quinta-feira, 12 de dezembro de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 662, 663, 664 - continua - Do MANDATO - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 662, 663, 664 - continua
- Do MANDATO - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo X – Do Mandato -
(art. 653 a 666) Seção I – Disposições Gerais –
vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 662.  Os atos praticados por quem não tenha mandato, ou o tenha sem poderes suficientes, são ineficazes em relação àquele em cujo nome foram praticados, salvo se este os ratificar.

Parágrafo único. A ratificação há de ser expressa, ou resultar de ato inequívoco, e retroagirá à data do ato.

Na plataforma de Claudio Luiz Bueno de Godoy, o artigo presente, cuja ideia se deve entender completada pela disposição do CC 665, examinado a seguir, cuida do ato praticado, em nome de terceiro, por quem não tenha poderes que a tanto o autorizem ou mesmo fora dos poderes que lhe foram outorgados. E, a propósito, o princípio central é o de que uma pessoa não pode ser obrigada por atos que outrem tenha praticado em seu nome sem ter para isso qualquer poder, sem poderes suficientes ou com excesso dos poderes conferidos. Já aí vale a ressalva de que, enquanto o CC 662 alude às hipóteses de falta de poderes ou de poderes insuficientes o CC 665, de seu turno, refere a atuação do mandatário em excesso dos poderes que lhe foram outorgados. Mesmo assim, impende entender que, de qualquer forma, aja o mandatário com poderes insuficientes, ou ultra vires, vale dizer, além dos poderes que lhe foram conferidos, identicamente o mandante não se terá por obrigado, de resto como quando se age sem outorga de qualquer poder, afinal, quem age além dos poderes conferidos atua sem poder, ou sem poder suficiente. Neste sentido, então, deve-se considerar não seja diversa a situação de quem atue sem suficientes poderes para o ato praticado e de quem o faça com excesso dos poderes conferidos (cf. DE PLÁCIDO E SILVA. Tratado do mandato e prática das procurações, 4. ed. Rio de Janeiro, Forense, 1989, v. I, p. 334), sempre sem obrigação para o mandante, ressalvada sua ratificação.

O ato, todavia, praticado sem poderes, sem poderes suficientes ou em excesso de poderes conferidos não é inexistente, nulo ou anulável. É, sim, ineficaz perante o mandante, como hoje se explicita na lei e, antes, já advertia Pontes de Miranda (Tratado de direito privado, 3. ed. São Paulo, RT, 1984, t, XLIII, § 4.685, n. 2, p. 64). Até porque, de um lado, este ato pode ser ratificado, como se verá. De outro, o mandatário que se encontra em uma dessas situações obriga-se, pessoalmente, perante aquele com quem negociou, afora sua responsabilidade de por eventuais danos que tenha provocado ao mandante.

Toda essa previsão, a rigor, não se distancia do que, na Parte Geral do Código, estatuiu-se para a representação (lembrando-se que o artigo em comento trata do ato praticado em nome de outrem, portanto, envolve representação, que se pressupõe no mandato, pese embora problemática a opção, valendo remissão ao comentário do CC 653), dispondo-se no CC 116 que o ato praticado pelo representante vincula o representado nos limites dos poderes outorgados. Mas, tanto quanto a hipóteses fática difere daquela em que o representante age nos limites dos poderes, mas contra os interesses do representado (CC 119), a mesma ressalva se deve fazer, aqui, para o mandato. Ou seja, não se há de confundir o ato praticado pelo mandatário sem poderes, ou com excesso, do ato praticado nos limites dos poderes, mas contra os interesses do mandante. É em doutrina a distinção que se faz entre excesso e abuso de poderes. O abuso, o agir em dissonância com os interesses do mandante é questão atinente à relação interna do mandato, entra as partes contratantes, que não pode prejudicar terceiro, salvo se este souber do conflito de interesses entre mandatário e mandante, aí com o mesmo efeito anulatório do CC 119. Tem-se, a rigor, o mesmo princípio contido no CC 679, adiante comentado.

Envolve-se ainda, no exame da matéria relativa à atuação de mandatário sem poderes, no caso suposto mandatário, a questão do chamado mandato aparente (ver, a respeito: MARMITT, Arnaldo. Mandato. Rio de Janeiro, Aide, 1992, p. 214-6). É a situação de quem atua em nome de outrem parecendo, em circunstâncias justificáveis, que levariam qualquer um a crer na outorga, ter recebido poderes para tanto. Porém, mais, é preciso que de alguma forma o mandante tenha contribuído para forjar essa situação de justificável aparência. Se assim for, o ato praticado pelo mandatário vincula o mandante, como corolário da proteção da boa-fé e confiança despertada em terceiros, afinal por conduta própria também do mandante.

Por fim, dispõe o parágrafo único do preceito em comento que o ato praticado em nome alheio por mandatário sem poderes, sem poderes suficientes ou em excesso de poderes pode ser ratificado pelo mandante, assim ganhando plena eficácia. Essa ratificação pode ser expressa ou tácita, i.é, inferida de conduta externada pelo mandante, a qual indique vontade de ratificar, por exemplo, quando ele paga despesas havidas com o ato praticado pelo mandatário. O certo, entretanto, é que, de uma maneira ou de outra, a ratificação pressupõe sempre a exata ciência do mandante sobre o ato praticado sem os devidos poderes. Veja-se que a ratificação importa no consentimento que previamente não se concedeu, assim seguindo a regra geral de forma para o mandato; mas, pela exigência de conhecimento do que se ratifica, sendo costume afirmar que reclama poderes especiais. O efeito da ratificação é ex tunc, o que equivale dizer que com ela o negócio passa a se ostentar eficaz desde quando praticado. Tudo sem prejuízo de a atuação do mandatário sem poderes, sem poderes suficientes ou além dos poderes conferidos ter afinal se ostentado útil ao mandante, com eventualidade ressarcitória a cargo deste, conforme previsão do CC 665, infra, a cujo comentário se remete. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 687-688 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 12/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

No diapasão de Ricardo Fiuza e sua doutrina, em princípio o mandatário deve, tão-somente, agir dentro dos poderes contidos no mandato e, como corolário lógico, não seriam hábeis a criar obrigações para o mandante os atos praticados por quem não tenha mandato ou que tenha excesso de poderes. A regra, pois, é a de que o mandatário só pode, validamente, agir, nos estritos limites que lhe foram conferidos.

Se atua sem nenhum poder, ou excedendo os poderes a ele confiados, praticando ato não autorizado no mandato, pode o mandante, nas duas hipóteses, ou impugná-lo, porque realizado em seu nome, mas sem permissão, ou ratifica-lo. Na primeira, é como se o ato inexistisse para ele, mandante, porque não se vincula ao ato excedente, cabendo somente ao mandatário, ipso facto, responder frente a terceiros pelas obrigações por ele assumidas e perante o próprio mandante pelos prejuízos dali advindos.

Se, de um lado, a impugnação deve ser fundamentada, a ponto de inadmiti-la se do ato, a despeito do excesso, não resultar prejuízo para o mandante (“pas de nullité sans grief”), de outro a ratificação pode ser expressa ou tácita; a primeira é a que se realiza por meio de declaração escrita ou verbal, em razão da qual o mandante, por ato positivo, demonstra a intenção de aprovar os atos executados em razão da qual o mandante, por ato positivo, demonstra a intenção de aprovar os atos executados pelo seu mandatário, fora dos lindes da outorga; a segunda resulta da evidencia de ato inequívoco, pelo qual  se tem como certa a vontade do mandante em aprova-lo e, por conseguinte, em cumpri-lo.

Por se tratar de negócio unilateral receptício, a ratificação pode ser revogada pelo ratificante, enquanto não comunicada ao destinatário, que é o sujeito que negociou com o agente sem poder algum de representação. Mas se não revogada, retroage até o início, forrando tudo que se fez até ali, como se o mandato, de fato, houvesse sido outorgado logo de prêmio. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 355 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 12/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No entender de Marco Túlio de Carvalho Rocha, segundo o princípio da relatividade dos efeitos do contrato, ele não atinge quem dele não participa. Assim, se A, dizendo-se mandatário de B sem o ser, realiza negócio com C em nome de B, nenhum efeito pode produzir o referido negócio para B. Se, porventura, suceder algum efeito jurídico, B poderá requerer a nulidade do negócio firmado por A em seu nome.

De outro lado, se B desejar aproveitar o negócio praticado por A sem a autorização de B, poderá ratificar o ato. A ratificação pode ser tácita ou expressa. É tácita quando o “dono do negócio”, B, no exemplo, pratica ato somente compatível com a aceitação do negócio. Se A se faz passar por representante de B para vender a C uma mercadoria e B, ao tomar conhecimento do negócio, cobra de C o pagamento do preço, dá-se a aceitação tácita, porque a cobrança somente se justifica mediante a validação do negócio feito por A. A ratificação expressa não apresenta qualquer dificuldade. Em ambos os casos, os efeitos da ratificação retroagem ao momento da realização do negócio. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 12.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 663. Sempre que o mandatário estipular negócios expressamente em nome do mandante, será este o único responsável; ficará, porém, o mandatário pessoalmente obrigado, se agir no seu próprio nome, ainda que o negócio seja de conta do mandante.

Na palavra de Claudio Luiz Bueno de Godoy, o preceito repete, mas com diferente redação, a mesma regra que já se continha no art. 1.307 do CC/1916. É interessante notar que, em ambos os dispositivos, os dois Códigos acabaram, malgrado de forma esparsa e para fins diversos, por efetua distinção que, todavia, não fizeram na abertura dos capítulos respectivos ou na normatização genérica reservada ao contrato de mandato. É que tanto o CC/1916 como o CC/2002, conforme já se assentou nos comentários ao CC 653, a que ora se remete, vincularam o contrato de mandato à outorga de poderes de representação, como se não pudesse haver mandato sem representação e como, inversamente, se a representação voluntária estivesse sempre e tão somente no contrato de mandato. Advertiu-se, porém, já naqueles anteriores comentários, que, a rigor, o contrato de mandato caracteriza-se pela outorga de poderes para que o mandatário atue no interesse e por conta do mandante, ainda que não necessariamente no seu nome. E no artigo em comento, sem desconhecê-lo, o Código Civil apenas ressalva que, tendo o mandatário praticado negócio em seu próprio nome, posto que no interesse do mandante, fica pessoalmente obrigado perante o terceiro com quem negociou. Ou seja, tendo o mandatário atuado no próprio nome, mandante e terceiro não se vinculam, reciprocamente, por efeito em si do mandato, ressalvadas as hipóteses de ações veiculadas com base direta no enriquecimento sem causa (CC 884 a 886). Certo, porém, que ao mandante caberá sempre a propositura de ações contra o mandatário, na forma do contrato que ajustaram (CC 668 e 671, infra).

Bem verdade que o dispositivo, tal como o que o precedeu, no CC/1916, e o que agora se reforça, na lógica do CC/2002, que regrou a comissão – muito embora, em princípio, só para atos de aquisição e de venda (ver CC 693 e seu comentário) -, mas coerente, enfim, com a pressuposição de ambos os Códigos de que no mandato houvesse necessariamente outorga de poderes de representação, foi sempre enfocado como se havido desvio de conduta do mandatário que, tendo recebido poderes para atuar em nome do mandante, acabava efetuando o negócio em seu próprio nome, por reputá-lo a si vantajoso (ver, por todos: CARVALHO SANTOS, J. M. Código Civil brasileiro interpretado, 5. ed. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1952, v. XVIII, p. 272-3). De toda sorte, diversa não é a consequência de pessoal vinculação do mandatário perante terceiro e de sua responsabilidade perante o mandante, que o pode acionar pelo que, aceita a tese tradicional, terá sido uma fraude de mandatário infiel, mas que, a rigor, será sempre uma ação de cumprimento do contrato (ver comentários aos CC 668 e 671). (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 688-689 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 12/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

No entendimento explícito na doutrina de Ricardo Fiuza, o mandatário assume a obrigação ou se compromete a executar o negócio ou o afazer que serve de objeto ao mandato. Dessarte, a ele compete agir não em seu próprio nome, mas em nome do mandante. Se o mandatário, porém, laborar em seu próprio nome, como se fora seu o negócio, as obrigações dali advindas serão totalmente alheias ao mandante, que não se obrigará nem se beneficiará, ficando o primeiro direta e pessoalmente obrigado, na mera condição de credor ou devedor.

A propósito, confira-se a brilhante admoestação de Washington de Barros Monteiro: “Se o mandatário age em seu próprio nome, duas conclusões se imporão: a) o mandante não pode proceder contra as pessoas com que tratou o pseudomandatário, pois são estranhos entre si; b) os terceiros não podem proceder igualmente contra o suposto mandante, por ausência de qualquer relação obrigacional entre os mesmos” (Direito civil direito das obrigações, r parte, 28. ed., 1995, p. 265). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 356 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 12/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na esteira de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o mandatário não se vincula pessoalmente pelos negócios que realizar no uso regular do mandato. A representa B em negócio realizado com C. O negócio vincula B e C; A não fica vinculado.

Se o mandatário agir em próprio nome, é o mandatário que fica vinculado, não o mandante, ainda que o negócio refira-se à esfera jurídica do mandante: A recebe poderes de B para vender uma casa a C; A faz o negócio da venda em nome próprio; B não responde pelo negócio, porque este não foi realizado em seu nome; A fica vinculado em relação a C e poderia vir a responder pelo descumprimento contratual ou pela eventual nulificação do negócio. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 12.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 664. O mandatário tem o direito de reter, do objeto da operação que lhe foi cometida, quanto baste para pagamento de tudo que lhe for devido em consequência do mandato.

No lecionar de Claudio Luiz Bueno de Godoy, já estabelecia o Código Civil de 1916 um direito de retenção, no contrato de mandato, deferido ao mandatário para garantia do quanto houvesse despendido no desempenho do encargo a si cometido. Criticava-se, porém, a redação do respectivo preceito, o do CC 1.315, quando preconizava a retenção sobre o objeto d mandato, já que consistente sempre em uma operação jurídica, um negócio jurídico ou, enfim, a prestação de um fato cometida ao mandatário. Na verdade, portanto, já se sustentava que a retenção deveria ser compreendida como incidente sobre o objeto, justamente, da operação para cuja consecução se tivessem conferido poderes por meio do mandato, contrato em essência preparatório. Pois nesse sentido se coloca a redação do novo preceito do Código Civil de 2002, ora em comento, ao dispor que retenção se procede sobre o objeto da operação de que incumbido o mandatário, e desde que se trate de bem passível de retenção, assim existente um objeto material do negócio jurídico-fim, para o qual outorgado o mandato.

Bem de ver, ainda, que o anterior Código Civil somente deferia a retenção para garantia de reembolso do quando o mandatário houvesse gasto para a execução do mandato, ou seja, das despesas havidas para cumprimento do encargo. Destarte, não se deferia igual benefício para assegurar o recebimento de eventual remuneração do mandatário ou de indenização a que fizesse jus. Era exatamente essa a diferenciação que se fazia entre a retenção do mandato civil e a retenção também havida no mandato comercial, mas aí sem igual limitação da extensão do crédito garantido. Com efeito, pelo art. 156 do Código Comercial o mandatário podia exercitar a retenção no quanto bastasse para pagamento de tudo que lhe fosse devido em consequência do mandato, assim incluídas remuneração e ocasionais indenizações.

Ora, mas é precisamente essa a redação do Código Civil de 2002, veja-se, perfeita reprodução do dispositivo do art. 156 do Código Comercial, à evidência indicando, então, que o mandato, hoje, civil ou comercial, até porque, com a nova normatização, unificadas as obrigações, suscita direito de retenção por tudo que seja devido ao mandatário em razão do mandato. Apenas persiste a exigência de que a retenção se deva exercer sobre bem que o mandatário haja recebido por força e em função do mandato, e não por qualquer outro motivo, exigindo-se também que, quando do exercício da retenção, este mesmo bem ainda esteja sob sua posse. Igualmente de direito de retenção do mandatário, mas criando diferenciação problemática, cuida o CC 681, infra, a cujo comentário se remete. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 689-690 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 12/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na escrita de Ricardo Fiuza, há um histórico: “Art. 664. O mandatário tem direito a reter, do objeto da operação que lhe foi cometida, quanto baste para pagamento de tudo quanto lhe for devido em consequência do mandato”. Esta era a redação original do dispositivo quando de seu envio para o Senado, ganhando a atual composição por meio de emenda do eminente Senador Gabriel Hermes, que melhorou a linguagem do texto. O que se verificou no presente caso foi um mero aperfeiçoamento redacional, dispensando-se maiores considerações. Corresponde ao art. 1.315 do CC de 1916.

Então, aparece na Doutrina de Ricardo Fiuza que o mandato tem o direito de reter (jus retentionis) o objeto que, por força do mandato, tiver em seu poder, até o efetivo reembolso do montante que houver gasto no desempenho do encargo. Este comando, comparando-se ao disposto sobre a matéria na legislação comercial, assume feição mais restrita à medida que, na seara comercial, concede-se o direito de retenção por auto aquilo devido ao mandatário em razão do mandato, já se limitando ao que gatou na execução do encargo. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 356 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 12/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na esteira de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o mandato obriga o mandante a indenizar as despesas que realizar o mandatário para o cumprimento do múnus. Além dessas despesas, se o mandato for oneroso, fica obrigado o mandante a remunerar o mandatário.

Uma vez que o mandato importe o recebimento de certa quantia, o dispositivo autoriza o mandatário a descontar o reembolso e a remuneração a que fizer jus, repassando ao mandatário a diferença. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 12.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

quarta-feira, 11 de dezembro de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 659, 660, 661 - continua - Do MANDATO - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 659, 660, 661 - continua
- Do MANDATO - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo X – Do Mandato -
(art. 653 a 666) Seção I – Disposições Gerais –
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Art. 659.  A aceitação do mandato pode ser tácita, e resulta do começo de execução.

Sob o prisma de Claudio Luiz Bueno de Godoy, o preceito repete a mesma redação do art. 1.292 da anterior normatização e prevê que, ademais de forma expressa, a aceitação do mandato possa também se dar de forma tácita. A previsão, a rigor, dimana da características de consensualidade de que se reveste o contrato de mandato, aperfeiçoado, sem exigência de forma especial, pelo ajuste, pela manifestação de vontade das partes, que pode ser expressa ou tácita, valendo relembrar a diferença entre a forma do mandato e da procuração, a respeito remetendo-se ao quanto expendido nos comentários aos CC 656 e 657. Importa ainda ressalvar que, malgrado a pertinência do preceito à questão da aceitação tácita, igualmente já se examinou, por ocasião dos comentários ao CC 656, supra, que mesmo a manifestação de vontade do mandante pode ser tácita.

De toda sorte, cuidando da aceitação do mandato, que completa seu processo de formação, garante o preceito em comento que ela se possa operar de maneira expressa, por escrito ou verbalmente, bem assim de forma tácita, pelo começo da execução do ajuste. Bem de ver que, de maneira geral, as declarações de vontade nos negócios informais podem externar-se a partir mesmo de comportamentos chamados concludentes, ou seja, ações que revelam a vontade, de que se pode inferir o intuito de contratar. Por exemplo, nos contratos de massa, as declarações de vontade manifestam-se muito costumeiramente de forma tácita, pelo comportamento, como quando se contrata transporte coletivo urbano ou um táxi, o que se aperfeiçoa com conduta gestual, ou ainda quando se ajusta uma compra de produtos em máquinas automáticas, dentre outras tantas hipóteses. Nada de diverso ocorre com a aceitação do mandato, a qual se pode consumar pelo comportamento do mandatário que já se dá a cumprir o ajuste, então com essa conduta denotando sua aceitação. Porém, na verdade, a interpretação do dispositivo não deve ser estreita e, assim, insta se admita como aceitação, além do início da execução, qualquer conduta pela qual o mandatário demonstre haver aceito o contrato. Cuida-se, enfim, de qualquer ação típica e própria de quem seja mandatário, da qual se possa inferir a tácita aceitação (nesse sentido: ALVES, Jones Figueiredo. Novo Código Civil comentado, coord. Ricardo Fiuza. São Paulo, Saraiva, 2002, p. 598). Por fim, cabe menção à diferenciação que se costuma efetivar entre aceitação tácita e presumida, a propósito remetendo-se ao comentário ao CC 656, em que a matéria já foi enfrentada. (Claudio Luiz Bueno de Godoy apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 683-684 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 11/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Confrontado com a Doutrina de Ricardo Fiuza, a rigor, o mandato, à vista de sua consensualidade, reputa-se perfeito e acabado com o consentimento das partes. Por isso diz-se que ele somente se aperfeiçoa, ou melhor, se conclui, pela aceitação do mandatário, que não recebe somente o poder, mas, ao revés, assume, pela aceitação, a obrigação de agir. Nessa linha de ideias, ensina-nos De Plácido e Silva: “O poder ou a ordem para agir tem que se justapor à aceitação, ou a ato de aceitação, a fim de que desta conjugação ou justaposição de atos se gere o contrato de mandato”. E arremata percucientemente: “A aceitação, pois, é que dá ao contrato. Dela se gera o dever de agir. Assim, o mandatário não somente o poder de ação, mas a obrigação de cumprir, dentro deste poder, o encargo ou a missão aceita” (Tratado dos mandatos e prático das procurações, 3. ed., Rio de Janeiro, forense, 1963, v. 1, p. 25).

Tratando-se a rigor, de condição existencial e de validade do negócio, a aceitação do mandato, em regra, deve operar-se expressamente, seja por meio escrito, seja verbalmente. Admite-se, contudo, a aceitação tácita, que resulta do começo de execução; porém, embora essa atuação exordial patenteie inequivocamente a aceitação do encargo, não representa a única forma de aceitação, a saber da existência de outros meios que a indiquem, p. ex., quando o mandatário pratica atos só compatíveis com um comportamento de quem tomou a si a sua execução, conquanto esta não esteja propriamente iniciada.

Na basta que alguém outorgue a procuração fixando prazo para o mandatário aceita-la ou repudiá-la, pois o simples vencimento do prazo de oposição não o traduz em mandatário, salvo se, a despeito de não repudia-la, começar a cumprir as obrigações outorgadas.

Em regra, o silêncio, por si só, não induz a aceitação do mandato; mas dele, porém, pode inferir-se, em certos casos, a aceitação do mandatário, quando este praticar algum ato compatível com a vontade de aceitar. Bem por isso entre ausentes, quando o negócio para que foi dado é da profissão do mandatário, refere-se à sua qualidade oficial ou foi oferecido mediante publicidade e o mandatário não providencia, imediatamente, a sua recusa.  Nessas situações presume-se, excepcionalmente, a aceitação do mandato, em face da apresentação a destempo da recusa; se o mandatário, portanto, recebendo a procuração, não se manifesta negativamente desde logo, presume-se que aceitou o mandato. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 353-354 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 11/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão de Marco Túlio de Carvalho Rocha, se uma pessoa confere poderes a outra que vem a realizar atos mediante o uso da procuração, presume-se a aceitação do mandato pelo mandatário. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 11.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 660. O mandato pode ser especial a um ou mais negócios determinadamente, ou geral a todos os do mandante.

Como leciona Claudio Luiz Bueno de Godoy, o artigo presente, como já o fazia seu correspondente no CC/1916, diferencia os casos de outorga de poderes, a qual, no mandato, pode ser geral ou especial. Vale dizer, quanto à extensão de outorga de poderes que envolve, o mandato pode ser geral ou especial. Tradicionalmente, entende-se que será geral quando não se determinem os negócios para cuja prática seja outorgado, assim induzindo a outorga de poderes de ordinária administração de todos os negócios ou interesses do mandante. Será especial quando, ao revés, especifiquem-se o negócio ou os negócios para cuja gestão se outorguem poderes, assim, em diversos termos, conferidos para a prática de certo ou certos atos ou negócios. Essa clássica definição, porém, pressupõe uma indiferenciação sobre o que seja a outorga de poderes gerais (mandato geral) do mandato em termos gerais, aquele de que trata o CC 661, logo a seguir examinado. Como salienta De Plácido e Silva, distinção haveria a se fazer, porquanto o mandato geral ou com poderes gerais é aquele outorgado em função da gestão da generalidade dos negócios do mandante, concedendo-se todos os poderes a tanto necessários (mandato total ou generalizado), enquanto o mandato em termos gerais significa uma outorga genérica, inespecífica de poderes, assim entendidos só como de administração, mas que podem referir-se a negócio certo ou determinado, destarte desenhando-se um mandato especial em termos gerais (Tratado do mandato e prática das procurações, 4. ed., Rio de Janeiro, Forense, 1989, v. I, p. 188-91).

Ou seja, para o autor, o que caracteriza o mandato geral ou especial é a generalização ou especificação dos negócios para o qual foi concedido; o que, diversamente, caracteriza o mandato em termos gerais é a generalização dos poderes conferidos (poderes genéricos), i.é, não especificados ou não determinados  (no mesmo sentido: MARMITT, Arnaldo. Mandato. Rio de Janeiro, Aide, 1992, p. 113). Certo que, para muitos, a distinção é obscura e ociosa (ver, a respeito, revisão da doutrina que se encontra em: SANDOVAL, Ovídio Rocha Barros. “Do mandato” In: O novo Código Civil, coord. Domingos Franciulli Netto, Gilmar Ferreira Mendes e Ives Gandra da Silva Martins filho. São Paulo, LTr, 2003, p. 605-6). De toda sorte, relevante é que o mandato em termos gerais apenas confere poderes de ordinária administração, exigindo a lei que, para determinados atos, os poderes conferidos sejam específicos, determinados. É o que se contém no preceito adiante examinado. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 684 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 11/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

No compasso da Doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, o mandato pode ser outorgado para negócio certo e específico, podendo ser um ou mais, quando se diz mandato especial, restrito aos atos discriminados pelo mandante na procuração, de cujos lindes não pode extravasar, porque vedada a sua extensão a outros, ainda que da mesma natureza. Esgota-se e extingue-se, simplesmente, com a realização do ato para o qual se destina. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 354 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 11/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No diapasão de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o mandato pode ser geral ou especial. O mandato geral para a realização de negócios (ad negotia) não discrimina os atos que o mandatário pode realizar em nome do mandante. Neste caso, conforme o CC 661, presume-se que foram outorgados poderes para a administração ordinária dos bens do mandante. O mandato especial especifica os atos que o mandatário pode praticar em nome do mandante e podem ser mais estritos ou mais amplos do que os poderes outorgados pelo mandato geral de administração. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 11.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 661. O mandato em termos gerais só confere poderes de administração.

§ 1º. Para alienar, hipotecar, transigir, ou praticar outros quaisquer atos que exorbitem da administração ordinária, depende a procuração de poderes especiais e expressos.

§ 2º. O poder de transigir não importa o de firmar compromisso.

Com a ressalva que nos comentários aos artigo anterior se fez acerca da sua exata significação e da distinção que dele se costuma efetuar em relação ao mandato geral, apontado por Claudio Luiz Bueno de Godoy, explicita o CC/2002, tal como já se procedia no CC/1916, que o mandato concedido em termos gerais apenas implica a outorga de poderes de ordinária administração dos negócios do mandante. Ou seja, se genéricos os poderes outorgados, a atuação autorizada do mandatário restringe-se aos atos de mera gestão, de gerência mesmo dos interesses do outorgante. Certo que, nenhuma das duas leis civis, velha e nova, detiveram-se na elaboração de um rol do que reputam configurar atos de mera administração. Mas não menos certo que desta compreensão desde logo excluídos os atos enumerados no § 1º do preceito em comento, porque para sua prática o legislador exigiu, como se verá, poderes especiais e expressos.

Sendo assim os atos de alienação ou gravação do patrimônio do mandante, bem assim de disposição de seus direitos, como regra, excluem-se ou exorbitam da mera gestão. Porém, mesmo nesses casos, sempre se ressalvou que alguns atos de disposição, por exemplo, podem conter-se nos poderes de ordinária administração assim quando os bens administrados sejam mesmo destinados à alienação. Também se considera possa haver alienação, malgrado a outorga só de poderes genéricos, quando haja perigo de deterioração dos bens ou quando se trate de frutos de bens principais (ver, a respeito, com larga remissão doutrinária: SANDOVAL, Ovídio Rocha Barros. “Do mandato”. In: O novo Código Civil, coord. Domingos Franciulli Netto, Gilmar Ferreira Mendes e Ives Gandra da Silva Martins Filho. São Paulo, LTr, 2003, p. 606).

Na verdade, os atos de administração ordinária devem ser analisados em função do negócio a que se referem, concebidos então como aqueles atos conservatórios, normais, de direção comum e usual conforme as circunstâncias da atividade principal a que estão voltados (cf. DE PLÁCIDO E SILVA. Tratado do mandato e prática das procurações. Rio de Janeiro, Forense, 1989, v. I, p. 231).

Mas a lei, como se disse, para a prática de atos que exorbitem dessa ordinária administração exige a outorga de poderes especiais e expressos, como o parágrafo único do dispositivo presente prevê, e em que se mencionam, a título exemplificativo, os atos de alienação, hipoteca e transação. Primeiro que a ideia do legislador foi de, como regra, ao que já se explicitou, evitar que se contivesse nos poderes gerais do mandatário a prática de atos que, de forma genérica, envolvessem alienação, gravação e disposição de direitos do mandante, portanto não só os atos descritos no parágrafo único em comento, porquanto meramente enunciativo e, ademais, encerrado com a cláusula geral em que se constitui a menção a qualquer ato que exorbite a administração ordinária. Assim, por exemplo, atos outros, como de reconhecimento de filho, renúncia, confissão, fiança, emissão ou aceitação de títulos, aceitação de doação com encargo, remissão, todos exorbitantes da administração ordinária, por isso mesmo exigem poderes especiais e expressos.

Todavia, outra questão ainda se coloca e está na exata compreensão do que sejam poderes especiais e expressos, inclusive para verificação sobre se possuem significado diverso e próprio ou se, ao referi-los, ambos, o legislador apenas pretendeu reforçar a cautela com atos de disposição ou gravação praticados por mandatário. Pois, se a propósito na doutrina e, em especial, na jurisprudência, grassa grande divergência, deve-se partir do suposto de que a lei não contém termos inúteis, sem significação própria. Por isso é que, para muitos, as expressões têm conteúdo próprio. Assim, poderes expressos identificam, de forma explícita (não implícita ou tácita), exatamente qual o poder conferido (por exemplo, o poder de vender). Já os poderes serão especiais quando determinados, particularizados, individualizados os negócios para os quais e faz a outorga (por exemplo, o poder de vender tal ou qual imóvel). Destarte, se no mandato se outorgam poderes de venda, mas sem precisão do imóvel a ser vendido, haverá poderes expressos mas não especiais, inviabilizando então a consumação do negócio por procurador. É certo, porém, como Carvalho Santos adverte (Código Civil brasileiro interpretado, 5. ed. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1952, v. XVIII, p. 163), que, se o mandato envolve a outorga de poderes para venda de todos os imóveis do mandante, terá sido cumprida a exigência de poderes especiais. Já quanto à identificação da pessoa com quem haverá o mandatário de negociar, a exigência tem sido restrita aos atos de liberalidade (v.g., PONTES DE MIRANDA. Tratado de direito privado, 3. ed. São Paulo, RT 1984, t. XLIII, § 4.679, n. 3, p. 38), porquanto intuitu personae, como sucede com a doação, por exemplo (ver ALVIM, Agostinho. Da doação, 2. ed. São Paulo, Saraiva, 1972, p. 31-3).

Veja-se que toda a matéria é controversa, por exemplo, sustentando De Plácido e Silva a desnecessidade do que considera ser um reforço de expressões, já que, a seu ver, o sentido de poder especial já integra o sentido de expresso (op. cit., p. 216), de seu turno defendendo Sílvio Rodrigues que seja de todos ocioso identificar-se, em mandato que já contenha poderes para venda, o exato bem a ser vendido (Direito Civil, 28.ed. São Paulo, Saraiva, 2002, v. III, p. 291). De toda sorte, menos discutível que a outorga de poderes especiais deva ser interpretada de forma restritiva, a fim de que não se admita deduzido do poder de vender o de hipotecar, ou vice-versa, do poder de vender o de prometer vender, como de resto o próprio § 2º do artigo em comento explicita não se compreender no poder de transigir o de firmar compromisso, verdadeiro regulamento da arbitragem (Lei n. 9.307/96). Excepcionalmente conferido, quando lhe seja instrumental ou consequente. Assim, por exemplo, compreende-se no poder de vender o de receber o preço e dar quitação, no de comprar o de receber a coisa, no de cobrar letras o de protestá-las. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 685-686 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 11/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Assim tem-se na Doutrina de Ricardo Fiuza, que o mandato “em termos gerais” somente habilita o mandatário a praticar atos de administração do interesse do mandante. São os chamados “atos de administração ordinária”, de que nos fala, pontualmente, o mestre Washington de Barros Monteiro, quando sustenta que “a administração ordinária, a que se refere o texto, compreende atos de simples gerência, em que não exista alienação ou disposição (pagar impostos, fazer reparações, contratar e despedir empregados)” (Direito civil – direito das obrigações, 2 ~pane, 28. ed., 1995, p. p. 255).

A atuação do mandatário destina-se, em essência, a gerir ou dirigir os negócios comuns do mandante, sem atingir a sua substância e sem importar em disposição de interesses ou de direitos, seja total, seja parcialmente. A orientação jurisprudencial tem-se pronunciado, outrossim, que “não exorbita os poderes de administração mandatário que contrate locação por preço, prazo e condições usuais” (RF 93/5 14).

Dada a importância da matéria, o legislador elencou, no § 1º deste dispositivo, num rol exemplificativo, os atos que extrapolam os de mera administração, os quais, ipso facto, exigem poderes especiais. Excepcionam-se os atos que importem disposição sobre bens de fácil deterioração, e todos os demais que se destinam, especificamente, à venda. Para estes atos exigem-se poderes expressos na procuração, seja judicial, seja extrajudicial. Os poderes especiais conferidos interpretam-se restritivamente, vedada a sua extensão a atos análogos.

Por outro lado, o poder de transigir não importa o de firmar compromisso. O mandato para transigir não abarca o poder para comprometer. Assim é porque, enquanto a transação é ato jurídico bilateral, no qual se extinguem as obrigações litigiosas, compromisso é o acordo entre as partes, que resolvem submeter sua desavença à solução arbitral, comprometendo-se a acatá-la. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 355 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 11/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Para Marco Túlio de Carvalho Rocha, os poderes conferidos pelo mandante ao mandatário, podem ser em caráter geral ou em caráter especial, conforme dele conste ou não a descrição dos atos que são autorizados: no mandato geral ad negotia, i.e, para a realização de negócios jurídicos, quando apenas poder geral de representação é conferido ao mandatário. Em razão da outorga desse poder geral de representação, o mandatário fica autorizado a realizar atos de administração ordinária, que são os atos que implicam o uso da coisa sobre a qual recai o mandato segundo sua finalidade econômica: o poder geral confere ao mandatário, por exemplo, poder para alugar um imóvel ou dá-lo em comodato, pois tais contratos visam a empregar o bem segundo sua finalidade econômica.

Atos que exorbite a administração ordinária, conforme o parágrafo 1º, exigem poderes especiais. O mais comum é que a procuração combine a outorga do poder geral ao lado de poderes especiais que explicita.

O poder de transigir é o de realizar concessões mútuas, visando a pôr termo a um litígio. A autorização para realizar transação não significa que o mandatário esteja autorizado a realizar qualquer tipo de transação, senão a que estiver incluída no âmbito de incidência do mandato. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 11.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

terça-feira, 10 de dezembro de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 656, 657, 658 - continua - Do MANDATO - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 656, 657, 658 - continua
- Do MANDATO - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo X – Do Mandato -
(art. 653 a 666) Seção I – Disposições Gerais –
vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 656. O mandato pode ser expresso ou tácito, verbal ou escrito.

Na esteira de Claudio Luiz Bueno de Godoy, o dispositivo trata da forma do mandato, contrato consensual, como se disse no comentário ao CC 653, por isso que entabulável sem exigência de forma especial, com a ressalva que se fará nos comentários ao artigo seguinte. De qualquer sorte, o mandato pode ser expresso, consumado por escrito ou verbalmente, tanto quanto pode ser tácito. O mandato tácito sempre foi assim definido a partir da perspectiva da aceitação do mandatário, que será tácita quando inferida do começo da execução do ajuste (CC 659). Porém, mesmo a declaração de vontade do mandante pode ser tácita, admitindo a prática de atos, no seu interesse, pelo mandatário, como no exemplo do empregador que age de modo a denotar outorga inexplícita de poderes para pequenas compras que, periodicamente, um empregado faz, no seu interesse (PEREIRA DA SILVA, Caio Mário. Instituições de direito civil, 10.ed. Rio de Janeiro, Forense, 1999, v. III, p. 255), o que para muitos configura, antes, gestão de negócios (v.g., PONTES DE MIRANDA. Tratado de direito privado, 3.ed. São Paulo, RT, 1984, t. XLIII, § 4.706, n. 2, p. 192), mas o que se diferencia por, num caso, de mandato tácito, se exigir mais que o silêncio do empregador, assim, uma conduta ativa, como o deixar recursos para as pequenas aquisições, desnecessária na segunda hipótese, de mera e omissiva anuência (ver a respeito: CARVALHO SANTOS, J.M. Código civil brasileiro interpretado, 5.ed. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1952, v. XVIII, p. 131-2).

Muito embora nem sempre se faça essa distinção, difere, para alguns o mandato tácito do mandato presumido, ou seja, de existência presumida até que se prove o contrário, ou mesmo que o presumido mandatário prove o inverso, como no caso do condômino presumido mandatário para administrar a coisa comum ou do portador presumido mandatário para preencher letra recebida sem data e lugar de saque (ver PONTES DE MIRANDA., Op. Cit., t. XLII, § 4.680, n. 1, p. 38-9; t. XII, § 1.293, n.2, p, 89), exemplos que, para muitos, são também de mandato tácito (v.g., BARROS MONTEIRO, Washington. Direito das obrigações. São Paulo, Saraiva, 1956, v. II, p. 275). A bem dizer, caso de mandato presumido, ou ao menos de aceitação presumida, havia no art. 1.293 do CC/1916. Presumia-se aceito o mandato entre ausentes quando o negócio para o qual dado fosse da profissão do mandatário, disse respeito à sua qualidade oficial ou fosse oferecido mediante publicidade, sem que o mandatário fizesse constar de imediato a sua recusa. Fato é, todavia, que a regra não foi repetida no novo Código Civil. No mais, e como já afirmado em comentários ao CC 654, a rigor não há confundir-se a forma do mandato com a forma da procuração. Ou seja, a regra para a forma do contrato de mandato vem disposta no artigo presente, destinando-se aquele a disciplinar a forma pela qual se outorga a procuração, instrumento da representação destinada ao conhecimento de terceiro, que, malgrado o que comumente ocorre, pode não conter todos os elementos do contrato de mandato (por exemplo, preço e condições de pagamento, se for oneroso), eventualmente em instrumento outro ou ajustado verbalmente. Pense-se, ainda exemplificativamente, na procuração outorgada a advogado, a qual não contém todas as condições do ajuste entre ele e seu cliente, próprias do contrato de mandato, assim sem possível confusão de um ou outro instituto, como se vem afirmando. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 681 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 10/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Veja-se na doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, no que tange à sua forma, o mandato, como contrato consensual que é, pode ser expresso ou tácito, verbal ou escrito. É expresso quando o mandante, pessoalmente, outorga, por escrito, ao mandatário os poderes que lhe são inerentes, ocorrente naqueles casos que exigem procuração contendo poderes especiais. É tácito, por sua vez, quando resulta da prática de atos em nome do mandante sem sua autorização, mas mediante seu conhecimento e sem qualquer oposição. Nele, a aceitação do encargo se opera por atos que a presumem e pode ser provada por todos os meios em direito permitidos. Arnaldo Marmitt, lucidamente, sustenta ser ele simples “gestão de negócios, que se constitui sem declaração expressa do mandante, à sua vista, sem sua oposição, por circunstâncias reveladoras da vontade de constituí-lo, e da existência do fator confiança do mandante para com o mandatário” (Mandato, 1. ed., Rio de Janeiro, Aide, 1992).

É verbal o mandato quando, oralmente e independentemente de instrumento, o mandante outorga ao terceiro os poderes a ele conferidos, desde que a lei não exija mandato escrito, podendo provar-se por todos os meios probatórios reconhecidos em direito, inclusive o testemunhal. Tem-se como exemplo aquele que não ultrapasse o décuplo do maior salário mínimo vigente no País ao tempo em que foi celebrado (CPC 401), ante a ausência de documentação escrita que o comprove. Ainda, em outra pertinente ponderação, assevera o autor supracitado: “o mandato verbal distingue-se do tácito, porque no primeiro a autorização é expressa, ao passo que o mandato tácito repousa na presunção ou na dedução de circunstâncias” (ob. cit., p. 110); já o escrito é o mais comum, materializando-se na procuração, que lhe serve de instrumento – seja particular, seja público – nos casos expressos em lei. (Arnaldo Marnijtt, Mandato, 1. ed., Rio de Janeiro, Aide 1992; Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de direito civil, 4. ed., Rio de Janeiro, Forense, 1978; Silvio rodrigues, Direito civil, 27. ed., São Paulo, Saraiva, 2000, v. 3 – Dos contratos e das declarações unilaterais da vontade. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 353 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 10/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No entender de Marco Túlio de Carvalho Rocha, a forma do mandato é livre, salvo exceções. O CC 657 determina que ele deve revestir a mesma forma exigida para o ato a ser praticado. Se o mandante for analfabeto, entende-se necessário o instrumento público. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 10.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 657. A outorga do mandato está sujeita à forma exigida por lei para o ato a ser praticado. Não se admite mandato verbal quando o ato deva ser celebrado por escrito.

No entendimento de Claudio Luiz Bueno de Godoy, a parte final do artigo presente, segundo a qual o mandato deve ser escrito quando o negócio a cuja prática se o outorgou for daqueles só consumáveis por igual instrumento escrito, repete a regra do art. 1.291, do CC de 1916. Sob seu pálio, aliado ainda ao que se continha na disposição do art. 1.289, § 2º, do mesmo CC/1916, grassava a discussão sobre a adoção, em nossos sistema, da assim chamada tese da simetria, i.é, sobre se exigível, para o mandato, a mesma forma exigida à prática do negócio jurídico para o qual outorgados poderes pelo mandante. Assim, por exemplo, e particularmente nessas hipóteses, debatia-se sobre se para a entabulação de compra e venda de imóvel, a que é necessária escritura pública, também exigível o mandato respectivo pela pública forma. Pois bem. Primeiro ponto a ser realçado, de novo, está na diferenciação que se deve fazer entre a forma do mandato e a forma da representação que se tenha outorgado. Nesse sentido, já de há muito observada Pontes de Miranda que o preceito do art. 1.291 do CC/1916, na verdade, usava o termo mandato por procuração, meio de comunicação da outorga a um terceiro, de tal sorte que, outorgada a procuração por escrito, mesmo quando essa forma fosse da essência do ato principal a ser praticado, o mandato, em si, poderia se dar de forma tácita, por exemplo pelo começo de execução (ver PONTES DE MIRANDA, Tratado de direito privado, 3. ed., São Paulo, RT, 1984, t. XLIII, § 4.678, n. 2, p. 21).

Quanto à simetria, em si, dividia-se a doutrina, ora ao contentar-se com que, se escrita e pública a forma exigida para o negócio a cuja prática outorgada a procuração, se a outorgasse por escrito, outros entendendo que, nesses casos, também a procuração deveria ter a forma pública, não sendo suficiente o escrito particular. Procede a uma detalhada revista da doutrina, ora esposando uma tese, ora outra, o civilista Renan Lotufo (Questões relativas ao mandato, representação e procuração. São Paulo, Saraiva, 2001, p. 117-25), para concluir pela ausência de simetria, mas sem olvidar relevante remissão à lição de José Paulo Cavalcanti, que já assinalava a importância de se distinguir a forma do mandato e da procuração e anotava – conclusão a que se acede – que, se o negócio a que outorgado poderes ao procurador é solene, exigindo a forma pública, é porque o legislador revelou especial preocupação com a manifestação de vontade refletida, assim importando que, malgrado a autonomia da procuração, se por meio dela se delibera outorgar poderes para a prática daquele negócio formal, então sua forma deve ser a mesma. Em diversos termos, assinala o autor que se a lei cuida de exigir forma especial e pública para determinado negócio jurídico, com isso tencionando garantir a deliberação refletida do sujeito, nenhuma diferença faz que essa deliberação seja tomada no próprio ato ou quando se outorgam poderes para s sua prática. E, pese embora a longa e grande divergência instaurada sobre o tema, parece ter o CC/2002, agora, definitivamente imposto a simetria, quando, na primeira parte do CC 657, que constitui inovação, porquanto ausente no art. 1.291 da legislação anterior, dispôs estar a outorga do mandato (rectius procuração) “sujeita à forma exigida por lei para o ato a ser praticado”. De resto o que, na mesma esteira, o Projeto de Lei n. 276 de 2007, de Reforma do Código Civil, pretende acrescentar ao CC 655, a cujo comentário se remete. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 682 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 10/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na esteira de Ricardo Fiuza, como observado anteriormente, o mandato verbal se dá quando a alguém delega a outrem sua representação por palavra falada e prova-se por qualquer meio, inclusive testemunhal. Todavia, não comporta esta modalidade a prática de atos para os quais se exija o mandato escrito, seja público, seja particular. Logo, não se admitirá mandato verbal, p. ex., para a constituição de servidão (RT 115/179), para aceite de títulos cambiais (RT 126/108, RF 101/317) e para outorga de fiança (RF 87/728). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 353 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 10/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No entendimento de Marco Túlio de Carvalho Rocha, a forma do mandato é, em geral, livre: é comum que o mandato ocorra, inclusive, tacitamente. O CC 657 exige, no entanto, que o mandato revista a mesma forma exigida para o ato a ser praticado. Assim, uma vez que a alienação de imóvel é necessária escritura pública, a representação para a outorga de escritura pública depende de procuração outorgada também por instrumento público.

Se o mandante for analfabeto, entende-se necessário o instrumento público. Durante muito tempo prevaleceu o entendimento de que a procuração outorgada por incapaz, por meio de seu representante legal, deveria ser pública. Atualmente, tal entendimento não mais prevalece.

É válida a procuração ‘ad judicia’, outorgada por instrumento particular pelo representante de menor impúbere, em nome deste (STF-1ª Turma, RE 86.168-8-SP, j. 27.5.80, vu., DJU 13.6.80, p. 4.461; RJTJESP 56/132, JTJ 188/225, Lex-JTA 162/424, RJTA-MG 33/81, JTAERGS 91/67, 91/151, Bol. AASP 955/40); neste sentido: comentário de Gelson amaro de Souza (RCJ 2/17)” (THEOTONIO NEGRÃO. Código de Processo Civil, 31. Ed. Nota ao Art. 38: 1a). (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 10.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 658. O mandato presume-se gratuito quando não houver sido estipulada retribuição, exceto se o seu objeto corresponder ao daqueles que o mandatário trata por ofício ou profissão lucrativa.

Parágrafo único. Se o mandato for oneroso, caberá ao mandatário a retribuição prevista em lei ou no contrato. Sendo estes omissos, será ela determinada pelos usos do lugar, ou, na falta destes, por arbitramento.

No entendimento de Claudio Luiz Bueno de Godoy, seguindo a tendência do Código Civil de 1916, a nova normatização manteve a regra do mandato presumidamente gratuito, sem, entretanto, estabelecer que essa gratuidade seja da essência do mandato (o ofício de amizade). Com efeito, malgrado presumindo-o gratuito, permitiu a lei que o mandato pudesse ser estabelecido de forma onerosa. E, mais, fê-lo não somente quando dispôs sobre a possibilidade de pactuar-se, expressamente, uma remuneração, como quando o objeto do ajuste for daqueles que o mandatário trata por ofício ou profissão. Bem de ver, então, que o mandato será oneroso quando, independentemente da natureza de seu objeto, tiverem as partes convencionado uma retribuição. Mas também o será sempre que o mandato se recebe por que, nessa condição, exerce profissão lucrativa, como o advogado, por exemplo, ou mesmo quando o mandatário atue profissionalmente na gestão de interesse alheio. Daí vir-se de costume afirmando que o mandato mercantil não pode ser considerado gratuito por presunção, revelando-se, ao contrário, um dos casos em que a retribuição é de rigor, de resto tal qual já o determinada o Código Comercial Brasileiro (art. 154, revogado), caracterizando-o como contrato necessariamente oneroso (ver, ainda: MARTINS, Fran. Contratos e obrigações comerciais. Rio de Janeiro, Forense, 1984, p. 292).

Todavia, como já na vigência do CC/1916 se ressalvava, a presunção de gratuidade pode ainda se infirmar, posto que não pelo pacto de retribuição ou pelo exercício profissional dos poderes outorgados, mas pelo quanto resulte das circunstâncias do caso, que façam acreditar na existência de convenção tácita, no dizer de Plácido e Silva (Tratado do mandato e prática das procurações, 4. ed., rio de Janeiro, Forense, 1989, v. I, p. 39). Conforme sua lição, as circunstâncias fáticas do caso podem bem levar à admissão de que tenha sido intenção das partes remunerar os serviços do mandatário. Pois se por qualquer das hipóteses examinadas havida remuneração, seu valor se estabelece pelo quanto preveja a lei ou o contrato. Mas, conforme está no parágrafo único do dispositivo em comento, omissos lei e contrato, a remuneração se fixará segundo os usos do lugar, ou seja, a praxe locar, se houver, ou, se não, de acordo com arbitramento judicial. Nesse caso, os salários do mandatário são arbitrados pelo juiz tomando-se em consideração o objeto do mandato, a dificuldade para sua execução e o proveito gerado. Vale aqui, de resto, socorro analógico aos mesmos critérios que a lei estabeleceu para o arbitramento dos honorários relativos ao mandato ad judicia, quando não convencionados, e que devem ser compatíveis com o trabalho realizado e com o valor econômico envolvido (art. 22, § 2º, da Lei n. 8.906/94). O arbitramento se fará em processo de conhecimento, formando título judicial executivo, em se tratando de mandatário profissional liberal mediante o rito sumário (CPC 1.063, sobre o conceito de profissional liberal, valendo conferir: MIRANDA, Gilson Delgado. Procedimento sumário. São Paulo, RT, 2000, p. 120-2). Por fim, diga-se que, se devidos, os honorários deverão ser pagos ainda que o negócio para o qual outorgado não surta os efeitos desejados, salvo culpa do mandatário, a propósito do que se remete ao comentário ao CC 676, infra. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 683 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 10/12/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Resumida na Doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, é gratuito o mandato quando não se estipula remuneração ao mandatário. O silêncio das partes interessadas sobre a remuneração faz presumir até prova em contrário (presunção juris tantum), a gratuidade da função, sem direito a qualquer tipo de indenização. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 353 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 10/12/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na esteira de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o mandato pode ser gratuito ou oneroso. No silêncio do contrato, será oneroso se outorgado para o exercício de profissão ou de atividade lucrativa do mandatário. Assim, por exemplo, embora a ética da advocacia exija que os honorários sejam expressos no momento da contratação, caso não o seja, , podem ser arbitrados, uma vez que o mandato judicial conferido a advogado visa a possibilitar o exercício profissional em benefício do outorgante. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 10.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).