quinta-feira, 10 de novembro de 2022

Comentários ao Código Penal – Art. 29 Do Concurso de Pessoas - VARGAS, Paulo S. R. vargasdigitador.blogspot.com – digitadorvargas@outlook.com –

 

Comentários ao Código Penal – Art. 29

Do Concurso de Pessoas - VARGAS, Paulo S. R.
vargasdigitador.blogspot.com –
digitadorvargas@outlook.com
 –

Whatsapp: +55 22 98829-9130

Parte Geral –Título IV – Do

Concurso de Pessoas

 

Do Concurso de Pessoas (Redação dada pela Lei nº 7,209, de 11/7/1984)

 

Art. 29. Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11/7/1984);

 

§ 1º. Se a participação for de menor importância, a pena pode ser diminuída de um sexto a um terço. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11/7/1984);

 

§ 2º. Se algum dos concorrentes quis participar de crime menos grave, ser-lhe-á aplicada a pena deste; essa pena será aumentada até metade, na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave. (Redação dada pela Lei na 7.209, de 11/7/1984).

Apreciações de Greco, Rogério. Código Penal: Comentado. 5ª ed. – Niterói, RJ: Comentários a: “Do Concurso de Pessoas” – Art. 29 do CP, p. 87-98, com extenso conteúdo e variáveis superinteressantes para neófitos como para jurisconsultos. Assunto aprimorado:

Concurso de pessoas - Fala-se em concurso de pessoas quando duas ou mais pessoas concorrem para a prática de uma mesma infração penal. Essa colaboração recíproca pode ocorrer tanto nos casos em que são vários os autores, como naqueles em que existirem autores e partícipes. A cooperação de qualquer forma com o companheiro na prática ilícita da mercancia implica a assunção da condição de coautor do delito (TJRS, Ap. Crim. 70018090902, 1ª Câm. Crim., Rel. Manoel José Martinez Lucas, j. 4/7/2007).

O art. 29 do Código Penal, ao definir o concurso de agentes e fixar a respectiva consequência normativa, deixa evidente que todos os partícipes devem ser imputáveis; a conduta do menor de 18 anos de idade é, penalmente, irrelevante (STJ, REsp. 76011/BA, Rel. Min. Luiz Vicente Cernícchiaro, LEXSTJ 114, p. 351).

Depois de cometido o delito é impossível a coautoria. O fato então praticado será delito autônomo, jamais, porém, o atribuído ao agente principal (TASP, Ap. 46099, Rel. Cardoso Rolim, R T 378, p. 307).

Requisitos para o concurso de pessoas - Para que se possa concluir pelo concurso de pessoas, será preciso verificar a presença dos seguintes requisitos: a) pluralidade de agentes e de condutas; b) relevância causal de cada conduta; c) liame subjetivo entre os agentes; d) identidade de infração penal.

Para a caracterização do concurso de pessoas, basta a adesão voluntária, antes da consumação, à conduta criminosa e a cooperação no sentido de realização do tipo penal, sendo irrelevante a existência de prévio acordo (TJMG, AC 1.0390.06. 014669-8/001, Rel. Des. Hélcio Valentim, DJ 11/5/2009).

 Teorias sobre o concurso de pessoas: a) teoria pluralista; b) teoria dualista; c) teoria monista.

Para a teoria pluralista, haverá tantas infrações penais quantos forem o número de autores e partícipes. Já a teoria dualista distingue o crime praticado pelos autores daquele cometido pelos partícipes. Para essa teoria, haverá uma infração pena para os autores e outra para os partícipes. A teoria monista, também conhecida como unitária, adotada pelo nosso Código Penal, aduz que todos aqueles que concorrem para o crime incidem nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade. Para a teoria monista, existe um crime único, atribuído a todos aqueles que para ele concorreram, autores ou partícipes. Embora o crime seja praticado por diversas pessoas, permanece único e indivisível.

Melhores exemplos sempre se encontram nas jurisprudências: Tratando-se de concurso de pessoas que agiram com unidade de desígnios e cujas condutas tiveram relevância causal para a produção do resultado, é inadmissível o reconhecimento de que um agente teria praticado o delito na forma tentada e o outro, na forma consumada. Segundo a teoria monista ou unitária, havendo pluralidade de agentes e convergência de vontades para a prática da mesma infração penal, como se deu no presente caso, todos aqueles que contribuem para o crime incidem nas penas a ele cominadas CP, art. 29), ressalvadas as exceções para as quais a Lei prevê expressamente a aplicação da teoria pluralista (STF, HC 97652-2/RS, 2ª T., Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe 3 8/9/2009).

Espécies de concurso de pessoas - O concurso poderá ocorrer na modalidade de coautoria ou de participação.

Não constituí ilegalidade cada autor, coautor ou partícipe responder pelas suas circunstâncias pessoais, dentre as quais se situa a motivação do delito - o executor será responsabilizado por ter aceitado retirar a vida de outrem mediante o recebimento de uma contraprestação, já o autor intelectual será responsabilizado pela sua intenção ao ter dado causa à prática infracional, como é o caso dos autos: a paciente — acusada de ser a suposta mandante do homicídio (STJ, RHC 14900/SC, Rel. Min. Jorge Scartezzini, 5ª T., DJ 9/8/2004, p. 277).

Conceitos de autor - Há conceito restritivo e conceito extensivo de autor.

Conceito restritivo de autor - Para os que adotam um conceito restritivo, autor será somente aquele que praticar a conduta descrita no núcleo do tipo penal. Todos demais que, de alguma forma, o auxiliarem, embora não realizem a conduta narrada pelo verbo do tipo penal, serão considerados partícipes.

Conceito extensivo de autor - O conceito extensivo de autor encontra-se numa situação diametralmente oposta à do conceito restritivo. Pelo fato de partir da teoria da equivalência das condições, os adeptos do conceito extensivo não fazem distinção entre autores e partícipes. Todos aqueles que, de alguma forma, colaboram para a pratica do fato são considerados autores.

Teoria do domínio do fato - Autor é aquele que decide o se, o como e o quando da infração penal; é o senhor de suas decisões.

Domínio funcional sobre o fato - Baseia-se na ideia de divisão de tarefas. Nilo Batista, com autoridade, depois de afirmar que a ideia de divisão de trabalho é fundamental ao conceito de coautoria, dissertando sobre o domínio funcional do fato, aduz: “Só pode interessar como coautor quem detenha o domínio (funcional) do fato; desprovida deste atributo, a figura cooperativa poderá situar-se na esfera da participação (instigação ou cumplicidade). O domínio funcional do fato não se subordina à execução pessoal da conduta típica ou de fragmento desta, nem deve ser pesquisado na linha de uma divisão aritmética de um domínio ‘integral do fato, do qual tocaria a cada coautor certa fração. Considerando-se o fato concreto, tal como se desenrola, o coautor tem reais interferências sobre o ‘Se’ e o seu ‘Como’; apenas, face à operacional fixação de papéis, não é o único a tê-las, a finalisticamente conduzir o sucesso. Pode-se, entretanto, afirmar com Roxín, que cada coautor tem a sorte do fato total em suas mãos, ‘através de sua função específica na execução do sucesso total, porque se recusasse sua própria colaboração faria fracassar o fato”. (BATISTA, Nilo. Concurso de agentes, p. 77).

Três exemplos jurisprudenciais: Mostrando-se decisiva a atuação do réu para o êxito da empreitada criminosa, inclusive praticando atos executórios, não há falar em participação, mas, sim, em coautoria, não se aplicando a participação de menor importância ao agente que realiza uma parte necessária do plano global (domínio funcional do fato), sendo impossível o afastamento do concurso de pessoas se o delito foi perpetrado, em unidade de desígnios, mediante divisão de tarefas essenciais para o sucesso da empreitada (TJMG, AC.1.0056.04.076986-3/001, Rel. Des. Judimar Biber, DJ 15/5/2009).

Na coautoria funcional que se fundamenta no princípio da divisão de tarefas, o agente que realiza atos executórios na parte que lhe cabe realizar do plano criminoso não pode ser considerado partícipe e receber o benefício da participação de menor importância (TJMG, AC 1.0188.05.030945-2/001, Rel. Des. Alexandre Victor de Carvalho, DJ 23/10/2006).

O acusado que na divisão de trabalho tinha o domínio funcional do fato (a saber, fuga do local do crime), é coautor, e não mero partícipe, pois seu papei era previamente definido, importante, e necessário para a realização da infração penal (SJT, HC 30.503/SP, Rel. Min. Paulo Medina, 6a T., DJ 12/12/2005, p. 424).

Coautoria - A teoria do domínio do fato fica mais evidente quando diversas pessoas, unidas pelo vínculo subjetivo, resolvem praticar uma mesma infração penal. Aqui, mais do que nunca, será de extrema importância saber quais são os autores e os partícipes. Na lapidar lição de Welzel, “a coautoria é autoria; sua particularidade consiste em que o domínio do fato unitário é comum a várias pessoas. Coautor é quem possuindo as qualidades pessoais de autor é portador da decisão comum a respeito do fato e em virtude disso toma parte na execução do delito”. (WELZEL, Hans. Derecho penal atemán. p. 129).

Como aplicado na jurisprudência: Não se exige, para a verificação da coautoria, que todos os agentes efetuem, necessariamente, a ação descrita pelo verbo componente do núcleo do tipo, sendo suficientes a adesão ao plano criminoso e a ajuda àquele que, efetivamente, pratica os atos de execução (TJMG, AC 1.05Í2.06.031578-9/001, Rel. Des. Walter Pinto da Rocha, DJ 6/2/2007).

Autoria direta e autoria indireta - Autor pode ser aquele que executa diretamente a conduta descrita pelo núcleo do tipo penal, ocasião em que será reconhecido como autor direto ou autor executor; ou poderá ser, também, aquele que se vale de outra pessoa, que lhe serve, na verdade, como instrumento para a prática da infração penal, sendo, portanto, chamado de autor indireto ou mediato.

Autoria mediata - Seguindo as lições de Wessels, “autor mediato é quem comete o fato punível ‘por meio de outra pessoa’, ou seja, realiza o tipo legal de um delito comissivo doloso de modo tal que, ao levar a cabo a ação típica, faz com que atue para ele um ‘intermediário’ na forma de um instrumento’’. (WESSÈLS, Johannes. Derecho penal, p. 159).

Nesse caso, para que se possa falar em autoria indireta ou mediata, será preciso que o agente detenha o controle da situação, i.é, que tenha o domínio do fato. Nosso Código Penal prevê expressamente quatro casos de autoria mediata, a saber: a) erro determinado por terceiro (art. 20, § 2º do CP); b) coação moral irresistível (art. 22, primeira parte, do CP); c) obediência hierárquica (art. 22, segunda parte, do CP); e d) caso de instrumento impunível em virtude de condição ou qualidade pessoal (art. 62, III, segunda parte, do CP).

Além dessas hipóteses, pode ocorrer, ainda, a autoria mediata, quando o autor se vale de interposta pessoa que não pratica qualquer comportamento - doloso ou culposo - em virtude da presença de uma causa de exclusão da ação, como ocorre nas situações de força irresistível do homem e do estado de inconsciência.

Entende-se com maior nitidez, exemplificando-se com os julgados: 1. Os elementos de convicção que embasaram a denúncia permitiram concluir que a conduta do paciente se mostrou em tese dirigida para a realização dos verbos destruir, inutilizar ou deteriorar bem especialmente protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial, inscrito no inciso 1 do art. 62 da Lei nº 9.605/98, em hipótese de autoria mediata, que restou em tese verificada ao sonegar dos adquirentes do imóvel a informação cerca da existência do sítio arqueológico no terreno, fazendo-os dar continuidade em projeto cujas obras tinha conhecimento que acarretariam a sua destruição. O habeas corpus não constitui via adequada ao pronunciamento acerca da responsabilidade criminal do paciente, quando a controvérsia envolver o exame aprofundado do conjunto probatório. Evidenciada na ação penal subjacente a existência de justa causa para sua instauração, com a existência de crime em tese e indícios suficientes de autoria (TRF, 3ª Reg., HC 28621, Processo 2007.03.00.0820Ó7-0. Rel. Des. Fed. Henrique Herkenhoff, 2ª T., j. 6/11/2007); e

2. Subtração de toca-fitas, do interior de veículo estacionado na via pública. Seriam partícipes os que limitam a instigar e prestar auxílio, vigiando o local e avisando da presença de policiais nas proximidades do veículo. Mas, sendo o executor menor inimputável, as condutas acessórias assumem a condição de autoria mediata (TJRS, Ap. Crim. 7000 2786135, 8ª Câm. Crim., Rel. Tupinambá Pinto de Azevedo, j. 29/10/2003).

Autoria mediata e crimes próprios – Entende-se ser perfeitamente possível a autoria mediata em crimes próprios, desde que o autor mediato possua as qualidades ou condições especiais exigidas pelo tipo penal. Zaffaroni e Pierangeli, esclarecendo o tema, afirmam: “O autor mediato deve reunir todos os caracteres que o tipo exige com relação ao autor, ou o intraneus (o funcionário público, exzemple), que se vale do extraneus (não funcionário) para praticar uma corrupção, é autor do crime de corrupção, mas o extraneus que se vale do intraneus não é autor mediato, por não possuir as condições típicas”. (ZAFFARONI, Eugênio Raúl: PIERANGEU. José Henrique. Manual de direito penal brasileiro - Parte geral, p. 672).

Autoria mediata e crimes de mão própria - Tem-se entendido, majoritariamente, não ser cabível autoria mediata em crimes de mão própria, uma vez que estes últimos são considerados personalíssimos, ou seja, aqueles que necessitam, para sua configuração, da atuação pessoal e intransferível do agente. No entanto, embora a posição doutrinária majoritária não admita a autoria mediata nos crimes de mão própria, no exemplo do crime

de falso testemunho, pode haver quebra da regra geral. Assim, imagine-se a hipótese em que a testemunha seja coagida, irresistivelmente, a prestar um depoimento falso para beneficiar o autor da coação. Nesse caso, de acordo com a norma constante do art. 22 do Código Penal, somente será punido o autor da coação, sendo este, portanto, um caso de autoria mediata.

Assim, pode-se dizer que, como regra, não se admite autoria mediata nos crimes de mão própria. No entanto, como toda regra, poderá sofrer exceções, como a do caso apontado, em que será possível a autoria mediata em um crime de falso testemunho praticado mediante coação irresistível. Veja o decision:

Os crimes de mão própria estão descritos em figuras típicas necessariamente formuladas de tal forma que só pode ser autor quem esteja em situação de realizar pessoalmente e de forma direta o fato punível. Não sendo delito de execução pessoal, como é a hipótese dos autos, a própria autoria mediata é plausível (STJ, REsp. 761354/PR, Rel. Min. Felix Fischer, 5ª T., DJ 16/10/2006, p. 421).

Coautoria e crimes próprios - Não haverá óbice algum nos delitos próprios, no que diz respeito à possibilidade de existirem, no critério de distribuição de funções, vários autores que, com unidade de desígnio, pratiquem a mesma infração penal, podendo-se falar, aqui, em coautoria. Poderão dois funcionários públicos, agindo em concurso, subtrair, valendo-se da facilidade que essa qualidade lhes proporcionava, um microcomputador existente na repartição na qual ambos trabalhavam. O crime de peculato é próprio, pois somente pode ser praticado por quem possua a qualidade de funcionário público. Contudo, embora próprio, admite a autoria mediata, bem como a coautoria, aplicando-se, com perfeição, a teoria do domínio funcional do fato. Serve de exemplo:

O delito de duplicata simulada (art. 172 do CP) exige que o agente emita duplicata que não corresponda à efetiva transação comercial e, por se tratar de crime próprio ou especial, admite coautoria ou participação (Precedente) (STJ, REsp. 975.962/CE, Rel. Ministro Felix Fischer, 5a T., DJe 23/3/2009).

Coautoria em crimes de mão própria - Da mesma forma que, como regra, não se admite em infrações penais dessa natureza a autoria mediata, também deverá ser afastada a possibilidade de coautoria. Isso porque, por se tratar de infrações personalíssimas, não há a possibilidade de divisão de tarefas. O delito, portanto, só pode ser realizado pessoalmente pelo agente previsto no tipo penal.

Em sentido contrário, já decidiu o STJ: Entendimento desta Corte de que é possível, em tese, atribuir a advogado a coautoria pelo crime de falso testemunho (STJ, Resp 402783/SP REsp. 2001/0193430-6; 53 T., Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, DJ 13/10/2003, p. 403).

Embora não se possa falar em coautoria em delitos de mão própria, nada impede que haja concurso de partícipes. Os partícipes, mesmo não possuindo o domínio sobre o fato, podem, de alguma forma, concorrer para a infração penal, induzindo, instigando ou auxiliando materialmente o autor, como se vê na decisão:

O delito de falso testemunho, apesar de ser considerado delito de ‘mão própria’, admite a participação, nas modalidades de induzimento e instigação, ressalvadas raras exceções. Precedentes desta Corte e do STF (STJ, REsp. 659.512/RS, Rel. Min. Gilson Dípp, 5ª T-, DJ 29/11/2004, p. 397).

Autor intelectual - Fala-se em autoria intelectual quando se quer referir ao “homem inteligente” do grupo, aquele que traça o plano criminoso, com todos os seus detalhes. Segundo a lição de Damásio, “na autoria intelectual o sujeito planeja a ação delituosa, constituindo o crime produto de sua criatividade”. (JESUS, Damásio E. de. Teoria do domínio do fato no concurso de pessoas, p. 19).

Pode acontecer até mesmo que ao autor intelectual não seja atribuída qualquer função executiva do plano criminoso por ele pen- sado, o que não afasta, contudo, seu status de autor. Pelo contrário. Pela teoria do domínio do fato percebe-se, com clareza, sua importância para o sucesso da infração penal.

O art. 62, I, do Código Penal diz que a pena será ainda agravada em relação ao agente que promove, ou organiza a cooperação no crime ou dirige a atividade dos demais agentes. A coautoria intelectual é pacificamente aceita, não se requerendo a participação efetiva de cada agente em cada ato executivo, bastando a sua aprovação consciente a todos eles (TA Crim./SP, Ap. 362361-1, Rel. Bonaventura Guglielmi, j. 23/5/1984).

Autor de determinação - Pierangeli e Zaffaroni trazem uma hipótese na qual não se pode falar em autoria, direta ou indireta, tampouco em participação, mas que, diante da redação do art. 29 do Código Penal, permite punir o agente pelo fato de ter determinado a prática da infração penal, sendo chamado, em razão disso, de autor de determinação.

Esclarecendo seu raciocínio, trazem à colação a hipótese de alguém que se valha de outro, que não realiza conduta para cometer um delito de mão própria: uma mulher dá sonífero à outra e depois hipnotiza um amigo, ordenando-lhe que com aquela mantenha conjunção carnal durante o transe. O hipnotizado não realiza conduta, ao passo que a mulher não pode, nessa situação, ser autora de estupro, porque é delito de mão própria. Tampouco é partícipe, pois falta o injusto alheio em que cooperar ou a que determinar. (ZAFFARONI, Eugênio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro - Parte geral, p. 676).

Mesmo após a nova redação dada pela Lei na 12.015, de 7 de agosto de 2009, ao delito de estupro, o exemplo ainda é válido. Isso porque o art. 213 do Código Penal prevê a conjunção carnal, ou seja, a relação sexual normal, o coito vagínico, que só pode ser realizado entre um homem e uma mulher.

Considerando-se o estupro, praticado mediante conjunção carnal, como crime de mão própria, no caso em exame, a mulher que ministra o sonífero à outra, bem como que hipnotiza o homem que, durante o transe, é levado a manter relações sexuais com aquela, não pode ser autora mediata de estupro. Tampouco poderá ser partícipe, pois, adotada pela maioria dos autores a teoria da acessoriedade limitada da participação, somente poderá haver a participação quando o autor vier a praticar um fato típico e ilícito. Pelo exemplo fornecido, o homem que manteve a conjunção carnal com a mulher que estava sob o efeito do sonífero não pratica conduta dolosa ou culposa. Portanto, se não há conduta penalmente relevante, não há fato típico, e, se não há fato típico, não haverá crime.

Para essas hipóteses em que não se pode falar em autoria ou participação, surge outra figura, vale dizer, a do autor de determinação. Será punido, segundo os renomados tratadistas, com as penas correspondentes à infração penal que houverem determinado, e, não, segundo eles, como autores dessa infração penal: “Não se trata de autoria de delito, mas de um tipo especial de concorrência, em que o autor só pode ser apenado como autor da determinação em si e não do delito a que tenha determinado. A mulher não é apenada como autora de estupro, mas lhe será aplicada a pena deste crime por haver cometido o delito de determinar para o estupro”. (ZAFFARONI, Eugênio Raúl; PIERANGEU, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro - Parte gerai, p. 676). Obs.: Na modalidade ter conjunção carnal, uma vez que, atualmente, de acordo com a nova redação legal, ocorrerá o estupro não somente quando o agente constrange alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal, como também a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso.

Autoria por convicção - Ocorre naquelas hipóteses em que o agente conhece efetivamente a norma, mas a descumpre por razões de consciência, que pode ser política, religiosa, filosófica etc.

Reinhart Maurach e Heinz Zipf esclarecem, no que diz respeito ao delinquente por convicção, que o autor não desconhece o “desvalor de sua ação para o direito vigente e as concepções ético-sociais, mas que devido às suas convicções morais, religiosas ou políticas se sente obrigado ao fato [...). Esse autor atuou corretamente segundo as leis de sua ética individual, da norma obrigacional reclamada para si”. (MAURACH, Reinhart: ZIPF, Heinz. Derecho penal - Parte general, v. 1, p. 584).

Coautoria sucessiva - A regra é de que todos os coautores iniciem, juntos, a empreitada criminosa. Mas pode acontecer que alguém, ou mesmo o grupo, já tenha começado a percorrer o iter críminis, ingressando na fase dos atos de execução, quando outra pessoa adere à conduta criminosa daquele, e agora, unidos pelo vínculo psicológico, passam, juntos, a praticar a infração penal. Em casos como esse, quando o acordo de vontade vier a ocorrer após o início da execução, fala-se em coautoria sucessiva.

Suponha-se que A perceba que seu irmão B está agredindo C. Querendo auxiliá-lo, A se une a B para que, juntos, espanquem a C. Como o crime de lesões corporais já estava em andamento, o ingresso de A no fato é tido como caso de coautoria sucessiva.

Limites da coautoria sucessiva – Como mostra o julgado:  É possível o conhecimento de habeas corpus após o trânsito em julgado em que se requer a desclassificação do delito se se tratar apenas de tese jurídica, analisável a partir do que restou consignado na sentença, sem a necessidade de extensão probatória.

Não é admissível a coautoria após a consumação do crime, salvo se comprovada a existência de ajuste prévio. A pessoa que participa apenas no momento do exaurimento do crime comete crime de favorecimento real, se sabe prestar auxílio destinado a tomar seguro o proveito do crime (HC 39732/RJ, Relª. Minª. Maria Thereza de Assis Moura, 6ª T., j. 26/6/2007, DJ 3/9/200, p. 225).

Autoria colateral, autoria incerta e autoria desconhecida - Fala-se em autoria colateral quando dois agentes, embora convergindo suas condutas para a prática de determinado fato criminoso, não atuam unidos pelo liame subjetivo. Diz-se incerta a autoria quando, embora possamos apontar aqueles que, provavelmente, praticaram a infração penal, não podemos indicar, com precisão, o seu autor. Ressalta-se que a autoria incerta resulta de uma situação de autoria colateral, pois os agentes não podem ter agido unidos pelo liame subjetivo, o que faria com que todos fossem considerados autores, independentemente de se apontar com precisão, por exemplo, aquele que praticou o ato de execução que culminou com a consumação da infração penal. Já nos casos de autoria desconhecida, como a própria denominação diz, não se conhece aquele (ou aqueles) que, provavelmente foram o autor (ou autores) da infração penal.

Autoria de escritório - Zaffaroni e Pierangeli dissertam sobre outra modalidade de autoria, chamada autoria de escritório.

Essa nova modalidade de autoria, tida como mediata pelos renomados autores, “pressupõe uma ‘máquina de poder, que pode ocorrer tanto num Estado em que se rompeu com a toda legalidade, como numa organização paraestatal (um Estado dentro do Estado), ou como uma máquina de poder autônoma ‘mafiosa’, por exemplo”. (ZAFFARONI, Eugênio Raúl; PIERANGEU, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro - Parte geral, p. 672).

Embora tratada como autoria mediata, o fato de alguém cumprir as ordens de um grupo criminoso extremamente organizado não o reduz à condição de mero instrumento, tal como acontece nos casos em que se pode falar em autoria mediata. Aqui, como em qualquer outro grupo organizado, como o “Comando Vermelho”, existente nas favelas e nos morros da cidade do Rio de Janeiro, aquele que executa as ordens emanadas pelo “cabeça da organização” o fez tendo o domínio funcional do fato que lhe fora atribuído. Não pode ser considerado simples instrumento, mas, na concepção de Zaffaroni e Pierangeli, trata-se de caso de autoria mediata especial.

Participação - Já se afirmou que o autor é o protagonista da infração penal. É ele quem exerce o papel principal. Contudo, não raras as vezes, o protagonista pode receber o auxílio daqueles que, embora não desenvolvendo atividades principais, exercem papéis secundários, mas que influenciam na prática da infração penal. Estes, que atuam como coadjuvantes na história do crime, são conhecidos como partícipes.

Modalidades de participação - Como atividade acessória, a participação pode ser moral ou material.

Diz-se moral a participação nos casos de induzimento (que é tratado pelo Código Penal como determinação) e instigação. Material seria a participação por cumplicidade (prestação de auxílios materiais).

Induzir ou determinar é criar, incutir, colocar, fazer brotar a ideia criminosa da cabeça do agente/autor. Nessa modalidade de participação, o autor não tinha a ideia criminosa, cuja semente lhe é lançada pelo partícipe. A participação por instigação limita-se a reforçar, estimular uma ideia criminosa já existente na mente do autor. A função do partícipe, com a sua instigação, é fazer com que o agente fortaleça sua intenção delitiva. A atuação do instigador, nas lições de Pierangeli e Zaffaroni, “deve ser decisiva no sentido de orientar e de determinar a execução, pelo autor, de uma conduta típica e antijurídica. Todavia, a punição da instigação decorre de ter levado o autor a decidir pela prática do crime, não pelo feito de ter-lhe dado a ideia, que até poderia ter sido dada por outrem”. (PIERANGELI, José Henrique. Escritos jurídico-penais, p. 73).

Na cumplicidade ou prestação de auxílios materiais, o partícipe facilita materialmente a prática da infração penal, ad esempio, cedendo a escada para aquele que deseja adentrar na casa da vítima, a fim de levar a efeito uma subtração, ou o que empresta sua arma para que o autor possa causar a morte de seu desafeto. Em toda prestação de auxílios materiais existe embutida uma dose de instigação. Aquele que empresta a escada ou sua arma para o autor está estimulando-o, mesmo que indiretamente, a praticar a infração penal, reforçando, portanto, sua ideia criminosa.

Vejam o julgado: Devida a condenação pela prática do crime de latrocínio quando o agente planejou em conjunto com inimputáveis a perpetração do ilícito, forneceu arma de fogo para sua consecução e foi até o local onde estava a vítima, dando apoio àquele que foi escolhido para efetuar a subtração. Não há falar em participação de menor importância em sendo a ação desempenhada pelo acusado essencial tanto material quanto moralmente para perpetração do crime. Além disso, no caso, não se pode afastar a hipótese de autoria mediata em vista de ter o réu obrado em conjunto com inimputáveis (TJRS, Ap. Crim. 70012052403, 8ª Câm. Crim., Rel. Roque Miguel Fank, j. 10/8/2005).

Cumplicidade necessária - Tem-se levado a efeito a distinção entre cumplicidade necessária e cumplicidade desnecessária, entendendo-se aquela nas hipóteses em que o bem ou o auxílio material são entendidos como escassos, ou seja, não poderiam ser fornecidos normalmente por qualquer pessoa, como ocorreria na segunda situação.

Teorias sobre a acessoriedade da participação: São quatro as teorias que disputam o tratamento sobre a acessoriedade da participação, a saber: a) teoria da acessoriedade mínima; b) teoria da acessoriedade limitada; c) teoria da acessoriedade máxima; e d) teoria da hiperacessoriedade.

Para a teoria da acessoriedade mínima, haverá participação punível a partir do momento em que o autor já tiver realizado uma conduta típica. Basta, para essa teoria, que o autor pratique um fato típico, para que possa haver a responsabilização penal do partícipe. A teoria da acessoriedade limitada pune a participação se o autor tiver levado a efeito uma conduta típica e ilícita. Para a teoria da acessoriedade máxima, somente haverá a punição do partícipe se o autor tiver praticado uma conduta típica, ilícita e culpável. A teoria da hiperacessoriedade vai mais além e diz que a participação somente será punida se o autor tiver praticado um fato típico, ilícito, culpável e punível.

Instigação a autores e a fatos determinados - A participação deve dirigir-se a fatos e a pessoas determinadas. Não se estimula, genericamente, ao cometimento de fatos não determinados. O instigador, seguindo as lições de Zaffaroni e Pierangeli, “deve pretender o cometimento de um fato determinado, i.é, de um delito determinado”, (ZAFFARONI, Eugênio Raúl; PIERANGEU, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro - Parte geral, p. 695), da mesma forma que deve dirigir-se a pessoa ou pessoas determinadas.

Participação punível – desistência voluntária e arrependimento do autor: Nas hipóteses de desistência voluntária ou de arrependimento eficaz do autor, o partícipe não será beneficiado com a regra contida no art. 15 do Código Penal, uma vez que, ao ser iniciada a execução, ali nasceu a possibilidade de puni-lo, (Nesse sentido também o entendimento de José Cerezo Mlr, que, depois de analisar a nova redação do Código Penal espanhol, afirma que “a desistência do autor não determina a impunidade dos partícipes", uma vez que entende ser o instituto da desistência voluntária uma causa pessoal de exclusão de pena, ou seja, uma escusa absolutória (Curso de derecho penal español - Parte general, v. III, p. 192-193), em sentido contrário, Nilo Batista aduz que a “impunidade do partícipe é decorrência da acessoriedade da participação’’, (BATISTA, Nilo. Concurso de agentes, p. 135-136, ou seja, se a desistência ou o arrependimento do autor o levar à atipicidade da conduta inicial por ele praticada, tal fato deverá ser estendido ao partícipe. No mesmo sentido é a posição de Esther de Figueiredo Ferraz, (FERRAZ, Esther de Figueiredo. A codelinquência no direito penal brasileiro, p. 173-174), quando diz: “se o executor desiste voluntariamente da consumação do crime ou impede que o resultado se produza, responderá apenas pelos atos já praticados (art. 13), beneficiando-se dessa circunstância inteiramente alheia às respectivas vontades os vários partícipes, uma vez que a isso conduz a doutrina unitária do concurso acolhida pelo art. 25”. (Os arts. 13 a 25 referidos na citação correspondem, respectivamente, aos arts. 15 e 29 da nova parte geral do Código Penal.

Arrependimento do partícipe - Se o partícipe houver induzido ou instigado o autor, incutindo-lhe a ideia criminosa ou reforçando-a a ponto de este decidir-se pelo cometimento do delito, e vier a se arrepender, somente não será responsabilizado penalmente se conseguir fazer com que o autor não pratique a conduta criminosa. Caso contrário, ou seja, se não tiver sucesso na sua missão de evitar que o delito seja cometido, depois de ter induzido ou instigado inicialmente o autor, seu arrependimento não será eficaz e, portanto, não afastará sua responsabilidade penal como ato acessório ao praticado pelo autor. Nesse sentido, o posicionamento de Jescheck, quando diz: “Se o partícipe se esforçou em vão para fazer com que o autor desistisse, a sua desistência foi fracassada - A desistência pode, ao contrário, ter êxito, quando o partícipe impede voluntariamente a consumação do fato para o qual havia cooperado”. (JESCHECK, Hans-Heinrich. Tratado de derecho penal - Parte general, v. II, p. 749).

No que diz respeito à cumplicidade (prestação de auxílios materiais), a solução para o partícipe aqui parece mais tranquila. Se houve, de parte dele, a promessa de que emprestaria a arma a ser utilizada pelo autor e, antes que ela seja entregue, desiste de participar, e se o autor comete o delito valendo-se de outro instrumento que não aquele prometido pelo partícipe, este último não poderá ser penalmente responsabilizado. Aplica-se o mesmo raciocínio se já havia emprestado a arma e, antes da prática da infração penal, consegue reavê-la, impedindo o autor de usá-la.

Participação em cadeia (participação de participação): É perfeitamente admissível, a exemplo da hipótese em que A induza B a induzir C a causar a morte de D. Ou que A, induza B a emprestar sua arma a C, para que este venha causar a morte de D.

Participação sucessiva - Damásio de Jesus preleciona que “a participação sucessiva ocorre quando, presente o induzimento (determinação) ou instigação do executor, sucede outra determinação ou instigação. Ex.: A instiga B a matar C. Após essa participação, o agente D, desconhecendo a precedente participação de A, instiga B a matar C. Se a instigação do sujeito D foi eficiente em face do nexo de causalidade, é considerado partícipe do homicídio”. (JESUS, Damásio E. da. Direito penal - Parte geral, v. I, p. 376).

Participação por omissão - A participação moral, segundo posição amplamente majoritária, é impossível de ser realizada por omissão. Nilo Batista, de forma absoluta, assevera: “Inimaginável o doloso processo de convencimento à resolução criminosa que se não estruture numa atuação positiva; nesse campo, poder-se-ia até abrir mão das palavras, porém nunca de uma ação”. (BATISTA, Nilo. Concurso de agentes, p. 133).

Já a participação material, contudo, pode concretizar-se numa inação do partícipe, que, com a sua omissão, contribui para a ocorrência da infração penal. Merece frisar que o partícipe que contribui para o fato, auxiliando materialmente sua execução, não pode, em qualquer hipótese, ser considerado garantidor da não ocorrência desse mesmo fato, pois, caso contrário, se, tendo o dever de agir para impedir o resultado, nada faz, responderá pela infração penal a título de autoria, e não de participação.

Raciocinando com o seguinte exemplo fornecido por Nilo Batista: “Numa firma comercial, o empregado A vem subtraindo semanalmente certa importância em dinheiro; B, que não é tesoureiro, nem caixa, nem exerce qualquer outra função que fizesse possível conceber o dever especial, mas que pode de alguma forma facilitar o acesso de A ao cofre, omite providências (chaves, horários etc.) que significariam obstáculos à atividade de A, desejando, por raiva do patrão, que a perda patrimonial seja expressiva.” (BATISTA, Nilo. Concurso de agentes, p. 134).

Participação de menor importância - O § 1º do art. 29 do Código Penal somente terá aplicação nos casos de participação (instigação e cumplicidade), não se aplicando às hipóteses de coautoria. Não se poderá falar, portanto, em coautoria de menor importância, a fim de atribuir a redução de pena a um dos coautores. Isso porque, segundo posição adotada pela teoria do domínio funcional do fato, observando-se o critério de distribuição de tarefas, coautor é aquele que tem o domínio funcional do fato que lhe fora atribuído pelo grupo, sendo sua atuação, assim, relevante para o sucesso da empreitada criminosa. Dessa forma, toda atuação daquele que é considerado coautor é importante para a prática da infração penal, não se podendo, portanto, falar em “participação de menor importância”.

Exemplificado no julgado: Inexiste participação de menor importância ou cooperação dolosamente distinta em relação àquele que se responsabiliza por uma das fases de divisão de tarefas, a qual, aliada às demais, realiza um todo indivisível e determinante para o sucesso da empreitada criminosa, assumindo, outrossim, de modo premeditado, consciente e esperado, os riscos da produção de resultado mais grave. De acordo com a teoria monística, perfilhada pelo nosso Código Penal, em tema de codelinquência quem de qualquer modo concorre para o crime incide nas penas a estes cominadas (...) pelo resultado final respondem todos os agentes, sendo indiferente a circunstância de ter sido, durante a execução material do crime, menor a quota de participação física de algum deles, posta em confronto com a dos demais comparsas. - Precedentes. (TJMG, AC 1.0418. 06.000 610-7/001, Rel. Des. Eduardo Brum, DJ 7/7/2009).

Participação em crime menos grave (desvio subjetivo de conduta) - Pelo que se dessume do mencionado parágrafo, o legislador pretendeu punir os concorrentes nos limites impostos pela finalidade de sua conduta, ou seja, se queria concorrer para o cometimento de determinada infração penal, se o seu dolo era voltado no sentido de cooperar e praticar determinado crime, não poderá responder pelo desvio subjetivo de conduta atribuído ao autor executor.

Imagine-se o seguinte exemplo: A estimula B a causar lesões em C. Ao dar início às agressões, B, agindo agora com animus occidendi (dolo de matar), espanca C até a morte. Como se percebe, B não fora instigado por A causar a morte de C. Tal fato se deveu, exclusivamente, a um desvio subjetivo da conduta de B. Em razão do disposto no § 2º do art. 29 do Código Penal, A somente deverá ser responsabilizado por seu dolo, ou seja, se a finalidade de sua participação era estimular, instigar o agente a causar lesões em alguém, e se, durante a execução do crime, o autor executor resolver ir mais adiante e praticar outra infração penal que não aquela sugerida ou estimulada pelo partícipe, este último somente será responsabilizado pelo seu dolo. Se o dolo foi o de estimular o agente a cometer o delito de lesões corporais, por ele deverá ser responsabilizado. Se o resultado mais grave fosse previsível para o concorrente, a pena prevista para a infração penal para a qual queria concorrer será aumentada de metade. Dois exemplos a seguir:

Hipótese em que os agentes queriam realizar conduta menos grave (roubo qualificado), porém, havendo previsibilidade do resultado mais grave - a morte da vítima - entendeu-se pela aplicação da última parte do § 2º do art. 29 do CP (STJ, REsp. 669138/DF, Rel. Min. Gilson Dipp, 5ª T., DJ 13/6/2005, p. 336).

No roubo, mormente praticado com arma de fogo, respondem, de regra, pelo resultado morte, situado evidentemente em pleno desdobramento causal da ação delituosa, todos que, mesmo não agindo diretamente na execução da morte, contribuíram para a execução do tipo fundamental (Precedentes). Se assumiram o risco, pelo evento, respondem (STJ, HC 35895/DF, Rel. Min. Felix Fischer, 5a T., DJ 4/10/2004 p. 334).

Punibilidade no concurso de pessoas - Havendo concurso de pessoas, cada agente deverá ser responsabilizado, nos termos da parte final do art. 29 do Código Penal, na medida de sua culpabilidade, ou seja, o julgador deverá realizar um juízo de censura sobre cada comportamento praticado pelos agentes, individualmente.

Espelhe-se no julgado: Quando alguém concorre para o crime, responde na medida de sua culpabilidade (a ideia comumente aceita é a de que a pena deve corresponder à culpabilidade), sendo possível diminuir a pena em caso de reconhecida participação de menor importância (STJ, HC 104.880/MS, Rel. Min. Nilson Naves, 6ª Turma, DJe 9/3/2009).

Tenha-se em mente que no ordenamento penal em vigor, não há obrigatoriedade de redução de pena para o partícipe, em relação à pena do autor, considerada a participação em si mesma, ou seja; como forma de concorrência diferente da autoria (ou coautoria). A redução obrigatória da pena para o partícipe se dá apenas em face daquela que a Lei chama de ‘menor importância* exemplificada no exemplo a seguir - o que já está a revelar que nem toda participação é de menor importância e que, a princípio, a punição do partícipe é igual à do autor; A diferenciação está ‘na medida da culpabilidade’ e, nessa linha, o partícipe pode, em tese, vir até mesmo a merecer pena maior que a do autor, como exemplo, no caso do inciso IV do art. 62 do CP’ (STJ, REsp. 575684/SP,' Rel. Min. Paulo Medina, 6ª T., DJ23/4/2007, p. 317).

Embora cada agente deva ser responsabilizado na medida de sua culpabilidade, ou seja, de acordo com o juízo de censura que recai sobre o seu comportamento, tal raciocínio não permite que, fora da hipótese prevista pelo § 2“ do art. 29 do Código Penal, o julgador dê ao fato definição jurídica diversa para cada um dos coparticipantes, punindo-os, consequentemente, também de forma diversa, a exemplo do que ocorreu no caso relatado no Habeas Corpus 97.652/RS, tendo como Relator o Min. Joaquim

Barbosa, do STF, em que um dos agentes foi condenado pelo delito consumado e o outro pela modalidade tentada, sendo que ambos agiram em concurso de pessoas, ou seja, convergiram as suas condutas, unidos pelo liame subjetivo, para prática de uma mesma infração penal, observada a divisão de tarefas.

Coautoria em crimes omissivos (próprios e impróprios) - Existe controvérsia doutrinária e jurisprudencial a respeito da possibilidade de coautoria em crimes omissivos. Nilo Batista, com autoridade, afirma: “O dever de atuar a que está adstrito o autor do delito omissivo é indecomponível/ Por outro lado, como diz Bacigalupo, a feita de ação priva de sentido o pressuposto fundamental da coautoria, que é a divisão do trabalho; “así, no es concebible que alguien omita una parte mientras otros omiten el resto”. Quando dois médicos omitem - ainda que de comum acordo - denunciar moléstia de notificação compulsória de que tiveram ciência (art. 269 CP), tem-se dois autores diretos individualmente consideráveis. A inexistência do acordo (que, de resto, não possui qualquer relevância típica) deslocaria para uma autoria colateral, sem alteração substancial na hipótese.

No famoso exemplo de Kaufmann, dos cinquenta nadadores que assistem passivamente ao afogamento do menino, temos cinquenta autores diretos da omissão de socorro. A solução não se altera se se transferem os casos para a omissão imprópria: pai e mãe que deixam o pequeno filho morrer à míngua de alimentação são autores diretos do homicídio; a omissão de um não ‘completa’ a omissão do outro; o dever de assistência não é violado em 50% por cada qual”. (BATISTA, Nilo. Concurso de agentes, p. 65).

Para o renomado autor, portanto, não se cogita de coautoria nos delitos omissivos, uma vez que cada agente possui o dever de agir de forma individualizada, indecomponível e intransferível. Se dois garantidores, a exemplo do pai e da mãe, como citou o autor, deixam de fazer aquilo a que estavam obrigados, a fim de tentar evitar a produção do resultado, como a teoria do domínio funcional do fato não se aplica aos crimes omissivos, sejam eles próprios, sejam impróprios, embora tenham agido com identidade de propósito, não será o caso de coautoria, sendo cada um, individualmente, considerado autor.

Em sentido contrário é o entendimento de Cezar Bítencourt, quando afirma “ser perfeitamente possível a coautoria em crime omissivo próprio. Se duas pessoas deixarem de prestar socorro a uma pessoa gravemente ferida, podendo fazê-lo, sem risco pessoal, praticarão, individualmente, o crime autônomo de omissão de socorro. Agora, se essas duas pessoas, de comum acordo, deixarem de prestar socorro, nas mesmas circunstâncias, serão coautoras do crime de omissão de socorro. O princípio é o mesmo dos crimes comissivos: houve consciência e vontade de realizar um empreendimento comum, ou melhor, no caso de não realizá-lo, conjuntamente”. (BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de direito penal- Parte geral, p. 445).

Tal raciocínio aplica-se, segundo o renomado autor, também aos crimes omissivos impróprios. Com a devida venia das posições em contrário, filiamo-nos à segunda corrente, acreditando ser possível falar em coautoria nos crimes omissivos, desde que cada agente possua o dever de agir naquele determinado caso concreto.

Participação em crimes omissivos (próprios e impróprios) - A maioria de nossos autores admite a participação em crimes omissivos, a exemplo de Fontán Balestra quando diz: “Não parece que ofereça dúvida a possibilidade de instigar, que é uma forma de participação nos delitos de omissão. Pode-se instigar a alguém para que faça ou deixe de fazer algo”. (FONTÁN BALESTRA, Carlos. Derecho penal, p. 450).

Coautoria em delitos culposos - Embora exista controvérsia doutrinária, a tendência contemporânea é a de aceitar a coautoria em delitos culposos. Duas pessoas podem, em um ato conjunto, deixar de observar o dever objetivo de cuidado que lhes cabia e, com a união de suas condutas, produzir um resultado lesivo.

A coautoria, tanto em crimes dolosos ou culposos, depende da existência de um nexo causal físico ou psicológico ligando os agentes do delito ao resultado (STJ, REsp. 25070/MT, Rel. Min. Cid Flaquer Scartezzini, 5ª T., RT 706, p. 375).

Vejam a menção nos dois julgados que seguem: É perfeitamente admissível, segundo o entendimento doutrinário e jurisprudencial, a possibilidade de concurso de pessoas em crime culposo, que ocorre quando há um vínculo psicológico na cooperação consciente de alguém na conduta culposa de outrem. O que não se admite nos tipos culposos, ressalve-se, é a participação. Precedentes desta Corte (STJ, H C 40.474/PR, Relª. Minª. Laurita Vaz, 5ª T., DJ 13/2/2006, p. 832).

Em sentido contrário, adotada a teoria dos delitos de infração de dever, não se admite a participação ou a coautoria em crimes culposos, devendo os concorrentes responder por crimes autônomos (TJMG, AC 2.0000.00.438534-0/000, Rel. Des. Alexandre Victor de Carvalho, DJ 26/6/2004).

Participação em crimes culposos - Ao contrário do que acontece com a coautoria em crimes culposos, em que a maioria, hoje em dia, a aceita sem muitas dificuldades, quando nos referimos à participação em crimes culposos, a tendência quase unânime é de rechaçar essa possibilidade. No entanto, estamos com Mariano Silvestroni quando, exemplificando, preleciona que “quem convence a outro de que exceda o limite de velocidade permitido nos leva a cabo uma ação de conduzir suscetível de violar o dever de cuidado na condução veicular. Portanto, afirmar a autoria a respeito de um eventual homicídio culposo é bastante forçado. A solução pela instigação é mais adequada, principalmente quando não existe nenhuma razão para excluir da tipicidade culposa as regras da participação criminal”. (SILVESTRONI, Mariano H. Teoria constitucional dei delito, p. 230).

Denúncia inepta - É gravemente inepta a denúncia que, a título de imputação de crimes praticados em concurso de agentes, não descreve nenhum fato capaz de corresponder às figuras de coautoria ou de participação de um dos denunciados (STF, HC 86520/SP, Rel. Min. Cezar Peluso, 2a T., DJ 8/6/2007, p. 46).

Conforme as melhores lições, da denúncia - peça narrativa e demonstrativa - exigem-se informações precisas sobre quem praticou o fato (quis) e sobre os meios empregados (quibus auxiliis). Tratando-se de acidente de trabalho com resultado morte, não se admite denúncia que dela não conste descrição das diversas condutas atribuídas aos sócios da empresa. Caso em que, por faltar descrição de elementos de convicção que a ampare, a denúncia não reúne, em tomo de si, as exigências legais, estando, portanto, formalmente inepta (STJ, HC 51.837/PA, Rel. Min. Nilson Naves, 6ª Turma, DJe 14/4/2008).

Conscientize-se com os julgados a seguir: Narração pormenorizada das condutas na denúncia - Tem-se admitido a denúncia genérica, em casos de crimes com vários agentes e condutas, como se dá na espécie, ou que, por sua própria natureza, devem ser praticados em concurso, quando não se puder, de pronto, pormenorizar as ações de cada um dos envolvidos, sob pena de inviabilizar a acusação. O importante é que os fatos sejam narrados de forma suficientemente clara, possibilitando o amplo exercício do direito de defesa, como se verifica no caso sub judice, pois os acusados se defendem dos fatos e não da tipificação feita pelo Ministério Público (STJ, RH C 21482/RS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, 5a T., DJe 12/4/2010).

Conforme as melhores lições, da denúncia - peça narrativa e demonstrativa - exigem-se informações precisas sobre quem praticou o fato (quis) e sobre os meios empregados (quibus auxiliis). Tratando-se de acidente de trabalho com resultado morte, não se admite denúncia que dela não conste descrição das diversas condutas atribuídas aos sócios da empresa. Caso em que, por faltar descrição de elementos de convicção que a ampare, a denúncia não reúne, em tomo de si, as exigências legais, estando, portanto, formalmente inepta (STJ, HC 51.837/PA, Rel. Min. Nilson Naves, 6ª Turma, DJe 14/4/2008).

A peça acusatória deve conter a exposição do fato delituoso em toda a sua essência e com todas as suas circunstâncias (HC 73.271/SP, Primeira Turma, Rel. Min. Celso de Mello, DJU de 4/9/1996). Denúncias genéricas, que não descrevem os fatos na

sua devida conformação, não se coadunam com os postulados básicos do Estado de Direito (H C 86.000/PE, Rel. Min. Gilmar Mendes, 2a T., DJU de 2/2/2007). A inépcia da denúncia caracteriza situação configuradora de desrespeito estatal ao postulado do devido processo legal (STJ, RHC 22.007/SP, Rel. Min. Felix Fischer, 5ª T., DJe 2/6/2008).

Desnecessário que a denúncia defina pormenorizadamente a conduta de cada um dos agentes envolvidos na empreitada criminosa, bastando para tanto, tão somente, de modo geral, narrar o fato delituoso na sua integralidade, ou seja, bastando a descrição dos fatos, atribuindo-se a responsabilidade penal a todos os coautores, deixando ao largo da instrução as particularidades do agir delituoso de cada um dos agentes (TJRS, Ap. Crim. 70010846152, 8a Câm. Crim., Relª. Lúcia de Fátima Cerveira, j. 17/1/2007). (Greco, Rogério. Código Penal: Comentado. 5ª ed. – Niterói, RJ: Comentários a: “Do Concurso de Pessoas” – Art. 29 do CP, p. 87-98. Editora Impetus.com.br, acessado em 10/11/2022 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Ainda que por demais extenso, o artigo abriga 50%, se não mais, o conteúdo de uma prova da OAB. Fica a sugestão para os neófitos prestarem o máximo de atenção ao artigo em comento e nos pareceres.

Viajando com Victor Augusto em artigo intitulado “O concurso de pessoas”, comentários ao art. 29 do CP, publicado no site Index Jurídico, em 28 de janeiro de 2019:

No que diz respeito ao concurso de pessoas ou concurso subjetivo no crime, o Código afirma que os agentes incidem nas penas cominadas à conduta típica, na medida de sua culpabilidade.

 

O concurso subjetivo nada mais é do que a cooperação para a realização do delito, a confluência de vontades e o liame subjetivo para atingir um resultado criminoso. Essa ligação psicológica pode surgir previamente ou no curso da execução, contanto que cada conduta envolvida tenha alguma relevância para o resultado final.

 

O concurso de pessoas pode ser eventual (para aqueles crimes que não necessitam de uma pluralidade de agentes) ou necessário (quando o tipo penal necessita dessa pluralidade – crimes plurissubjetivos).

 

Observe que é possível o concurso para crime culposo, bastando que, na conduta inicial, os agentes atuem em cooperação, alcançando culposamente um resultado ilícito previsível.

 

Igualmente, pode-se cogitar o concurso em crime omissivo, bastando que os agentes, ligados por um liame subjetivo, se omitam diante de um dever legal.

 

A teoria que prevalece como regra é a unitária (monística ou monista)só há um delito para todos, mesmo que existam múltiplos agentes. Nas penas desse delito cada um responderá de acordo com sua participação. Inclusive, se a participação for de menor importância, prevê o Código uma causa de diminuição de um sexto a um terço (1/6 a 1/3).

 

Como se percebe, a teoria unitária reconhece a existência de um só crime, sendo seus responsáveis apenados na medida de suas culpabilidades. Nesse contexto, a doutrina já aponta para as figuras dos sujeitos principais (autor, coautor e autor mediato) e dos sujeitos secundários (partícipes) (BITENCOURT, 2018).

 

A doutrina aponta que a adoção da teoria monista decorre da escolha, no âmbito da causalidade, pela teoria da equivalência dos antecedentes, pois todos que contribuem volitivamente para o resultado, respondem pelo mesmo.

 

As noções de autor partícipe são alvos de ricos debates doutrinários, mas prevalecem na praxe e na academia a adoção de certos parâmetros para definir quem é autor e quem é partícipe no crime.

 

Autor é aquele que pratica diretamente a conduta prevista no tipo penal (teoria objetivo-formal) ou que, de forma mediata, se vale de um terceiro como instrumento para realizar o crime (autoria mediata) ou que, por capacidade decisória, tem controle e domínio sobre a realização do crime (teoria do domínio do fato). A coautoria seria a pluralidade de pessoas agindo no papel de autor.

 

Sobre a teoria do domínio do fato, atribuída a Claus Roxin, Bitencourt (2018) explica que a mesma se apresenta como uma teoria objetiva-subjetiva, pois destaca as necessidades do controle pessoal e final sobre o resultado pelo agente mediato (aspecto subjetivo), bem como o domínio decisório sobre o fato (aspecto objetivo).

 

autoria mediata tem como situações típicas o uso de inimputáveis, de pessoas em erro ou de pessoas coagidas moralmente (coação moral irresistível) como instrumentos para realização de um crime.

 

Diferentemente, o partícipe seria o colaborador que, mesmo praticando atos relevantes para se alcançar o resultado, não se enquadra nas hipóteses mencionadas. Possui, portanto, um papel secundário e acessório no crime.

De forma geral, o partícipe ou instiga a realização do delito, estimulando moralmente a vontade criminosa do autor, ou é cúmplice, participando e auxiliando materialmente a prática criminosa.

 

Relembra a doutrina que, no que diz respeito à participação, adota o Código Penal a teoria da acessoriedade limitada, segundo a qual a participação é acessória da conduta principal e será criminosa contanto que a conduta do autor seja típica e ilícita (não precisando ser culpável).

 

Por exemplo, o indivíduo que instiga ato infracional cometido por inimputável responderá pela conduta típica criminosa (na ausência de uma autoria mediata), e não como partícipe de ato infracional.

 

O concurso de agentes não se confunde com a autoria colateral, na qual múltiplos agentes, sem combinação ou colaboração, agem sozinhos contra a mesma vítima, procurando o mesmo resultado, sem que uns tenham conhecimento da pretensão criminosa dos outros.

 

§ 2º – Se algum dos concorrentes quis participar de crime menos grave, ser-lhe-á aplicada a pena deste; essa pena será aumentada até metade, na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave.

 

A hipótese do segundo parágrafo trata da cooperação dolosamente distinta. Neste caso, há uma ruptura na unidade criminosa. Um agente quer praticar um crime, e outro, crime diverso, mais grave.

 

Como resultado, aquele que queria praticar crime menos grave responderá pelas penas deste, salvo se o resultado mais grave for previsível.

 

Imagine-se um caso envolvendo lesão e homicídio - Dois sujeitos encontram um desafeto comum e começam a agredi-lo. O primeiro quer lesionar a vítima, enquanto o segundo quer matá-la. O primeiro desfere alguns ataques e cessa a ação, mas o segundo continua até consumar o homicídio. Dependendo da previsibilidade do resultado mais grave (por exemplo, o primeiro agente viu que o segundo sacou um revólver ao ver a vítima, ou havia mencionado que a queria morta), o agente responderá pelo crime menos grave com ou sem a causa de aumento. Se sobre esse resultado mais grave, entretanto, existir um dolo eventual, aperfeiçoar-se-á o liame subjetivo em prol do resultado final. (Victor Augusto em artigo intitulado “O concurso de pessoas”, comentários ao art. 29 do CP, publicado no site Index Jurídico, em 28 de janeiro de 2019, acessado em 10/11/2022 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Referências: BITENCOURT, Cesar Roberto. Tratado de direito penal. v. 1. São Paulo: Saraiva, 2018.

HUNGRIA, Nelson; FRAGOSO, Heleno Cláudio. Comentários ao código penal. v. 1, tomo II. Rio de Janeiro: Forense, 1978.

 

Encerrando com a participação do parecer de Flávio Olímpio de Azevedo, Artigo intitulado “Do Concurso de PessoasComentários ao art. 29 do Código Penal, publicado no site Direito.com:

 

O concurso de agentes (concursus delinquentium), é a combinação de duas ou mais pessoas na coautoria na prática delituosa no iter crimes no concurso.

 

Verificada a divisão de tarefas e o liame subjetivo entre os autores na prática do crime de roubo circunstanciado tentado, caracterizado está o concurso de pessoas.

 

“Pluralidade de comportamento. 1. Deve haver condutas de duas ou mais pessoas, seja realizando o ato típico (coautoria) seja contribuído de algum modo para que outrem o realize (participação). 2. Nexo de casualidade. É indispensável que o comportamento do coautor ou partícipe, seja relevante ou eficaz para a ação ou resultado. 3. Vínculo subjetivo ou psicológico. Não basta nexo causal, sendo necessário que cada concorrente tenha consciência de contribuir com atividade de outrem” (Código Penal comentado, Celso Delmanto et al, ed. Renovar, p. 60).

 

Na codelinquência cessando a ação de cada um dos partícipes responderá pela conduta própria pela transgressão penal, dependendo da intensidade da culpabilidade e tarefa de menor importância conforme preceitua o parágrafo primeiro.

 

No valor de Guilherme de Souza Nucci: “a individualização da pena tem o significado de eleger a justa e a adequada sanção penal, quanto ao montante, ao perfil e aos efeitos pendentes sobre o sentenciado, tornando-o único e distinto dos demais infratores, ainda que coautores ou mesmo corréus. (Individualização da Pena. 6ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 19).

 

O § 2º, ameniza a pena do agente que participou de crime menos grave na ação delituosa bem explicitada pela jurisprudência: “O art. 29, § 2º, do CP, consagra o princípio da individualização da pena no concurso de pessoas, tratando da hipótese denominada “cooperação dolosamente diversa, na qual um dos agentes (participe), queria participar de delito menos agravado que aquele que efetivamente ocorre, devendo, assim, ser responsabilizado, pelo crime do qual quis participar, e não de acordo com aquele realizado pelo autor direito” (JCAT 91/517). (Flávio Olímpio de Azevedo, Formado em Direito pela FMU em 1973. Comentários ao art. 28 do Código Penal, “Do Concurso de Pessoas” publicado no site Direito.com, acessado em 10/11/2022 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

quarta-feira, 9 de novembro de 2022

Direito Civil Comentado - Art. 792, 793, 794 - DO SEGURO DE PESSOA - VARGAS, Paulo S. R. vargasdigitador.blogspot.com - digitadorvargas@outlook.com

 

Direito Civil Comentado - Art. 792, 793, 794
- DO SEGURO DE PESSOA - VARGAS, Paulo S. R.
vargasdigitador.blogspot.com -
digitadorvargas@outlook.com

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações

Título VI – Das Várias Espécies de Contrato

 (Art. 481 a 853) Capítulo XV – DO SEGURO DE PESSOA

 – Seção III - (art. 789 a 802)  

 

Art. 792. Na falta de indicação da pessoa ou beneficiário, ou se por qualquer motivo não prevalecer a que for feita, o capital segurado será pago por metade ao cônjuge não separado judicialmente, e o restante aos herdeiros do segurado, obedecida a ordem da vocação hereditária.

 

Parágrafo único. Na falta das pessoas indicadas neste artigo, serão beneficiários os que provarem que a morte do segurado os privou dos meios necessários à subsistência.

 

Nos termos de Claudio Luiz Bueno de Godoy, como se viu nos comentários ao artigo anterior, a escolha do beneficiário, pelo segurado, é livre, com a ressalva contida no artigo seguinte. Pode essa escolha se dar logo no instante da entabulação ou em momento posterior, inclusive por substituição, também como está no dispositivo antecedente. Cuida-se aqui, porém, da hipótese de faltar, por qualquer motivo, o beneficiário de seguro de vida, portanto quando já também falta o segurado, impondo-se à lei deliberar sobre o destino da importância a ser por isso paga. E, nessa senda, diferentemente do Código de 1916, determina a nova lei que então metade do capital segurado seja entregue ao cônjuge não judicialmente separado do segurado e a outra metade a seus herdeiros, conforme a ordem legal de vocação hereditária (CC 1.822). a inovação, em relação ao Código revogado, está no acréscimo do cônjuge como destinatário de metade da verba do seguro, independentemente do regime de bens do casamento. Exige-se, todavia, que esse casamento, ao tempo da morte, ainda persista, portanto, afastando-se a previsão se houver dissolução da sociedade conjugal por separação judicial.

 

Omite-se, contudo, o artigo em pauta sobre a situação do separado de fato. Veja-se que tal não se deu nem mesmo quando se tratou da situação hereditária do cônjuge, cuja vocação sucessória se condicionou à não ocorrência, ao instante da morte, inclusive de separação de fato, há mais de dois anos, a não ser que sem culpa do sobrevivente. Da mesma forma, no CC 1.642, V, quando se regrou a reivindicação de bem comum doado por cônjuge casado a seu concubino, ressalvou-se a separação de fato já existente, porém, há mais de cinco anos. Pois também na hipótese do dispositivo em discussão, ao que se entende, deve-se ressalvar a separação de fato. Observe-se que a instituição, por lei, de beneficiários subsidiários, atende a um imperativo de solidariedade familiar. É por isso que, além dos herdeiros, hoje o cônjuge é elencado coo tal. Mas, se havida, comprovadamente, separação de fato, rompido está o laço de afetividade que constitui, atualmente, o conteúdo material do casamento. Não por outro motivo é que se permitiu, depois de dois anos dessa separação, o divórcio direto. Não se vê sentido, destarte, em destinar metade do capital segurado a quem, no instante da morte, já estava separado de fato do segurado, mesmo que então já lhe fosse dado estabelecer, como beneficiário, eventual companheiro (CC 793).

 

Aliás, outra omissão do preceito, que não há, por exemplo, na lei previdenciária (Lei n. 8.213/91) e na lei fiscal (Lei n. 9.250/95), está justamente na indicação do companheiro como beneficiário subsidiário, da mesma forma que como tal se institui o cônjuge, do ponto de vista material, havendo igual família no casamento e na união estável, que, afinal, pode ser provada, embora não da mesma maneira apriorística do casamento, porquanto com a apresentação da certidão do respectivo assento. Contudo, note-se que a lei também inclui o companheiro, malgrado em diferentes condições – o que é objeto de proposta de alteração (ver Projeto de Lei n. 276/2007) -, no rol dos sucessores do morto. Por isso, e mesmo que possa haver sua instituição por ato de vontade do segurado (CC 793), entende-se, por interpretação extensiva, dever-se considerar o companheiro, provada a união estável, com todos seus elementos de configuração, ao momento da morte, beneficiário subsidiário do segurado morte, portanto nas mesmas condições do cônjuge não separado.

 

A outra metade do capital segurado, como explicita a lei, vai aos herdeiros do segurado falecido, na ordem da respectiva vocação hereditária. Não havendo cônjuge, companheiro nem herdeiros, em geral, receberá o capital segurado quem comprovar que dependia do segurado e que, assim, com sua morte, ficou privado dos meios necessários à subsistência. Considera-se não se deva dar a essa previsão, também nova, contida no parágrafo do artigo em pauta, interpretação restritiva, exigindo, por exemplo, que o beneficiário seja parente do segurado, bastando que comprove dele depender para sua subsistência. Pense-se no caso de alguém cujas necessidades o segurado voluntariamente provia, mesmo sem dever legal. De seu turno, José Augusto Delgado (Comentários ao novo Código Civil, coord. Sálvio Teixeira de Figueiredo. Rio de Janeiro, forense, 2004, v. XI, t. I, p. 741) exemplifica com os menores não parentes, os incapacitados, os serviçais de idade avançada, enfermeiros e assim por diante – sempre, porém, provado que o sinistro lhes tenha retirado os meios de subsistência.  (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 820-821 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 13/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

 

Há um histórico antecedendo a Doutrina de Ricardo Fiuza: A redação atual é a mesma do projeto. O CC/2002, a rigor, desmembrou o vetusto art. 1.473 do CC de 1916, em dois novos artigos, quais sejam os CC 791 e CC 792. A redação deste último dispositivo identifica-se, parcialmente, com a do art. W do Decreto-Lei n. 5.384, de 8-4-1943, que dispõe sobre os beneficiários do seguro de vida, assim transcrito, in litteris: “Art. I- Na falta de beneficiário nomeado, o seguro de vida será pago metade à mulher e metade aos herdeiros do segurado. Parágrafo único. Na falta das pessoas acima indicadas, serão beneficiários, os que dentro de seis meses reclamarem o pagamento do seguro e provarem que a morte do segurado os privou de meios para proverem sua subsistência. Fora desses casos, será beneficiária a União”.

 

Aplicando a Doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, em se tratando de seguro de vida, é certo que a livre escolha dos beneficiários constitui, por sua própria natureza, preceito basilar dessa espécie de seguro. Por isso, diz-se que o segurado pode, legitimamente, preterir os próprios parentes, em favor de estranhos. É lícito, porém, ao segurado não indicar, desde logo, o nome do beneficiário, ou, fazendo-o, por alguma razão, não prevalecer tal nomeação; nessas duas hipóteses negativas, a lei determina seja o montante segurado pago, pela metade, ao cônjuge não separado judicialmente, revertendo-se a outra metade aos herdeiros do segurado, obedecida, obviamente, a ordem da vocação hereditária.

 

O novel dispositivo privilegia o chamado “beneficiário subsidiário”, quando, na ausência de individuação do beneficiário, coloca o cônjuge, desde que não separado judicialmente, em posição favorável quanto aos demais herdeiros do segurado, à medida que lhe garante, separadamente, o seu respectivo quinhão (1/2 do capital segurado), deixando os demais herdeiros, considerados num todo, com a outra metade do montante.

 

Estando o cônjuge falecido, ou separado judicialmente do segurado, aliado à ausência de qualquer herdeiro deste último, beneficiar-se-ão aqueles que necessitassem do segurado para sua própria subsistência, desde que provem, efetivamente, tal dependência econômica, como condição sine qua non para receber o seguro. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 417 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 13/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

No entender de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a indicação do beneficiário não é obrigatória. Se o estipulante não indicar beneficiário, a lei presume que o seguro foi contratado em favor do cônjuge e dos demais herdeiros do segurado. Cabe a analogia com o cônjuge em favor do companheiro.

 

O dispositivo manda que seja obedecida a ordem de sucessão hereditária. Assim, a existência de descendentes exclui os ascendentes e os colaterais até o 4º grau somente se beneficiam na falta daqueles. A referencia à ordem de vocação hereditária atrais, embora a lei não seja expressa, a observância da proporção a que faz jus os herdeiros beneficiários. Assim, o cônjuge, além de receber a metade do benefício, fará jus, ainda, a uma parte equivalente ao que lhe permitir o direito de concorrer na herança, se incidente. Do mesmo modo, casos netos participem da herança representação, farão jus apenas à parte do herdeiro pré-morto que representarem.

 

Finalmente, se não houver indicação de beneficiários nem herdeiros, o Código permite que terceiros que ficaram privados do necessário para a sua subsistência em razão da morte do segurado possam reivindicar a indenização. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 13.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

 Art. 793. É válida a instituição do companheiro como beneficiário, se ao tempo do contrato o segurado era separado judicialmente, ou já se encontrava separado de fato.

 

Como leciona Claudio Luiz Bueno de Godoy, no Código Civil de 1916, dispunha-se, no art. 1.474, ser vedada a instituição de beneficiário que estivesse inibido de receber, por doação, do segurado. Era o caso, muito especialmente, da doação feita pelo cônjuge casado a seu concubino, regra que se continha no art. 1.177 do Código anterior e que se repete no CC 550 atual. No artigo em pauta, a rigor, implicitamente contempla-se a mesma proibição, mas com a ressalva que em seu texto se expressa. Na verdade, até o artigo diz mais do que precisava, pois o atual Código foi claro ao diferenciar, nos CC 1723 e 1.727, o companheiro do concubino. Para a nova lei, o companheiro mantém união estável, o antigo concubinato puro, destarte envolvente de pessoas sem impedimento para se casar, incluindo, no entanto, o separado de fato (CC 1.723, § 1º), que, certamente, com o divórcio direto, poderá vir a se casar, de resto já com a separação de fato rompendo-se o laço fundamental do casamento, a relação de afetividade que é seu conteúdo material. Quer-se dizer, então, que, se se trata de companheiro, necessariamente será pessoa solteira, divorciada, separada judicialmente ou mesmo de fato. E o companheiro não só não está inibido de receber doação, como, mais, pode ser instituído beneficiário do seguro de vida do segurado com quem mantém união estável.

 

Já se o segurado, ao tempo da instituição, era casado, não separado judicialmente nem de fato, para preservar tal relação, proíbe-se a instituição como beneficiário do seguro de quem então será considerado seu concubino (CC 1.727). Ressalva-se, contudo, a posição externada na obra de Caio Mário da Silva Pereira, atualizada por Régis Fichtner (Instituições de direito civil, 11.ed. Rio de Janeiro, forense, 2004, v. III, p. 465), de que, a rigor, a verificação sobre a situação civil do segurado deve ser contemporânea não ao contrato, mas ao instante da morte; assim, se no momento do falecimento o beneficiário se encontrava separado de fato ou judicialmente, terá sido como que convalidada a instituição. Se esta não é a ilação literal da redação do dispositivo, parece razoável ao menos que, a exemplo do que consta do CC 550 atual e como já se defendia à luz do art. 1.474 do Código anterior (v.g., J.M. Carvalho Santos. Código Civil brasileiro interpretado, 5.ed. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1951, v. XIX, p. 407), se restrinja ao cônjuge, ou a seus herdeiros necessários, a legitimidade exclusiva para questionar o seguro feito ao concubino, à simetria, veja-se, com aquela regra do CC 550. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 822 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 13/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

 

Em sua doutrina, explica Ricardo Fiuza que, no Código Civil de 1916 não se admitia que o beneficiado pelo seguro de vida fosse pessoa a quem o segurado não pudesse ofertar a sua liberalidade (v.g., concubina do segurado casado), tampouco seria lícito, segundo escólio jurisprudencial, o segurado indicar como beneficiário do seguro o filho adulterino, ao argumento de que, presumidamente, este transferiria o beneficia à sua mãe (arts. 1.474 e 1.177). conferir: RI’ 422/335.

 

Com o advento da Carta Magna de 1988, denominada pelo saudoso Ulysses Guimarães, “Constituição Cidadã’, é evidente que tais restrições ruíram por terra, em homenagem aos princípios constitucionais nela albergados. Como ressabido, foi no campo do Direito de Família que a Constituição Federal, havendo incursionado com maior profundidade, veio de reclamar do codificar civil uma nova regulamentação, operando-se, de fato, as novas regras, com destaque marcante, no efeito da presente análise, para a seguinte linha inovativa: a família passou a ser reconhecida e protegida, independentemente do casamento (CC 226, caput e § 32), muito embora a entidade familiar, oriunda de união estável, não alcance a qualificação jurídica inerente àquela relação.

 

Realmente, a partir da Constituição de 1988, o modo da constituição familiar não se tornou exclusivo da união originária do casamento, sendo, igualmente, modelos de família a união estável entre o homem e a mulher, admitida, em toda a sua inteireza, como entidade familiar, e a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes (CC 226, §§ 32 e 42). Por tais razões, a norma confere atualidade constitucional à matéria ora tratada. Dessarte, reconhece-se a união estável como condição de assegurar ao companheiro o direito ao benefício, desde que respeitados os requisitos exigidos no caput. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 418 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 13/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Na toada de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o Código Civil de 2002 resulta do Anteprojeto preparado pela Comissão Reale em 1969. Embora tenha havido a adaptação do projeto de modo a adaptá-lo à Constituição de 1988, muitos de seus dispositivos deixam transparecer noções incompatíveis com o direito atual.

 

O dispositivo estabelece a validade da instituição do companheiro como beneficiário. Contemporaneamente, tal faculdade legal é redundante, uma vez que a união estável goza de proteção estatal. Mais do que poder ser indicado como beneficiário, ao companheiro deve-se dar tratamento análogo ao que é dado pele ao cônjuge em matéria de seguro, inclusive a presunção de que seja beneficiário se nenhum tiver sido indicado.

 

A condição de ser o companheiro separado judicialmente ou separado de fato é redundante, pois predomina o entendimento, baseado no próprio Código Civil, que a união estável somente é possível uma vez que não concorra com o casamento.

 

Gradativamente, no entanto, tem-se reconhecido a existência de uniões paralelas. Se o impedimento é do desconhecimento do companheiro, tem-se a união estável putativa, que não impede o reconhecimento da condição de companheiro. Consequentemente, não incide a proibição do artigo. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 13.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 794. No seguro de vida ou de acidentes pessoais para o caso de morte, o capital estipulado não está sujeito às dívidas do segurado, nem se considera herança para todos os efeitos de direito.

 

Lecionando, Claudio Luiz Bueno de Godoy, explicitando o conteúdo do art. 1.475 do Código Civil de 1916, que, como aponta Clóvis Beviláqua (Código Civil comentado, 4.ed. Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1939, v. V, p. 237-8), havia sido já objeto de polêmica na tramitação do projeto, acentua o atual Código que, nos seguros de pessoa em que o sinistro seja o evento morte, real ou presumida – discutindo-se, nesse caso, se só aquela do art. 7º ou também a ausência (pela orientação positiva, veja João Marcos Brito Martins. O contrato de seguro. Rio de Janeiro, Forense Universitária, 2003, p. 145) -, referindo, portanto, dentre as diversas hipóteses de cobertura pessoal, (invalidez, educacional, por sobrevivência), o seguro de vida e de acidentes pessoais, no caso de falecimento do segurado, o capital estipulado não se considera herança, para todos os efeitos. Isso porque, nessas hipóteses, ocorrido o sinistro, o capital segurado pertence a um beneficiário que é necessariamente um terceiro. ou seja, segurado e beneficiário, nesses casos, obviamente não podem ser uma só pessoa. E, sendo assim, tratando-se de valor pertencente ao beneficiário, não se sujeita às dívidas do segurado nem se considera herança, pois, se instituído, pelo contrato, em favor de um herdeiro necessário, por exemplo, não está submetido à colação. Não por diverso motivo a previa o art. 649, VI, do Código de Processo Civil, ser impenhorável o seguro de vida. Apenas há a se ressalvar o entendimento, que já se esposava antes do atual Código, de que pelos prêmios atrasados responde o capital segurado, mesmo no seguro de via, uma vez que, afinal, é a fonte de seu custeio ou da composição do fundo que o suporta (ver comentário ao CC 757). (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 822 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 13/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

 

Segundo a doutrina de Fiuza, pela simples leitura desse dispositivo, percebe-se, claramente, que a verba oriunda de segura não está sujeita à execução, não podendo, ipso facto, ser dada em garantia, porque impenhorável (art. 649, IX, do CPC/1973, com correspondência no art. 833, do CPC/2015).

 

Noutro prumo, porém, a jurisprudência tem averbado que “é lícito estipular que a soma do seguro responda pelo pagamento dos prêmios atrasados ou empréstimos feitos pelo próprio segurado sobre a apólice” (RT, 131/725).

 

Além da vedação da penhora, o capital estipulado não se comunica com a herança, para os efeitos legais. Trata-se de previsão legítima e razoável, ou, porque não dizer, inteiramente lógica. Ora, a inclusão do montante, estipulado no seguro, no acervo hereditário, colocando o beneficiário, quanto a essa estipulação, em igualde de condições com os demais herdeiros, representaria um verdadeiro contrassenso. É que, se o segurado almeja privilegiar o beneficiário, com a antedita estipulação, este passaria a repousar numa situação assaz desvantajosa, à medida que concorreria com todos os herdeiros do segurado para receber o prêmio, desvirtuando, por completo, a essência da doação.

 

Em verdade, ocorrendo o sinistro, que, nesse caso, seria a morte do segurado, o prêmio deve reverter-se, sem dúvida, em favor do beneficiário, já que, a rigor, aquele montante jamais integrou o patrimônio do segurado para ser considerado como parte da herança por este último deixada. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 418 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 13/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

No vislumbre de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a indenização consiste em direito subjetivo do beneficiário. Não compõe o patrimônio do segurado. Em razão disso, a indenização não fica sujeita a cobrir eventuais dívidas do segurado. Do mesmo modo, não compõe a herança. Sobre ela não há incidência de imposto de transmissão causa mortis, nem direitos dos herdeiros, salvo se não houver indicação de beneficiário. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 13.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Comentários ao Código Penal – Art. 28 Emoção, paixão e embriaguez VARGAS, Paulo S. R. vargasdigitador.blogspot.com – digitadorvargas@outlook.com –

 

Comentários ao Código Penal – Art. 28

Emoção, paixão e embriaguez

VARGAS, Paulo S. R.
vargasdigitador.blogspot.com –
digitadorvargas@outlook.com
 –

Whatsapp: +55 22 98829-9130

Parte Geral –Título III – Da

Imputabilidade Penal

Emoção, paixão e embriaguez (Redação dada pela Lei na 7,209, de 11/7/1984)

Art. 28. Não excluem a imputabilidade penal: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11/7/1984.)

 

I - a emoção ou a paixão; (Redação dada pela Lei nº 7.209, deli !7/l984).

 

Embriaguez

 

II - a embriaguez, voluntária ou culposa, pelo álcool ou substância de efeitos análogos. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11/7/1984).

 

§ 1º. É isento de pena o agente que, por embriaguez completa, proveniente de caso fortuito ou força maior, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11/7/1984).

 

§ 2º. A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, por embriaguez, proveniente de caso fortuito ou força maior, não possuía, ao tempo da ação ou da omissão, a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11/7/1984).

 

Importantes apreciações de Greco, Rogério. Código Penal: Comentado. 5ª ed. – Niterói, RJ: Comentários à “Emoção, paixão e embriaguez” – Art. 28 do CP, p. 83-86:

 

Emoção e paixão - O inciso I do art. 28 do Código Penal assevera que a emoção e a paixão não excluem a imputabilidade penal. A emoção, segundo Montovoní, “é uma intensa perturbação afetiva, de breve duração e, em geral, de desencadeamento imprevisto, provocada como reação afetiva a determinados acontecimentos e que acaba por predominar sobre outras atividades psíquicas (ira, alegria, medo, espanto, aflição, surpresa, vergonha, prazer erótico etc.). Paixão é um estado afetivo violento e mais ou menos duradouro, que tende a predominar sobre a atividade psíquica, de forma mais ou menos alastrante ou exclusiva, provocando algumas vezes alterações da conduta que pode tomar-se de todo irracional por falta de controle (certas formas de amor sexual, de ódio, de ciúme, de cupidez, de entusiasmo, de ideologia política)". (Apud SILVA FRANCO, Alberto. Código penal e sua Interpretação jurisprudencial - Parte geral), v. I, I.I, p. 430).

 

Crime passional - Com essa redação, o Código Penal permitiu a punição dos chamados crimes passionais, ou seja, aqueles que são motivados por uma intensa paixão ou emoção. Os crimes passionais, como sabemos, são alegados com frequência perante o Tribunal do Júri, cuja composição do Conselho de Sem- tença é formada, geralmente, por pessoas leigas, que desconhecem as leis penais, julgam de acordo com o próprio sentimento e colocam na urna o voto da sua consciência. Não precisam motivar suas decisões, razão pela qual aceitam as teses, tanto da acusação como da defesa, que mais lhe satisfazem a natureza. Com muita frequência, os jurados acolhem o descontrole emocionai do réu e o absolvem do crime por ele cometido. Embora a perturbação mental sofrida pelo réu, advinda da sua emoção ou paixão, não afaste, no juízo singular, sua imputabilidade, isso não impede que os seus pares o absolvam, após se colocarem no lugar do agente. (Merece registro o pensamento de Roberto Lyra, quando diz que “o verdadeiro passional não mata. O amor é, por natureza e por finalidade, criador, fecundo, solidário, generoso. Ele é o cliente das pretorias, das maternidades, dos lares e não dos necrotérios, dos cemitérios, dos manicômios. O amor, o amor mesmo, jamais desceu ao banco dos réus. Para os fins da responsabilidade, a lei considera apenas o momento do crime. E nele o que atua é o ódio. O amor não figura nas cifras da mortalidade e sim nas da natalidade; não tira, põe gente no mundo. Está nos berços e não nos túmulos" (Como julgar, como defender, como acusar, p. 97).

 

Sob o domínio de violenta emoção e sob a influência de violenta emoção - Existe diferença, de acordo com a redação do Código Penal, entre o domínio e a influência de violenta emoção, sendo aquele um sentimento arrebatador, que pode conduzir a redução da pena na hipótese prevista no § 1º do art. 121 do estatuto repressivo, e esta última, sendo de menor intensidade, importará na aplicação da circunstância atenuante prevista no art. 65, III, c, do mesmo diploma penal.

 

Embriaguez alcoólica - Na definição de Eduardo Rodrigues, embriaguez alcoólica é a “perturbação psicológica mais ou menos intensa, provocada pela ingestão do álcool, que leva à total ou parcial incapacidade de entendimento e volição”. (RODRIGUES, Eduardo Silveira Meio. A embriaguez e o crime, p. 9).

 

Actio libera in causa - Na precisa definição de Narcélio de Queiroz, deve-se entender por actio libera in causa “os casos em que alguém, no estado de não imputabilidade, é causador, por ação ou omissão, de algum resultado punível, tendo se colocado naquele estado, ou propositadamente, com a intenção de produzir o evento lesivo, ou sem essa intenção, mas tendo previsto a possibilidade do resultado, ou, ainda, quando a podia ou devia prever”. (QUEIROZ, Narcélio de. Teoria da “actio libera in causa" e outras teses, p. 37).

 

Pela adoção da teoria da actio libera in causa (embriaguez preordenada), somente nas hipóteses de ebriez decorrente de ‘caso fortuito’ ou ‘forma maior’ é que haverá a possibilidade de redução da responsabilidade penal do agente (culpabilidade), nos termos dos §§ 1º e 2º do art. 28 do Código Penal. Em que pese o estado de embriaguez possa, em tese, reduzir ou eliminar a capacidade do autor de entender o caráter ilícito ou determinar-se de acordo com esse entendimento, tal circunstância não afasta o reconhecimento da eventual futilidade de sua conduta. Precedentes do STJ (STJ, REsp. 908.396/MG, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 5ª T. (DJe 30/3/2009).

 

O regramento do nosso Código Penal, quanto à imputabilidade, adota, em seu art. 28, II, a teoria da actio libera in causa, segundo a qual considera-se imputável quem se põe em estado de inconsciência ou de incapacidade de autocontrole, seja dolosa ou culposamente, e nessa situação comete o crime (TJMG, AC

1.0352.03.007518-3/001, Relª. Desª. Maria Celeste Porto, DJ 24/2/2007).

 

A aplicação da teoria da actio libera in causa exige que se analise o elemento subjetivo do agente no momento anterior ao fato (TJMG, AC 2.0000.00.491860-5/000, Rel. Des. Alexandre Victor de Carvalho, DJ 12/11/2005).

 

Embriaguez voluntária - A embriaguez voluntária se biparte em voluntária em sentido estrito e culposa. Diz-se voluntária em sentido estrito a embriaguez quando o agente, volitivamente, faz a ingestão de bebidas alcoólicas com a finalidade de se embriagar. É muito comum essa espécie de embriaguez, haja vista que principalmente os jovens, quando querem comemorar alguma data que considerem importante, dizem que “beberão até cair”. Querem, outrossim, colocar-se em estado de embriaguez.

 

Culposa é aquela espécie de embriaguez, também dita voluntária, em que o agente não faz a ingestão de bebida alcoólica querendo embriagar-se, mas, deixando de observar o dever de cuidado, ingere quantidade suficiente que o coloca em estado de embriaguez. Nessa hipótese, o agente, por descuido, por falta de costume ou mesmo sensibilidade do organismo, embriaga-se sem que fosse sua intenção colocar-se nesse estado.

 

Nas duas modalidades de embriaguez voluntária, o agente será responsabilizado pelos seus atos, mesmo que, ao tempo da ação ou da omissão, seja inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento. Se sua ação, como diz a teoria da actio libera in causa, foi livre na causa, ou seja, no ato de ingerir bebida alcoólica, poderá o agente ser responsabilizado criminalmente pelo resultado.

 

A embriaguez voluntária não é causa de exclusão da imputabilidade penal, nos termos do artigo 28, inciso II, do Código Penal. Aplicação da teoria da actio libera in causa, segundo a qual considera-se imputável quem se coloca em estado de inconsciência ou de incapacidade de autocontrole, de forma dolosa ou culposa, e nessa situação comete o crime (TJES, ACr. 11080061911, 2ª Câm. Crim., Rel. Des. Subst. Walace Pandolpho Kiffer, DJES 13/8/2010, p. 191).

 

Embriaguez involuntária - A embriaguez involuntária pode ser proveniente de caso fortuito ou força maior.

 

Costuma-se chamar de caso fortuito o evento atribuído à natureza e força maior aquele produzido pelo homem. Assim, no clássico evento daquele que, em visita a um alambique, escorrega e cai dentro de um barril repleto de cachaça, se, ao fazer a ingestão da bebida ali existente, vier a embriagar-se, sua embriaguez será proveniente de caso fortuito. Suponhamos, agora, que durante um assalto a vítima do crime de roubo, após ser amarrada, seja forçada a ingerir bebida alcoólica e venha a se embriagar. Essa embriaguez será considerada proveniente de força maior.

 

Para que possa ser afastada a culpabilidade do agente, isentando-o de pena, é preciso, conforme determina o § 1º do inciso II do art. 28 do Código Penal, que a involuntária e completa embriaguez do agente seja conjugada com sua total incapacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

 

Isenção de pena na Lei Antidrogas - Da mesma forma que a embriaguez completa, proveniente de caso fortuito ou força maior, também isenta de pena, como vimos, deverá ser considerado isento de pena o agente que, nos termos do art. 45 da Lei Antidrogas, sob o efeito de droga, proveniente de caso fortuito ou força maior, era, ao tempo da ação ou da omissão, qualquer que tenha sido a infração penal praticada, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

 

Sérgio Ricardo de Souza, analisando com precisão o mencionado artigo, preleciona que “não está afastada a possibilidade de aplicação dessa causa de exclusão da imputabilidade em relação a qualquer dos crimes previstos nesta Lei, desde que fique demonstrado que, em razão da dependência, ou sob o efeito, proveniente de caso fortuito ou força maior, de droga, o agente era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento e isso resta evidente, por estar expressamente previsto na cabeça do art. 45 que ele se aplica ‘qualquer que tenha sido a infração penal praticada'. A ênfase do legislador serve para afastar controvérsias jurisprudenciais que estiveram presentes na vigência das leis revogadas, havendo quem entendesse que a referida causa de inimputabilidade não se aplicava ao tráfico”. (SOUZA, Sérgio Ricardo de. A nova lei antidrogas, p. 72).

 

Embriaguez involuntária incompleta - Prevista pelo § 2º do art. 28 do Código Penal, continua a exigir a embriaguez involuntária, proveniente do caso fortuito ou de força maior, contudo, tal embriaguez não é completa e, em virtude disso, o agente tem alguma capacidade de, ao tempo da ação ou da omissão, entender o caráter ilícito do fato ou determinar-se de acordo com esse entendimento. Dessa forma, o fato por ele cometido é considerado típico, ilícito e culpável. Dado o seu estado de embriaguez involuntário, o juízo de censura sobre sua conduta será menor, razão pela qual sua pena deverá ser reduzida de um a dois terços.

 

Redução de pena na Lei Antidrogas - O art. 46 da Lei Antidrogas, tal como o § 2º do art. 28 do Código Penal, prevê uma causa de redução de pena dizendo:

 

Art. 46. As penas podem ser reduzidas de um terço a dois terços se, por força das circunstâncias previstas no art. 45 desta Lei, o agente não possuía, ao tempo da ação ou da omissão, a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

 

A embriaguez só é proveniente de caso fortuito quando o sujeito desconhece o efeito inebriante da substância que ingere. Sendo voluntária, não há falar-se em exclusão da responsabilidade penal do réu (TJMT. AP., Rel. Flávio José Bertin, j. 7/4/1999. RT 768/650.

 

Se o agente não provar desconhecer os efeitos inebriantes da substância que o embriagou ou ignorar especial condição fisiológica que o predispunha à embriaguez completa, descabe invocar em seu favor, validamente, a descriminante prevista no art. 28, II, 1º, do CP (TJBA, Ap. Crim. 19.405-4795. Rel. José Alfredo, j. 13/06/1995) (Greco, Rogério. Código Penal: Comentado. 5ª ed. – Niterói, RJ: Comentários à “Da Imputabilidade Penal – Emoção, paixão ou embriaguez” – Art. 28 do CP, p. 83-86. Editora Impetus.com.br, acessado em 08/11/2022 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Ainda tratando da imputabilidade penal, neste artigo, Victor Augusto em artigo intitulado “Da Imputabilidade Penal – Emoção, paixão ou embriaguez”, comentários ao art. 28 do CP, publicado no site Index Jurídico, importa a definição destes estados:


Emoção e paixão - são estados psicológicos relacionados com a intensificação dos sentimentos de um indivíduo. Para autores como Hungria (1978), pode-se afirmar que a emoção é uma descarga sentimental repentina, enquanto a paixão corresponderia a um estado sentimental crônico e prolongado.

Pode dizer-se que a paixão é a emoção que protrai no tempo, incubando-se, introvertendo-se, criando um estado contínuo e duradouro de perturbação afetiva em torno de uma ideia fixa, de um pensamento obsidente. A emoção dá e passa; a paixão permanece, alimentando-se de si própria. HUNGRIA; FRAGOSO, 1978, P. 369.

 

De qualquer forma, nenhum destes dois estados permite a isenção de responsabilidade penal. De fato, quando muito, a violenta emoção decorrente de provocação injusta da vítima pode justificar a atenuação da pena:


Art. 65 – São circunstâncias que sempre atenuam a pena: 

III – ter o agente: c) cometido o crime sob coação a que podia resistir, ou em cumprimento de ordem de autoridade superior, ou sob a influência de violenta emoção, provocada por ato injusto da vítima; Código Penal.

embriaguez, a seu turno, é o estado de torpência causado por álcool ou outra substância de efeitos análogos (opióides, cocaína, barbitúricos etc.). Ela pode ser completa (o indivíduo perde completamente a noção e controle psicomotor, tornando-se inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento) ou parcial (o indivíduo bêbado ainda mantém certa consciência e controle dos seus atos, mas tem apenas parcial capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento).

Quando voluntária (o indivíduo deliberadamente queria ficar embriagado) ou culposa (o indivíduo engana-se sobre sua resistência diante da substância), a embriaguez que precede o delito não exclui a responsabilidade penal, independentemente de ser completa ou parcial. Nestes casos, entende-se que ação nasceu livre, mesmo que, quando da sua execução, o indivíduo não tinha mais controle sobre suas condições psicomotoras.

É a aplicação da máxima actio libera in causa (ação livre na causa, na origem).

Então imagine que o indivíduo, para tomar “coragem”, embebeda-se antes de enfrentar o desafeto (a chamada embriaguez preordenada), vindo a lesionar este. Responderá como se não houvesse se embriagado.

Na hipótese de a embriaguez decorrer de caso fortuito ou força maior (assim como outras situações involuntárias), é necessário aferir se o grau daquela. Se completa, é excluída a imputabilidade, a culpabilidade e, consequentemente, o próprio crime. Se parcial, a pena será reduzida de um a dois terços (1/3 a 2/3).

Lembre-se do exemplo clássico, citado acima, do indivíduo que está passeando em uma cervejaria e fortuitamente cai dentro do barril cheio de cerveja, saindo de lá completamente alterado e vindo a cometer um crime. (Victor Augusto em artigo intitulado “Da Imputabilidade Penal – Emoção, paixão e embriaguez”, comentários ao art. 28 do CP, publicado no site Index Jurídico, em 24 de janeiro de 2019, acessado em 09/11/2022 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Seguindo a mesma linha de raciocínio de Greco e Victor Augusto, as apreciações de Flávio Olímpio de Azevedo, Artigo “Da Imputabilidade Penal – Emoção, paixão e embriaguezComentários ao art. 28 do Código Penal, publicado no site Direito.com:

 

A diferença de emoção e paixão é tempo de duração dessas anomalias. Emoção é a sensação física provocada por algum estilo: é transitória, comoção ou excitação. Perturbação passageira é estado afetivo que causa um repentino desequilíbrio no estado psíquico, tem curta duração para voltar ao estado normal; v.g., raiva, alegria, medo, coragem, surpresa, prazer erótico etc.

 

A paixão é um abalo profundo, intenso, afetivo ou moral, é durador estado crônico, arrasta-se no tempo. Possui a capacidade de alterar o comportamento, o pensamento: grande atração por alguma coisa ou pessoa; ódio, vingança, ciúmes etc.

 

A emoção e paixão são protagonistas de muitos crimes passionais praticados contra a honra, por vez homicídio e feminicídio, agindo quanto o autor é rejeitado pela vítima, mas não excluem a imputabilidade penal.

 

Os crimes passionais são geralmente de relacionamentos amorosos, mas não excluem a imputabilidade penal, como bem colocado pelo seguinte julgado:

 

Ameaça. Violência doméstica. Forte emoção ou paixão. Palavra da vítima. 1. Não se exige tranquilidade e reflexão por parte do autor das ameaças. O estado de ira, paixão ou forte emoção, portanto, precedem ou são concomitantes à prática do delito. E não excluem a imputabilidade penal (art. 28, I, do CP). 2. Nos crimes praticados em situação de violência doméstica e familiar, a palavra da vítima tem especial relevância, sobretudo se corroborada pelo depoimento de testemunha. 3. Apelação não provida. (TJDF 20170310064429 DF 0006340-2017.8.07.0003. Relator: Jair Soares. Dje 13/03/2018, p. 187/199).

 

Embriaguez é o estado que se encontra o agente decorrente de intoxicação aguda e transitória, causada pela ingestão de álcool ou substância análoga que diminui a capacidade de compreensão em situação que exijam capacidade de avaliação, enfim, separar o certo do errado pela perda de raciocínio e autodeterminação.

 

A mens legis foi definir a embriaguez em graus de intensidade e formas: a) voluntária: quando o agente ingere bebida alcoólica conscientemente e, sabedor que pelo volume ingerido pode levar ao estado de embriaguez; b) embriaguez acidental: “derivada de caso fortuito ou força maior – na primeira, não há vontade ou culpa; o agente não a quis, nem previu se podia fazê-lo; na segunda decorre da inevitabilidade – exclui a imputabilidade penal, se completa; reduz a pena se incompleta (art. 28, II, §§ 1º e 2º, do CP – Comentários ao Código Penal, Luiz Regis Prado, 2ª ed., p. 165, ed. RT.).

 

Não acidental: quando o agente não tem intenção de se embriagar, derivada do caso fortuito ou da força maior, desconhece que determinada substância produz embriaguez, desconhecendo a graduação alcoólica ou forçada por terceiros.

 

Embriaguez preordenada: O agente se embriaga para encorajar-se a praticar o crime. O crime é caracterizado pela anterioridade, pela premeditação, conduz a agravação e ao cometimento de ato típico planejado, sob o efeito do álcool.

 

Pena de embriaguez: A embriaguez voluntária ou preordenada é agravante e punível em ordenamento jurídico em vários Códigos. Art. 70 do CPM: ter cometido o crime, depois de embriagar-se; art. 202 do mesmo Código: embriaguez em serviço. Lei de contravenções, art. 62, apresentar-se publicamente em estado de embriaguez. O CTN pune o motorista, art. 306: Conduzir veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa.

 

Atenuantes, agravantes e excludentes – “no que se refere aos efeitos jurídicos das várias formas de embriaguez, há a considerar que embriaguez acidental completa, se incapacitar o agente de entender o caráter ilícito do fato ou determinar-se de acordo com esse entendimento, torna-se isento de pena. Se embriaguez acidental for incompleta, subtraindo ao agente a plena capacidade de entendimento ou reduzindo-lhe a determinação, atuará como causa de diminuição da pena. (Código Penal comentado. Paulo José da Costa, 9ª ed. DPJ, p. 118).

 

A embriaguez preordenada já explicitada é fator de agravamento da pena nos termos do art. 61, I e II do Código Penal.

 

Conforme a teoria da actio libera in causa não exclui a imputabilidade, a embriaguez voluntária ou culposa. O agente não pode isentar-se da responsabilidade penal diante da sua conduta delituosa.

 

A embriaguez patológica é considerada doença mental e resulta em tornar o agente inimputável, mas é necessária prova cabal da defesa, mediante prova pericial.

 

Nota: Vide arts. 62 e 63 da Lei de Contravenções Penais (Decreto 3.688 de 3.10.1941). (Flávio Olímpio de Azevedo, Formado em Direito pela FMU em 1973. Comentários ao art. 28 do Código Penal, “Da Imputabilidade Penal – Emoção, paixão ou embriaguez” publicado no site Direito.com, acessado em 09/11/2022 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).