quarta-feira, 23 de dezembro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 1.412, 1.413 Do Uso – VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado - Art. 1.412, 1.413

Do Uso – VARGAS, Paulo S. R.

- Parte Especial –  Livro III – Capítulo IV – Título VII

Do Uso  – (Art. 1.412 e 1.413) - digitadorvargas@outlook.com

digitadorvargas@outlook.com - vargasdigitador.blogspot.com
Whatsap: +55 22 98829-9130 Phone Number: +55 22 98847-3044
fb.me/DireitoVargasm.me/DireitoVargas

 

 Art. 1.412. O usuário usará da coisa e perceberá os seus frutos, quanto o exigirem as necessidades suas e de sua família.

§ lº Avaliar-se-ão as necessidades pessoais do usuário conforme a sua condição social e o lugar onde viver. 

§ 2º As necessidades da família do usuário compreendem as de seu cônjuge, dos filhos solteiros e das pessoas de seu serviço doméstico.

Na ponderação de Francisco Eduardo Loureiro, e fica aqui registrado um alerta ao legislador (Grifo VD), o direito real de uso, de escassa utilização em nossos costumes, foi mantido no atual Código Civil com sua principal característica de usufruto restrito, em miniatura, ou limitado às necessidades do usuário ou de sua família. 

Podem ser objeto do direito real de uso coisas móveis e imóveis, desde que não consumíveis ou fungíveis. As fontes do direito real de uso podem ser a convenção, por ato inter vivos ou causa mortis, a título oneroso ou gratuito, e a usucapião; mas não contempla o Código Civil o uso decorrente diretamente da lei, como o faz com o usufruto e o direito real de habitação legal. Caso recaia sobre coisa imóvel, o registro é constitutivo do direito real.

Tal como o direito real de usufruto, o direito real de uso é sempre temporário e pode ser subordinado a termo ou condição. Podem ser titulares do direito real pessoas naturais e jurídicas, as últimas desde que destinem a coisa para suprir necessidades relativas à própria atividade. Ao contrário do usufruto, o uso não comporta cessão de exercício a terceiros, porque é personalíssimo. É também intransmissível, inter vivos ou causa mortis, salvo nos casos em que importar em consolidação e extinção do direito real.

No dizer de Caio Mário da Silva Pereira, a principal distinção entre os direitos reais de usufruto e de uso está em que “enquanto o usufrutuário aufere toda a fruição da coisa, ao usuário não é concedida senão a utilização reduzida aos limites de suas necessidades” (Instituições de direito civil, 18. ed. Rio de Janeiro, Forense, 1995, v. IV, p. 307).

É certo que a cabeça do artigo refere que o usuário não somente usará a coisa, como também receberá os frutos, quando o exigirem as necessidades suas e de sua família. Pode receber frutos naturais e civis, mas na medida de suas necessidades. Pontes de Miranda diz que os frutos destinados ao consumo por necessidade integram o conceito de uso, e não de fruição (Tratado de direito privado. Rio de Janeiro, Borsoi, 1973, v. X IX , p. 323). 

O § 1º dá balizas ao intérprete, para que saiba até onde vão as necessidades do usuário. Note-se que somente a percepção de frutos está limitada à necessidade do usuário e de sua família, enquanto o excesso pertence ao nu-proprietário. Já o uso deve ser pessoal, mas não está contido no conceito de necessidade. Para dar parâmetros do que considera necessidade, o legislador menciona exemplificativamente os termos “local onde viver” e “condição social do usuário”. Outros fatores devem ser levados em conta, como profissão, hábitos, saúde e idade do usuário, como alerta Tupinambá Miguel Castro do Nascimento (Usufruto, 2. ed. Rio de Janeiro, Aide, 1983, p. 193). A necessidade é sempre aferida levando em conta as circunstâncias do caso concreto, lembrando a possibilidade de alteração no curso do tempo, podendo ser aumentada ou diminuída.

O § 2º do artigo em exame define o que é família, para efeito do direito real de uso. O conceito é restrito aos filhos solteiros, ao cônjuge e às pessoas que prestam serviço doméstico ao usuário, numa noção peculiar de família. Estão excluídos, portanto, filhos casados ou em regime de união estável, além de outros descendentes, ascendentes e colaterais. Discute-se se o companheiro está abrangido no conceito legal de família. Embora omissa a lei, não se vê razão plausível para que a união estável, entidade familiar de estatura constitucional, fique fora da proteção legal. O elemento fático essencial é a dependência econômica, que, segundo a mais autorizada doutrina (Pontes de Miranda, Tupinambá Miguel Castro do Nascimento, Maria Helena Diniz), pode se estender a pessoas estranhas às linhas parentais, como afilhados e crianças que vivam às expensas do usuário. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.482-83. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 23/12/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Historicamente, este era o texto original do dispositivo constante como do projeto: “O usuário usará da coisa e perceberá seus frutos, quanto o exigirem as necessidades suas e de sua família. ... § 2º As necessidades da família do usuário compreendem as de seu cônjuge, dos filhos solteiros, ainda que ilegítimos, e das pessoas de seu serviço doméstico”. Emenda senatorial de autoria do relator-geral naquela Casa pretendia manter a redação do caput do art. 742 do Código Civil de 1916, que considerava de melhor estilo e clareza, além de suprimir, no § 2º , a expressão “ainda que ilegítimos”, de manifesta inconstitucionalidade. O relator parcial da matéria na Câmara dos Deputados, afirmando que a emenda não aperfeiçoava como pretendia a redação do caput e que “fruir a utilidade” é expressão técnica e semanticamente estranha, opinou, ao final, pela aprovação parcial da emenda, para que se alterasse apenas o texto do § 2o . A posição do relator-geral Ricardo Fiuza foi pelo acolhimento parcial da emenda, resultando, dai; o texto atual. 

Da doutrina que se insere pelo relator Ricardo Fiuza, o uso é diferente do usufruto, já que mais restrito que aquele. E definido como direito real temporário, podendo recair sobre coisa móvel ou imóvel. • Esta norma equipara-se aos arts. 742, 743 e 744 do Código Civil de 1916, conjugando tais dispositivos com considerável melhora em sua redação. No mais, deve ser-lhe aplicado o mesmo tratamento doutrinário dado aos dispositivos indicados, (i.é, que o usufrutuário estará sempre na contra mão da lei, por opressão do sistema, sendo-lhe vedado o uso de alimentos, móveis e/ou imóveis, além do estipulado, o que lhe proíbe uma convivência social além do da familiar direta. Grifo VD). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 721, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 23/12/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Segundo artigo de JC Moraes, de 16 de outubro de 2009, “Uso e habitação – arts. 1.412 a 1.416”, no site jcmoraes.wordpress.com, de acordo com a doutrina, uso é o direito real sobre coisa alheia de fruição, constituído a título oneroso ou gratuito, pelo qual o usuário fica autorizado a retirar, temporariamente, todas as utilidades da coisa para atender às suas necessidades pessoais e às de sua família (utiliza-se o conceito amplo e aplica-se, portanto, ao cônjuge, filhos, empregados) *a finalidade do direito de uso é, portanto, proteção à pessoa ou à família do usuário. O uso é diferente do usufruto, já que mais restrito que aquele. E definido como direito real temporário, podendo recair sobre coisa móvel ou imóvel, corpóreas ou incorpóreas. 

O uso tem algumas características tipo: Temporariedade – dura pelo prazo do contrato ou enquanto houver necessidade pessoal ou familiar;  indivisibilidade – o titular é o usuário (atende as suas necessidades e a de seus familiares), apenas é possível dividir o uso no tempo entre várias pessoas, com horário certo para cada um; inalienabilidade: o uso não pode ser transferido a qualquer título; intuitu personae: o direito de uso é personalíssimo. Vincula-se às necessidades familiares, muito embora a ideia de família não deva sser apenas a do cônjuge, filhos solteiros e empregados domésticos, ante a necessidade de adaptação da regra aos demais filhos e sua extensão à união estável. 

Com a Lei 11.481/2007, houve a inclusão de dois novos direitos reais acrescidos no artigo 1.225, incisos XI e XII. – XI: a concessão de uso especial para fins de moradia (poder público concede direito de uso ao particular com a finalidade de moradia, desde que o particular esteja efetivamente ocupando área de até 250 m², sem interrupção e sem oposição, servindo esta para fins de moradia própria ou familiar. É obtido administrativamente junto ao órgão próprio da Administração Pública ou por ação judicial, uma vez declarada pelo juiz). * Lei 11.481/2007 e art. 290 – A da Lei 6.015/73. * Medida Provisória 2.220/2001. E XII: a concessão de direito real de uso (Poder Público, por licitação, conceder ao particular o poder de usar área pública com finalidade diversa de moradia, por um prazo previamente fixado

no edital e para cumprimento de função social ou de ordem econômica). (JC Moraes, de 16 de outubro de 2009, “Uso e habitação – arts. 1.412 a 1.416”, no site jcmoraes.wordpress.com, acessado em 23.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Art. 1.413. São aplicáveis ao uso, ao que não for contrário à sua nøturen, as disposições relativas ao usufruto. 

No lecionar de Francisco Eduardo Loureiro, estende o preceito o regime jurídico do usufruto ao uso, naquilo que não contrariar sua natureza, quanto aos direitos e deveres do usufrutuário. Algumas regras do usufruto, porém, não se estendem ao uso, como vimos acima. Tomem-se como exemplos a incredibilidade, a indivisibilidade do uso e a impossibilidade de constituição ex lege. No que se refere ao direito de acrescer, previsto no CC 1.411 anteriormente comentado, não depende ele de cláusula expressa no uso, em vista de sua indivisibilidade. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.483. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 23/12/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na doutrina apresentada no artigo de JC Moraes, de 16 de outubro de 2009, “Uso e habitação – arts. 1.412 a 1.416”, no site jcmoraes.wordpress.com, por não existir incompatibilidade com o instituto do usufruto, a lei manda aplicar ao uso as mesmas normas daquele, de forma que o que distingue os institutos é a limitação de fruição por parte do usuário, que fica restrita às necessidades próprias e de sua família. (JC Moraes, de 16 de outubro de 2009, “Uso e habitação – arts. 1.412 a 1.416”, no site jcmoraes.wordpress.com, acessado em 23.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No estender Guimarães e Mezzalira, como mencionado anteriormente, o direito real de uso tem por finalidade precípua a garantia de subsistência do usuário e sua família, restringindo-se a destinação do instituto apenas quanto a este particular, fato diferenciador do usufruto. Assim, ressalvada esta natureza típica do uso, no mais, todas as demais características e disposições relativas ao usufruto são aplicáveis ao uso. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao art. 1.413 do CC/2002, acessado em 23.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

terça-feira, 22 de dezembro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 1.410, 1.411 Da Extinção do Usufruto – VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado -  Art. 1.410, 1.411

Da Extinção do Usufruto – VARGAS, Paulo S. R.

- Parte Especial –  Livro III – Capítulo IV – Título VI

Da Extinção do Usufruto  – (Art. 1.410 e 1.411)

- digitadorvargas@outlook.com - vargasdigitador.blogpot.com

 

Art. 1.410. O usufruto extingue-se, cancelando-se o registro no Cartório de Registro de Imóveis: 

I — pela renúncia ou morte do usufrutuário; 

II — pelo termo de sua duração; 

III — pela extinção da pessoa jurídica, em favor de quem o usufruto foi constituído, ou, se ela perdurar, pelo decurso de trinta anos da data em que se começou a exercer;

IV — pela cessação do motivo de que se origina 

V — pela destruição da coisa, guardadas as disposições dos CC 1.407, 1.408, 2ª parte, e 1.409;

VI — pela consolidação;

VII — por culpa do usufrutuário, quando aliena, deteriora, ou deixa arruinar os bens, não lhes acudindo com os reparos de conservação, ou quando, no usufruto de títulos de crédito, não dá às importâncias recebidas a aplicação prevista no parágrafo único do CC 1.395; 

VIII — pelo não uso, ou não fruição, da coisa em que o usufruto recai (CC 1.390 e 1.399).

Os comentários estendidos de Guimarães e Mezzalira iniciam com a Renúncia, que deverá ser feita por escritura pública se referente a bens imóveis de valor acima de trinta salários vigentes (CC 108).

Como o usufruto é temporário e, sendo estabelecido de forma vitalícia, extinguir-se-á o direito pelo falecimento do titular do uso. Caso haja dois ou mais usufrutuários, o direito vai se extinguindo em relação a cada um deles, à medida de seu falecimento, subsistindo pro parte, salvo se pactuado sua indivisibilidade, caso em que a parte de cada um acrescerá a do outro sobrevivo (Diniz, 2011, p. 382).

Termo de duração, é o tempo de vigência estabelecido ao usufruto no próprio ato constitutivo, fazendo-o extinguir ao seu término. Da mesma forma faz extinguir o direito pela ocorrência de determinada condição resolutiva pré-estabelecida ou pelo falecimento do usufrutuário antes do período previsto. 

Quanto a extinção da pessoa jurídica, a lei estabelece o prazo de trinta anos de vigência do usufruto quando se tratar de pessoa jurídica a parte beneficiária, cessando o direito de usufruto caso haja anterior dissolução da sociedade empresária. 

A cessação do motivo encerra o usufruto quando a razão de sua constituição deixa de existir, como se dá quando o benefício é constituído para custear estudos superiores de um parente próximo ou o tratamento médico alheio. 

Destruição da coisa: efetivamente, desaparecendo o bem objeto do usufruto não haverá como preservá-lo, salvo naquelas hipóteses que abrangem a desapropriação, incêndio e destruição por terceiros, quando o direito do usufrutuário se sub-roga no valor da indenização ou seguro.

Consolidação: dá-se na hipótese de o usufrutuário vir a adquirir a nua-propriedade ou vice-versa, reunindo-se os dois direitos na mão de um único titular. 

Por culpa do usufrutuário: o dispositivo elenca várias hipóteses de cessação do usufruto quando o beneficiário atua de forma culposa ou dolosa, violando o dever de cuidado que deve ter em relação do bem, assim ocorrendo nos casos de usufruto quando o beneficiário atua de forma culposa ou dolosa, violando o dever de cuidado que deve ter em relação do bem, assim ocorrendo nos casos de usufruto sobre títulos de crédito. 

O dispositivo legal não prevê um prazo certo. Assim, no caso em apreço, ocorrerá a extinção do usufruto após o decurso do prazo de dez anos do desuso, regrando o CC 205 que, no silêncio, este será o prazo prescricional a ser considerado. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao art. 1.410 do CC/2002, acessado em 22.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Este artigo, como lembra Francisco Eduardo Loureiro, corresponde ao art. 739 do Código Civil de 1916, com diversas alterações, acrescentando e modificando causas de extinção do usufruto. Viu-se anteriormente que o usufruto é sempre temporário, vedada por norma cogente a perpetuidade. Há causas previstas no próprio negócio de constituição e outras na lei, que levam à extinção. 

O caput do CC 1.410 reza que, se o usufruto recai sobre coisa imóvel, a causa não opera por si só a extinção, mas deve ser levada ao registro imobiliário. O registro, salvo o caso do usufruto legal, da usucapião e com origem em sucessão hereditária, é constitutivo do direito real, de modo que, para a simetria do sistema, deve a causa extintiva ser averbada no registro imobiliário, para que produza efeito erga omnes. Note-se que a averbação da causa deve ser feita mesmo no caso de usufruto adquirido por usucapião ou sucessão hereditária, se foi este levado a registro por mandado judicial, em homenagem ao que dispõem o art. 252 da Lei n. 6.015/73 e o art. 1.245, § 2º, do Código Civil. De outro lado, a extinção do usufruto incidente sobre bens móveis se opera pela incidência da causa, independentemente de qualquer ato ulterior, por falta de previsão legal. 

Tal regra produz relevantes consequências, especialmente em relação a terceiros. Tupinambá de Castro Nascimento dá diversos exemplos de efeitos de usufruto cuja causa extintiva já se operou, mas sem averbação do cancelamento no registro imobiliário. Tome-se o caso de usufruto a termo, cujos frutos colhidos após decurso do prazo pertencem ao proprietário, mas que podem ser penhorados pelo terceiro credor do usufrutuário, enquanto não se averbar o cancelamento. Também o contrato de cessão de exercício de natureza pessoal - comodato, ou locação - entre o usufrutuário e terceiro não pode ser denunciado pelo proprietário, antes da averbação do cancelamento. Em termos diversos, o usufruto ganha uma ultratividade após o advento da causa extintiva, mas antes do cancelamento (Usufruto, 2. ed. Rio de Janeiro, Aide, 1983, p. 121). Em relação às partes cientes da ocorrência da extinção, porém, os efeitos cessam com a causa e não com a averbação, de modo simétrico ao que ocorre com a constituição. 

A primeira causa de extinção do usufruto é a morte do usufrutuário. O usufruto é constituído sobre a cabeça do usufrutuário e a este não sobrevive, salvo no caso de usufruto simultâneo com cláusula de acrescer, que será comentado no CC 1.411 a seguir. Trata-se de causa legal e de ordem pública, prevalecendo sobre eventual causa convencional, v.g., a morte que ocorre antes do termo negocial. A morte do nu-proprietário é irrelevante, porque, salvo disposição negocial expressa em sentido contrário, seus herdeiros recebem a coisa gravada por direito real. A morte do usufrutuário pode ser real ou presumida (CC 7º) ou mesmo do caso de ausência, após operar-se a sucessão definitiva (CC 39). Não altera a questão a morte do usufrutuário causada ou buscada pelo nu-proprietário, porque não prospera o usufruto sem titular e, como direito personalíssimo, não se transmite aos herdeiros. Ocorrendo o óbito, a averbação do cancelamento do registro se faz mediante simples pedido formulado ao registrador, sem necessidade de intervenção judicial, não se aplicando o disposto no art. 725, VI, do CPC, mas sim o disposto no art. 250, III, da Lei n. 6.015/73. 

A segunda causa é a renúncia do usufrutuário, por ato unilateral, mas comunicada ao usufrutuário. Caso incida sobre coisa imóvel, a renúncia é solene, por instrumento público, e somente produz efeitos perante terceiros após averbação do cancelamento no registro imobiliário. 

A terceira causa é pela incidência do termo de duração do usufruto. Não prevalece o termo se ocorrer antes a morte do usufrutuário. Embora não diga de modo expresso a lei, também o advento de condição resolutiva, aposta de modo convencional no título constitutivo, leva à extinção do usufruto. Acrescente-se, ainda, o caso de o usufruto ter sido constituído sobre imóvel com propriedade resolúvel. Resolvido o domínio, caem todos os direitos reais concedidos na sua pendência. Mais uma vez, o advento do termo e da condição comprovável de modo documental permite o cancelamento do registro independentemente de decisão judicial.

A quarta causa é a extinção da pessoa jurídica beneficiária do usufruto, quer de direito público, quer de direito privado. As sociedades irregulares, por lhes faltar personalidade jurídica, não são usufrutuárias, mas apenas os sócios que a compõem. Coloca a lei uma causa legal, impondo que o usufruto de pessoa jurídica não pode ultrapassar trinta anos, contados da data do início do exercício. Foi o prazo reduzido de cem para trinta anos, somente incidente sobre os usufrutos constituídos na vigência do Código Civil de 2002, porque, em relação aos antigos, há ato jurídico perfeito. Nada impede que as partes convencionem prazo inferior a trinta anos. O que não se admite é a convenção por prazo superior, porque a norma é cogente, de modo que o termo é automaticamente reduzido, sem invalidar, no entanto, a própria constituição do direito real. 

A quinta causa é pela cessação do motivo que originou o usufruto. Embora divirja a doutrina tradicional a respeito, o melhor entendimento, já referendado pelo Supremo Tribunal Federal (RTJ 101/377), é no sentido de que a causa em exame se aplica tanto ao usufruto convencional como ao legal. O motivo a que alude a lei é o externo, determinante e comum a ambas as partes, desprezadas as razões íntimas, subjetivas e individuais. No dizer de Orlando Gomes, é a razão o móvel determinante que move as partes a realizar determinado contrato (Contratos, 12. ed. Rio de Janeiro, Forense, 1987, p. 61). No usufruto legal, tome-se como exemplo a cessação do poder familiar, que extingue o usufruto do pai sobre os bens dos filhos. No usufruto convencional, tome-se como exemplo, citado por Clóvis, o usufruto instituído para que o usufrutuário conclua seus estudos, ou realize determinada pesquisa científica. O cancelamento, aqui, pode exigir intervenção judicial, se a cessação do motivo determinante depender de exame de fatos não provados documentalmente e de modo cabal, inviáveis de serem aferidos pelo registrador na esfera administrativa. A alteração da redação do dispositivo provocou dúvida em doutrina, sobre a necessidade do motivo determinante ser ou não declarado no título. Razoável entender a desnecessidade do motivo determinante ser expresso, bastando que seja inequívoco e comum a ambas as partes, não sendo suficiente as simples razões íntimas e psicológicas do nu-proprietário (frs., a respeito, Carlos Alberto Garbi, Relação jurídica de direito real e usufruto, Método, 2008, p. 278). 

A sexta causa é a destruição da coisa, que causa a perda do objeto, ressalvadas as hipóteses de sub-rogação, previstas nos CC 1.407, 1.408 e 1.409, anteriormente comentados. Nos casos em que há sub-rogação - seguro, desapropriação e culpa de terceiro, que indeniza o proprietário -, o usufruto se transfere para o bem sub-rogado, com todas suas características e sem solução de continuidade. Embora fale a lei em destruição - melhor seria perecimento -, o melhor entendimento é no sentido de que não há necessidade de ser total. A perda parcial ou a deterioração grave, que comprometa a qualidade frugífera ou a possibilidade de exploração, também conduzem à extinção, pela incompatibilidade de o usufrutuário extrair as utilidades da coisa. Embora haja controvérsia na doutrina, a transformação radical da coisa não equivale à destruição, desde que persistam as qualidades frugíferas e o interesse do usufrutuário. 

A sétima causa é a consolidação, que nada mais é do que a reunião, na mesma pessoa, das qualidades de nu-proprietário e usufrutuário. Pode ocorrer em razão de o usufrutuário adquirir a nua-propriedade, por qualquer razão, ou o inverso, de o nu-proprietário adquirir o usufruto. Como viu-se no comentário ao CC 1.393, a inalienabilidade do usufruto não tem nenhuma incompatibilidade com a extinção por consolidação. O que proíbe a norma cogente é que o direito real de usufruto sobreviva sob a titularidade de terceiro, porque é personalíssimo do usufrutuário. A transmissão, porém, se admite quando provocar a extinção do usufruto por consolidação. São os casos da aquisição do usufruto a título gratuito ou oneroso pelo nu-proprietário, ou, então, de um terceiro que adquira simultaneamente a nua-propriedade e o usufruto, consolidando a propriedade em suas mãos. Não há aí propriamente alienação do direito real, mas sim modo de sua extinção por consolidação.

A oitava causa é a culpa do usufrutuário, que aliena, deteriora ou deixa arruinar os bens, ao não promover os cuidados de reparação. A novidade do inciso está em adicionar a hipótese do usufruto dos títulos de crédito, quando o usufrutuário não dá ao crédito recebido a regular aplicação prevista em lei. Constata-se que em todos os casos há inadimplemento do usufrutuário, ou na forma de abuso de exercício - alienação - ou na forma de mau uso - deterioração - dos bens entregues ao seu proveito. Viu-se em comentário ao CC 1.393 que a alienação do usufruto é nula, salvo nos casos de consolidação. O que a lei pune, portanto, é a tentativa de alienação, ainda que o nu-proprietário recupere a coisa em poder de terceiro. Já as deteriorações devem ser visíveis, duráveis e culposas. A conduta é sempre culposa, o que exige investigação de fato imputável ao usufrutuário, necessariamente na via judicial, descabendo o pedido de cancelamento direto ao oficial registrador. Além disso, não é a extinção automática, porque pressupõe a iniciativa do nu-proprietário, que, aliás, tem a opção de exigir a reparação, a extinção ou os dois pedidos cumulativos. Como alerta Carvalho Santos, tem o juiz ampla liberdade ao examinar os atos culposos do devedor, especialmente a sua gravidade. Pode, assim, determinar a extinção pura e simples, como a extinção apenas de uma parte, manter o usufrutuário na posse dos bens, mas obrigando-o a reparar os danos, ou a prestar caução, ainda quando esta tenha sido anteriormente dispensada (Código Civil brasileiro interpretado, 5. ed. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1953, v. IX). O não pagamento de tributos e despesas condominiais atribuíveis ao usufrutuário pode também colocar em risco jurídico de perda a coisa, em razão da excussão. Abre-se ao nu-proprietário a obrigação alternativa de pagar as dívidas e reavê-las do usufrutuário, ou de pedir a extinção do usufruto por conduta culposa.

Finalmente, a nona causa de extinção é o não uso, ou a não fruição da coisa em que o usufruto recai. No silêncio da lei, o prazo é o ordinário, previsto no art. 205 do Código Civil. No regime do velho Código Civil, havia na doutrina divergência sobre o prazo aplicável, se o ordinário para as pretensões pessoais (vinte anos) ou o decenal, ou quinzenal para as pretensões reais, com clara preferência pela última corrente, matéria ainda relevante, em razão de seus reflexos no direito intertemporal.

Deve haver distinção entre duas situações. A primeira é a inércia do usufrutuário de exercer a pretensão contra a violação de seu direito subjetivo de tirar o proveito do objeto do direito real de gozo e fruição. Em tal hipótese, o que se perde não é o direito material de usufruto, mas sim a pretensão de obter ou reaver o bem objeto do usufruto. Tanto isto é verdade, que se o bem objeto do usufruto cuja pretensão se encontra prescrita for voluntariamente entregue ao usufrutuário, não pode este ser compelido a devolvê-lo, tal como ocorre no pagamento de dívida prescrita. O prazo em tal hipótese será prescricional de dez anos e começa a correr da data em que deveria ter sido entregue o bem ao usufrutuário, ou da data em que o usufrutuário praticou o último ato de proveito em relação ao bem usufruído. Nada impede, de outro lado, que corra contra o nu-proprietário e contra o usufrutuário a prescrição aquisitiva por posse ad usucapionem de terceiro, pelos prazos previstos nos CC 1.238 a 1.242 e 1.260 /1.261, de acordo com a natureza da coisa possuída.

A segunda situação é o simples não exercício do direito pelo usufrutuário, sem qualquer resistência do nu-proprietário ou de terceiros. Não há aqui pretensão, pois não houve violação a direito subjetivo, e o prazo será decadencial de dez anos, com termo inicial na data em que poderia o usufrutuário exercer o direito. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.476-79. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 22/12/2020. Revista e atualizada nesta data por VD). 

Como exposto até aqui e da forma projetada na Doutrina de Ricardo Fiuza, este artigo trata das causas extintivas do usufruto, enumerando-o taxativamente, ressaltando que a extinção se opera quando houver cancelamento do usufruto no Cartório de Registro de Imóveis competente. O usufruto é uma servidão pessoal, está vinculada à pessoa, e com ela se extingue. A morte extingue necessariamente o usufruto, pois é da natureza do usufruto que o nu-proprietário e o usufrutuário coexistam. O termo de duração (inicial e final), ou qualquer outra condição (suspensiva ou resolutiva) imposta ao usufruto, deve ser determinado no título que o constituiu, fixando-se um momento específico para a sua extinção, ou determinando se está ele sujeito à ocorrência de uma condição. Se o imóvel ruir ou for devastado por um incêndio, destruindo completamente a coisa, extingue-se também o usufruto. Se a destruição for parcial, o usufruto subsistirá na parte restante do prédio. A consolidação da propriedade corre quando o usufrutuário adquire o domínio do bem, reunindo o direito de uso e gozo separados pelo usufruto. Na hipótese inversa, o nu-proprietário readquire a plena propriedade. É causa também de extinção do usufruto quando, por culpa do usufrutuário, deixar ele de cumprir uma de suas obrigações principais, v. g., velar pela coisa e mantê-la em bom estado. Opera-se ainda a extinção quando o usufrutuário perfeito aliena o bem.  Este artigo inova ao reduzir para trinta anos o prazo do usufruto constituído em favor de pessoa jurídica e ao prever a extinção do usufruto pelo não-exercício de seu direito. Equipara-se aos arts. 739 e 741 do Código Civil de 1916, conjugando esses dispositivos com considerável melhora da redação. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 720, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 22/12/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Art. 1.411. Constituído o usufruto em favor de duas ou mais pessoas, extinguir-se-á a parte em relação a cada uma das que falecerem, salvo se, por estipulação expressa, o quinhão desses couber ao sobrevivente.

O artigo em exame corresponde ao art. 740 do Código Civil de 1916, com alteração apenas formal em sua redação, sem nenhuma mudança substancial. Como leciona Francisco Eduardo Loureiro, disciplina o preceito a extinção do usufruto simultâneo e a exceção ao princípio de que o usufruto se extingue necessariamente com a morte do usufrutuário. 

Prevê a norma que, no caso de usufruto simultâneo ou conjuntivo, qual seja, aquele constituído em favor de uma pluralidade de usufrutuários, a um só tempo, a extinção será feita parte a parte, em relação a cada um dos que falecerem. Essa é a regra geral, que consolida quotas de propriedade plena nas mãos do nu-proprietário, na medida em que forem falecendo os usufrutuários. 

A exceção a tal regra está na possibilidade de estipulação expressa de cláusula de acrescer, pela qual a parte ideal do usufruto cabente ao usufrutuário falecido não se consolida nas mãos do nu-proprietário, mas, ao invés, se soma à parte do usufrutuário sobrevivente, de tal modo que subsiste íntegra até que o último usufrutuário venha a falecer. 

Não se admite por norma cogente, porém, a figura do usufruto sucessivo, pela qual, com a morte de um usufrutuário, ou cousufrutuário, sua parte se transmite a terceiro que até então gozava dessa qualidade. Em termos diversos, não se admite que, com a morte de um usufrutuário, alguém que até então não o era passe a sê-lo, recebendo o direito do falecido. Lembre-se de que, no caso de usufrutos legados conjuntamente a favor de duas ou mais pessoas, a parte do que faltar acresce aos colegatários, independentemente de disposição expressa no testamento, por força do que dispõe o CC 1.946. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.481. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 22/12/2020. Revista e atualizada nesta data por VD). 

Para Guimarães e Mezzalira, valem aqui os comentários traçados anteriormente, ou seja, na hipótese de constituição de dois ou mais usufrutuários. Neste caso, o direito vai se extinguindo em relação a cada um deles, à medida de seu falecimento, subsistindo pro parte, salvo se pactuado no título a sua indivisibilidade, circunstância na qual a parte de cada um acrescerá a do outro sobrevivo (Diniz, 2011, p. 382). (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao art. 1.411 do CC/2002, acessado em 22.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Em obra de Ademar Fionarelli, “O usufruto no Código Civil de 2002 e A proibição de alienar o direito” no site www.irib.org.br, o CC 1.411 manteve a mesma redação do artigo 740 do Código de 1.916. No sucessivo (não admitido), para solidificar o entendimento, o usufrutuário exerce sozinho o direito de usar e gozar do bem e por sua morte ou por certa condição ou termo, transmitir a outrem ou seu sucessor.

No simultâneo, configura-se a pluralidade de usufrutuários, que a um só tempo gozam da coisa usufruída, com a possibilidade de inserção de cláusula de acrescer, se convencionada, ao usufrutuário sobrevivente. Indispensável que no ato da constituição sejam declinados os nomes de todos os usufrutuários e de forma expressa a subsistência do mesmo usufruto em favor dos demais. Não estipulada a cláusula de acrescer, pela superveniência da morte de um dos usufrutuários, consolida-se na pessoa do nu-proprietário a plena propriedade da parte ideal do usufrutuário falecido.

O registrador há que estar atento para a elaboração correta da averbação ou do cancelamento parcial do usufruto e união ao nu-proprietário ou a de acrescer ao cônjuge ou usufrutuários sobrevivos, de maneira que os respectivos titulares exerçam na plenitude seus legítimos direitos.

A execução do contrato, na forma estabelecida, reclama a imperiosa averbação, ocorrência que altera substancialmente o registro. Daí o alerta para a correta interpretação da vontade das partes no mesmo contrato.

Sobre os vários modelos de atos (averbações e registros) do aqui tratado, reporta-se o autor ao já inserido na obra Direito Registral Imobiliário, ed. Sérgio Fabris – 2001 – IRIB – págs. 379/442 e de 508/513, de sua autoria. (Ademar Fionarelli, “O usufruto no Direito Civil de 2002 e .A proibição de alienar o direito” no site www.irib.org.br, acessado em 22.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

segunda-feira, 21 de dezembro de 2020

Direito Civil Comentado - 1.406, 1.407, 1.408, 1.409 Dos Deveres do Usufrutuário – VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado - 1.406, 1.407, 1.408, 1.409

Dos Deveres do Usufrutuário – VARGAS, Paulo S. R.

- Parte Especial –  Livro IIITítulo VI – Dos Deveres do Usufrutuário - Capítulo III – Disposições Gerais (Art. 1.400 a 1.409)

- digitadorvargas@outlook.com - vargasdigitador.blogpot.com

 

Art. 1.406. O usufrutuário é obrigado a dar ciência ao dono de qualquer lesão produzida contra a posse da coisa, ou os direitos deste. 

Ainda das obrigações e deveres do usufrutuário, complementa Francisco Eduardo Loureiro, constituir o artigo em exame novidade, sem correspondência com regras do velho Código Civil. A regra complementa o dever do usufrutuário de restituir a coisa no mesmo estado em que a recebeu. A incolumidade diz respeito não só ao estado físico, como também à integridade jurídica. Decorre daí o dever do usufrutuário de cientificar o dono de toda e qualquer agressão injusta à posse, assim como de qualquer outra afronta que possa atingir os direitos deste, como, por exemplo, ofensa a direito de vizinhança, penhoras e arrestos.

Lembre-se que o usufrutuário, na qualidade de possuidor direto da coisa, pode usar da tutela possessória, ou das ações de vizinhança em nome próprio, o que não o exonera de cientificar o proprietário, para que este, como assistente, possa exercer os direitos que entenda corretos. Note-se que tal dever já era implícito no velho Código Civil, tanto assim que Caio Mário da Silva Pereira, ao arrolar os deveres do usufrutuário, afirma que “compete ao usufrutuário defender a coisa usufruída, repelir as ocupações e as vias de fato de terceiros, impedir a constituição de situações jurídicas adversas ao nu-proprietário, avisar o proprietário das pretensões de terceiros, exercer o que seja mister para que não pereçam as servidões ativas, obstar que se criem servidões passivas, abster-se de tudo que possa danificar a coisa, diminuir-lhe o valor, ou restringir as faculdades residuais do proprietário (Instituições de direito civil-direitos reais, 18. ed. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. IV, p. 302). (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.474. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 21/12/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Em comentário de Guimarães e Mezzalira, o dispositivo em análise trata da obrigação legal que tem o usufrutuário em dar ciência ao nuproprietário quanto a eventuais danos causados ao bem objeto de usufruto, a fim de se resguardá-lo de futuras reparações, por se encontrar no exercício da posse direta. Muito embora não haja qualquer cominação legal, caso o dano pudesse ter sido evitado pelo proprietário, se tivesse sido comunicado anteriormente, sua falta de ciência poderá gerar a obrigação do usufrutuário em indenizá-lo devidamente, por conta de sua negligência (Bezerra, 1015, p. 396).  (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao art. 1.406 do CC/2002, acessado em 21.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

A redação não poderia ser mais clara, então, em sua doutrina, o relator Ricardo Fiuza explica em poucas palavras: “Inova o artigo ao determinar a obrigatoriedade de comunicação ao proprietário nas hipóteses da ocorrência de, por exemplo, esbulho, turbação da posse, apossamento administrativo (desapropriação indireta) ou qualquer lesão ao direito do nu-proprietário.(Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 717, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 21/12/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.407. Se a coisa estiver segurada, incumbe ao usufrutuário pagar, durante o usufruto, as contribuições do seguro.

§ 1º. Se o usufrutuário fizer o seguro, ao proprietário caberá o direito dele resultante contra o segurador.

§ 2º. Em qualquer hipótese, o direito do usufrutuário fica sub-rogado no valor da indenização do seguro. 

Como se exprime Francisco Eduardo Loureiro, referindo-se ao CC 1.407, o artigo em exame corresponde ao art. 735 do Código Civil de 1916, com alteração mínima, de cunho meramente gramático. Constata-se, de início, que o seguro da coisa dada em usufruto é meramente facultativo, não constituindo obrigação do usufrutuário fazê-lo, salvo convenção a respeito no título. 

Pode ocorrer, porém, de a coisa já se encontrar segurada, quando da constituição do usufruto, caso em que ao usufrutuário incumbirá o pagamento do prêmio. Pode o usufrutuário contratar o seguro da coisa usufruída, mas eventual indenização será paga ao proprietário, em típica estipulação em favor de terceiro. Em qualquer hipótese, quer seja o seguro feito pelo usufrutuário, quer pelo nu-proprietário, ocorrido o sinistro, o usufrutuário fica sub-rogado no valor da indenização do seguro. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.475. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 21/12/2020. Revista e atualizada nesta data por VD). 

No entendimento de Sebastião de Assis Neto et al. 2017, se a coisa estiver segurada, a obrigação de pagar o prêmio do seguro é do usufrutuário, mas é do proprietário o direito de cobrar a indenização contra o segurador, ainda que o segura tenha sido feito pelo usufrutuário (art. 1.407). 

O parágrafo segundo do referido dispositivo reza, porém, que, “em qualquer hipótese o direito do usufrutuário fica sub-rogado no valor da indenização do seguro”. Tal quer dizer que o usufrutuário tem direito a ser ressarcido pelo valor do direito real que perdeu, a ser deduzido da indenização a ser paga ao proprietário. (Manual de Direito Civil, Volume único, Sebastião de Assis Neto, et al. P. 1.566, 6ª edição, Editora Juspodium, consultada em 21/12/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Ao discorrer sobre o artigo em comento, Guimarães e Mezzalira firma entre as obrigações consideradas regulares em relação ao bem objeto de usufruto estão as de pagar taxas referentes ao seguro, tal como se dá com o locatário em prédios residenciais e comerciais, estando aquele segurado. Caso o prédio não esteja segurado, e os bens que integram o usufruto venham a ser destruídos por terceiro, a indenização devida por este caberá ao usufrutuário, como titular da posse direta e dos frutos. Idêntica solução ocorrerá se o bem, estando segurado, for destruído por incêndio, caso em que o usufrutuário se sub-rogará no direito do respectivo seguro (Rodrigues, 2003, p. 309).

Se o seguro for realizado pelo usufrutuário, e não pelo proprietário, menciona o dispositivo (§ 1º) que caberá ao proprietário o direito resultante do seguro; entretanto, como dito acima, o usufrutuário se sub-rogará na respectiva indenização. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao art. 1.407 do CC/2002, acessado em 21.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.408. Se um edifício sujeito a usufruto for destruído sem culpa do proprietário, não será este obrigado a reconstruí-lo, nem o usufruto se restabelecerá, se o proprietário reconstruir à sua custa o prédio; mas se a indenização do seguro for aplicada à reconstrução do prédio, restabelecer-se-á o usufruto.

No lecionar de Guimarães e Mezzalira, na hipótese de um prédio ser destruído sem qualquer responsabilidade do proprietário (inundações, incêndio etc.), não terá este obrigação na sua reconstrução, extinguindo-se, desta forma, o usufruto, dado o perecimento do objeto, mesmo que ele venha reconstruí-lo às suas expensas. 

Caso o proprietário use a indenização do seguro para reconstruí-lo, o usufruto se restabelecerá na sua forma originalmente estabelecida, uma vez que aquele direito real se sub-rogará no valor pago pela indenização do mencionado seguro. Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao art. 1.408 do CC/2002, acessado em 21.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Em menção de Maria Clara Silva Fernandes, incumbe ao usufrutuário a obrigação de restituir a coisa usufruída. O prédio que recai a nua propriedade for destruído sem culpa do nu proprietário, não será ele obrigado a reconstruir, nem o usufruto se restabelecerá. Havendo seguro patrimonial e, for aplicado na reconstrução, restabelece o usufruto, como proclama o CC 1.408. Em caso de destruição do prédio, extingue-se o usufruto pelo perecimento de seu objeto, ocorrendo o seu restabelecimento se o prédio se encontrar segurado. (Maria Clara Silva Fernandes, ”Breves considerações do direito real do usufruto”, em 2017, site JusBrasil.com.br, acessado em 21.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na extensão de Francisco Eduardo Loureiro, o artigo em exame corresponde ao art. 737 do Código Civil de 1916, com poucas alterações substanciais. A regra é simples. Se o prédio dado em usufruto for destruído sem culpa do nu-proprietário e por este reconstruído, como o investimento e o dispêndio do capital são novos e sem contribuição do usufrutuário, o usufruto não se restabelece. Caso, porém, esteja o prédio segurado, por quem quer que seja, e o produto da indenização, no qual se sub-roga o seguro, for invertido na reconstrução do prédio, o usufruto se restabelecerá. 

Art. 1.409. Também fica sub-rogada no ônus do usufruto, em lugar do prédio, a indenização paga, se ele for desapropriado, ou a importância do dano, ressarcido pelo terceiro responsável no caso de danificação ou perda.

No comentário de Francisco Eduardo Loureiro, disciplina o artigo três causas de sub-rogação do usufruto: desapropriação e indenização paga por terceiro que causar a perda ou danificação da coisa usufruída. A desapropriação é modo originário de aquisição da propriedade, de forma que não subsiste o direito real de usufruto em face do expropriante. Em contrapartida, há o imperativo legal do pagamento do justo preço, de maneira que o patrimônio do proprietário muda qualitativamente, mas não quantitativamente. Decorrência disso é que sobre a quantia paga se sub-roga o usufruto, que passa a recair sobre bem fungível, a ser restituído, devidamente atualizado, quando da extinção do direito real. Anota Carvalho Santos, e com razão, que, se parte da indenização for paga ao usufrutuário pelo não recebimento dos frutos durante certo período, tal valor, assim como ocorreria com os frutos, pertence ao usufrutuário. 

Igual fenômeno ocorre no caso de perda ou deterioração da coisa usufruída, causada por ato ilícito de terceiro. A indenização paga por terceiro é também onerada pelo usufruto, lembrando que, se houver mera danificação, o valor é invertido na recuperação da coisa. Se o terceiro for insolvente, o usufruto se extingue. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.475-76. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 21/12/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Como entende em sua doutrina, Ricardo Fiuza, relator do projeto, a desapropriação extingue, juridicamente, o objeto do usufruto por uma espécie de mutatio rei — de mudança na forma substancial da coisa. Mas na soma recebida do título de indenização pela desapropriação fica sub-rogado o gravame (RJTJSP, 135/280). O mesmo ocorre nas hipóteses de indenização paga por terceiro em razão de dano causado ao bem. • Este artigo é idêntico ao art. 738 do Código Civil de 1916, devendo a ele ser dado o mesmo tratamento doutrinário.  (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 718, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 21/12/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Resumindo e finalizando o Capítulo III, para os autores Guimarães e Mezzalira  a solução legal trazida no texto é idêntica à apresentada acima, em caso de bem destruído que seja anteriormente segurado. Assim, quando ocorrer desapropriação deste no interesse social ou por utilidade pública, o direito do usufrutuário ficará sub-rogado no valor da indenização a ser recebida pelo expropriante. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao art. 1.409 do CC/2002, acessado em 21.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

sexta-feira, 18 de dezembro de 2020

Direito Civil Comentado - 1.403, 1.404, 1.405 Dos Deveres do Usufrutuário – VARGAS, Paulo S. R.

 

 Direito Civil Comentado - 1.403, 1.404, 1.405

Dos Deveres do Usufrutuário – VARGAS, Paulo S. R.

- Parte Especial –  Livro IIITítulo VI – Dos Deveres do Usufrutuário - Capítulo III – Disposições Gerais (Art. 1.400 a 1.409)

- digitadorvargas@outlook.com - vargasdigitador.blogpot.com

 

Art. 1.403. Incumbem ao usufrutuário:

 

 I - as despesas ordinárias de conservação dos bens no atado em que os recebeu;

 

II - as prestações e os tributos devidos pela posse ou rendimento da coisa usufruída .

 

No comentário de Francisco Eduardo Loureiro, o inciso I atribui ao usufrutuário o encargo de arcar com as despesas ordinárias de conservação. Lembre-se, porém, que o preceito é complementado pelo CC 1.404. Além de ordinárias, as despesas também devem ser módicas. Por ordinárias se entendem aquelas despesas normais para a conservação do bem, as de mera manutenção no estado em que se encontra, evitando a deterioração ou o desgaste acentuado. As despesas ordinárias, embora deva-se evitar um rol casuístico, têm as marcas da previsibilidade, periodicidade e regularidade.

 

Tupinambá Miguel Castro do Nascimento exemplifica como ordinárias as despesas como a pintura de um prédio ou a lavagem de um carro, ou a troca de seus pneus ou amortecedores, pois ocorrem dentro de um certo período e são suscetíveis de previsão. O conserto da estrutura de um prédio ou a retífica de um motor com baixa quilometragem, por sua vez, são extraordinários, porque irregulares e imprevisíveis ( Usufruto, 2. ed. Rio de Janeiro, Aide, 1983, p. 88-9). Já o conceito de modicidade é dado pelo próprio legislador no CC 1.404, comentado adiante.

O inadimplemento do usufrutuário confere ao nu-proprietário a pretensão de exigir compulsoriamente a realização de despesas, ou que as faça diretamente e as cobre do devedor. Além disso, se a falta de manutenção colocar a coisa em risco, o nu-proprietário pode exigir caução, ou mesmo a extinção do usufruto. A regra, todavia, deve sempre ser interpretada em atenção ao princípio da boa-fé objetiva, na sua função de controle, evitando desproporção entre o descumprimento da obrigação e as suas consequências.

O inciso II confere ao usufrutuário o encargo de arcar com o pagamento de prestações e tributos que incidam sobre o imóvel ou a sua renda. Como prestações, tomem-se o pagamento das despesas ordinárias de condomínio, foros, no caso de imóvel enfitêutico, assim como tarifas sobre serviços públicos. Como tributos incidentes sobre o imóvel, tomem-se o IPTU e o imposto territorial rural, inteiramente a cargo do usufrutuário. Como tributos incidentes sobre a renda, tomem-se o imposto de renda e eventuais contribuições sobre o lucro de pessoa jurídica. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.471. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 18/12/2020. Revista e atualizada nesta data por VD). 

Segundo o histórico apresentado na coluna de Ricardo Fiuza, o dispositivo em comentário não foi alvo de alteração nem por parte do Senado Federal, nem por parte da Câmara dos Deputados, no período final de tramitação do projeto. A redação atual é a mesma do projeto. Contudo, contraditando o histórico, Francisco Eduardo Loureiro afirma: “O artigo em exame corresponde ao art. 733 do Código Civil de 1916, sem alterações substanciais. Apenas o inciso II recebeu nova redação, mais técnica e adequada aos encargos do usufruto.”

Enquanto a doutrina apresentada pelo relator aponta a obrigação de dever o usufrutuário conservar a coisa usufruída, mantendo-a no estado em que a recebeu, arcando com as despesas ordinárias , que são os consertos ou pequenos reparos que se tomam necessários em consequência do seu uso normal. E de sua responsabilidade, também, o pagamento dos tributos devidos em razão da posse ou rendimento da coisa dada em usufruto.  Insiste o relator ser o dispositivo idêntico ao art. 733 do Código Civil de 1916, no que não está errado completamente,  (ressalve-se o Inciso II, aludido por Francisco Eduardo Loureiro), devendo a ele ser dispensado o mesmo tratamento doutrinário . 

Limitando-se os autores Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a simples comentário em relação a que o dispositivo em apreço é um desdobramento do anterior, no sentido de estipular que o pagamento de despesas pelo uso regular e normal do bem incumbe a quem o utiliza, como se dá com o usufrutuário, visando sua conservação. Neste panorama incumbe a ele, também, o pagamento das dívidas próprias do bem, como taxas condominiais e impostos sobre a propriedade rural ou urbana. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao art. 1.403 do CC/2002, acessado em 18.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Art. 1.404.  Incumbem ao dono as reparações extraordinárias e as que não forem de custo módico; mas o usufrutuário lhe pagará os juros do capital despendido com as que forem necessárias à conservação, ou aumentarem o rendimento da coisa usufruída. 

§ 1º. Não se consideram módicas as despesas superiores a dois terços do líquido rendimento em um ano. 

§ 2º. Se o dono não fizer as reparações a que está obrigado, e que são indispensáveis à conservação da coisa, o usufrutuário pode realizá-las, cobrando daquele a importância despendida.

Seguindo com os comentários de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, as despesas consideradas estruturais do prédio, que possa colocá-lo de alguma forma em risco ou desvalorizá-lo, ou mesmo causar danos ao prédio vizinho – tais como sistemas hidráulicos ou elétricos envelhecidos ou, na área rural, um solo enfraquecido, sem as mínimas condições para a agricultura destinada no usufruto – de valores expressivos (não módicos) são da responsabilidade do proprietário, nos termos do dispositivo.

Considera o texto legal que é considerado expressivo o valor da despesa que seja superior a dois terços dos rendimentos líquidos auferidos pelo usufrutuário no período de um ano, razão pela qual esta responsabilidade se desviará para o nuproprietário, o qual poderá pactuar com aquele, se for o caso, sua justa repartição (§ 1º).

Se o nuproprietário não realizar os reparos considerados imprescindíveis, o usufrutuário poderá efetuar as repetidas despesas, com direito de regresso legalmente assegurado contra aquele (§ 2º). (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao art. 1.404 do CC/2002, acessado em 18.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Estendendo seus comentários Francisco Eduardo Loureiro, o artigo em exame corresponde ao art. 734 do Código Civil de 1916, com redação idêntica em seu caput e § 1º. A novidade está na adição do § 2º, que regula a possibilidade de o usufrutuário efetuar por conta própria as reparações que cabem ao proprietário, para posteriormente ser ressarcido.

Como já mencionado no comentário ao artigo anterior, para que as reparações incumbam ao usufrutuário, devem atender a dois requisitos cumulativos: ser ordinárias e módicas. Via de consequência, as reparações extraordinárias e as ordinárias que não forem módicas ficam a cargo do proprietário.

Claro que, se o usufrutuário deu causa aos estragos que exigem a reparação, por culpa, ainda que leve, tal critério é desprezado e o usufrutuário deve assumir, em razão do ato ilícito, a reparação integral. Além disso, a norma em exame é dispositiva, de tal modo que nada impede que as partes convencionem em sentido contrário. Em poucas palavras, o critério legal somente se aplica aos casos em que não houver disposição em contrário no título ou em negócio posterior entre as partes e quando resultar do fortuito ou do estrago natural da coisa.

Viu-se no comentário ao artigo anterior o que são despesas ordinárias. Para evitar a incerteza que o termo indeterminado despesa módica, ou pequena, certamente acarretaria, tratou o legislador de fixar seu conceito, no § 1º: são módicas as despesas superiores a dois terços do líquido rendimento de um ano. A contagem de um ano, segundo Tupinambá Miguel Castro do Nascimento, é aquela “que vai, retrocedendo, do dia em que a necessidade da reparação apareceu, até o mesmo mês e dia do ano antecedente” (Usufruto, 2. ed. Rio de Janeiro, Aide, 1983, p. 89). 

O § 2º do artigo em exame supre lacuna do Código Civil de 1916, disciplinando a sanção que sofre o proprietário que deixa de fazer as reparações que lhe incumbem. Faculta agora a lei ao usufrutuário, desde que as reparações sejam necessárias à conservação da coisa - excluindo, portanto, as úteis e voluptuárias -, que as faça por sua própria conta e as cobre posteriormente do proprietário. Lembre-se, porém, que a lei confere um direito ao usufrutuário. Nada impede que este permaneça inerte, correndo o proprietário o risco com a deterioração ou perda da coisa, do que não poderá reclamar.

A parte final do caput confere ao proprietário que realize despesas com reparações necessárias à conservação da coisa, ou que aumentarem o seu rendimento, a possibilidade de cobrar do usufrutuário juros do capital despendido. Radica-se a regra no fato de o dono ter interesse na preservação da substância, mas a despesa reverter em proveito imediato do usufrutuário. Os juros são os legais, nada impedindo que as partes convencionem juros diversos, desde que respeitadas a norma cogente da Lei da Usura.

Na doutrina do relator Ricardo Fiuza, ao nu-proprietário cabe reparar o imóvel quando o valor do conserto for de elevado custo, ou seja, for superior a dois terços do valor líquido do rendimento anual do bem, e na hipótese de a reparação ser extraordinária (as que não forem consideradas despesas ordinárias — v. CC 1.403). • Este artigo inova ao obrigar o proprietário da coisa a realizar as obras indispensáveis ou sua conservação, sob pena de ser ela feita pelo usufrutuário a expensas do dono. Corresponde ao art. 734 do Código Civil de 1916, devendo receber o mesmo tratamento doutrinário.

Art. 1.405. Se o usufruto recair num patrimônio, ou parte deste, será o usufrutuário obrigado aos juros da dívida que onerar o patrimônio ou a parte dele.

Lecionando Guimarães e Mezzalira, caso seja estabelecido o usufruto sobre determinado patrimônio – ou universalidade – e essa possua dívidas, o usufrutuário se responsabilizará pelos juros das mencionadas dívidas, como decorrência natural de sua titularidade, uma vez que será o patrimônio, na sua integralidade, quem responderá por eventuais dívidas.

A responsabilidade do usufrutuário, no caso especificado, será aquela limitada à dívida que o patrimônio assumirá integralmente, ou seja, será restrita à esfera daquilo que o patrimônio deve se comprometer. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao art. 1.405 do CC/2002, acessado em 18.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Historicamente, segundo o livro da doutrina de Ricardo Fiuza, este dispositivo não sofreu qualquer espécie de modificação, seja da parte do Senado Federal, seja da parte da Câmara dos Deputados, no período final de tramitação do projeto. A redação atual é a mesma do projeto. Para a Doutrina recaindo o usufruto sobre uma universalidade patrimonial, ou em uma parte dela, entende-se que os juros da dívida, que oneram esse complexo de bens, ficam a cargo do usufrutuário, porque ele é um sucessor a título universal, a quem passam as vantagens e os ônus que entram na formação do patrimônio. Como apontado no histórico, equipara-se este artigo ao de n. 736 do Código Civil de 1916, com considerável melhora em sua redação. No mais, deve ser aplicado à matéria o mesmo tratamento doutrinário dado ao dispositivo apontado. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 717, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 18/12/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Contundente, acrescenta Francisco Eduardo Loureiro em seus comentários das modificações no artigo em exame correspondente ao art. 736 do Código Civil de 1916, com expressiva alteração. Não mais trata dos juros incidentes sobre usufruto de coisa singular, mas somente de patrimônio ou parte dele, vale dizer, universalidade de direito. A regra é no sentido de que aquele que adquire usufruto sobre patrimônio ou parte dele, que constitui universalidade de direito, sucede a título universal, razão pela qual se obriga pessoalmente pelos juros da dívida que eventualmente onerar tal patrimônio. Note-se que a regra diz respeito apenas aos juros, pelos quais responde pessoalmente o usufrutuário. Óbvio que, se for o usufruto constituído em fraude de credores ou de execução, será ineficaz frente aos credores, cabendo ao usufrutuário apenas o direito de remir a dívida, para a persistência do direito real. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.474. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 18/12/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).