seu representante legal.
Suporte interessante trazido por Nelson Rosenvald,
relacionado ao nascituro já possuir direitos da personalidade, como atributo
inerente a qualquer ser humano, desde a concepção. Porém, é carecedor de
capacidade de direito, atributo apenas concedido àqueles que já nasceram com
vida.
Ocorre que o direito eventual que lhe assiste para a
aquisição de direitos patrimoniais (extensivo à transmissão causa mortis, CC
1.798) é suficiente para permitir a validade do negócio jurídico de doação em
período anterior ao nascimento, mas posterior à concepção.
Contudo, apesar de válido o negócio jurídico, a condição
suspensiva do nascimento com vida provoca a ineficácia temporal do contrato (CC
125), ao aguardo do evento futuro e incerto. Como não se pode falar em
invalidade superveniente pois o negócio nasce valido ou inválido, o nascimento
sem vida provoca a definitiva ineficácia do negócio jurídico. Só se cogitará de
invalidade caso a doação tenha sido realizada sem que a concepção realmente
tivesse ocorrido. A nulidade resultará da impossibilidade do objeto do contrato
(CC 166, II).
A menção à aceitação
do representante legal significa que a anuência deste se insere no plano de
validade. Ou seja, sem a concordância do curador do nascituro, mesmo que o
nascimento se produza com vida, não haverá a doação pela falta da
representação. (Rosenvald Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n.
10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e
atual, p. 595 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 01/10/2019. Revista e
atualizada nesta data por VD).
Confirma a doutrina de Ricardo Fiuza, ser possível a
coação feita ao nascituro (o infans conceptus, cujo nascimento se
aguarda como fato futuro certo), visto que a lei põe a salvo desde a concepção
os direitos do nascituro (art. 2º, segunda parte do CC/2002). O contrato de
doação tem a sua validade, desde que já concebido o donatário ao tempo em que é
estabelecida a liberalidade e não do momento em que se dá a aceitação, segundo
doutrina João Luiz Alves. Trata-se de doação sob condição suspensiva: caducará
a doação, se o nascituro for natimorto, ou seja, dado à luz sem vida, o que há
de se distinguir do feto que, nascido não viável, de vida efêmera, morre imediatamente
após o nascimento. Pelo ato instante e fugaz de vida obtém direitos, tomando-se
definitiva a doação. A aceitação, necessária para aperfeiçoar o contrato,
dar-se-á pelo seu representante legal (v. art. 1.779, sobre a “curadoria
do ventre”). Ela é condicional ao nascimento com vida do nascituro (João Luiz
Alves, Código Civil da República dos Estados Unidos do Brasil anotado, Rio de
Janeiro, E Briguiet, 1917; Sérgio Abdala Senúão. Os direitos do nascituro —
aspectos cíveis, criminais e do biodireito, 2. ed. Belo Horizonte, Dei Rey,
2000.) (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 288 apud
Maria Helena Diniz Código Civil
Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf,
Microsoft Word. Acesso em 01/10/2019,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Como esclarece Marco Túlio de Carvalho Rocha, a
personalidade tem início com o nascimento com vida, mas, como tradicionalmente
é afirmado, a lei resguarda os interesses do nascituro. A proteção dos
interesses do nascituro é utilizada por grande parte da doutrina brasileira
para a defesa da tese Concepcionista, i.é, a que considera a personalidade a
partir da concepção ou da nidação (sabe-se, ela é um
passo fundamental no processo de gestação, pois permite o início do desenvolvimento
do embrião. A nidação acontece quando o zigoto, o óvulo fecundado
pelo espermatozoide, se desloca até o útero e se fixa em sua parede interna. A
parede interna do útero é chamada de endométrio – Nota VD).
O fato de a lei assegurar a proteção de interesses
significa o reconhecimento de que a dignidade humana não respeita as fronteiras
da existência autônoma; desde antes do nascimento e mesmo após a morte há
elementos da pessoa que merecem proteção jurídica. Do mesmo modo que a proteção
de traços da personalidade após a morte não significa que esta se estenda para
além do marco final, a proteção de elementos próprios da personalidade não
justifica a tese Concepcionista.
Em regra, o nascituro não é admitido nas
relações jurídicas; não pode vender, comprar, alugar, doar... A lei admite, no
entanto, que seja feita doação sob a condição suspensiva de o donatário vir a
nascer com vida. Implementada a condição, a obrigação assumida pode ser
cobrada; se não vier a ser implementada, o negócio resta ineficaz.
Conforme o dispositivo em comento, o representante legal do nascituro é
a pessoa legitimada a realizar tal negócio sob condição suspensiva.
Os representantes do nascituro são, ordinariamente, seus pais. Na falta
ou em caso de incapacidade destes, será o nascituro representado pelo curador
da mãe, se houver, ou, se não houver, por curador ad hoc (Marco Túlio de
Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 01.10.2019, corrigido e aplicadas
as devidas atualizações VD).
Art. 543. Se o donatário for absolutamente
incapaz, dispensa-se a aceitação, desde que se trate de doação pura.
Sob o prisma de Nelson Rosenvald, o Código Civil de 2002 inovou
substancialmente com essa regra. Agora, dispensa-se a aceitação do
absolutamente incapaz nas doações puras, posto serem elas realizadas em
beneficio exclusivo. Quer dizer, não se trata de aceitação presumida ou ficta
do incapaz. Simplesmente se aperfeiçoa a doação com a tradição do bem ao
incapaz e com o registro da escritura de doação dobem imóvel, sem a participação
do absolutamente incapaz e de seu representante legal. O consentimento do
incapaz deixa de ser elemento integrativo do contrato.
Certamente, em se tratando
de doação em prol de incapaz com encargo, a necessidade de aceitação através do
representante será imperiosa, pois o modo produz obrigações para aquele. Mesmo
na doação pura, provado ao juiz pelo representante que a liberalidade é
desvantajosa ao incapaz, será ela reputada como ineficaz perante este. (Rosenvald
Nelson, apud Código Civil Comentado:
Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar
Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual, p. 596 - Barueri, SP: Manole,
2010. Acesso 01/10/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).
Já em sua doutrina, Ricardo Fiuza aponta a doação pura, desprovida
de encargos, vindo em benefício do absolutamente incapaz, desobrigando, por
tais razões, a aceitação. A dispensa, em verdade, arrima-se em lógica jurídica,
posto que a norma tem finalidade protetiva, dando ensejo de ele poder receber
doações. A aceitação, no caso, não é mais ficta ou presumida. Deixa de ser
exigida, como elemento integrativo à formação do contrato.
Revela notar o tratamento diferenciado dado pela lei ao nascituro
(CC 542) para o qual se exige a aceitação do representante legal. E o nascituro
não é, sequer, absolutamente incapaz, porque ainda não nasceu. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 289 apud
Maria Helena Diniz Código Civil
Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf,
Microsoft Word. Acesso em 01/10/2019,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Voltando
ao Código de 1916 conta Marco Túlio de Carvalho Rocha, admitia que incapazes
aceitassem doações puras. Realizava, com essa autorização, recorte na
incapacidade civil dessas pessoas. A doutrina brasileira, no entanto, via na
referida autorização uma contradição entre a capacidade para aceitar doações e
o estado de incapacidade do donatário, como se a incapacidade civil devesse ser
rígida e igual para todos os atos. A inovação do artigo em comento pretendeu,
portanto, eliminar essa suposta antinomia eliminando a necessidade de
aceitação. A regra, em sua literalidade, permite o absurdo de se poder tornar o
incapaz proprietário de bens perigosos e inadequados por mero ato unilateral do
doador. A supressão da consulta aos interesses do incapaz atenta contra sua
dignidade, tal como constitucionalmente protegida e, pois, em tais casos,
impõe-se a recusa da aplicação da regra em seu sentido literal, permitindo-se
considerar nulo o ato de doação. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso
em 01.10.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
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