segunda-feira, 11 de maio de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 966 – continua Da Caracterização e da Inscrição - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 966 – continua
Da Caracterização e da Inscrição - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro II – (Art. 966 ao 1.195) Do Direito de Empresa
Título I – Do Empresário (Art. 966 ao 980) Da Caracterização e da Inscrição
– vargasdigitador.blogspot.com digitadorvargas@outlook.com

Prolegômenos

Houve alguma controvérsia na doutrina quanto à denominação “Direito de Empresa”. Na redação original do anteprojeto, chamava-se o Livro II “Da Atividade Negocial”. A questão foi bem posta no relatório Ernani Sátyro, nos termos seguintes: “Não há dúvida que o Livro II, além das atividades empresárias, cuida de outras que não têm por finalidade a produção ou a circulação de bens ou serviços, mas esta parte, conforme veio a ser reconhecido no próprio seio da Comissão Revisora e elaboradora do Código Civil, é tão reduzida em relação à primeira, que nada impede que prevaleça a sua denominação, mesmo porque algumas delas, como a agrícola, podem assumir estrutura empresarial. Nem sempre, aliás, a classificação das matérias jurídicas comporta critérios rígidos.

(...) Isto posto, nada impede que, sob a denominação de “Direito de Empresa” se disciplinem também determinadas relações que são de natureza econômica, embora destituídas daqueles requisitos de organização que caracterizam a atividade empresarial propriamente dita. Além disso, o termo ‘Direito de Empresa’ terá melhor correspondência com a denominação dos títulos dos demais livros do Código, tais como direito de Família, Direito das Coisas e outros. Por outro lado, a palavra empresa, consoante orientação que resulta do Projeto, não significa uma dada entidade empresarial, mas indica, ao contrário, de maneira genérica, toda e qualquer forma de atividade econômica organizado como escopo de atender à produção ou à circulação de bens ou de serviços.

Dado o sentido genérico atribuído à palavra empresa, é esta que se põe como centro dominante de todas as normas que compõe o Livro II, sendo despiciendo o fato de, nesse Livro, ser disciplinada a matéria que diz respeito à atividade econômica daqueles que, não sendo empresários, visam a fins econômicos, como é o caso dos que exercem profissão intelectual, de natureza literária ou artística.

Não procede, por conseguinte, a alegação de que o termo ‘Direito de Empresa’ seria restritivo da matéria disciplinada no livro em apreço, com o que se evita qualquer confusão com a matéria dos ‘negócios jurídicos’, disciplinada na Parte Geral. (Crédito deste texto concedido (por todos) a Ricardo Fiuza, nota VD).

Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços.

Parágrafo único. Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa.

Sob o prisma de Barbosa Filho, o Código Civil de 2002 reorganizou, no âmbito do direito privado, a legislação nacional, condensando vasto número de normas extravagantes e esparsas, mas, principalmente, procurou ultrapassar as barreiras criadas pela galopante pormenorização e particularização de suas normas e propôs fosse englobado, num único diploma, em conjunto, o direito comum, i.é, o direito civil, e parcela do mais relevante dos ramos especializados, o direito comercial. Foi promovida, frise-se, uma unificação formal puramente do direito privado.

O direito comercial pode ser conceituado como o complexo de normas regradoras das operações econômicas privadas que visem à produção e à circulação de bens, por meio de atos exercidos em caráter profissional e habitual, com o fim de obtenção de lucro.

Se bem que toda a disciplina das obrigações já tenha assimilado regras antes próprias à atividade mercantil, deixando de lado aquelas totalmente desgastadas e despidas, no mundo de hoje, de praticidade, tal unificação apresentará, sem dúvida, grandes dificuldades, dada a divergência de metodologia entre as duas disciplinas enfocadas. O direito comercial é dedutivo, de índole cosmopolita e ligado à celebração massificada de negócios. Suas regras são estratificadas a partir do surgimento concreto de questões geradas pela contínua atividade negocial, e não como derivação de concepções abstratas, sendo marcadas pela onerosidade e direcionadas para a reprodução profissional e seriada. Suas normas renovam-se incessantemente, com acelerado dinamismo, sempre tendendo para a internacionalização, vinculadas às alterações das formas de produção e acumulação capitalista, sistema que provocou o nascimento do direito comercial e ao qual continua umbilicalmente ligado. Tais características, à evidência, não estão presentes no direito civil e tornam necessário, como o advento do presente diploma, um exercício continuado de compatibilização e concreção das novas regras positivadas.

Nesse sentido, a empresa surge como principal foco de análise para a incidência do direito comercial. Trata-se da figura dominante da terceira fase evolutiva desse ramo especial do direito privado, superando o sujeito de direito designado como destinatário das normas, o mercador ou comerciante associado a corporações, e o conteúdo pontual de atos ou negócios jurídicos profissionalmente celebrados, os chamados atos de comércio. A empresa é uma organização de pessoas, bens e atos voltada para a produção e circulação de mercadorias ou serviços destinados ao mercado, com o fim de lucro e sob a iniciativa e o comando de dado sujeito de direito, o empresário. Ela constitui uma estrutura econômica complexa, formada pela reunião e disposição racional de elementos totalmente heterogêneos, cuja concepção está identificada com a criação de formas extremamente intensivas de emprego da capital, i.é, com o capitalismo pós-industrial ou financeiro, não se enquadrando perfeitamente em qualquer das categorias fundamentais da teoria geral do Direito, mas congregando elementos próprios a várias delas.

Desde sua estratificação no Código Civil italiano de 1942 (art. 2.082), a ausência de traços uniformes e simplificados chama a atenção dos estudiosos que buscam delimitar o conceito de empresa. De início, visões fragmentadas surgiram e, num segundo momento, visando a sua superação, Alberto Asquini pregou que fosse efetivado o estudo mediante a identificação de quatro perfis complementares entre si:

a)    Perfil subjetivo, correspondente ao sujeito de direito gestor da empresa, que mo- dela, segundo suas declarações de vontade, toda a empresa, dando-lhe vida;

b)    Perfil funcional, composto de todos os atos jurídicos em sentido lato concretizados pelo empresário, com caráter profissional e sempre encadeados, formando um todo uno, uma atividade voltada para o mercado e para a obtenção de lucro;

c)    Perfil patrimonial, relativo ao conjunto de bens corpóreos e incorpóreos, organizados e dispostos racionalmente para a execução da atividade própria à empresa, formando uma universalidade conhecida como estabelecimento empresarial;

d)    Perfil corporativo, englobando todos os indivíduos que, por meio de contratações, gravitam e interagem com a empresa, contribuindo, direta ou indiretamente, para a realização de sua atividade na qualidade de empregados ou de auxiliares do empresário.

Em todo caso, destacada a empresa como traço essencial para a incidência das normas de direito comercial, os princípios atinentes a tal disciplina não são alterados, mas há mais que mera alteração de nomenclatura, visto ser obtida a imediata ampliação da incidência das normas especiais, abarcando a atividade profissional de prestação de serviços, bem como as formas de atuação derivadas da circulação de direitos incidentes sobre imóveis e de sua utilização como insumo na produção. O presente artigo, tomando como modelo o referido Código italiano de 1942, não se refere, porém, à empresa, mas sim, a seus perfis, num primeiro plano, ao empresário. A empresa em si mesma, não tem personalidade jurídica, de maneira que uma pessoa, o empresário, manifesta sua vontade e comanda toda a atividade empresarial, assumindo obrigações e auferindo créditos. Esse sujeito de direito ostenta como características primordiais a iniciativa e o risco. É ele quem cria e gerencia toda a atividade empresarial, ditando, conforme suas decisões, seu desenvolvimento e o sucesso ou o insucesso resultante, com o qual arcará, suportando os ônus dos prejuízos e as benesses derivadas dos lucros. Sua atuação é sempre vinculada a um mercado, concebendo, organizando e gerenciando continuadamente a produção e a circulação de bens, assumindo tanto a forma de pessoa física quanto a de jurídica. Distingue-se, então, o empresário individual (pessoa física), tratado no presente título do Código, do empresário coletivo (pessoa jurídica).

O conceito de empresário apresenta uma amplitude muito maior que o de comerciante, peculiar à legislação revogada. Todos os comerciantes são empresários, mas nem todos os empresários são comerciantes. Incluem-se aqui aqueles que exercem a atividade de prestação de serviços e de natureza rural, ou seja, agrícola ou pecuária, que não se enquadravam como comerciantes. O exercício de profissão intelectual, no entanto, como é o caso do advogados, médicos, engenheiros, arquitetos, artistas plásticos, literatos ou músicos, i.é, dos profissionais liberais, não qualifica, em regra, uma pessoa como empresário, mesmo que seja ela assessorada por outras pessoas (auxiliares e colaboradores). Apenas quando sua atuação se voltar para o mercado, colocando, indistinta e massificadamente, os serviços prestados à disposição do público e formando uma estrutura própria para tanto, tal profissional, por exceção, se qualificará como empresário. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 981 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 11/05/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Em seu histórico, a norma do CC 966, que conceitua o empresário, não teve sua redação alterada durante a tramitação do projeto do Código Civil, cujo Livro II, que trata do direito de empresa, foi elaborado pelo consagrado jurista Sylvio Marcondes. O Código Civil de 1916 não se refere à empresa como agente econômico, mas, apenas, como atividade que poderia caracterizar s sociedades civil particulares (art. 1.371). o Código Comercial de 1850, por seu turno, não conhecia a figura intitulada empresário. Aquele que exercia atividade mercantil era definido como comerciante. O art. 42 do Código comercial, agora revogado, considerava como comerciante quem possuísse matrícula perante a Junta Comercial (requisito formal) e fizesse da mercancia profissão habitual (requisito material). Mercancia significa, em linhas gerais, o exercício de atividade econômica de produção ou circulação de mercadorias, conceito atualizado pelo novo Código civil de modo mais completo, abrangendo outros tipos de bens e serviços ofertados no mercado.

Sob a orientação de Ricardo Fiuza, tem-se que o conceito de empresário expresso no CC 966, reproduz, fielmente, a definição do Código Civil italiano de 1942 (art. 2.082). Três são os elementos ou atributos fundamentais desse conceito: a economicidade, como fator de geração de riquezas, a organização e a profissionalidade. O conceito de empresário não se restringe mais, apenas, às pessoas que exerçam atividades comerciais ou mercantis. O novo Código Civil eliminou e unificou a divisão anterior existente entre empresário civil e empresário comercial. A partir de agora, o conceito de empresa abrange outras atividade econômicas produtivas que até então se encontravam reguladas pelo Código civil de 1916, e assim submetidas, dominantemente, ao direito civil. O empresário é considerado como a pessoa que desempenha, em caráter profissional, qualquer atividade econômica produtiva no campo do direito privado, substituindo e tomando o lugar da antiga figura do comerciante. A ressalva à caracterização do empresário constante do parágrafo único do CC 966 exclui desse conceito aqueles que exerçam profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística. Não seriam consideram assim como empresários os profissionais liberais de nível universitário, que desempenham atividades nos campos da educação, saúde, engenharia, música e artes plásticas, somente para citar alguns exemplos. Todavia, se o exercício da profissão intelectual constituir elemento de empresa, i.é, se estiver voltado para a produção ou circulação de bens e serviços, essas atividades intelectuais enquadram-se também como sendo de natureza econômica, ficando caracterizadas como atividades empresariais. O CC/2002 veio, portanto, a qualificar como atividade de empresa o exercício de profissões organizadas destinadas à produção ou circulação de riquezas, eliminando o critério anterior de separação entre as atividades comerciais e as atividades civis em razão da finalidade lucrativa. No regime jurídico passado, como elemento diferenciador, seria comercial ou mercantil a atividade econômica que objetivasse o lucro, ficando submetidas à legislação civil todas as demais atividades que, em princípio, não perseguissem o lucro como escopo essencial. Em sentido amplo, o conceito de empresário deve abranger tanto o empresário titular de firma individual coo os administradores de sociedades, ficando agora as sociedades classificadas ou divididas entre sociedade empresária (antiga sociedade comercial) e sociedade simples (antiga sociedade civil). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 503-504, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 11/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Segundo Bruno Mattos e Silva, em seu artigo “A teoria da empresa no novo Código Civil e a interpretação do art. 966”, (site Jus.com.br, acesso em 11/05/2020) ao positivar a teoria da empresa, o CC/2002 passa a regular as relações jurídicas decorrentes de atividade econômica realizada entre pessoas de direito privado. Evidentemente, várias lei específicas ainda permanecem em vigor, mas o cerne do direito civil e comercial passa a ser o novo Código Civil.

Ao positivar a teoria da empresa, o novo Código Civil passa a regular as relações jurídicas decorrentes de atividade econômica realizada entre pessoas de direito privado. Evidentemente, várias leis específicas ainda permanecem em vigor, mas na realidade o direito civil e comercial passam a ser o novo Código Civil.

O novo Código Civil, na Parte Especial, trata no Livro II Do Direito de Empresa. Esse Livro II, por sua vez, está dividido em quatro títulos: Título I - Do Empresário, Título II - Da Sociedade, Título III - Do EstabelecimentoTítulo IV Dos Institutos Complementares.

A teoria empresa está em oposição à teoria dos atos de comércio, que fora adotada pelo Código Comercial de 1850.

Em linhas muito gerais, de acordo com a teoria dos atos de comércio, parte da atividade econômica era comercial, i.é, tinha um regime jurídico próprio, diferenciado do regime jurídico de uma outra parte da atividade econômica, que se sujeitava ao direito civil. Isso significava dizer que certos atos estavam sujeitos ao direito comercial e outros não. Os atos de comércio eram os atos sujeitos ao direito comercial; os demais eram sujeitos ao direito civil. Ou seja, atos com conteúdo econômico poderiam ser civis ou comerciais. Na verdade a questão não era tão simples, pois a doutrina não conseguia estabelecer exatamente um conceito científico do que seria o ato de comércio, sendo mais fácil admitir que ato de comércio seria uma categoria legislativa, então ato de comércio seria tudo que o legislador estabelece que teria regime jurídico mercantil.

A teoria da empresa não divide os atos em civis ou mercantis. Para a teoria da empresa, o que importa é o modo pelo qual a atividade econômica é exercida. O objeto de estudo da teoria da empresa não é o ato econômico em si, mas sim o modo como a atividade econômica é exercida, ou seja, a empresa, com os sentidos que será apontado adiante.

Diferença entre empresário e sociedades empresárias - Sociedade empresária é a sociedade que exerce atividade econômica organizada. Ou, como diz o CC 982, é a que "tem por objeto o exercício de atividade própria de empresário sujeito a registro (CC 967)".

Em oposição às sociedades empresárias, estão as sociedades simples, que são as sociedades que não exercem "profissionalmente atividade econômica organizada" (CC 966).

O novo Código Civil não define o que seja "atividade econômica organizada" ou o que seja "empresa". Essas definições cabem à doutrina.

Já é célebre a definição de empresa dada por Asquini, para quem ela compreende quatro perfis. Veja-se três significados jurídicos para o vocábulo técnico, que correspondente aos três primeiros perfis:

(1) Perfil Subjetivo. A empresa é o empresário, pois empresário é quem exercita a atividade econômica organizada, de forma continuada. Nesse sentido, a empresa pode ser uma pessoa física ou uma pessoa jurídica, pois ela é titular de direitos e obrigações. Quando se diz "arrumei um emprego em uma empresa", temos a palavra empresa empregada com esse significado.

(2) Perfil Funcional. A empresa é uma atividade, que realiza produção e circulação de bens e serviços, mediante organização de fatores de produção (capital, trabalho, matéria prima etc.). Quando se diz "a empresa de estudar será proveitosa", tem-se a palavra empresa empregada com esse significado.

(3) Perfil Objetivo (patrimonial). A empresa é um conjunto de bens. A palavra empresa é sinônima da expressão estabelecimento comercial. Os bens estão unidos para uma atividade específica, que é o exercício da atividade econômica. Como exemplo desse significado, pode-se dizer "a mercadoria saiu ontem da empresa".

Há também um quarto perfil, criticado pela doutrina por não corresponder a qualquer significado jurídico, mas apenas por estar de acordo com a ideologia fascista, que controlava o Estado italiano por ocasião da positivação da teoria da empresa:

(4) Perfil Corporativo. A empresa é uma instituição, uma organização pessoal, formada pelo empresário e pelos colaboradores (empregados e prestadores de serviços), todos voltados para uma finalidade comum.

Para fins do CC 966, a palavra empresa tem como significado o segundo perfil mencionado acima. Empresa, portanto, é a atividade econômica organizada. A organização é a união de vários fatores de produção, com escopo de realização de bens ou serviços. O empresário, assim, é quem realiza essa empresa, expressão tomada como sinônimo de atividade.

A noção jurídica de atividade econômica organizada exige o concurso de atividade profissional alheia. Se alguém exercer uma atividade econômica individualmente, não será considerado empresário, à luz do CC 966 em comento.

Pouco importa o regime jurídico das pessoas que trabalharem para o empresário. Poderá ser o regime trabalhista ou civil (em caso específicos, até mesmo o administrativo). Os colaboradores do empresário poderão ser empregados, regidos pelo direito do trabalho, ou trabalhadores autônomos, que são prestadores de serviço, regidos pelo direito civil. Pouco importa. Ou seja, empresário não é sinônimo de patrão; mas o empresário sempre contrata pessoas para trabalhar, ele sempre organiza o trabalho de outrem.

Mas a organização não compreende apenas a contratação de serviços sob regime civil ou trabalhista. Juridicamente, a organização definida no art. 966 é a organização de fatores produção. Abrange capital e trabalho. O capital compreende o estabelecimento, que é o conjunto de bens utilizados pelo empresário na sua atividade econômica (estoque, matéria prima, dinheiro, marcas, automóveis, computadores etc.).

Essa organização deve ser profissional. Isso significa que deve ser contínua e com intuito de lucro, objetivando meio de vida. Atos isolados não são empresariais, mesmo que tenham conteúdo econômico.

Toda essa atividade organizada deve ter um sentido econômico. Se o objeto não for a produção ou a circulação de bens ou de serviços, não se esta diante de empresa. Essa é a teoria de empresa. Ela estuda isto: a atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços. É o que se lê, claramente, no caput do CC 966 do atual Código Civil.

Mas o CC 966 tem um parágrafo. Esse parágrafo diz que não é empresário "quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística (...)". O que significa isso? Estaria o parágrafo único do CC 966 a excluir parte da atividade econômica do conceito de empresa?

Isso pode causar uma certa perplexidade quando se tem em mente que a teoria dos atos de comércio é que fazia isso. A teoria dos atos de comércio é que dividia a atividade econômica em atos sujeitos e atos não sujeitos ao regime mercantil.

Tecnicamente, um parágrafo em um dispositivo de lei pode significar uma exceção ou uma explicação ao que foi dito no caput. Em outras palavras, um parágrafo pode estabelecer uma regra contraditória à do caput, aplicável apenas a situações específicas, pois regra especial derroga regra geral (parágrafo excepcionador) ou pode apenas explicar melhor algum conceito contido no caput, esclarecendo que alguma situação específica está ou não abrangida pela ideia do caput, sem qualquer contradição filosófica (parágrafo explicativo).

No caso concreto, pode-se interpretar o parágrafo único do CC 966/2002 como uma exceção à regra do caput ou como uma explicação. Analise-se as duas possíveis interpretações a esse parágrafo único, para, ao final, se concluir por uma ou outra interpretação.

Se visto como uma exceção, o novo Código Civil estaria positivando a teoria da empresa, mas conteria uma pequena ou não pequena exceção: toda atividade econômica profissional organizada seria considerada empresa, com exceção dos serviços intelectuais.

Estaria excluída, assim, a atividade econômica desempenhada por médicos, advogados, escritores, escultores, ainda que com o concurso de auxiliares ou colaboradores. Essas atividades, ainda que realizada de forma profissional e organizada, com objetivo de lucro, não se sujeitariam ao regime jurídico empresarial.

Frise-se este ponto: se for dado ao parágrafo único, que se refere à profissão intelectual, como fator excepcionador da regra do caput, significará dizer que a atividade de prestação de serviços intelectuais realizada por uma grande organização não seria empresarial.

Isto posto, uma sociedade de advogados, titular de um grande escritório de advocacia, com muitos empregados, com muitos computadores em rede, máquinas de xerox, acesso rápido à Internet, bibliotecas, enfim, com uma grande estrutura, não seria considerada empresa.

Essa sociedade de advogados, com seu grande escritório de advocacia, reuniria todas as definições teóricas do caput do CC 966 do novo Código Civil, mas não seria considerada empresa em razão do parágrafo único ter excluído a profissão intelectual da atividade econômica sujeita ao regime empresarial. Esse parágrafo único conta, na sua parte final, com a expressão "salvo se o exercício da profissão constituir elemento da empresa".

Interpretando-se o alcance da expressão "salvo se o exercício da profissão constituir elemento da empresa", o parágrafo único desse modo é no sentido de ser ele excepcionador da regra do caput, tem-se, então, dois incontornáveis problemas de hermenêutica, senão, veja-se:

(1) O novo Código Civil positiva a teoria da empresa, que não divide a atividade econômica pelos atos em si considerados, mas sim pelo modo em que ela é exercitada. A teoria que divide os atos em si considerados (atos comerciais versus atos civis) é a teoria dos atos de comércio, do Código Comercial de 1850. Caso se diga que a profissão intelectual em si não é empresarial, estar-se-á interpretando o parágrafo único do CC 966 de acordo com a teoria dos atos de comércio e não de acordo com a teoria da empresa.

(2) A segunda parte do parágrafo único do CC 966 não teria qualquer sentido lógico ou prático. Veja-se, então, a interpretação no sentido de que o parágrafo único do CC 966, ao se referir à profissão intelectual, não constitui uma exceção ao caput do CC 966, mas sim uma explicação. Trata-se da interpretação tecnicamente mais adequado do ponto de vista científico, pelos motivos a seguir expostos.

A ideia do parágrafo único do CC 966/2002 é que a princípio a profissão intelectual não é empresarial por características próprias, i.é, não compreende a organização de fatores de produção. O parágrafo único do CC 966 diz a profissão intelectual, a despeito de ter conteúdo econômico (o parágrafo único usa a palavra "profissão", o que denota o caráter econômico) não é empresarial, mesmo se existentes auxiliares ou colaboradores.

Como visto, de acordo com a teoria da empresa, não basta a contratação de pessoas ("auxiliares ou colaboradores", no dizer do parágrafo único do CC 966) em uma atividade econômica para a configuração da existência jurídica da empresa. É preciso um elemento a mais, que é o estabelecimento, o conjunto de bens. Isso fica mais claro quando se faz lembrar dos quatro perfis de Asquini, mencionados acima, que compõem a noção jurídica de empresa.

Assim, de acordo com o parágrafo único do CC 966 do novo Livro, embora a princípio a profissão intelectual não seja empresarial, excepcionalmente pode ela constituir elemento de empresa. Nesse caso, ela será empresarial.

Retorne-se ao exemplo do grande escritório de advocacia, com sua biblioteca, sua rede de computadores da mais alta tecnologia, com acesso à Internet. Ou mesmo pense em um grande hospital, de propriedade de um médico, com os mais modernos aparelhos cirúrgicos. Conclui-se não haver dúvida de que tais constituem o estabelecimento, parte da organização empresarial prevista no caput do CC 966.

É preciso diferenciar a hipótese do advogado que contrate uma secretária e um office-boy para realizar as tarefas de secretariado e de mensageiro, da hipótese do grande escritório de advocacia mencionado acima. Esse advogado não é um empresário, mas apenas um profissional liberal, um trabalhador autônomo, que pode ter auxiliares nas suas atividades. Isso não é vedado pela lei, nem tampouco o transforma em empresário de acordo com a teoria da empresa. É este o sentido do parágrafo único do CC 966: diferenciar alguém que realiza atividade econômica não organizada de alguém que realiza atividade econômica organizada.

Portanto, tecnicamente parece ser mais adequado interpretar o parágrafo único do CC 966 como uma explicação e não como exceção ao disposto no caput. A princípio, a atividade intelectual não é empresarial (primeira parte do parágrafo único), mas se presente todos os elementos de uma empresa, ela será empresarial (segunda parte do parágrafo único). Em outras palavras, a profissão intelectual pode ser empresarial, se presentes todos os requisitos previstos no caput. Essa é a explicação do parágrafo único do CC 966.

Embora a interpretação ora adotada seja tecnicamente lógica e esteja de acordo com a teoria da empresa, ela não deverá prevalecer, pelos motivos políticos e culturais a seguir expostos:

O regime jurídico do empresário, de acordo com o novo Código Civil, é o regime jurídico do comerciante. É o que diz o CC 2.037, do novo Código Civil: "Art. 2.037. Salvo disposição em contrário, aplicam-se aos empresários e sociedades empresárias as disposições de lei não revogadas por este Código, referentes a comerciantes, ou a sociedades comerciais, bem como a atividades mercantis."

Disso decorre que empresários e sociedades empresárias estão sujeitas ao regime jurídico mercantil, ainda que não exerçam qualquer atividade que antes seria considerada como ato de comércio.

Este aspecto que é importante: perdeu relevância jurídica a noção de ato de comércio. Só que, culturalmente, continua-se com a divisão da atividade econômica em atividades "civis" (ex. advocacia), de um lado, e "comerciais", de outro lado (embora juridicamente isso não exista mais).

Se o regimento jurídico do empresário e da sociedade empresária é o regime jurídico do comerciante, então os empresários e as sociedades empresárias, tal como definidas pelo novo Código Civil, estão sujeitas à todos os institutos mercantis, como por exemplo, a falência e o registro na Junta Comercial. A potencial sujeição à falência e o registro na Junta Comercial fazem parte do regime jurídico do comerciante.

Realmente, o novo Código Civil é expresso no sentido de que o empresário, tal como definido no CC 966, deverá se inscrever na Junta Comercial. É o que diz o CC 967, que estabelece ser obrigatória a inscrição do empresário no "Registro Público de Empresas Mercantis", que é a tão conhecida Junta Comercial.

Levando tudo isso em consideração, é de se duvidar que os operadores do direitos, as grandes sociedades de advogados, a OAB irão aceitar a interpretação de que sociedades de advogados sejam consideradas sociedades empresárias e, por via de consequência, sujeitas ao regime jurídico mercantil e que devam ser inscritas na Junta Comercial e sujeitas à falência.

(Na realidade não se usa mais o termo “Falência”, mas “Recuperação de Empresa”. O juiz preside o processo falimentar, desde o momento em que é proposta a ação. Em regra não existe falência de ofício, pelo juiz. A exceção ocorre quando o empresário tem o seu pedido de recuperação judicial negado, ou quando concedida a recuperação judicial, o devedor não a cumpre, nota VG).

Veja-se que as sociedades de advogados, ainda que estejam regidas por lei específica, Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994 (Estatuto da Advocacia), deveriam se sujeitar às disposições do CC 967, do novo Código Civil, caso se conclua que sociedade de advogados possam vir a ser sociedades empresárias. É verdade que o art. 15, § 1º, do Estatuto da Advocacia, lei especial, é expresso no sentido de que a sociedade de advogados adquire personalidade jurídica com o registro dos seus atos constitutivos no Conselho Seccional da OAB (e não no cartório de registro civil, muito menos na Junta Comercial). Contudo, o CC 2.031 do novo Código Civil dá o prazo de 1 (um) ano paras as sociedades constituídas sob a forma de leis anteriores (inclui a Lei nº 8.906/94?) adaptarem-se às disposições no novo Código, contado a partir da sua vigência.

Culturalmente, é muito difícil aceitar a mudança, sendo mais fácil aceitar que a "sociedade civil" é agora a "sociedade simples" e a "sociedade comercial" é agora a "sociedade empresarial". Seria tudo muito simples, se ainda se estivesse na teoria dos atos de comércio e não na teoria da empresa.

Embora tecnicamente equivocada, é bem provável que prevaleça interpretação ao CC 966 do novo Código Civil no sentido de que a profissão intelectual (incluindo, portando, as sociedades de advogados), mesmo se tiverem trabalhadores contratados e contem com forte estrutura material, não são sociedades empresárias.

Também provável o prevalecimento de que atividades intelectuais são exercidas sempre pelas "sociedades simples", com registro no cartório de pessoas jurídicas, ainda que tenham estrutura material e humana complexa. (Bruno Mattos e Silva Bacharel em Direito pela USP. Mestre em Direito e Finanças pela Universidade de Frankfurt (Alemanha), elaborado em 11/2002, publicado em 01/2003, acessado no site Jus.com.br em 11/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

sexta-feira, 8 de maio de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 961, 962, 963, 964, 965 Das Preferências e Privilégios


Direito Civil Comentado - Art. 961, 962, 963, 964, 965
Das Preferências e Privilégios
Creditórios - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
(Art. 233 ao 965) - Título X – Das Preferências e Privilégios
Creditórios - (Art. 955 a 965) – vargasdigitador.blogspot.com

Art. 961. O crédito real prefere ao pessoal de qualquer espécie; o crédito pessoal privilegiado, ao simples; e o privilégio especial, ao geral.

À visão de Amorim, este artigo estabelece a regra de preferencia entre créditos, ou seja, determina a classificação ou a ordem a ser obedecida no momento da liquidação do débito. Em primeiro lugar temos os créditos que têm origem nas garantias reais, o penhor, a anticrese e a hipoteca, porém, pelo valor excedente dos bens dados em garantia, entrarão no rol dos quirografários. Nos casos de hipoteca e penhor prevalecerá a data da inscrição no Cartório de Registro de Imóveis para determinar qual deles tem preferência, exceto nos casos de créditos provenientes de acidente do trabalho, de direitos trabalhistas e os da Fazenda Pública, cuja preferência é absoluta. Os créditos especiais privilegiados preferem aos privilegiados gerais e quirografários justamente pela vinculação existente entre a coisa determinada e a dívida. Temos ainda os privilégios especiais sobre móveis e imóveis, os primeiros estabelecidos no CC 964 e nos outros CC 959, 964, 1.422 e 1.442 do mesmo Código Civil. Os privilégios gerais prevalecem sobre os quirografário, pois têm como determinante a causa da dívida (CC 965).

No caso de falência, reservou o legislador aos credores que tenham bens indevidamente arrecadados pela massa, sua reivindicação, pela ação de restituição, haja vista não se tratar de credor falido, mas de proprietário indevidamente afetado (Lei de Recuperação e Falências, arts. 85 a 93). (José Roberto Neves Amorim, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 973-974 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 08/05/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Em reflexão da doutrina de Ricardo Fiuza, esse dispositivo só tem aplicação aos privilégios de direito privado. Os de direito público, a exemplo dos créditos trabalhistas e tributários, gozam de ordem de preferência própria.

É da própria essência do direito real de garantia a sua preferência sobre o crédito pessoal, de qualquer espécie.

Crédito pessoal privilegiado: É aquele que goza de privilegio, geral ou especial, preferindo ao crédito simples ou quirografário.

Privilégio especial: É o que recai sobre coisa determinada (CC 964), e Privilégio geral: É o que decorre de origem da dívida (CC 965). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 501, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 08/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Segundo análise de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, os créditos decorrentes de acidente do trabalho, direitos trabalhistas e os da Fazenda Pública, a despeito de não tratados no dispositivo, detêm preferência absoluta.

Os créditos de privilégio especial são os estabelecidos nos CC 959, 964, 1.422 e 1.442. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 08.05.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 962. Quando concorrerem aos mesmos bens, e por título igual, dois ou mais credores da mesma classe especialmente privilegiados, haverá entre eles rateio proporcional ao valor dos respectivos créditos, se o produto não bastar para o pagamento integral de todos.

Aqui, Amorim entende que o dispositivo trata da hipótese em que credores têm iguais direitos sobre o patrimônio do devedor, o que significa a inexistência de preferência legal de um sobre o outro dentro da mesma classe. Mas, quando a apuração de valores na liquidação dos bens não for suficiente para pagar todos os credores da mesma classe, a divisão será proporcional ao crédito de cada qual, salientando-se que serão todos inseridos na classe de quirografários, mesmo os com privilégio. A igualdade aqui referida diz respeito aos credores quirografários e o com privilégio especial geral. (José Roberto Neves Amorim, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 974 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 08/05/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

No lecionar de Ricardo Fiuza, o rateio far-se-á entre os credores privilegiados da mesma classe e igual título. Assim não haverá concorrência entre os credores com privilégio geral, já que os primeiros sempre preferem aos segundos (CC 961). Créditos hipotecários só concorrem com outros credores hipotecários, e assim por diante.

Os credores especialmente privilegiados dividem-se em oito classes, dispostas nos incisos I a VIII do CC 964. O rateio entre eles, quando necessário, só se dará entre os credores de cada classe, sobre o valor dos bens nela mencionados. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 501, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 08/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No entendimento de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o dispositivo em questão aplica-se para casos de igualdades em créditos quirografários e aqueles com privilégio especial (CC 964) e geral (CC 965). Não se aplicam aos créditos com direito real, dado que nesses casos há a preferência do credor real, dado que nesses casos há a preferência do credor que obteve a constituição do direito real de garantia com anterioridade. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 08.05.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 963. O privilégio especial só compreende os bens sujeitos, por expressa disposição de lei, ao pagamento do crédito que ele favorece; e o geral, todos os bens não sujeitos a crédito real nem a privilégio especial.

Na visão de Amorim, este artigo delimita a extensão dos privilégios, não admitindo interpretação extensiva. Portanto, os privilégios especiais são aqueles determinados na lei (CC 964), e excluídos os que têm origem em garantia real, o remanescente é privilégio geral, que assim se mantém em razão da causa da dívida, o que os difere dos quirografários. (José Roberto Neves Amorim, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 975 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 08/05/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Não houve, como afirma Ricardo Fiuza, qualquer submissão de modificação, seja da parte do Senado Federal, seja da parte da Câmara dos Deputados, no período final de tramitação do projeto. Trata-se de mera repetição do art. 1.565 do Código Civil de 1916, com pequena melhoria de redação.

Segundo a doutrina, os privilégios, especial ou geral, não atribuem ao credor o direito de sequela, mas apenas o de preferência, que só poderá ser exercido enquanto os bens permanecerem no patrimônio do devedor. Só serão atingidos pelo privilégio os bens não sujeitos a crédito real. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 501, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 08/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Também na interpretação de Guimarães e Mezzalira, não há a possibilidade de interpretação extensiva do sistema de privilégios. São considerados como tais apenas e tão somente aqueles determinados em lei. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 08.05.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 964. Têm privilégio especial:

I – sobre a coisa arrecadada e liquidada, o credor de custas e despesas judiciais feitas com a arrecadação e liquidação;

II – sobre a coisa salvada, o credor por despesas de salvamento;

III – sobre a coisa beneficiada, o credor por benfeitorias necessárias ou úteis;

IV – sobre os prédios rústicos ou urbanos, fábricas, oficinas, ou quaisquer outras construções, o credor de materiais, dinheiro, ou serviços pra a sua edificação, reconstrução ou melhoramentos;

V – sobre os frutos agrícolas, o credor por sementes, instrumentos e serviços à cultura, ou à colheita;

VI – sobre as alfaias e utensílios de uso doméstico, nos prédios rústicos ou urbanos, o credor de aluguéis, quanto às prestações do ano corrente e do anterior;

VII – sobre os exemplares da obra existente na massa do editor, o autor dela, ou seus legítimos representantes, pelo crédito fundado contra aquele no contrato da edição;

VIII – sobre o produto da colheita, para a qual houver concorrido com o seu trabalho, e precipuamente a quaisquer outros créditos, ainda que reais, o trabalhador agrícola, quanto à dívida dos seus salários.

IX – sobre os produtos do abate, o credor por animais. (Incluído pela Lei n. 13.716, de 2015).

Sintetizando Amorim, o artigo, de forma expressa, indica os privilégios especiais, estando muitos de seus incisos voltados ao princípio da equidade. O credor de custas e despesas judiciais tem privilégio especial para receber o que desembolsou para promover a ação judicial, obtendo êxito no reconhecimento do seu crédito, não sendo justo que receba apenas o valor do seu crédito sem a devolução do que despendeu para obtê-lo; as despesas para salva a coisa, retirando-a do perigo e mantendo a garantia, em proveito do credor, fazem aquele que despendeu o valor credor possuir privilégio especial, porque sem a sua ação a garantia desapareceria; as benfeitorias são consideradas necessárias quando destinadas à conservação do bem e úteis as que melhorem sua utilização, portanto aquele que as realizou deve ser indenizado, recebendo o que despendeu, sob pena de fazer valer o direito de retenção. Os demais credores não podem receber uma coisa valorizada sem ressarcir o benfeitor. Tal regra só não se aplica quando o imóvel estiver hipotecado, em razão da necessidade de registro; o credor de materiais, dinheiro ou serviço para a edificação, a reconstrução ou o melhoramento de prédio deve ser privilegiado porque contribuiu para a garantia, aumentando o valor da coisa; o credor de sementes, instrumentos e serviços agrícolas deve ser privilegiado, porque caso assim não fosse os demais credores estariam a se locupletar do trabalho alheio; alfaias são as roupas e objetos de uso pessoal, servindo como forma de pagamento dos débitos de locação; o crédito fundado em contrato de edição é privilegiado pela proteção legal ao trabalho intelectual; o crédito por salários do trabalhador agrícola prefere a qualquer outro, mesmo aqueles oriundos de garantia real, como salientado no comentário ao CC 961, supra, por ter origem no direito trabalhista. (José Roberto Neves Amorim, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 977 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 08/05/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Sob o foco de Ricardo Fiuza, o dispositivo enumera quais os créditos que gozam de privilégio especial, no que praticamente repetiu o art. 1.566 do Código Civil de 1916, à exceção do inciso VIII, o qual esclarece que os salários do trabalhador agrícola terão preferencia sobre o produto da colheita, com prioridade sobre quaisquer outros créditos, inclusive reais. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 502, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 08/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na análise de Guimarães e Mezzalira, as hipóteses de créditos com privilégio especial são fundadas, em geral, no princípio da equidade.

Ilustrativamente, tem-se os incisos II e III que conferem privilégio especial ao credor que despendeu valores para conservar determinado bem do devedor: é justo que ele detenha privilégio, pois, neste caso, ele evitou que o bem se perdesse em benefício de todos os demais credores. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 08.05.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 965. Goza de privilégio geral, na ordem seguinte, sobre os bens do devedor:

I – o crédito por despesa de seu funeral, feito segundo a condição do morto e o costume do lugar;

II – o crédito por custas judiciais, ou por despesas com a arrecadação e liquidação da massa;

III – o crédito por despesas com o luto do cônjuge sobrevivo e dos filhos do devedor falecido, se foram moderadas;

IV – o crédito por despesas com a doença de que faleceu o devedor, no semestre anterior à sua morte;

V – o crédito pelos gastos necessários à mantença do devedor falecido e sua família, no trimestre anterior ao falecimento;

VI – o crédito pelos impostos devidos à Fazenda Pública, no ano corrente e no anterior;

VII – o crédito pelos salários dos empregados no serviço doméstico do devedor, nos seus derradeiros seis meses de vida;

VIII – os demais créditos de privilégio geral.

Para Amorim, excluídas as garantias reais e os privilégios especiais, remanescem os privilégios gerais enumerados neste artigo, cuja ordem deve ser seguida por expressa disposição do texto. O crédito por despesas de funeral tem origem nos gastos com o enterro e todos aqueles itens necessários para sua consecução, como flores, o espaço no cemitério, dentre outros, mas sempre dentro das condições do falecido; o crédito por despesas judiciais é aquele inerente aos interesses dos credores para conservação da coisa, advogados etc.; o crédito por despesas de luto tem sentido humanitário na medida em que se expressa o pesar pela perda de ente querido, mas deve ser o gasto moderado; o crédito por despesas com doença de que faleceu o devedor é considerado privilegiado para evitar o abandono do doente. Inclui as despesas hospitalares, médicas, com remédio, exames e todas as necessárias à manutenção da vida da pessoa; o crédito com a mantença do devedor falecido e de sua família também tem sentido humanitário e abrange as despesas com moradia, vestuário, alimentação e todas as que se fizeram necessárias à subsistência tanto do devedor falecido como da própria família, nos três meses precedentes à sua morte; o crédito por impostos beneficia as Fazendas Públicas em todos os seus níveis, tendo como finalidade o interesse social, pelo qual a arrecadação permite à administração pública prestar os serviços a ela destinados, atendendo às necessidades da população. O Código Civil de 2002 diminuiu a proteção aos créditos fazendários; o crédito pelos salários dos empregados domésticos do devedor, nos seis meses anteriores ao seu falecimento, é privilegiado pela necessidade de subsistência do próprio empregado e de sua família, tendo como fundamento os serviços prestados ao falecido enquanto doente. Incluem-se nesse rol a cozinheira, o motorista, a arrumadeira, ou qualquer pessoa que tenha prestado serviços com frequência determinada ao falecido; consideram-se créditos com privilégio geral outros a que a lei expressamente atribua tal condição.

Apesar da repetição do dispositivo do Código Civil de 1916, não se pode deixar de salientar que a Lei de Recuperação e Falências (Lei n. 11.101/2005) estabeleceu nova relação de preferência dando como absoluta as relativas aos créditos resultantes de salários e indenizações trabalhistas (art. 83, I). Embora não seja um entendimento uniforme, alguns doutrinadores entendem que as preferências trabalhistas e fiscais devem ser aplicadas à insolvência civil. Pode-se apontar como regra de classificação dos créditos para a insolvência civil: os resultantes de salário e indenizações trabalhistas; os tributários da União, Estados e Municípios; os parafiscais (INSS, PIS, FGTS etc.); os com garantia real; os com privilégios especiais; os com privilégios gerais; e os quirografários. (José Roberto Neves Amorim, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 978/979 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 08/05/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

De acordo com o histórico, este era o texto original do inciso 1 tal como proposto no Anteprojeto: “1. O crédito por despesa de seu funeral, feito sem pompa segundo a condição do finado e o costume do lugar;” Emenda apresentada no Senado Federal suprimiu, com razão, a expressão “sem pompa”, quer por ser desnecessária em razão do inciso já se referir ao funeral “segundo a condição” do morto, quer pela subjetividade de sua conceituação. Por outro lado, a substituição da palavra “finado” por “morto” proposta na emenda foi de boa técnica, tanto por conferir maior simplicidade ao texto, como por expurga-lo de termos e expressões desatualizadas. Corresponde ao art. 1.569 do Código Civil de 1916.

Quanto à doutrina, apresentada por Fiuza, o artigo traz o elenco dos créditos que gozar de privilégio geral, repetindo o art. 1.569 do CC/1916, à exceção do inciso VIII, acrescentado pelo novo Código. A enumeração constante deste artigo é meramente exemplificativa, em face do disposto no inciso VIII. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 502, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 08/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na disposição de Guimarães e Mezzalira, a respeito dos privilégios, é importante lembrar que a Lei n. 11.101/2005 estabeleceu nova ordem de privilégios, concedendo aos créditos trabalhistas privilégio absoluto em relação aos demais. Assim, de acordo com Amorim, como acima citado, nota de VD, a regra de classificação de créditos na insolvência civil passou a ser a seguinte: créditos trabalhistas, créditos fiscais, créditos parafiscais (INSS, FGTS, PIS etc.), créditos com garantia real, créditos com privilégio especial, créditos com privilégio geral e créditos quirografários. (Amorim, José Roberto Neves. Comentário ao artigo 962 do Código Civil. In Peluso, Cezar (coord.) Código Civil comentado, Barueri: Manole, 2015.).

quinta-feira, 7 de maio de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 958, 959, 960 – continua Das Preferências e Privilégios Creditórios - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 958, 959, 960 – continua
Das Preferências e Privilégios
Creditórios - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
(Art. 233 ao 965) - Título X – Das Preferências e Privilégios
Creditórios - (Art. 955 a 965) – vargasdigitador.blogspot.com

Art. 958. Os títulos legais de preferência são os privilégios e os direitos reais.

No lecionar de Amorim, a preferência defere a determinado credor o recebimento de seu crédito antes dos demais de acordo com a natureza de sua obrigação. A preferência pode ser decorrente de privilégio ou de direito real. Considera-se privilégio o direito pessoal que o credor tem de ser pago antes dos demais pela qualidade de seu crédito, conferindo-lhe prioridade no recebimento. Já os direitos reais referidos neste artigo são os de garantia, como o penhor, a anticrese, a hipoteca e a alienação fiduciária. O STJ, nas Súmulas 144 e 219, delimitou como créditos preferenciais os alimentícios e os decorrentes de serviços prestados à massa falida. (José Roberto Neves Amorim, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 971 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 07/05/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

A doutrina de Fiuza mostra o conceito dos Créditos privilegiados ou preferenciais: São aqueles que gozam de preferência estabelecida em lei, e acrescenta que as preferências dividem-se em privilégios reais (direitos reais de garantia sobre coisa alheia) e privilégios pessoais, tratados nos CC 955 e ss deste Código. Os privilégios pessoais podem ser especiais (CC 964) e gerais (CC 965). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 499-500, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 07/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Como esclarecem Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a preferência confere ao credor o direito de que seu crédito seja recebido, anteriormente, ao dos demais. São privilégios eventuais direitos pessoais conferidos a determinado credor (v.g. crédito alimentício). Já os direitos reais mencionados pelo dispositivo são aqueles referentes a garantias, tais quais, o penhor, a hipoteca e a anticrese.

Sumula STJ 144. Os créditos de natureza alimentícia gozam de preferencia, desvinculados os precatórios da ordem cronológica dos créditos de natureza diversa”.

“Súmula STJ 219. Os créditos decorrentes de serviços prestados à massa falida, inclusive a remuneração do síndico, gozam dos privilégios próprios dos trabalhistas”.

“Ação de cobrança de débitos condominiais. Fase executiva. No concurso de credores, o crédito relativo a despesas condominiais prefere ao crédito hipotecário, pois se destina à própria conservação do imóvel. Agravo improvido” (TJSP, 34ª Câm. De Direito Privado, AI. 0309927 – 34.2011.8.26.0000, Rel. Des. Soares Nevada, j. 26.3.2012). (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 07.05.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 959. Conservam seus respectivos direitos os credores, hipotecários ou privilegiados:

I – sobre o preço do seguro da coisa gravada com hipoteca ou privilégio, ou sobre a indenização devida, havendo responsável pela perda ou danificação da coisa;

II – sobre o valor da indenização, se a coisa obrigada a hipoteca ou privilégio for desapropriada.

Como aponta Amorim, traz este artigo o direito do credor de sub-rogar-se no recebimento de qualquer importância referente a seguro ou indenização em razão de o bem hipotecado ou sob privilégio não mais servir como garantia. Portando, a garantia primitiva será substituída pelo prêmio do seguro no caso como garantia. Portanto, a garantia primitiva será substituída pelo prêmio do seguro no caso de perda ou danificação da coisa, seja total seja parcial, decorrente ou não de fatos alheios à vontade do devedor ou por ele provocados. Pouco importa se o seguro foi feito pelo devedor ou pelo credor. Inexistindo seguro, sub-roga-se o credor no direito de ação, passando a ter legitimidade ativa para demandar em busca da indenização. No caso de desapropriação, igualmente sub-roga-se no recebimento do valor a ser pago pelo poder público, quer por ação, quer de qualquer outra forma. (José Roberto Neves Amorim, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 973 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 07/05/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Sob o prisma de Ricardo Fiuza, o dispositivo em comento enumera duas hipóteses em que, mesmo ocorrendo perda ou deterioração da coisa gravada, os privilégios continuam a existir: a) o credor privilegiado tem preferência no recebimento do seguro ou da indenização referente ao bem onerado; b) há também preferência sobre a indenização, no caso de desapropriação. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 500, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 07/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No entendimento de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a intenção do dispositivo em comento é conferir ao credor o direito de sub-rogar-se no recebimento de seguro ou indenização de bem hipotecado ou sob privilégio que não sirva mais como garantia. Assim, acionado o seguro – que pode ter sido contratado tanto pelo credor quanto pelo devedor -, o devedor fica sub-rogado no direito de receber o respectivo prêmio. Caso o bem deteriorado ou perdido não esteja segurado, o credor fica legitimado a buscar indenização do causador do dano, inclusive via ação judicial.

Em caso de desapropriação pelo Poder Público, o credor fica, igualmente, sub-rogado para receber o valor que venha a ser pago por aquele. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 07.05.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 960. Nos casos a que se refere o artigo antecedente, o devedor do seguro, ou eq indenização, exonera-se pagando sem oposição dos credores hipotecários ou privilegiados.

Sob orientação de Amorim, aquele que for responsável pelo pagamento do seguro ou da indenização, sabendo dos direitos de credores, deverá consignar o valor para que se decida quem o receberá. Caso efetive o pagamento ao proprietário sem comunicar aos credores, será responsável por pagar novamente, ressalvado o direito de regresso. Mas, se os credores forem citados e não se manifestarem, está o segurador exonerado de qualquer outra obrigação, haja vista a ausência de oposição do credor ao pagamento. Não havendo a consignação pelo devedor do seguro ou da indenização, o credor sub-roga-se no direito de ação, como mencionado no artigo anterior, demandando para receber o valor devido. Antes da ação do credor, é obrigação do devedor consignar o valor. (José Roberto Neves Amorim, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 973 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 07/05/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Em sua doutrina Ricardo Fiuza cita João Luiz alves, que observa com insuperável objetividade, que “o segurador, a autoridade que desapropria, e o responsável pela indenização podem ignorar a existência do direito real ou do privilégio, e pagando ao dono da coisa o preço do seguro, da desapropriação ou o valor da indenização, realiza um pagamento válido. Para impedi-lo, deve o credor hipotecário ou privilegiado notificar ao obrigado pelo referido preço ou valor do seu direito, opondo-se ao pagamento ao seu devedor” (Código Civil anotado, cit., p. 1093-94). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 500, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 07/05/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na balada de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o devedor do seguro ou causador do dano deverá consignar o valor referente ao bem deteriorado ou perdido em Juízo, para que então se decida quem deverá recebe-lo. Na hipótese de pagar o valor diretamente a determinado credor, sem comunicar aos demais, fica responsável por pagar novamente, caso o pagamento tenha sido feito em desacordo com as regras de preferência do concurso de credores. Caso tenha comunicado os credores e nenhum deles tenha se oposto ao pagamento a determinado credor, o devedor do seguro ou causador do dano fica exonerado da obrigação. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 07.05.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).