DIDÁTICA DO ENSINO SUPERIOR
– ANTÔNIO CARLOS GIL –
ATLAS S.A.2015 – PREFÁCIO – 1. O QUE É DIDÁTICA DO ENSINO SUPERIOR - VARGAS
DIGITADOR
Prefácio
Com intensidade muito maior
do que em qualquer outra época, o ensino universitário vem sendo objeto de
discussão. Discute-se o acesso de um contingente cada vez maior de pessoas a
esse nível de ensino. Discute-se o perfil do profissional que a universidade
deve formar. Discute-se o que fazer para tornar mais eficaz o ensino
proporcionado pelos estabelecimentos de Ensino Superior. E, em relação a este
item, o papel das novas tecnologias de ensino corresponde, sem dúvida, à
discussão mais constante.
Também se discute acerca da
preparação dos professores universitários. E é consenso que essa preparação
deve ocorrer principalmente em cursos de pós-graduação, como define a Lei de
Diretrizes e Bases. Como consequência, os cursos de Mestrado e Doutorado vêm
sendo muito procurados por profissionais com interesse no exercício do
Magistério Superior. Basta considerar que em 1996, segundo dados da CAPES,
existiam 67.820 alunos da pós-graduação no país e em 2003 eram 112.237.
Os cursos de pós-graduação,
no seu sentido estrito, têm como objetivo principal formar pesquisadores, o que
contribui significativamente para que seus concluintes possam ministrar
melhores aulas. Mas esses cursos, em sua grande maioria,não oferecem a seus
estudantes disciplinas voltadas para o desenvolvimento de habilidades
pedagógicas, que são tão importantes para o professor quanto os conhecimentos
específicos referentes às disciplinas que pretendem lecionar. Isto porque nem
as novas concepções acerca do papel do professor nem o desenvolvimento das
tecnologias de comunicação foram capazes de tornar desnecessária a presença em
sala de aula de professores hábeis para promover apresentações, animar
discussões e incentivar os estudantes a desenvolver atividades fora da sala de
aula.
Requer-se, ainda, a presença
em sala de aula de profissional que, mediante habilidosa combinação de suas
habilidades pessoais com as exigências do ambiente e as expectativas dos
estudantes, seja capaz de tornar o aprendizado mais agradável e eficiente. É
necessária a presença de profissional que saiba definir objetivos de ensino,
selecionar conteúdos, escolher as estratégias de ensino mais adequadas e
promover uma avaliação comprometida coma aprendizagem. Ou, em outras palavras,
de um professor que detenha conhecimentos e habilidades relacionadas à
Didática, especificamente Didática do Ensino Superior.
O ensino de Didática tem sido
bem aceito no Ensino Básico e Médio, mas não no Ensino Superior. Basta
considerar que um dos mais importantes livros destinados à preparação de
professores universitários, que é o Wilbert J. McKeachie, vem sendo editado nos
EUA há mais de 50 anos, com o título Teaching
tips (“Dicas de ensino”). Constitui ele excelente manual de didática do
Ensino Superior.
Ao aceitar, portanto, a
publicação desta Didática do Ensino
Superior, a Editora Atlas, cujas obras se destinam principalmente ao
público universitário, demonstra sua crença nas possibilidades de aprimoramento
do pessoal docente nesse nível. Não poderia, portanto, ao prefaciar este livro,
deixar de agradecer à Editora Atlas, de forma especial ao seu Presidente, Luiz
Hermann Júnior, e ao seu Diretor de Marketing Editorial, Ailton Bonfim Brandão,
a confiança depositada nesta obra. E de lembrar, com muita saudade, o apoio
oferecido por tantos anos por Luiz Hermann ao nosso trabalho e ao de tantos
outros autores nacionais.
ANTONIO CARLOS GIL
1
– O que é didática do Ensino Superior
Durante muito tempo
prevaleceu no âmbito do Ensino Superior a crença de que, para se tornar um bom
professor neste nível, bastaria dispor de comunicação fluente e sólidos
conhecimentos relacionados à disciplina que pretendesse lecionar. A
justificativa dessa afirmação fundamentava-se no fato de o corpo discente das
escolas superiores ser constituído por adultos, diferentemente do corpo
discente do ensino básico, constituído por crianças e adolescentes. Assim,
esses alunos não necessitariam do auxílio de pedagogos. Aliás, o próprio termo pedagogia tem sua origem relacionada à
palavra criança (em grego: paidos = criança; gogein = conduzir). Os estudantes universitários, por já possuírem
uma “personalidade formada” e por saberem o que pretendem, não exigiriam de
seus professores mais do que competência para transmitir os conhecimentos e
para sanar suas dúvidas. Por essa razão é que até recentemente não se
verificava preocupação explícita das autoridades educacionais com a preparação
de professores para o Ensino Superior. Ou melhor, preocupação existia,mas com a
preparação de pesquisadores, ficando subentendido que quanto melhor pesquisador
fosse mais competente professor seria.
Hoje são poucas as pessoas
envolvidas com as questões educacionais que aceitam uma justificativa desse
tipo. O professor universitário, como o de qualquer outro nível, necessita não
apenas de sólidos conhecimentos na área em que pretende lecionar, mas também de
habilidades pedagógicas suficientes para tornar o aprendizado mais eficaz. Além
disso, o professor universitário precisa ter uma visão de mundo, de ser humano,
de ciência e de educação compatível com as características de sua função.
As deficiências na formação
do professor universitário ficam claras nos levantamentos que são realizados
com estudantes ao longo dos cursos. Nestes é comum verificar que a maioria das
críticas em relação aos professores refere-se à “falta de didática”. Por essa
razão é que muitos professores e postulantes à docência em cursos universitários
vêm realizando cursos de didática do Ensino Superior, que são oferecidos em
nível de pós-graduação, com uma frequência cada vez maior, por instituições de
Ensino Superior.
Como este livro é
inteiramente dedicado à Didática do Ensino Superior, seu Capítulo 1 destina-se
à discussão do significado da formação dos professores universitários. Após
estudá-lo cuidadosamente, você será capaz de:
·
Analisar o conceito de Didática em um
contexto histórico;
·
Reconhecer a importância da opção pelo ensino
ou pela aprendizagem;
·
Contrastar diferentes abordagens acerca do
processo da aprendizagem;
·
Contrastar os princípios da Pedagogia e da
Andragogia;
·
Identificar fatores que contribuem para a
eficácia da aprendizagem.
1.1 – Qual o lugar da didática na formação
de professores
O termo didática deriva do grego didaktiké,
que tem o significado de arte de ensinar. Seu uso difundiu-se com o
aparecimento da obra de Jan Amos Comenius (1592-1670), Didactica Magna, ou Tratado
da arte universal de ensinar tudo a todos, publicada em 1657. Nos dias
atuais, deparamo-nos com muitas definições diferentes de didática, mas quase
todas apresentam-na como ciência, técnica ou arte de ensinar. Uma definição
obtida em dicionário atual a vê como “parte da Pedagogia que trata dos preceitos
científicos que orientam a atividade educativa de modo a torná-la mais
eficiente” (HOUAISS, 2011). Com efeito, a Pedagogia reconhecida
tradicionalmente como a arte e a ciência da educação, enquanto ao didática é
definida como a ciência e a arte do ensino. Para Masetto (1997), Didática é “o
estudo do processo de ensino-aprendizagem em sala de aula e de seus resultados”
e surge, segundo Libâneo (1994, p. 58), “quando os adultos começam a intervir
na atividade de aprendizagem das crianças e jovens através da direção
deliberada e planjeda do ensino, ao contrário das formas de intervenção mais ou
menos espontâneas de antes”.
Até o final do século XIX, a
Didática encontrou seus fundamentos quase que exclusivamente na filosofia. Isso
pode ser constatado não apenas nos trabalhos de Comenius, mas também nos Jean
Jacques Rousseau (1712-1778), Johann Heinrich Pestalozzi (1746-1827), Johann
Friedrich Herbart (1777-1841) e de outros pedagogos desse período. As obras
desses autores, no entanto, mostraram-se bastante adiantadas em relação às
concepções psicológicas dominantes em seu tempo.
A partir do final do século
XIX, a Didática passou a buscar fundamentos também nas ciências, especialmente
na Biologia e na Psicologia, graças às pesquisas de cunho experimental. No início
do século XX, por sua vez, surgiram números movimentos de reforma escolar tanto
na Europa quando na América. Embora diversos entre si, esses movimentos
reconheciam a insuficiência da didática tradicional e aspiravam a uma educação
que levasse mais em conta os aspectos psicológicos envolvidos no processo de
ensino. Costuma-se reunir essas tendências pedagógicas sob o nome de Pedagogia
da “Escola Nova” ou da “Escola Ativa”. A literatura referente a essas
tendências é muito extensa e envolve obras de autores como: Ovide Decroly
(1881- 1932), da Bélgica, Georg Kerschensteiner (1854-1932), da Alemanha, Roger
cousinet (1881-1973), da França, Édouard Claparède (1873-1940), da Suíça, e
John Dewey (1859-1952), dos Estados Unidos. Esses movimentos surgiram dentro de
um contexto histórico-social que teve como foco principal o processo de
industrialização, com a burguesia industrial firmando-se como classe hegemônica
e interessada, consequentemente, na difusão de suas ideias liberais.
O movimento escolanovista
surgiu como uma nova forma de tratar os problemas da educação, procurando
fornecer um conjunto de princípios tendentes a rever as formas tradicionais de
ensino. A Escola Nova pretendia ser um movimento de renovação pedagógica de
cunho fundamentalmente técnico, que buscava aplicar na prática educativa os
conhecimentos derivados das ciências do comportamento. Com efeito, a partir da
segunda década do século XX a Didática passou a seguir os postulados da Escola
Nova. Como essa perspectiva afirmava a necessidade de partir dos interesses
espontâneos e naturais da criança, passou-se a valorizar os princípios de
atividade, liberdade e individualização. Abandonou-se a visão da criança como
um adulto em miniatura para centrar-se nela como um ser capaz de adaptar-se a
cada uma das fases de sua evolução. Assim, do aluno passivo ante os
conhecimentos transmitidos pelo professor passou-se ao aluno que se autoeduca
ativamente num processo natural, sustentado pelos interesses e ações concretas
de seus colegas.
A ideia básica da Escola
Nova é a de que o aluno aprende melhor por si próprio. A atenção às diferenças
individuais e a utilização de jogos educativos passaram, portanto, a ter maior
destaque. Dessa forma, a Didática da Escola Nova passou a considerar o aluno
como sujeito da aprendizagem. O que caberia ao professor seria colocar o aluno
em situações em que fosse mobilizada a sua atividade global, possibilitando a
manifestação de suas atividades verbais, escritas, plásticas ou de qualquer
outro tipo. O centro da atividade escolar não seria, portanto, nem o professor
nem a matéria, mas o aluno ativo e investigador. Ao professor caberia
principalmente incentivar, orientar e organizar as situações de aprendizagem,
adequando-as às capacidades e às capacidades e às características individuais
dos alunos.
No Brasil, as ideias da
escola Nova tornaram-se conhecidas na década de 1920 e foram muito prestigiadas
após a Revolução de 11930, graças ao trabalho de educadores domo Fernando de
Azevedo, Anísio Teixeira e Lourenço Filho. Estas ideias, no entanto, receberam
muitas críticas, principalmente dos educadores mais conservadores. A Escola
Nova foi acusada de não exigir nada dos alunos, de abrir mão dos conteúdos
tradicionais e de acreditar ingenuamente em sua espontaneidade. Como as mudanças
introduzidas pela Revolução de 1930 não foram suficientes para abalar
significativamente o conservadorismo das elites brasileiras, a Escola Nova não
conseguiu modificar de maneira significativa os métodos didáticos utilizados
nas escolas brasileiras. Mas no meio acadêmico universitário, o ensino da
Didática continuou até a década de 1950 a privilegiar objetivos, temas e
procedimentos metodológicos de inspiração escolanovista.
Do início da década de 1950
até o final da década de 1970, o ensino da didática privilegiou métodos e
técnicas de ensino com vistas a garantir a eficiência da aprendizagem dos
alunos e a defesa de sua neutralidade científica. O tecnicismo passou a assumir
uma posição fundamental no discurso educacional e consequentemente no ensino da
Didática. Enquanto disciplina acadêmica, a didática passou a enfatizar a
elaboração de planos de ensino, a formulação de objetivos instrucionais, a
seleção de conteúdos, as técnicas de exposição e de condução de trabalhos em
grupo e a utilização de tecnologias a serviço da eficiência das atividades
educativas. A Didática passou a ser vista principalmente como um conjunto de
estratégias para proporcionar o alcance dos produtos educacionais,
confundindo-se com a Metodologia de Ensino. Seus propósitos eram, pois, os de
“fornecer subsídios metodológicos aos professores para ensinar bem, sem se
perguntar a serviço do que e de quem se ensina” (OLIVEIRA, ANDRÉ, 2003, p. 13).
Essa tendência acentuou-se com a adoção das políticas de cunho
desenvolvimentarista pelo governo militar que se instalou em 1964, que tinha a
formação de mão-de-obra como o referencial central da educação.
A partir do final da década
de 1970, acentuaram-se as críticas a essa Didática instrumental, sobretudo em
relação aos pressupostos da neutralidade científica e técnica que a envolvem.
De fato, a Didática, nessa perspectiva, pode ser concebida como um conjunto de
conhecimentos técnicos apresentados de forma universal e, consequentemente,
desvinculados dos problemas relativos ao sentido e aos fins da educação, dos
conteúdos específicos e do contesto sociocultural concreto em que foram gerados
(CANDAU, 1986).
As principais críticas a
essa didática instrumental têm sido feitas por educadores vinculados à corrente
conhecida como didática crítico-social dos conteúdos. Segundo os que a
defendem, é necessário, em primeiro lugar, definir um projeto de sociedade que
contemple a escola com função de transformação da realidade na qual está
inserida. A partir desse projeto de sociedade, busca-se uma proposta pedagógica
que instrumentalize o aluno para que, como cidadão, possa transformar a
realidade existente. Um dos principais expoentes desse movimento é José Carlos
Libâneo, que afirma em um de seus textos:
“Insistimos bastante na exigência didática de partir do
nível de conhecimentos já alcançado, da capacidade atual de assimilação e do
desenvolvimento mental do aluno. Mas, atenção: não existe o aluno em geral, mas
um aluno vivendo numa sociedade determinada, que faz parte de um grupo social e
cultural determinado, sendo que essas circunstâncias interferem na sua
capacidade de aprender,nos seus valores e atitudes, na sua linguagem e suas
motivações. Ou seja, a subjetividade e a experiência sociocultural concreta dos
alunos são o ponto de partida para a orientação da aprendizagem. Um professor
que aspira ter uma boa didática necessitra aprender a cada dia como lidar com a
subjetividade dos alunos, sua liguagem, suas percepções, sua prática de vida.
Sem essa disposição, será incapaz de colocar problemas, desafios, perguntas,
relacionados com os conteúdos, condição para se conseguir uma aprendizagem
significativa. [...] A didática hoje precisa comprometer-se com a qualidade
cognitiva das aprendizagens e esta, por sua vez, está associada à aprendizagem
do pensar. Cabe-lhe investigar como se pode ajudar os alunos a se constituírem
como sujeitos pensantes, capazes de pensar e lidar com conceitos, argumentar,
resolver problemas, para se defrontarem com dilemas e problemas da vida
prática. [...] Para adequar-se às necessidades contemporâneas relacionadas com
as formas de aprendizagem, a didática precisa fortalecer a investigação sobre o
papel mediador do professor na preparação dos alunos para o pensar. [...] Nesse
caso, a questão está em como o ensino pode impulsionar o desenvolvimento das
competências cognitivas mediante a formação de conceitos teóricos. Ou, em
outras palavras, o que fazer para estimular as capacidades investigadoras dos
alunos ajudando-os a desenvolver competências e habilidades mentais (LIBÂNEO,
2001, p. 3).
A polêmica em relação à
Didática é bastante acentuada. Na verdade,e sta disciplina nunca foi
monolítica. É o que prova a própria necessidade de adjetivação adotada muitas
vezes: Didática renovada, Didática ativa, Didática nova, didática tradicional,
Didática experimental, Didática psicológica, Didática sociológica, Didática
filosófica, Didática moderna, Didática geral, didática especial etc. (CASTRO,
1991, p, 21). Essa polêmica, no
entanto,não aparece com tanta ênfase em relação ao ensino universitário. Embora
os estudiosos da educação insistam na importância da aquisição de conhecimentos
e habilidades pedagógicas pelos professores também nesse nível de ensino,
muitos professores universitários não reconhecem a importância da Didática para
a sua formação.
Cabe considerar também que a
maioria dos professores universitários não dispõe de preparação pedagógica. E
também qe, ao contrário dos que lecionam em outros níveis, muitos professores
universitários exercem duas atividades: a de profissional de determinada área e
a de docente, com a predominância da primeira. Por essa razão, tendem a
conferir menos atenção às questões de natureza didática que os professores dos
demais níveis, que são os que receberam sistematicamente formação pedagógica.
Aliás, no Ensino Superior é
onde menos se verifica menor diversidade em relação às práticas didáticas. As
aulas expositivas são as mais frequentes e o professor de modo geral aprende a
ensinar por ensaio e erro. O professor constitui a principal fonte sistemática
de informações, e uma das habilidades que mais incentivam nos alunos é a da
menorização. A prática mais constante de avaliação da aprendizagem consiste em
aplicar provas e dar notas, que com frequência também é usada como meio de
estabelecer autoridade em relação ao aluno. Aos alunos, por sua vez, cabe
colocarem-se na condição de ouvintes e esperar que os professores “deem aulas”.
Até parece, como afirma Maria Isabel Cunha (1997, p. 26), “que os professores
criam um certo sentimento de culpa se não são eles que estão ‘em ação’, isto é,
ocupando espaço com a palavra na sala de aula”.
1.2 Ensino ou aprendizagem?
Uma das principais questões
relacionadas à atuação do professor universitário refere-se à relação entre
ensino e aprendizagem. Trata-se de um assunto bastante polêmico, apesar de
alguns autores considerarem-no uma falsa questão. Para Abreu e Masetto (1986),
uma das mais importantes opções feitas pelo professor dá-se entre o ensino que
ministra ao aluno e a aprendizagem que este adquire.
Muitos professores, ao se
colocarem à frente de uma classe, tendem a se ver como especialistas na
disciplina que lecionam a um grupo de alunos interessados em assistir a suas
aulas. Dessa forma, as ações que desenvolvem em sala de aula podem ser
expressas pelo verbo ensinar ou por correlatos, como: instruir, orientar, apontar, guiar, dirigir, treinar, formar, amoldar,
preparar, doutrinar e instrumentar. A atividade desses professores, que, na
maioria das vezes, reproduz os processos pelos quais passaram ao longo de sua
formação, centraliza-se em sua própria pessoa, em suas qualidades e
habilidades. Assim, acabam por demonstrar que fazem uma inequívoca opção pelo
ensino.
Esses professores
percebem-se como especialistas em determinada área do conhecimento e cuidam
para que seu conteúdo seja conhecido pelos alunos. “A sua arte é a arte da
exposição” (LEGRAND, 1976, p. 63). Seus alunos, por sua vez, recebem a
informação, que é transmitida coletivamente. Demonstram receptividade e a
assimilação correta por meio de “deveres”, “tarefas” ou “provas individuais”.
Suas preocupações básicas podem ser expressas por indagações como: “Que
programa devo seguir?”, “Que matéria devo dar?”, “Que critério deverei utilizar
para aprovar ou reprovar os alunos?”.
Mas há professores que veem
os alunos como os principais agentes do processo educativo. Preocupam-se em
identificar suas aptidões, necessidades e interesses com vistas a auxiliá-los
na coleta das informações de que necessitam no desenvolvimento de novas
habilidades, na modificação de atitudes e comportamentos e na busca de novos
significados nas pessoas, nas coisas e nos fatos. Suas expectativas,
interesses, possibilidades, oportunidades e condições para aprender. Atuam,
portanto, como facilitadores da aprendizagem, segundo a linguagem utilizada por
Carl Rogers (1902-1987). Os educadores progressistas, preocupados com uma
educação para a mudança, constituem os exemplos mais claros de adoção desta
postura. Seus alunos são incentivados a expressar suas próprias ideias, a
investigar com independência e a procurar os meios para o seu desenvolvimento
individual e social.
À medida que a ênfase é
colocada na aprendizagem, o papel predominante do professor deixa de ser o de
ensinar, e passa a ser o de ajudar o aluno a aprender. Este contexto, educar
deixa de ser a “arte de introduzir ideias na cabeça das pessoas, mas de fazer
brotar ideias” (WERNER, BOWER, 1984, p. 1-15). As preocupações básicas desses
professores, por sua vez, são expressas em indagações como: “Quais as
expectativas dos alunos?”, “Em que medida determinado aprendizado poderá ser
significativo para eles?”, “Quais as estratégias mais adequadas para facilitar
seu aprendizado?”.
Consciente ou
inconscientemente, os professores tendem a enfatizar um ou outro polo, o que
faz com que sua atuação se diversifique significativamente. Em apoio à postura
que enfatiza o ensino, costuma-se lembrar que o magistério é uma vocação, que a
missão do professor é a de ensinar, que para isso é que ele se preparou e que,
à medida que seja um especialista na matéria e que domine a “arte de ensinar”,
ninguém melhor do que ele poderá contribuir para que, por meio de seu ensino,
os alunos aprendam.
Muitas críticas, no entanto,
têm sido feitas à postura dos professores que conferem maior ênfase ao ensino.
Segundo Paulo Freire (2002, p, 86),
A
narração, de que o educador é o sujeito, conduz os educandos à memorização
mecânica do conteúdo narrado. Mais ainda, a narração os transforma em
“vasilhas”, em recipientes a serem “enchidos” pelo educador. Quanto mais vá
enchendo os recipientes com seus “depósitos”, tanto melhor educador será.
Quanto mais se deixarem totalmente “encher”, tanto melhores educados serão.
Esse tipo de educação,
caracterizada pelo ato de transmitir, depositar ou transferir valores e conhecimentos,
é chamado por Paulo Freire (2002, p. 67) de “bancária”, pois nela:
a) O
educador é o que educa; os educandos, os que são educados;
b) O
educador é o que sabe; os educandos, os que não sabem;
c) O
educador é o que pensa; os educandos, os pensados;
d) O educador
é o que diz a palavra; os educandos, os que a escutam docilmente;
e) O
educador é o que disciplina; os educandos, os disciplinados;
f) O
educador é o que opta e prescreve sua opção; os educandos, os que seguem a
prescrição;
g) O
educador é o que atua; os educandos, os que têm a ilusão de que atuam na
atuação do educador;
h) O
educador escolhe o conteúdo programático; os educandos jamais são ouvidos nesta
escolha, acomam-se a ele;
i) O
educador identifica a autoridade do saber com sua autoridade funcional, que se
opõe, antagonicamente, à liberdade dos educandos; estes devem adaptar-se às
determinações daquele;
j) O
educador, finalmente, é o sujeito do processo; os educandos, meros objetos.
De fato, as perspectivas
educacionais mais modernas, que se apoiam tanto numa visão humanista da
educação quanto nas contribuições fornecidas pelas ciências do comportamento,
concorrem para valorizar a ênfase na aprendizagem dos alunos sobre o ensino de
seus professores. Hoje, o que mais interessa é a aquisição de uma mentalidade
científica, o desenvolvimento das capacidade de análise, síntese e avaliação,
bem como o aprimoramento da imaginação criadora. Nesse contexto, o que menos
interessa é a informação especializada. O principal papel do professor do
ensino Superior passa a ser, portanto, o de formar pessoas, prepará-las para a
vida e para a cidadania e treiná-las como agentes privilegiados do progresso
social.
Mas a ênfase na
aprendizagem, a despeito de seus inegáveis méritos humanistas e do embasamento
nas modernas teorias e pesquisas educacionais, também tem gerado equívocos. Há
professores que exageram o peso a ser atribuído às qualidades pessoais de
amizade, carinho, compreensão, amor, tolerância e abnegação e simplesmente
excluem a tarefa de ensinar de suas cogitações funcionais. Alicerçados no
princípio de que “ninguém ensina ninguém”, atribuído a Rogers, muitos
professores simplesmente se eximem da obrigação de ensinar. Na verdade, o que
passam a fazer nada mais é que, mediante o argumento da autoridade, desprezam a
tarefa de ensinar, “entram no jogo das classes dominantes, pois a estas
interessa um professor bem comportado, um
missionário de um apostolado, um abnegado; tudo, menos um profissional que
tem como função principal o ensino” (ALMEIDA, 1986).
Para muitos professores
universitários, essa polêmica ao existe. Boa parte desses professores aprendeu
seu ofício como os antigos aprendiam: fazendo. Os professores universitários
não recebem preparação pedagógica específica e mesmo ao longo da sua vida
profissional raramente têm a oportunidade de participar em cursos, seminários
ou reuniões sobre métodos de ensino e avaliação da aprendizagem. A pedagogia
fica, portanto, ao sabor dos dotes naturais de cada professor.
O que de fato ocorre é que a
grande maioria dos professores universitários ainda vê o ensino principalmente
como transmissão de conhecimento através das aulas expositivas. Muitos estão
certamente atentos às inovações pedagógicas, sobretudo no referente à
tecnologia material de ensino, mas muitos outros mantêm uma atitude
conservadora. Isto não significa que a generalidade dos professores negligencie
a qualidade do ensino a que são devotados,mas que, de modo geral, não tem
incentivos para desenvolver a sua capacidade pedagógica e que, muitas vezes,nem
dispõe de informação sobre a evolução da pedagogia universitária.
A pedagogia do Ensino
Superior tem progredido com novos conceitos e novos métodos. O estudante, que
era visco como sujeito passivo, é hoje substituído pelo sujeito ativo da
aprendizagem. Ele procura ativamente a informação complementar necessária para
a solução de problemas concretos, estruturando racionalmente os conhecimentos
que vai adquirindo, entrelaçando o que lhe é transmitido com o que ele próprio
procura. Com isto, o ensino passa a ser mais do que a transmissão de
conhecimento. Passa a exigir o fornecimento de métodos e de ferramentas para o
desempenho desse papel ativo. Dessa forma, a atenção principal na ação
educativa transfere-se, em grande parte, do ensino para a aprendizagem. Mudou
com isto o papel do professor, em síntese, a atenção principal na ação
educativa, transfere-se, em grande parte, do ensino para a aprendizagem. Assim,
o professor mais do que transmissor de conhecimento, é um facilitador da
aprendizagem.
Embora a polêmica persista,
não é difícil constatar que o ensino torna-se muito mais eficaz quando os
alunos de fato participam. As aulas tornam-se muito mais vivas e interessantes
quando são entrecortadas com perguntas feitas aos alunos. Elas concluem a rumos
diferentes, conforme as respostas dos alunos. Uma resposta suscita uma
informação adicional que suscita outra pergunta e, consequentemente, outra
resposta. Desta forma, as aulas passam geralmente a requerer uma breve revisão,
que é feita coloquialmente com a participação dos alunos.
Os professores deixa de ser
a figura central em sala de aula. Com a participação dos alunos é que a aula
verdadeiramente é tecida. Lembrando os magníficos versos de João Cabral de Melo
Neto, em Tecendo a manhã:
Um galo sozinho não tece uma
manhã:
Ele precisará sempre de
outros galos,
De um que apanhe esse grito
E o lance a outro; de um
outro galo
Que apanhe o grito de um
galo antes
E o lance a outro; e de
outros galos
Que com muitos outros galos
se cruzem
Os fios de sol de seus
gritos de galo,
Para que a manhã, desde uma
teia tênue,
Se vá tecendo, entre todos
os galos.
Neste contexto, o professor
passa a ter um papel mais difícil. Com frequência, tem que improvisar. Já não
pode limitar-se a explanar a matéria. Tem que estar preparado para, a qualquer
momento, ter que reorientar a aula, dar-lhe uma nova perspectiva. Precisa
garantir que aula que ministra é superior à leitura de um livro ou à
assistência a um filme. Mesmo porque muitas das aulas ministradas em cursos
universitários não passam de seções de leitura, diferindo das aulas medievais
apenas porque o livro utilizado pelo lente naquela época foi substituído pelas
transparências projetadas.
Uma velha anedota auxilia no
entendimento desta questão. É possível ensinar um cachorro a falar? Sim, e é
muito fácil. O difícil é fazê-lo aprender.
1.3 Como abordar o processo de ensino
O fenômeno educativo não é
uma realidade acabada capaz de ser identificada clara e precisamente em seus
múltiplos aspectos. Por ser um fenômeno humano e histórico, tende a ser
abordado sob diferentes óticas. Mizukami (1986) define cinco abordagens:
tradicional, comportamentalista, humanista, cognitivista e sociocultura, que
são apresentadas a seguir.
Abordagem
tradicional. Esta abordagem privilegia o professor como
especialista, como elemento fundamental na transmissão dos conteúdos. O aluno é
considerado um receptor passivo, até que, de posse dos conhecimentos
necessários, torna-se capaz de ensiná-los a outros e a exercer eficientemente
uma profissão. Essa abordagem denota uma visão individualista do processo
educativo e do caráter cumulativo do conhecimento. O ensino é caracterizado
pelo verbalismo do professor e pela memorização do aluno. Sua didática pode ser
resumida em “dar a lição” e “tomar a lição”, e a avaliação consiste
fundamentalmente em verificar a exatidão da reprodução do conteúdo comunicado
em aula.
Abordagem
comportamentalista. Para os comportamentalistas ou behavioristas,
o conhecimento é resultado direto da experiência. A escola é reconhecida como a
agência que educa formalmente e os modelos educativos são desenvolvidos com
base na análise dos processos por meio dos quais o comportamento é modelado e
reforçado. O professor é visto como um planejador educacional que transmite
conteúdos que têm como objetivo o desenvolvimento de competências. Para
Skinner, um dos principais teóricos desta abordagem, a realidade é um fenômeno
objetivo e o ser humano é um produto do meio, podendo, portanto, ser controlado
e manipulado. Dessa forma, o ensino se dá num processo que tem como modelo a
instrução programada, na qual assume fundamental importância o controle do
trabalho pelo professor, não interessando tanto a atividade mais autônoma do
estudante.
Abordagem
humanista. Esta abordagem foca predominantemente o desenvolvimento
da personalidade dos indivíduos e tem Carl Rogers como um de seus principais
teóricos. O professor não transmite conteúdos, mas dá assistência aos
estudantes, atuando como facilitador da aprendizagem. O conteúdo emerge das
próprias experiências dos estudantes, que são considerados num processo
contínuo de descoberta de si mesmos. A ênfase é no sujeito, mas uma das
condições necessárias para o desenvolvimento individual é o ambiente. Assim, a
escola é vista como a instituição que deve oferecer condições que possibilitem
a autonomia dos alunos.
Abordagem
cognitivista. Esta abordagem é fundamentalmente
interacionalista. O conhecimento é entendido como produto das interações entre
sujeito e objeto, não enfatizando nenhum polo desta relação, como acontece na
abordagem comportamentalista, que enfatiza o objeto,e na humanista, que
enfatiza o sujeito.os principais representantes desta corrente são Jean Piaget
e Jerome Bruner. O cognitivismo considera o indivíduo como um sistema aberto,
que passa por reestruturações sucessivas, em busca de um estágio final nunca
alcançado completamente. Assim, a escola deveria proporcionar ao estudante as
oportunidades de investigação individual que lhe possibilitassem aprender por
si próprio. O ensino compatível com esta abordagem deveria fundamentar-se no
ensaio-e-erro, na pesquisa e na solução de problemas por parte dos estudantes e
não na aprendizagem de definições, nomenclaturas e fórmulas. A estratégia geral do processo seria a de ajudar o
estudante no desenvolvimento de um pensamento autônomo, crítico e criativo. Não
seriam privilegiadas ações finalistas, mas mediadoras do processo de
aprendizagem. Estas deveriam contribuir para a organização do raciocínio com
vistas a lidar com informações, estabelecer relações entre conteúdos e conduzir
a uma generalização cognitiva que possibilitasse sua aplicação em outras
situações e momentos da aprendizagem. Aos professores caberia proporcionar a
orientação necessária para que os objetos pudessem ser explorados pelos
estudantes sem o oferecimento de soluções prontas.
Abordagem
sociocultural. Esta abordagem enfatiza os aspectos
socioculturais que envolvem o processo de aprendizagem. Assim como o
construtivismo, esta abordagem pode ser considerada interacionista. No entanto,
confere ênfase especial ao sujeito como elaborador e criador do conhecimento. O
ser humano torna-se efetivamente um “ser sujeito” à medida que, integrado ao
seu contexto, reflete sobre ele e toma consciência de sua historicidade. A
educação torna-se, portanto, fator de suma importância na passagem das formas
mais primitivas de consciência para uma consciência crítica. Sendo o ser humano
sujeito de sua própria educação, as ações educativas devem ter como principal
objetivo promovê-lo e não ajustá-lo à sociedade. Um dos principais
representantes dessa corrente é Paulo Freire, para quem a verdadeira educação é
a educação problematizadora, que auxilia na superação da relação
opressor-oprimido. A essência desta educação é a dialogicidade, por meio da qual
educador e educando tornam-se sujeitos de um processo em que crescem juntos.
Nessa abordagem, o conhecimento deve ser entendido como uma transformação contínua
e não transmissão de conteúdos programados.
1.4 Pedagogia ou Andragogia?
Embora o professor seja frequentemente
visto como o principal elemento do processo de aprendizagem, ele não tem
naturalmente o domínio de fatores relacionados aos estudantes, tais como suas
características pessoais, necessidades e interesses na é capaz também, na
maioria dos casos, de influenciar significativamente a organização
administrativa da escola. Mas ele tem muita responsabilidade em relação ao
conhecimento da disciplina que ministra, às habilidades para comunicação dos
conteúdos, à maestria em relação ao uso de recursos instrucionais e ao clima
estabelecido em sala de aula.
Como foi visto, a preparação
dos professores para o ensino básico dá-se em cursos que oferecem disciplinas
de cunho pedagógico. Também foi lembrado que a palavra pedagogia refere-se à condução
de crianças. Dessa forma, cursos dessa natureza não seriam adequados para a
preparação de professores universitários, cujos alunos, embora nem sempre sejam
adultos, estão mais próximos dessa etapa da vida do que da infância. Por essa
razão é que a partir do último quartel do século XX, graças ao aparecimento do
livro The modern pratice of adult
education, de Malcom Knowles (1970), começou a popularizar-se o termo Andragogia para referir-se à arte e à
ciência de orientar os adultos a aprender.
A Andragogia fundamenta-se
nos seguintes princípios:
1.
Conceito
de aprendente. Este conceito é adotado como alternativa ao
de “aluno” ou “formando”. O aprendente, ou aquele que aprende, é autodirigido,
o que significa que é responsável pela sua aprendizagem e estabelece e delimita
o seu percurso educacional.
2.
Necessidade
do conhecimento. Os adultos sabem melhor d que as crianças da
necessidade de conhecimento. Eles se sentem muito mais responsáveis pela sua
aprendizagem e pela delimitação de seu percurso educacional.
3.
Motivação
para aprender. O modelo andragógico leva em conta as
motivações externas, como melhor trabalho e aumento salarial, mas valoriza,
particularmente, as motivações internas, relacionadas com a sua própria vontade
de crescimento, como autoestima, reconhecimento, autoconfiança e atualização
das potencialidades pessoais.
4.
O
papel da experiência. Os adultos entram num processo educativo
com experiências bastante diversas e é a partir delas que eles se dispõem a
participar ou não de algum programa educacional. Por isso, essas experiências
devem ser aceitas como fonte de recrursos a serem valorizados e partilhados e
servir de base para a formação. Os conhecimentos do professor e os recursos
instrucionais, como os livros e as projeções, são fontes que por si só não garantem
o interesse pela aprendizagem. Devem ser vistos como opções que são colocadas à
disposição para a livre escolha do aprendiz.
5.
Prontidão
para o aprendizado. O adulto tem uma orientação mais pragmática
do que a criança. O adulto está pronto para aprender o que decide aprender. Ele
se torna disponível para aprender quando pretende melhorar seu desempenho em
relação a determinado aspecto de sua vida. Sua seleção de aprendizagem é
natural e realista; por isso, muitas vezes ele se nega a aprender o que os outros
lhe impõem. Além disso, sua retenção tende a decrescer quando percebe que o
conhecimento não pode ser aplicado imediatamente. Assim, convém organizar as
experiências de aprendizagem de acordo com unidades temáticas que tenham
sentido e sejam adequadas às tarefas que os adultos são solicitados a realizar
nos seus diversos contextos de vida.
Dessa forma, uma educação no
contexto andragógico requer:
·
Elaboração de diagnósticos de necessidades e
interesses dos estudantes;
·
Definição de objetivos e planejamento das
tarefas com a participação dos estudantes;
·
Estabelecimento de um clima cooperativo,
informal e de suporte à aprendizagem;
·
Seleção de conteúdos significativos para os
estudantes;
·
Definição de contratos e projetos de
aprendizagem;
·
Aprendizagem orientada para tarefas ou
centrada em problemas;
·
Uso de projetos de investigação, estudo
independente e técnicas vivenciais;
·
Valorização de discussão e da solução de
problemas em grupo;
·
Utilização de procedimentos de avaliação
diretamente relacionados à aprendizagem.
Embora a adoção do conceito
de Andragogia não seja consensual, pode-se afirmar que a prática docente do
professor universitário pode ser significativamente melhorada com a adoção de
seus princípios.
1.5 O que torna o aprendizado eficaz
As considerações apresentadas na seção 1.4
indicam a conveniência do professor em fazer sua opção preferencial pela
aprendizagem. Mas essa opção por si só não é garantia de um aprendizado eficaz.
Muitos outros fatores naturalmente concorrem para que os alunos sejam capazes
de compreender fatos e teorias, desenvolver habilidades para a solução de
problemas. Podem ser consideradas três fontes independentes de influência sobre
a aprendizagem: o estudante, o professor e o curso. Para cada uma dessas
fontes, por sua vez, identificam-se algumas variáveis. As variáveis
relacionadas aos alunos referem-se às suas aptidões, aos seus hábitos de estudo
e à sua motivação. As variáveis relacionadas aos professores reeferem-0se
principalmente aos conhecimentos relativos à matéria, às suas habilidades
pedagógicas, à sua motivação e à sua percepção acercada educação. As variáveis
relacionadas ao curso, por fim, referem-se aos objetivos propostos e aos
métodos utilizados para alcançá-los.
1.5.1 Variáveis relacionadas aos alunos
As diferenças individuais
relativas às habilidades dos estudantes constituem importante influência em
relação à aprendizagem. Em muitos cursos, o nível intelectual dos alunos, suas
aptidões específicas, assim como os conhecimentos e as habilidades
desenvolvidos anteriormente, explicam em boa parte as diferenças de desempenho
dos alunos. Estudantes com maior talento para a matemática poderão aprender
mais facilmente os conteúdos das disciplinas de um curso de engenharia do que
estudantes com maior aptidão verbal.
Não é confortável para um
educador humanista, que luta para vencer as desigualdades sociais e para
promover o desenvolvimento dos alunos, ressaltar a importância das diferenças individuais
no desempenho acadêmico. Com efeito, sua atuação deverá voltar-se
constantemente para a sua relativização. Não há, no entanto, como deixar de
considerar os resultados das pesquisas psicológicas e a experiência dos
professores universitários, que indicam o peso, ainda que relativo, das
diferenças individuais. Por essa razão é que os professores devem considerar o
peso desses fatores tanto no planejamento quanto na condução de suas aulas e na
avaliação da aprendizagem.
Outro importante fator na
determinação do sucesso na aprendizagem é a motivação do aluno. A motivação é
que nos impulsiona para a ação, e tem origem numa necessidade. Assim, à medida
que o aluno sente necessidade de aprender, tende a buscar fontes capazes de
satisfazê-las, tais como leituras, aulas e discussões. A influência da
motivação é facilmente verificável. Alunos motivados aprendem muito mais
facilmente do que os nãomotivados. A motivação constitui um problema bastante
complexo, pois, tendo origem numa necessidade, não pode, a rigor, ser determinada
por um fator externo, como a ação educativa do professor, o que não significa
que este não disponha de elementos para canalizar a motivação dos alunos para
alvos apropriados.
Os hábitos dos alunos também
são muito importantes no que se refere à aprendizagem. Alunos que planejam seus
estudos, fazem anotações das aulas, adotam técnicas de leitura e revisam
constantemente a matéria costumam se sair melhor nos estudos. E é interessante
considerar que de todas as variáveis relacionadas à aprendizagem estas são as
que mais facilmente podem ser manipuladas pelos alunos com vistas ao sucesso. Por
essa razão é que se propõe aos professores não apenas que ensinem a matéria,
mas também que ensinem sés alunos a aprender.
1.5.2 Variáveis relacionadas ao professor
Habilidades, motivação e
hábitos de estudo dos alunos, a despeito de sua importância, não são
suficientes para explicar o sucesso em relação à aprendizagem. Cabe, portanto,
considerar o papel do professor nesse processo.
Costuma-se considerar muito
importantes os conhecimentos de que o professor dispõe em relação à matéria que
se dispõe a ensinar. Com efeito, o professor que conhece bem os conteúdos da
disciplina que ministra demonstra muito mais segurança ao ensinar, expõe com
maior propriedade e é capaz de responder sem maiores dificuldades às perguntas
formuladas pelos alunos. Mas há outros fatores a serem considerados, já que
alguns professores mostram-se mais competentes que outros para manter os alunos
atentos, para explanar conceitos complexos e pata criar uma atmosfera agradável
em sala de aula. Assim, pode-se considerar que a efetiva prática do professor
universitário repousa sobre um tripé que envolve os conhecimentos específicos
relacionados á matéria, a suas habilidades pedagógicas e à sua motivação.
As habilidades pedagógicas
do professor universitário não têm sido devidamente consideradas ao longo da
história desse nível de ensino. Tanto dos professores do ensino fundamental
quanto do ensino médio há muito tempo se exige formação específica, quer por
meio do curso normal, hoje em nível superior, quer de licenciaturas
específicas. Nesses cursos, mediante disciplinas como Didática, Metodologia do
Ensino, psicologia da aprendizagem e Prática de Ensino, os professores
podem desenvolver as habilidades necessárias para o desempenho de suas
atribuições de professor. Dos professores universitários exige-se hoje, de acordo
com Lei de Diretrizes e Bases, formação em nível de pós-graduação,
prioritariamente em programas de mestrado e doutorado. Ocorre, porém, que a
maioria desses programas não contempla seus concluintes com disciplinas de caráter
didático-pedagógico. Dessa forma, o desenvolvimento de habilidades pedagógicas
dos professores universitários costuma dar-se por meio de cursos específicos ou
de leituras desenvolvidas individualmente. Muitos professores também conseguem,
por meio de intuição e da experiência, obter altos níveis de capacitação
pedagógica. Outros, no entanto, tentem a permanecer carentes de habilidades
pedagógicas ao longo de toda a sua vida acadêmica.
O aprendizado dos alunos
também tem a ver com a motivação do professor. Quando o professor está motivado
para ensinar e demonstra o seu entusiasmo com a matéria, cria-se um clima muito
mais favorável para a aprendizagem. E convém considerar que essa motivação
depende muito menos do salário e das condições de ensino do que do quão
responsável o professor se sente pelo aprendizado dos alunos e quão realizadora
e desafiador é a sua missão.
1.5.3 Variáveis relacionadas ao curso
Além das variáveis
relacionadas aos professores e alunos, também devem ser consideradas as
relacionadas ao curso, sobretudo as relacionadas aos seus objetivos e à sua
organização. Os cursos oferecidos nas universidades e faculdades têm (ou deveriam
ter!) objetivos. Convém considerar que hoje as escolas dispõem de mais
liberdade nesse aspecto do que dispunham no passado. Antes da vigência da Lei
de Diretrizes e Bases, o Conselho Nacional de Educação fixava currículos mínimos para cada curso
superior. Hoje, apresenta apenas as diretrizes curriculares, o que faz com que
a escola tenha muito mais flexibilidade para definir seus currículos, bem como
para estabelecer os objetivos de seus cursos e disciplinas.
Os objetivos mais amplos,
referentes principalmente ao profissional que se deseja formar, são definidos
pela escola. Já os objetivos mais específicos, que se referem aos conhecimentos
e habilidades esperados dos alunos ao final de cada aula ou unidade de ensino,
são definidos pelo professor. E são estes os que mais diretamente influenciam o
aprendizado dos alunos. Dos objetivos formulados para cada disciplina é que
dependem a definição dos conteúdos, a determinação das estratégias de ensino, a
seleção de recursos instrucionais e também as técnicas de avaliação. Nem sempre,
porém, os objetivos são claramente formulados, o que dificulta a elaboração de
um plano de ensino adequado, favorecendo a aquisição de um aprendizado que não
corresponde ao que é desejado.
A organização do curso
também exerce influência significativa sobre o aprendizado. As principais
variáveis relativas a esta dimensão são: a carga horária destinada à
disciplina; o ano ou semestre em que é ministrada; as disciplinas já cursadas
pelo estudante, assim como as que são cursadas paralelamente; a qualidade dos
recursos instrucionais; e o número de alunos em classe. De modo geral, os
professores têm pouca ou nenhuma influência na administração de fatores.
Também há que se considerar
que as crenças dos dirigentes das instituições educacionais nem sempre
coincidem com as crenças dos professores. Até mesmo porque nem sempre os
dirigentes podem ser considerados educadores, mas empresários que ainda se
prendem a modelos administrativos em que o mais importante é a redução dos
custos. Parece até mesmo que muitos desses dirigentes desconhecem o significado
de vantagens competitivas. Dessa forma, muitos dirigentes tendem a admitir que
basta oferecer aos professores recursos mínimos naturalmente pela atenção dos
alunos e pelas tradicionais anotações em sala de aula. Os professores, com
frequência, sentem-se desestimulados ou mesmo proibidos de adotar posturas mais
criativas nos cursos que lecionam.
Também há dirigentes
empresários que, por conta de uma leitura equivocada de textos sobre qualidade
total, assumem a crença de que o “cliente é o rei” e que é preciso “encantá-lo”.
Nesse processo, o professor passa a ter menos poder em relação aos alunos,
cujos clamores por facilidades com frequência sensibilizam os dirigentes que
temem perdê-los. Já é comum dirigentes recepcionarem professores dizendo que
dispõem de mais currículos de professores que de matrículas de alunos, o que
leva alguns professores a procurarem antes de tudo granjear a simpatia dos
alunos, o que faz, nesses casos, com que a popularidade do professor se torne
mais importante do que a qualidade de ensino.
Leituras
recomendadas
LIBÂNEO, José Carlos. O ensino de graduação na universidade: a
aula universitária. Disponível em:
<www.ucg.br/site_docente/edu/libaneo/pdf/ensino. acesso em: 3 ago 2005.
Este texto apresenta
reflexões sobre parâmetros de qualidade do ensino e da gestão de unidades de
Ensino Superior diante das mudanças que vêm ocorrendo na sociedade e no mundo
do conhecimento e da formação profissional. Sugere, inicialmente, as relações
entre a qualidade de ensino e o trabalho docente em sala de aula. Após apresentar
dados sobre a situação do ensino universitário, aponta formas alternativas de
aula universitária e de organização escolar.
MASETTO, Marcos Tarciso. Competência pedagógica do professor
universitário. São Paulo: Summus, 2003.
Este livro analisa aspectos
diversos da atividade do professor universitário, desde o planejamento
curricular e o discernimento das prioridades, passando pela interação entre os
participantes do processo de ensino, recursos técnicos e tecnológicos até a
dimensão política de sua atuação.