sexta-feira, 1 de junho de 2018

CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 - COMENTADO – Art 537 – DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA QUE RECONHEÇA A EXIGIBILIDADE DE OBRIGAÇÃO DE FAZER, OU DE NÃO FAZER– VARGAS, Paulo. S. R.



CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 - COMENTADO – Art 537 – DO
CUMPRIMENTO DE SENTENÇA QUE RECONHEÇA A EXIGIBILIDADE DE
 OBRIGAÇÃO DE FAZER, OU DE NÃO FAZER– VARGAS, Paulo. S. R.


PARTE ESPECIAL- LIVRO I – DO PROCESSO DE CONHECIMENTO
E DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – TÍTULO II – DO CUMPRIMENTO
DA SENTENÇA CAPÍTULO VI – DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA
 QUE RECONHEÇA A EXIGIBILIDADE DE OBRIGAÇÃO DE FAZER,
NÃO FAZER OU DE ENTREGAR COISA – Seção I – Do Cumprimento de Sentença
que Reconheça a Exigibilidade de Obrigação de Fazer ou de Não Fazer - vargasdigitador.blogspot.com

Art 537. A multa independe de requerimento da parte e poderá ser aplicada na fase de conhecimento, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução, desde que seja suficiente e compatível com a obrigação e que se determine prazo razoável para cumprimento do preceito.

§ 1º. O juiz poderá, de ofício ou a requerimento, modificar o valor ou a periodicidade da multa vincenda ou excluí-la, caso verifique que:

I – se tornou insuficiente ou excessiva;

II – o obrigado demonstrou cumprimento parcial superveniente da obrigação ou justa causa para o descumprimento.

§ 2º. O valor da multa será devido ao exequente.

§ 3º. A decisão que fixa a multa é passível de cumprimento provisório, devendo ser depositada em juízo, permitido o levantamento do valor após o trânsito em julgado da sentença favorável à parte.

·         Parágrafo 3º com redação dada pela Lei 13.256, de 04.02.2016.

§ 4º. A multa será devida desde o dia em que se configurar o descumprimento da decisão e incidirá enquanto não for cumprida a decisão que a tiver cominado.

§ 5º. O disposto neste artigo aplica-se no que couber, ao cumprimento de sentença que reconheça deveres de fazer e de não fazer de natureza não obrigacional.

Correspondência no CPC/1973 com o art 461. (...) § 4º e § 6º, nesta ordem e com a seguinte redação:

Art 461 (...) § 4º. (Este refere-se ao caput do art 537 do CPC/2015, ora analisado). O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior, ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou comparável com a obrigação, fixando-lhe prazo razoável para o cumprimento do preceito.

Art 461 (...) § 6º. (Este refere-se ao § 1º do art 537 do CPC/2015, ora analisado). O juiz poderá, de ofício, modificar o valor ou a periodicidade da multa, caso verifique que se tornou insuficiente ou excessiva.

Demais itens sem correspondência do art 537 do CPC/2015, ora analisado, no CPC/1973.

1.    MULTA COERCITIVA

Apesar de não existir uma gradação entre as medidas executivas à disposição do juízo para efetivar a tutela das obrigações de fazer e não fazer, a multa como forma de pressionar o executado a cumprir sua obrigação parece ter merecido posição de destaque, sendo também medida de extrema frequência na praxe forense. A valorização da multa pode ser percebida pela expressa menção a ela feita pelo diploma processual em seu art 537.

A exclusão pelo CPC atual, dos termos “diária” ou “por tempo de atraso” como qualificativos da multa ora analisada é um avanço e deve ser elogiada. A multa, afinal, nem periódica precisa ser, em especial quando aplicada para pressionar psicologicamente o devedor a cumprir uma obrigação instantânea que não pode ser repetida. Seja como for, a interpretação é de que cabe multa, e que sua qualificação – única, periódica, por ato ilícito praticado – é tarefa do juiz no caso concreto, e não do legislador.

Apesar de ser a periodicidade diária a mais frequente na aplicação da multa coercitiva, o juiz poderá determinar outra periodicidade – minuto, hora, semana, quinzena, mês -, bem como determinar que a multa seja fixa, única forma logicamente aceitável de multa nas violações de natureza instantânea.

Aduz o art 537, caput, do CPC que o juiz poderá, inclusive de ofício, impor multa diária ao réu, podendo tal multa ser aplicada na fase de conhecimento, em tutela provisória, na sentença ou na fase de execução. Além de uma repetição, já que o dispositivo poderia ter se limitado a prever o cabimento da multa a qualquer tempo do processo, há uma omissão injustificável: o processo autônomo de execução. Não obstante a intrigante comissão legal, tratando-se de medida executiva, qualquer que seja a forma de execução, será cabível a aplicação da multa.

No mesmo dispositivo, está previsto que cabe ao juízo, na aplicação da multa, determinar prazo razoável para cumprimento do preceito. Acredito que esse prazo não seja o de duração da aplicação da multa, mas sim o prazo de cumprimento voluntário (não espontâneo) que poderá impedir a sua incidência no caso concreto. Não posso concordar que o juiz deve indicar um prazo para o cumprimento, porque, nesse caso, o executado pode fazer previamente cálculos e decidir que vale a pena descumprir a obrigação, mesmo que lhe venha a ser aplicada a multa. Entendo que a multa deve durar enquanto se mostrar útil a seu fim, qual seja, o cumprimento da obrigação, cabendo ao juiz fazer a análise temporal de sua eficácia durante sua aplicação, e não fixando um termo final antes mesmo de sua aplicação.

A multa coercitiva passou a ser conhecida pelos operadores de direito como astreintes, em razão de sua proximidade com instituto processual do direito francês de mesmo nome. Não cumpre neste momento, a análise comparativa entre a multa cominatória do direito brasileiro e os astreintes do do direito francês, que resultaria na constatação de que, apesar de próximas, têm diferenças importantes. A constatação empírica é que a utilização do termo astreintes se presta a designar a multa cujas características principais serão neste capítulo analisadas.

Registre-se que, mesmo sendo a obrigação cumprida a destempo, a multa continua a ser exigível pelo período de atraso no cumprimento da obrigação, de forma que somente o cumprimento dentro do prazo exime a parte do pagamento (Informativo 526/STJ, 3ª Turma, REsp 1.183.774-SP, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 18.06.2013, DJe 27.06.2013). (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 949/950. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

2.    VALOR DA MUILTA

Não existe nenhuma previsão legal referente ao valor da multa coercitiva, apenas mencionando o art 537, caput, do CPC a exigência de que seja suficiente e compatível com a obrigação, e é melhor que assim seja. Tratando-se de medida de pressão psicológica, caberá ao juiz analisar as particularidades do caso concreto para determinar um valor que seja apto a efetivamente exercer tal influência no devedor para que seja convencido de que a melhor alternativa é o cumprimento da obrigação. Essa é uma das razões para negar a natureza coercitiva à multa prevista no art 523, § 1º, do CPC.

A tarefa do juiz, no caso concreto, não é das mais fáceis. Se o valor não pode ser irrisório, porque assim sendo não haverá nenhuma pressão sendo efetivamente gerada, também não pode ser exorbitante, considerando-se que um valor muito elevado também desestimula o cumprimento da obrigação. Valendo-se de uma expressão poética revolucionária, tem-se que endurecer sem perder a ternura.

Essa responsável liberdade concedida ao juiz na determinação do valor da multa faz com que não exista nenhuma vinculação entre o seu valor e o valor da obrigação descumprida podendo, portanto, superá-lo (Informativo 262, 3ª Turma, REsp 1.352.426-GO, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em 5/5/2015, DJe 18/05/2015). Se tivesse natureza sancionatória ou compensatória, como ocorre com a cláusula penal, seria o valor limitado ao da obrigação compensatória, como ocorre com a cláusula penal, seria o valor limitado ao da obrigação principal por expressa previsão do art 412, do CC. Inclusive, nos Juizados Especiais, Estaduais, exite entendimento no sentido de que as astreintes não se limitam ao valor teto de 40 salários-mínimos, que se refere somente à pretensão principal do autor (STJ, 2ª Seção, Rcl 7.861/SP, rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 11.09.2013, DJe 06/03/2014; STJ, 3ª Turm, rms 38.884/AC, REL. Min. Nancy Andrighi, j. 07/05/2013, DJe 06.03.2013; Enunciado 25 do Fonaje: “A multa cominatória não fica limitada ao valor de 40 salários-mínimos, embora razoavelmente fixada pelo juiz, obedecendo ao valor da obrigação principal, mais perdas e danos, atendidas as condições econômicas do devedor”). (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 950. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

3.    CREDOR DA MULTA

Tendo natureza coercitiva, as astreintes sempre beneficiará a parte que pretende o cumprimento da obrigação. É evidente que, na hipótese de a multa funcionar em sua tarefa de pressionar o obrigado, a parte contrária será beneficiada por sua aplicação, porque conseguirá a satisfação de seu direito em razão do convencimento gerado no devedor em razão da aplicação da multa. Ocorre, entretanto, que nem sempre a multa surte os efeitos pretendidos, e sempre que isso ocorre será criado um direito de crédito no valor da multa fixada. Nesse caso, não parece correto falar em quem será o beneficiado pela multa para aferir quem é o credor desse valor; melhor será falar em beneficiado pela frustração da multa e a consequente criação de um crédito.

Apesar da crítica de parcela da doutrina, o legislador nacional entende que o credor do valor gerado pela frustração da multa será a parte para a qual não foi determinado o cumprimento da obrigação, conforme expressa previsão do § 2º do art 357. Esse também é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (Informativo 497/STJ, 4ª Turma, REsp 949.509/RS, Rel. originário Min. Luis Felipe Salomão, Rel. para o acórdão Min. Marco Buzzi, j. 08.05.2012, DJe 16.04.2013). costuma-se afirmar que o beneficiado, nesse caso, é o demandante, mas não se pode descartar a possibilidade de o demandado ser credor, o que ocorrerá sempre que o demandante descumprir uma determinação para o cumprimento de uma obrigação de fazer ou não fazer com aplicação de multa. De qualquer forma, a multa não é revertida para o Estado, mas para uma das partes, geralmente o demandante.

Realmente a opção do legislador não deve ser elogiada, em especial quando considerada a previsão do art 500, do CPC, que determina que a multa não impede a indenização por perdas e danos. Nota-se que, tendo tido um efetivo dano em razão do descumprimento da obrigação, caberá à parte pedir a devida indenização, tendo que provar a existência do dano. Tornando-se credor do valor da multa frustrada, a parte tem um ganho patrimonial em detrimento do patrimônio da parte contrária, sem nenhum respaldo jurídico para legitimar tal locupletamento. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 951. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

4.    ALTERAÇÃO DO VALOR E PERIODICIDADE DA MULTA

O art 537, § 1º, do CPC menciona a possibilidade de alteração do valor e/ou da periodicidade das astreintes prevendo as causas que justifiquem tal alteração.

A causa prevista no inciso I do dispositivo legal não traz maiores complicações, sendo a hipótese clássica de alteração do valor da multa: a percepção pelo juiz de que se tornou insuficiente ou excessiva. A fixação do valor adequado não é tarefa simples, devendo o juiz se afastar dois extremos, já que um valor ínfimo não permite que a multa cumpra sua função (de pressão psicológica do devedor) e um valor exorbitante desestimula o devedor no cumprimento da obrigação. Dessa forma, caso o juiz note que o valor fixado originariamente se mostrou insuficiente para pressionar efetivamente o devedor a cumprir a obrigação, ou excessivo a poto de não estimular o devedor a tal cumprimento, deve, inclusive de ofício, modificar o valor da multa.

O inciso II do § 1º do art 537 do CPC justifica a alteração ora analisada no cumprimento parcial superveniente da obrigação ou justa causa para o descumprimento. acredito que a hipótese cumprimento parcial superveniente, a multa deva ser readequada em termos de valor porque a inadimplência terá objetivamente diminuído. Já no caso de justa causa para o descumprimento, vejo com dificuldade diminuir o valor da multa, porque não sendo materialmente possível cumprir a obrigação, a multa simplesmente não pode ser aplicada.

Entendo que a previsão do dispositivo ora analisado seja dirigida ao próprio juiz que fixou originariamente o valor e a periodicidade da multa, com o que se afasta do caso concreto a preclusão judicial, indevidamente chamada de preclusão pro iudicato. Alguma segurança jurídica, entretanto, deve se exigir, de forma que a modificação do valor e/ou da periodicidade deve ser justificada por circunstancias supervenientes, sendo o reiterado descumprimento da obrigação robusto indicativo de que a multa não está cumprindo com a sua função. Os incisos do art 537, § 1º, do CPC são nesse sentido de que mudança sem circunstancias supervenientes que a justifique não deve ser admitida.

Apesar de não haver preclusão nesse caso, a parte terá o direito de recorrer contra a decisão que fixa a multa, podendo a revisão do valor ser realizada pelo tribunal em grau recursal. Inclusive o Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso especial, vem alterando o valor da multa quando o entende irrisório ou exorbitante (STJ, 3ª Turma, AgRg no AREsp 674.690/SP, rel. Min. João Otávio de  Noronha, j. 25/08/2015, DJe 28/08/2015; STJ, 1ª Turma, AgRg no AREsp 619.408/SE, rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 25/08/2015, DJe 03.09.2015; STJ, 4ª Turma, AgRg no AREsp 693.437/RS, rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, j. 20/08/2015, DJe 26/08/2013).

Havendo valor da multa fixado no título executivo extrajudicial, o juiz só poderá diminui-lo se tal valor se mostrar excessivo, nos termos do art 814, parágrafo único, do CPC (Informativo 505/STJ, 3ª Turma, REsp 1.198.880/MT, rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, j. 20.09.2012, DJe 11/12/2012). Dessa forma, mesmo que a multa não se mostre efetiva no caso concreto, não poderá o juiz aumentar seu valor. Realidade diferente se verifica com a multa fixada em sentença (título executivo judicial), mesmo que transitada em julgado, já que o Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento de que as astreintes não produzem coisa julgada material por serem apenas meio de coerção indireta, de forma que podem ter seu valor modificado e até mesmo ser suprimidas no momento executivo (Informativo 539/STJ, 2ª Seção, Resp 1.333.988/SP, rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, j. 09.04.2014. DJe 11.04.2014). (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 951/952. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

5.    DIMINUIÇÃO DO VALOR CONSOLIDADO DA MULTA

Questão interessante diz respeito à modificação do valor e/ou periodicidade da multa fixada em sentença transitada em julgado. Uma falsa compreensão da natureza e da função das astreintes pode levar o intérprete a acreditar que nessa hipótese haverá uma vinculação do juiz que conduz o cumprimento de sentença ao estabelecido em sentença em virtude do fenômeno da coisa julgada material. O equívoco de tal percepção é manifesto, porque a multa é apenas uma forma executiva de cumprir a obrigação reconhecida em sentença, naturalmente não fazendo parte do objeto que se tornará imutável e indiscutível em razão da coisa julgada material (STJ, 3ª Turma, REsp 681.294/PR, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, rel. p/acórdão Min. Nancy Andrighi, j. 18.12.2008, DJe 18.02.2009).

Outro tema de extrema relevância diz respeito à possibilidade de mudança do valor final da multa, no momento em que a tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente tornarem-se impossíveis ou a vontade do devedor for a conversão em perdas e danos. Pode o juiz reduzir o valor que será executado pela parte? Seria possível aplicar o art 537, § 1º, do CPC a essa situação, ou o dispositivo legal limita-se a tutelar as situações em que a multa ainda está sendo aplicada?

Há defensores da impossibilidade de o juiz diminuir o valor final gerado pela frustração da multa. Alguns doutrinadores simplesmente afirmam que não há base legal para o juiz retroativamente eximir parcial ou totalmente o devedor, enquanto outros defendem a impossibilidade de o juiz fazer tal revisão com fundamento no direito adquirido da parte beneficiada com o direito de crédito advindo da frustração da multa. O entendimento é interessante, mas não deve ser admitido, ao menos não em sua integralidade.

Em meu entendimento, enquanto a multa mostrou concreta utilidade em pressionar o devedor, o valor obtido é realmente um direito adquirido da parte, não podendo o juiz reduzi-lo, ainda que instado a tanto pela parte contrária. Mas isso não significa que o valor calculado durante todo o tempo de vigência da multa seja efetivamente devido, porque a sua manutenção passaria a ter caráter puramente sancionatório, com nítido desvirtuamento de sua natureza. O mais adequado é o juiz determinar, com eficácia ex tunc, a partir de quando a multa já não tinha mais utilidade, revogando-a a partir desse momento e calculado o valor somente relativamente ao período de tempo em que a multa mostrou-se útil. Reconheço que a determinação exata do momento a partir de quando a multa passou a ser inútil pode ser extremamente difícil, mas caberá ao juiz determina-lo valendo-se do princípio da razoabilidade.

O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento de que o valor final da multa frustrada pode ser reduzido pelo juiz para evitar o enriquecimento sem causa da parte (STJ, 1ª Turma, AgRg no AREsp 42.278/GO, rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 28.05.2013, DJe 04.06.2013; STJ, 2ª Turma, AgRg no REsp 1.318.332/PB, rel. Min. Herman Benjamin, j. 26.06.2012, DJe 01.08.2012; STJ, 4ª Turma, RCDESP no AREsp 94.599/DF, rel. Min. Maria Isabel Gallotti, j. 27.11.2012, DJe 11.12.2012), mas esse entendimento não é correto porque o enriquecimento sem causa não depende do valor da multa, verificando-se pela simples posição de credor da parte, como já afirmado. Há parcela doutrinária que entende que a diminuição de valor final exorbitante, decorrente do longo lapso temporal de vigência da multa, justifica-se no princípio da boa-fé e da lealdade processual, considerando haver abuso de direito na atitude do credor que deixa de requerer a conversão da obrigação de fazer e/ou não fazer em perdas e danos em tempo razoável, quando notar que a mula não está funcionando.

O tema, entretanto, passa longe de ser tranquilo, existindo tanto doutrina quanto decisões do próprio Superior Tribunal de Justiça (Informativo 459/STJ, 3ª Turma, REsp 1.229.335-SP, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 17.04.2012, DJe 27.06.2012.; Informativo 490/STJ, 3ª Turma, REsp 1.192.197-SC, rel. originario Min. Massami Uyeda, rel. para acórdão Min. Nancy Andrighi, j. 07.02.2012, DJe 05.06.2012; Informativo 448/STJ, 3ª Turma, REsp 1.135.824/MG, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 21.09.2010, DJe 14.03.2011; Informativo 414/STJ, 3ª Turma, AgRg no REsp 1.026.191-RS, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 03/11/2009, DJe 23.11.2009; Informativo 408/STJ, 3ª Turma, REsp 1.022.022-RJ, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 22.09.2009, DJe 18.11.2009) entendendo que se o não cumprimento da decisão do juiz deu-se por resistência injustificada da parte, não há sentido em se minorar o valor final da multa. Nesse entendimento, se o valor é alto, isso decorre da postura de afronta ou desleixo adotada pela parte, e em razão disso diminuir o valor da multa é contrariar a própria natureza da multa cominatória.

E, ainda, uma terceira corrente jurisprudencial que, apesar de admitir a redução do valor da multa, entende que o valor total fixado a título de astreintes somente poderá ser objeto de redução se fixada a multa diária em valor desproporcional e não razoável à própria prestação que ela objetiva compelir o devedor a cumprir, nunca em razão do simples valor total da dívida, mera decorrência da demora e inércia do próprio devedor STJ, 3ª Turma, REsp 1.475.157-SC, rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 18.09.2014, DJe 06.10.2014).

A modificação do valor consolidado da multa pode ser feita de ofício ou mediante pedido do executado. O mais comum é que tal alegação seja veiculada por meio de defesa típica do executado, ou seja, a impugnação, considerando que a execução da multa dar-se-á por meio de cumprimento de sentença. O Superior Tribunal de Justiça, entretanto, já teve oportunidade de admitir tal alegação em sede de exceção de pré-executividade, considerando tratar-se de matéria de ordem pública que dispensa a instrução probatória (Informativo 485/STJ, 3ª Turma, REsp 1.019.455/MT, rel. Min. Massami Uyeda, j. 18.10.2011, DJe 15.12.2011). (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 953/954. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

6.    EXIGIBILIDADE DA MULTA

A multa coercitiva pode ser aplicada tanto para pressionar o devedor a cumprir uma decisão interlocutória que concede tutela de urgência quanto para cumprir uma sentença que julga procedente o pedido do autor. Questão que causa séria divergência na doutrina pátria refere-se ao momento a partir do qual a multa torna-se exigível. Em outras palavras, a partir de qual momento a parte beneficiada com o crédito gerado pela frustração da multa poderá executá-lo?

Para parcela da doutrina, a multa é exigível a partir do momento em que a decisão que a fixa torna-se eficaz, ou porque não foi recorrida ou porque foi impugnada por recurso sem efeito suspensivo. Essa exigibilidade permitiria a execução imediata de crédito decorrente da multa frustrada, fixada em decisão ainda não definitiva, inclusive a decisão interlocutória que concede a tutela provisória, o que so pode ser compreendido com a possibilidade de execução provisória do crédito.

Para essa corrente doutrinária, a necessidade de exigibilidade imediata resulta da própria função coercitiva da multa, porque a necessidade de aguardar a definitividade da decisão, que só ocorrerá com o advento da coisa julgada material, seria extremamente contrária à necessidade de pressionar efetivamente o devedor a cumprir a obrigação. Uma perspectiva de remota execução não seria suficiente para exercer a pressão psicológica esperada das astreintes.

Para outra corrente doutrinária, deve-se aguardar o trânsito em julgado para que se possa exigir o crédito gerado pela frustração da multa. Essa corrente doutrinária entende que a mera ameaça de aplicação da multa, independentemente do momento em que o crédito gerado por sua frustração passará a ser exigível, já é suficiente para configurar a pressão psicológica pretendida pelo legislador. Por outro lado, como só deve pagar a multa a parte definitivamente derrotada na demanda judicial – o que só será conhecido com o trânsito em julgado -, cabe aguardar esse momento procedimental para admitir a execução da multa.

Numa tentativa de se tentar um meio termo entre a executabilidade imediata, fundada na maior eficácia da multa, e a executabilidade condicionada ao trânsito em julgado, em prestígio à segurança jurídica, o Superior Tribunal de Justiça passou a entender que a multa fixada em sede de tutela antecipada só poderia ser executada após a confirmação da tutela antecipada em sentença, e desde que o recurso contra essa decisão não tenha efeito suspensivo (Informativo 546/STJ, Corte Especial, REsp 1.200.856/RS, rel. Min. Sidnei Beneti, j. 01.07.2014, DJe 17.09.2014; Informativo 511/STJ, 4ª Turma, REsp 1.347.726-RS, rel. Min. Marco Buzzi, j. 27.11.2012, DJe 04.02.2013). Registre-se que a ausência do efeito suspensivo não chegava a ser um problema, porque ele só poderia ser obtido excepcionalmente no caso concreto (efeito suspensivo ope iudicis). O equilíbrio buscado entre a eficácia da multa e a segurança jurídica foi alcançado de outra forma pelo art 537, § 3º, do CPC.

Inicialmente, a previsão do dispositivo legal deve ser saudada por duas razoes. Primeiro, porque consagra expressamente a eficácia imediata da multa, em nítido prestígio da efetividade desse meio executivo. Segundo, porque deixa claro que a execução definitiva dessa multa depende do trânsito em julgado da sentença, afastando indevida confusão entre executabilidade e provisoriedade sentida em algumas decisões do Superior Tribunal de Justiça. (Informativo 422/STJ: 1ª Turma, REsp 1.098.028/SP, rel. Min. Luiz Fux, j. 09.02.2010, DJe 02.03.2010; STJ, 3ª Turma, AgRg no REsp 1.116.800/RS, rel. Min. Massami Uyeda, j. 08.09.2009, DJe 25.09.2009).

Apesar de consagrar a eficácia imediata da multa, o dispositivo legal ora analisado consagra um cumprimento de sentença incompleto, já que exige para o levantamento dos depósitos realizados em juízo o trânsito em julgado de sentença favorável à parte. O único ato vedado pela norma comentada na execução provisória da multa é o levantamento de valores, de forma que, sendo penhorada qualquer outro bem que não seja dinheiro, deverá ocorrer normalmente sua expropriação, permanecendo o valor recebido depositado em juízo à espera do trânsito em julgado.

O legislador, aparentemente, encontrou uma solução que prestigia a efetividade e a segurança jurídica. A executabilidade imediata reforça o caráter de pressão psicológica da multa porque o devedor sabe que, descumprida a decisão em tempo breve, poderá sofrer desfalque patrimonial. Por outro lado, ao exigir para o levantamento de valores em favor do exequente, o trânsito em julgado, o legislador prestigia a segurança jurídica.

Tenho sérias dúvidas a respeito da aplicabilidade da norma legal ora comentado no processo coletivo, considerando que o microssistema coletivo tem regra a respeito do tema em outro sentido, exigindo o trânsito em julgado para que a multa fixada durante o processo possa ser executada. Dessa forma, na ação civil pública (art 12, § 2º da Lei 7.347/1985), nas demandas regidas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, (art 213, § 3º, da Lei 8.069/1990) e nas demandas reguladas pelo Estatuto do Idoso (art 83, § 3º, d Lei 10.741/2003), a multa só será exigível após o trânsito em julgado da decisão.

Não posso deixar de registrar minha profunda lamentação por tal solução, porque no processo coletivo, no qual se tutelam direitos indisponíveis e disponíveis com repercussão social, a eficácia da multa é ainda mais relevante. Condicionar sua executabilidade ao trânsito em julgado é em grande medida frustrar a expectativa de que a multa cumpra sua função de pressionar psicologicamente o devedor a cumprir a obrigação. As regras presentes no microssistema coletivo, entretanto, não deixam margem a outra interpretação.

Conforme consta do dispositivo ora analisado, é possível o levantamento do dinheiro antes do trânsito em julgado, bastando para isso estar pendente de julgamento o agravo contra recurso especial e recurso extraordinário. A permissão legal dá-se em razão das chances mínimas de sucesso de tal recurso, assumindo o legislador, nesse caso, o risco por um levantamento antes do trânsito em julgado.

Apesar de raro, é possível que tal recurso seja provido e tal situação deve ser considerada. sendo por meio de decisão definitiva demonstrando não assistir razão à parte que teria sido beneficiada pela multa,na hipótese de a multa ainda não ter sido cobrada, esta perderá seu objeto. Já tendo sido executada, com a satisfação doc redor, caberá a repetição de indébito. Ainda que existisse uma decisão do juiz, à época da fixação da multa que deveria ter sido cumprida, se posteriormente essa decisão mostrou-se contrária ao direito, não há mais nenhuma justificativa para a manutenção das consequências do inadimplemento da obrigação. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 954/956. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

7.    TERMO INICIAL DA MULTA E INTIMAÇÃO DO EXECUTADO

O termo inicial da multa será a intimação do devedor a cumprir a obrigação, sendo que o Superior Tribunal de Justiça já pacificou o entendimento (Súmula 410/STJ) de que essa intimação deve ser pessoal, não servindo a intimação na pessoa do advogado. Como o ato de cumprimento da obrigação é um ato a ser praticado pela parte, diferente dos atos postulatórios, não se inicia a contagem da multa sem a intimação pessoal do devedor (Informativo 464/STJ, 2ª Seção, EAg 857.758/RS, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 23.02.2011, DJe 09.03.2012).

A questão pode voltar a ser tema de debate em razão do art 513, caput e § 2º do CPC. Isso porque,no capítulo destinado às disposições gerais do cumprimento de sentença, o dispositivo determina diferentes formas de intimação do devedor para o cumprimento da obrigação, inclusive por publicação no Diário Oficial, na pessoa de seu advogado constituído nos autos (inciso I). Trata-se de norma aplicável a qualquer espécie de cumprimento de sentença (de tutela provisória ou definitiva), de forma que, ao menos nesse caso, a intimação do devedor não precisaria mais ser necessariamente pessoal.

No processo de execução, o executado é citado para ser integrado à relação jurídica processual e intimado a cumprir obrigação, sendo tal ato de comunicação de ato processual realizado pessoalmente. Caso a multa já tenha sido fixada no pronunciamento judicial que determina a citação do executado, o ato de comunicação terá sido pessoa. Situação diversa tem-se com a fixação da multa após a integração do executado ao processo, ficando nesse caso a dúvida a respeito da forma mais adequada de intimação: pessoal ou nos termos do art 513, § 2º, do CPC por analogia? Entendo que para manter o sistema minimamente harmônico e homogêneo, a segunda forma é a mais adequada. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 956. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

quarta-feira, 30 de maio de 2018

CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 - COMENTADO – Art 536 – DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA QUE RECONHEÇA A EXIGIBILIDADE DE OBRIGAÇÃO DE FAZER, OU DE NÃO FAZER– VARGAS, Paulo. S. R.


CPC LEI 13.105 e LEI 13.256 - COMENTADO – Art 536 – DO
CUMPRIMENTO DE SENTENÇA QUE RECONHEÇA A EXIGIBILIDADE DE
 OBRIGAÇÃO DE FAZER, OU DE NÃO FAZER– VARGAS, Paulo. S. R.


PARTE ESPECIAL- LIVRO I – DO PROCESSO DE CONHECIMENTO
E DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – TÍTULO II – DO CUMPRIMENTO
DA SENTENÇA CAPÍTULO VI – DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA
 QUE RECONHEÇA A EXIGIBILIDADE DE OBRIGAÇÃO DE FAZER,
NÃO FAZER OU DE ENTREGAR COISA – Seção I – Do Cumprimento de Sentença
que Reconheça a Exigibilidade de Obrigação de Fazer ou de Não Fazer - vargasdigitador.blogspot.com

Art 536. No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, para a efetivação da tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, determinar as medidas necessárias à satisfação do exequente.

§ 1º. Para atender ao disposto no caput, o juiz poderá determinar entre outras medidas, a imposição de multa, a busca e apreensão, a remoção de pessoas e coisas, o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva, podendo, caso necessário, requisitar o auxílio de força policial.

§ 2º. O mandado de busca e apreensão de pessoas e coisas será cumprido por 2 (dois) oficiais de justiça, observando-se o disposto no art 846, §§ 1º a 4º, se houver necessidade de arrombamento.

§ 3º. O executado incidirá nas penas de litigância de má-fé quando injustificadamente descumprir a ordem judicial, sem prejuízo de sua responsabilização por crime de desobediência.

§ 4º. No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer, aplica-se o art 525, no que couber.

§ 5º. O disposto neste artigo aplica-se, no que couber, ao cumprimento de sentença que reconheça deveres de fazer e de não fazer de natureza não obrigacional.

Correspondência no CPC 1973, artigos 461, 461 (...) § 5º, 842 caput e § 1º e 644 caput, nesta ordem e com a seguinte redação:

Art 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providencias que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento. (Este referente ao caput do art 536 do CPC 2015, ora analisado).

Art 461. (...) § 5º. Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como a imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial. (Este referente ao § 1º do art 536 do CPC 2015, ora analisado).

Art 842. O mandado será cumprido por dois oficiais de justiça, um dos quais o lerá ao morador, intimando-o a abrir as portas.
   § 1º. Não atendidos, os oficiais de justiça arrombarao as portas externas, bem como as internas e quaisquer móveis onde presumam que esteja oculta a pessoa ou a coisa procurada. (Estes referentes ao § 2º do art 536 do CPC 2015, ora analisado).

Art 644. A sentença relativa a obrigação de fazer ou não fazer cumpre-se de acordo com o art 461, observando-se, subsidiariamente, o disposto neste Capítulo. (Este referente ao § 4º do art 536 do CPC 2015, ora analisado).

Itens não mencionados, sem correspondência no CPC/2015

1.    INÍCIO DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA

Havendo sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer e de não fazer ainda não transitada em julgado, eventual execução provisória dependerá de requerimento do credor. Com o trânsito em julgado, entretanto, parece mais adequado o entendimento de que o juiz pode dar início de ofício ao cumprimento de sentença, determinando as medidas executivas que entender necessárias à satisfação do direito do credor, em aplicação da regra do impulso oficial.

Entendo que esse entendimento é confirmado pelo art 536, caput, do CPC, que ao prever a determinação das medidas necessárias à satisfação do direito do exequente aponta que essas podem ser adotadas mediante requerimento ou de ofício. Não descarto a possibilidade de se interpretar o dispositivo legal em omento procedimental posterior ao da provocação do exequente, mas não havendo previsão expressa a respeito da necessidade de tal provocação, como ocorre no art 523, caput do CPC para o cumprimento de sentença de pagar quantia, parece mais adequada a aplicação do princípio do impulso oficial. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 943/944. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

2.    TUTELA ESPECÍFICA E TUTELA PELO EQUIVALENTE EM DINHEIRO

Não há dúvida de que a tutela específica tenha mais qualidade do que a tutela pelo equivalente em dinheiro, apontando a melhor doutrina que a execução é tao bem-sucedida quando entregar ao credor exatamente o que o cumprimento voluntário da obrigação lhe esntregaria. Todas as formas executivas previstas exemplificativamente no art 536, § 1º, do CPC, se prestam justamente para instrumentalizar a obtenção da tutela específica ou do resultado prático equivalente, que como devidamente analisado nos comentários ao art 497 do CPC não deixa de ser tutela específica.

Ocorre, entretanto, que a tutela específica nem sempre é obtida no caso concreto, dendo possível a obrigação de fazer e não fazer ser convertida em prestação pecuniária quando essa for a vontade do exequente ou pela impossibilidade material ou jurídica de obtenção da tutela específica. Apesar de existir opinião doutrinária no sentido de que a conversão também se justifica quando a tutela específica se mostra excessivamente onerosa, entendo que essa não é uma das justificativas para o sacrifício da tutela específica no caso concreto. A onerosidade será resultante da própria natureza da obrigação, e, sendo a vontade do credor de que seja efetivada a tutela específica, basta ser possível o cumprimento para não se justificar a conversão em perdas e danos. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 944. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

3.    VONTADE DO EXEQUENTE

Esse ideal do legislador de melhor qualidade na prestação jurisdicional invariavelmente converge com a própria vontade do exequente, que, uma vez em juízo para obter a satisfação de uma obrigação de fazer ou de não fazer, verá com bons olhos as medidas adotadas pelo juiz, ainda que de ofício, almejando que o ato seja feito ou deixe de ser feito, o que se afirma, até com ares de obviedade, é que o resultado eficaz da execução, entregando ao exequente exatamente aquilo que receberia se não precisasse do processo, além de fonte de prestígio ao Poder Judiciário, será também fonte de plena satisfação do próprio exequente. Significa dizer que, ao menos em regra, há uma identidade entre a boa prestação jurisdional, entendida como a entrega da tutela específica e a pretensão do exequente.

Ocorre, entretanto, que o exequente pode preferir a prestação pecuniária, ainda que a obtenção da tutela específica seja concretamente alcançável. Nessa hipótese, ter-se-á de um lado o autor abrindo mão da melhor tutela jurisdicional passível a ser obtida naquele processo e se contentando com uma satisfação subsidiária (já que distante de seu direito material), e de outro o juiz ciente de que poderia, ainda que agindo de ofício, entregar ao credor exatamente aquilo que está representado no título executivo.

Tratando-se de direito disponível, entendo que a mera vontade do exequente vincula o juiz, ainda que em sacrifício da melhor qualidade da prestação jurisdicional que poderia ser obtida no caso concreto (STJ, 3ª Turma, REsp 598.233/RS, rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro, rel. p/acórdão min. Nancy Andrighi, j. 02.08.2005, DJ 29.08.2005). Se o direito discutido é disponível, podendo o autor abrir mão dele a qualquer momento, sem nenhuma interferência do juiz, seria absurdo prestigiar a atuação oficiosa do juiz em detrimento de sua vontade. Não é correta a doutrina que exige resistência à pretensão do exequente durante a execução para que se admita a conversão pela vontade do exequente, ou ainda a necessidade de concessão de uma última chance ao devedor por meio de sua intimação para cumprir a prestação. Se já existem as condições para o cumprimento de sentença, é porque não houve o cumprimento voluntário, ou seja, já houve resistência do devedor e o consequente inadimplemento.

Basta para chegar a essa conclusão o princípio da disponibilidade da execução, consagrado no art 775, caput, do CPC, que admite a desistência do credor de algumas medidas executivas, mantendo-se a execução. Sendo a satisfação da tutela específica obtida somente por meio da realização, no caso concreto, das medidas de execução forçada e indireta que se encontram à disposição do juiz, caso o exequente não deseje mais essa espécie de tutela, basta desistir de tais medidas, tornando a conversão em perdas e danos, a única forma viável de prosseguimento da execução.

Tratando-se de direito indisponível, a mera vontade do autor não será suficiente, admitindo-se a conversão em perdas e danos somente quando a tutela específica se tornar impossível. Fala-se, nesse caso, de indisponibilidade do resultado específico, como ocorre nas execuções coletivas. É importante ressaltar, entretanto, que mesmo tratando-se de direito indisponível, a vontade do exequente continua a ser determinante no tocante aos meios executivos, desde que a opção não frustre a tutela específica passível de obtenção no caso concreto. Tome-se, como exemplo, a execução de alimentos, na qual o exequente pode optar entre a penhora e a prisão civil, porque em ambas o direito de crédito tutelado é pretensamente passível de satisfação.

A conversão da tutela específica em perdas e danos por vontade do credor independe de expressa previsão no título executivo, já tendo o Superior Tribunal de Justiça corretamente entendido que a transformação em sede executiva da obrigação de fazer ou não fazer em obrigação de pagar quantia certa não afronta os arts 141 e 492 do CPC (STJ, 1ª Turma, AgRg no REsp 992.028/RJ, rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 14.12.2010, DJe 14.02.2011). (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 944/945. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

4.    IMPOSSIBILIDADE DE OBTENÇÃO DA TUTELA ESPECÍFICA OU DO RESULTADO PRÁTICO EQUIVALENTE

A impossibilidade material afeta a pessoa do devedor na hipótese de obrigação de fazer infungível, de forma que fisicamente torna-se impossível o cumprimento da obrigação. Basta imaginar a morte do devedor ou a perda da habilidade específica que determinou a contratação do devedor, como na hipótese de um professor que tenha perdido a voz. Também quando se nota uma inviabilidade de convencer o executado a cumprir essa espécie de obrigação, haverá uma impossibilidade material de obtenção da tutela específica. A diferença é que na primeira hipótese, a conversão em perdas e danos é automática, e na segunda, resulta da frustração dos meios de pressão psicológica adotados no caso concreto.

Entendo que essa espécie de impedimento não atinge, ao menos em regra, a obrigação de fazer fungível, sendo sempre possível a obtenção da tutela específica pelo cumprimento da obrigação por terceiro. Somente no caso de demonstração objetiva de perda de interesse do exequente na tutela específica, haverá uma espécie de impossibilidade material derivada da inutilidade que a tutela específica geraria nesse caso.

A impossibilidade jurídica deriva de alguma regra de direito que torna inviável o cumprimento da obrigação de fazer, como uma regra que, garantindo a inviolabilidade profissional, proíba o devedor da prática de determinado ato. Nesse caso, materialmente, será possível e provavelmente útil ao exequente a tutela específica, mas norma jurídica impedirá a execução dessa forma. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 945/946. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

5.    ONEROSIDADE EXCESSIVA

Outra hipótese de conversão da tutela específica em perdas e danos é a excessiva onerosidade da primeira (art 805 do CPC). Nesse caso, ainda que a tutela específica seja material e juridicamente possível, sua efetivação gera tamanha onerosidade ao executado que proporcionalmente será mais adequada a sua conversão em perdas e danos.

Como a obtenção da tutela específica continua a ser material e juridicamente possível, o exequente pode não concordar com a conversão ora analisada, mas nesse caso, cabe ao juiz a aplicação das regras da proporcionalidade e razoabilidade no caso concreto, sendo sua a última palavra sobre a adequação da conversão. Sujeita ao recurso de agravo de instrumento, naturalmente. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 946. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

6.    ROL EXEMPLIFICATIVO DAS MEDIDAS EXECUTIVAS

Prevê o art 536, § 1º, do CPC que o juiz poderá, de ofício ou a requerimento do exequente, determinar as medidas necessárias para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente, enumerando exemplificativamente a aplicação de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas ou coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial.

A doutrina é tranquila no entendimento de que o rol de formas executivas previsto pelo dispositivo legal é exemplificativo, o que é corroborado pela utilização da expressão “entre outras medidas” antes da descrição específica das formas executivas constante do texto legal e diante da generalidade da previsão contida no art 139, IV, do CPC. Essa interpretação é a única possível à luz da preocupação em municiar o juiz de todos os instrumentos necessários para que a tutela específica ou o resultado prático equivalente sejam efetivamente obtidos no caso concreto.

Esse amplo poder concedido ao juiz na execução da obrigação de fazer e não fazer evidentemente não é irrestrito ou incondicionado, cabendo na aplicação das medidas executivas sempre levar o juiz em consideração o princípio da razoabilidade e da menor onerosidade ao executado (art 805 do CPC). Ainda que a efetivação da tutela seja desejada pelo sistema e o juiz tenha liberdade em sua atuação prática para que isso ocorra, é natural que as medidas não sejam adotadas sem preocupação com as garantias básicas do executado.

Admitindo o entendimento de não compor as medidas previstas no art 536, § 1º, do CPC um rol exaustivo, o Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento pela admissão de bloqueio de verbas públicas para efetiva a execução de uma ordem de fornecimento de medicamento, considerando que a proteção constitucional à saúde, à vida e à dignidade humana prevalece sobre os princípios de direito financeiro e administrativo (STJ, 1ª Seção, AgRg no EREsp 796.509/RS, rel. Min. Luiz Fux, j. 11.10.2006, DJ 30.10.2006, p. 233).

A doutrina aponta a intervenção judicial para a realização de atividades específicas que incumbia à sociedade realizar prevista na Lei Antitruste (Lei 12.529/2011) como forma de execução para a efetivação de tutela de obrigação de fazer e não fazer não prevista no rol do art 536, § 1º, do CPC (STJ, 1ª Seção, AgRg 796.509/RS, rel. Min. Luiz Fux, j. 11.10.2006, DJ 30.10.2006, p. 233).

Na realidade, não só em questões tuteladas pela Lei Antitruste permite-se a nomeação de fiscal ou interventor para fazer ou não fazer aquilo a que a sociedade-devedora estaria obrigada, bastando imaginar a relevância dessa medida numa demanda na qual se busca evitar o sacrifício do meio ambiente saudável. Nesse sentido, não deve ser gerada consequência prática a retirada do texto final do Código de Processo Civil em comento, da previsão de tal medida executiva dentre os meios típicos consagrados no art 536, § 1º, do CPC.

Registre-se o Enunciado 12 do FPPC no sentido de que os meios atípicos de execução será aplicados de forma subsidiária às medidas tipificadas, com observação do contraditório, ainda que diferido, e por meio de decisão à luz do art 489, § 1º, I e II do CPC. Entendo que essa subsidiariedade pode ser a regra, mas que em circunstâncias excepcionais o juiz poderá adotar os meios atípicos sem a frustração prévia dos meios típicos, sempre em respeito aos princípios da menor onerosidade e da maior efetividade da execução. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 946/947. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

7.    BUSCA E APREENSÃO

Pode, num primeiro momento, causar estranheza a presença da regra consagrada no § 2º do art 536 do CPC em dispositivo destinado a regular o cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer. O dispositivo trata de requisitos formais da busca e apreensão, prevendo que o mandado de busca e apreensão de pessoas e coisas será cumprido por 2 oficiais de justiça, observando-se o disposto no art 846, §§ 1º a 4º do CPC, se houver necessidade de arrombamento.

A impressão de estranheza seria casada por ser a busca e apreensão, ao menos de coisas, típica de obrigação de entregar coisa. A previsão legal, entretanto, se justifica quando a busca e apreensão de coisa ou de pessoa puder levar ao cumprimento da obrigação de fazer ou não fazer. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 947. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

8.    DESCUMPRIMENTO DA ORDEM JUDICIAL

Sendo descumprida a ordem judicial que determine o cumprimento da obrigação de fazer ou de não fazer, caberá ao juiz aplicar, no caso concreto, as medidas executivas indutivas, coercitivas e sub-rogatórias que entender mais eficazes.

O § 3º do art 536 do CPC trata das consequências não executivas do descumprimento da ordem judicial. São, na realidade, consequências sancionatórias no plano processual e penal. Assim, descumprida de forma injustificada a ordem do juiz, o executado incidirá nas penas de litigância de má-fé (sanção processual) e pode ser responsabilizado por crime de desobediência (sanção penal). (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 947. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

9.    IMPUGNAÇÃO

 Naturalmente que em respeito ao princípio do contraditório, o executado, no cumprimento de sentença, que reconheça obrigação de qualquer natureza terá direito à impugnação, defesa executiva prevista em lei para essa forma de execução. Como as regras procedimentais da impugnação já estão consagradas no art 525 do CPC, o § 4º do art 536 do mesmo diploma legal se limitou a prever sua aplicação no cumprimento de sentença que reconheça obrigação de fazer e de não fazer, sendo a regra também aplicável às obrigações de entregar coisa, em razão do disposto no art 538, § 3º, do CPC. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 947/948. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).

10.  DEVERES DE FAZER E DE NÃO FAZER DENATUREZA NÃO OBRIGACIONAL

Nos termos do § 5º do art 536 do CPC o disposto neste artigo aplica-se, no que couber, ao cumprimento de sentença que reconheça deveres de fazer e de não fazer de natureza não obrigacional. Trata-se de deveres positivos ou negativos que decorrem da lei e não de um vínculo obrigacional, tais como o dever de não praticar ato criminoso, de respeitar a livre concorrência, ao meio ambiente equilibrado, entre outros.

Não haveria mesmo qualquer sentido em ratar tais deveres, somente por não derivarem da vontade das partes, de forma diferente no que toca ao seu cumprimento executivo. (Daniel Amorim Assumpção Neves, p. 948. Novo Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo – 2016. Ed. Juspodivm).