349. audiência de
conciliação
A lei prevê duas audiências no procedimento sumário: a
primeira destinada à conciliação e a eventual resposta do réu; a segunda, à
instrução e julgamento.
Não se abrem o contraditório e a instrução sem antes tentar a
solução conciliatória. A citação, por isso, é para conciliação, em primeiro
lugar. Somente depois de frustrada a solução negocial é que o réu produzirá sua
contestação, ainda dentro da audiência inaugural (art. 278).
Chegando as partes a um acordo, a conciliação será reduzida a
termo e homologada pelo juiz, tudo na própria audiência (art. 277, § 1º). Tanto
o acordo como ao homologação ficarão constando da ata da audiência, produzindo
sua plena eficácia, independentemente de qualquer outra intimação.
Para estimular a composição negocial dos litígios, que além
de mais econômica é quase sempre melhor do que a imposta pela sentença, a Lei
nº 9.245/95 previu a possibilidade de o juiz ser auxiliado na audiência de
conciliação por um “conciliador”, que se encarregará de ouvir as partes e de
incentivá-las a transigir (art. 277, § 1º). O recurso a esse auxiliar do juízo
dependerá de lei local para criar o respectivo cargo ou para disciplinar a
função independentemente da criação de cargo específico.
A ideia de agregar ao juízo a figura do conciliador já está
em prática há algum tempo na França, graças à sistemática de seu novo Código de
Processo Civil, que não só fez integrar à função do juiz a tarefa de “conciliar
as partes”, como instituiu em todo órgão judicial o agente auxiliar denominado “conciliador”,
e que é escolhido entre “notáveis” ou “juízes aposentados”. Esse conciliador
não é um magistrado, pois sua função não é julgar, mas apenas aproximar as
posições litigiosas, na tentava de que as próprias partes encontrem uma solução
para suas divergências. Trata-se de uma providência integrante da política
moderna de aceleração da prestação jurisdicional, que opera por meio de uma
espécie de “justiça consensual” e que vem desfrutando de todos os favores do
legislador francês. Nela se enxerga um meio de aliviar os tribunais e de tornar
mais humana a justiça. A doutrina aplaude o programa do legislador e considera
a “justiça consensual” intimamente ligada “à ideia de que neste fim de século
XX, o jurisdicionado aspira a uma Justiça mais simples, menos solene, mais
próxima de suas preocupações quotidianas, àquilo que numa palavra se denomina
uma justiça de proximidade”.
Para facilitar o acesso à solução negocial, a lei impõe a
necessidade de as partes estarem presentes à audiência de conciliação, ou, pelo
menos, fazerem-se representar por preposto com poderes para transigir (art.
277, § 2º).
Visando a acelerar a marcha do procedimento sumário,
estipulou-se que a designação da audiência conciliatória se dê para 30 dias, no
máximo (art. 277), o que não será difícil de cumprir-se, visto que, limitada à
tentativa de composição negocial, a audiência não demandará sessão demorada,
tanto mais que o juiz pode servir-se do auxílio de conciliador para abreviar o
contato com as partes.
Ao despachar a inicial, também, não deve se preocupar com o
saneamento de questões preliminares mais complicadas, pois poderão restar
prejudicadas pela composição eventual entre as partes. Assim, salvo falhas
grosseiras da petição inicial, que o juiz não terá como ignorar e deixar de
coibir desde logo, o mais comum será a designação pura e simples da audiência
de conciliação.
Fracassada a tentativa de acordo, aí sim, o magistrado, ainda
na audiência, examinará as preliminares, mormente aquelas que dizem respeito ao
valor da causa (art. 275, I) e à natureza da demanda (art. 275, II). Reconhecendo
que a causa não se enquadra no campo que a lei destina ao procedimento sumário,
determinará, de plano, a sua conversão para o rito ordinário (art. 277, § 4º). Nesse
caso, se a causa ainda não foi contestada, o juiz encerrará a audiência e
abrirá o prazo normal de resposta previsto para o rito ordinário.
Haverá, também, conversão para o rito ordinário quando o juiz,
no exame da inicial, se convencer de que, pela exposição dos fatos e dos
fundamentos de direito, a solução da causa estiver a exigir prova pericial de
maior complexidade (art. 277, § 5º).
Ainda na audiência inicial, caberá ao juiz, se não obtida a
conciliação:
a)
Receber a contestação, escrita ou oral (art.
278, caput);
b)
Decidir sobre as provas ainda cabíveis
(testemunhas e perícia, principalmente);
c)
Se couber perícia, nomeará o perito e marcará o
prazo de pelo menos 20 dias, antes da audiência de instrução e julgamento (art.
433, caput);
d)
Designará audiência de instrução e julgamento,
para data próxima, não excedente de 30 dias, salvo se houver determinação de
perícia (art. 278, § 2º).
349-a. Audiência de instrução e julgamento
Somente ocorrerá a segunda audiência, destinada à instrução e
julgamento, se, após a frustração da tentativa de conciliação, houver
necessidade de colher prova oral para dirimir a lide. Portanto, mesmo depois de
oferecida a contestação na primeira audiência, não será designada a segunda se
o juiz verificar:
a)
Que deve extinguir o processo por falta
insanável de pressuposto processual ou condição da ação (art. 278, § 2º, c/c
art. 267, IV e VI);
b)
Que deve proferir julgamento antecipado da
lide, por desnecessidade de prova oral diante da natureza puramente documental
da prova, da presunção legal de veracidade dos fatos alegados pela parte ou da
circunstância de ser puramente de direito a controvérsia a solucionar (art.
278, § 2º, c/c art. 330, I e II).
A designação da audiência de instrução e julgamento será para
data que não ultrapasse 30 dias a contar da audiência de conciliação, prazo que
deverá ser ampliado se houver determinação de perícia (art. 278 § 2º).
Na documentação dos atos probatórios realizados na audiência
(depoimentos de partes e testemunhas e esclarecimentos de perito), usar-se-ão,
de preferência, métodos como a estenotipia. Far-se-á constar do registro comum
do depoimento, onde não for possível o uso da estenotipia ou taquigrafia, “apenas
o essencial” (art. 279, parágrafo único).
Tudo o que o juiz decidir em audiência de instrução e
julgamento somente poderá ser impugnado por meio de agravo retido manifestado
imediatamente e sob a forma oral (art. 523, § 3º, com a redação da Lei nº
11.187, de 19.10.2005). Com isso, busca-se eliminar os inconvenientes e
embaraços da formação do agravo de instrumento durante a marcha processual. Regra,
aliás, que foi generalizada pelas Leis nºs 10.352/01 e 11.187/2005,
de modo a abranger todo e qualquer procedimento.
A audiência deve permitir às partes o debate oral, após a
coleta das provas orais. E a sentença, em princípio, deverá ser proferida pelo
juiz na própria audiência. Se não for possível, terá 10 dias de prazo para
fazê-lo, depois de encerrada a audiência final (art. 281).
350. Revelia
Ocorre a revelia no procedimento sumário, nos mesmos casos e
com os mesmos efeitos previstos para o procedimento ordinário. Há, porém, uma
novidade introduzida pela Lei nº 9.245/95, no texto do art. 277, § 2º: o não
comparecimento do réu à audiência de conciliação, sem justificativa, importa
por si só confissão quanto à veracidade dos fatos alegados pelo autor na
inicial. Isto quer dizer que, se o réu não se fizer presente ou não enviar
preposto credenciado para transigir (art. 277, § 3º), o juiz não designará
audiência de instrução e julgamento. É que estará, desde logo, autorizado a
proferir a sentença de mérito, nos termos do art. 330 (julgamento antecipado da
lide), circunstância também prevista no art. 278, § 2º (na redação da Lei nº
9.245, de 26.12.95), como impedimento à realização da segunda audiência do
procedimento sumário.
Nas hipóteses de réu preso, ou citado por edital ou com hora
certa (art. 9º, II), o juiz nomeará curador especial na própria audiência. Se o
advogado nomeado estiver presente e declarar-se em condições de defender o réu,
a audiência poderá ter prosseguimento. Mas se requerer prazo para preparar a
resposta em nome do revel, deverá o juiz suspender os trabalhos, de maneira que
o curador disponha, pelo menos, dos 10 dias a que alude o art. 278 (ver, retro, nº 348).
351. Declaratória incidental, intervenção de
terceiros, litisconsórcio e assistência
Para agilizar o procedimento sumário, eliminando as causas
mais comuns de embaraço e retardamento da marcha processual, a Lei nº 9.245/95
havia vedado, com a redação dada ao art. 280, I, todas as formas de intervenção
de terceiros, com exceção apenas da assistência e do recurso de terceiro
prejudicado. Posteriormente, com a Lei nº 10.444/02, que novamente alterou o
art. 280, permitiu-se também a intervenção de terceiro fundada em contrato de
seguro.
Coma mesma preocupação, ficou interditada a ação declaratória
incidental e, consequentemente, o incidente de falsidade, que, como se sabe, é
uma simples modalidade de declaratória incidental (ver, retro, nº 346).
As matérias que a parte queira opor a terceiros terão de ser
objeto de ação apartada, de maneira a não prejudicar a tramitação e julgamento
da ação sumária, dentro da celeridade programada pela lei.
Quanto à assistência e à citação de litisconsortes
necessários, não há restrição alguma. A primeira deverá ser admitida sem
prejuízo do andamento regular do feito, e a segunda mediante o necessário
adiamento da audiência, para que o litisconsorte seja convocado a participar da
instrução e julgamento, caso a citação já não tenha sido determinada, de
ofício, pelo juiz, no despacho da petição inicial.
Da mesma forma, não há empecilho a que se use o chamamento ao
processo da seguradora nas hipóteses de direito à cobertura prevista em
contrato de seguro de responsabilidade civil, a que se use a intervenção de
terceiro com base em pretensão fundada em contrato de seguro (v., retro, nºs 115 e 124-b).
352. Direito intertemporal
O Código revogado não previa o procedimento sumário, mas o
novo estatuto determinou que suas disposições fossem aplicadas desde logo aos
processos pendentes (art. 1.211).
Como proceder-se à adaptação, ao rito sumário, de causas em
andamento que tiveram, assim, seu ajuizamento sob rito ordinário?
A orientação assentada pela jurisprudência resolveu o
impasse, com base na melhor doutrina, a seguir exposta.
A feição própria do procedimento sumário é adquirida a partir
da própria inicial (Código de Processo Civil, art. 276). “Esta sua
configuração, que surge, portanto, da propositura da ação, impede que, iniciada
a demanda pelo procedimento ordinário e até contestada, tal ainda na vigência
da antiga lei adjetiva civil, venha, quando em grau de recurso, e aí já
vigorando o novo Código”, a ser aplicado o regime recursal do procedimento
sumário.
Sob esse mesmo prisma, para os feitos ainda em primeiro grau
de jurisdição, “se a citação ocorreu na vigência da lei processual revogada,
será de todo impossível a conversão do processo de rito ordinário em sumário”
Em suma, o que prevaleceu na transição do Código de 1939 para
o de 1973 foi a tese de que o rito novo só devia atingir as causas ordinárias
ajuizadas anteriormente à vigência do último, quando o réu ainda não tivesse
sido citado, caso em que o juiz mandaria o autor adaptar sua petição ao art.
276 e citaria o demandado, já na forma do art. 278.
O mesmo princípio deve prevalecer em relação às inovações
procedimentais criadas pela Lei nº 9.245, de 26.12.95. dessa forma, se a
audiência já se realizou sob o regime do texto antigo do Código, nada
praticamente será mudado: a contestação, ou revelia, já terá acontecido e seus
efeitos haverão de ser respeitados. Válidas serão também as intervenções de
terceiros já requeridas, como denunciação da lide, nomeação à autoria,
chamamento ao processo etc.
Se, porém, o processo estiver em sua fase inicial, deverá o
juiz seguir inteiramente o novo rito, realizando a audiência de conciliação e
observando, daí em diante, todos os trâmites preconizados pela Lei nº 9.245/95.
Não poderá, todavia, aplicar ao réu a pena de confesso pelo
seu não comparecimento à audiência, se seu advogado estiver presente e
apresentar defesa. É que, segundo o texto inovado do art. 277, caput, a sanção em foco depende de
prévia advertência a ser incluído no ato citatório. Se, pois, a citação se deu
na forma da lei anterior, sem a advertência reclamada pela lei atual, não
haverá como presumir a veracidade dos fatos alegados pelo autor, somente porque
o réu não compareceu e não justificou sua ausência à audiência.
Quanto às causas que se iniciaram sob rito sumário e com a
nova redação do art. 275, II, deixaram de ser incluídas no respectivo rol,
deverão prosseguir no rito sob o qual se estabeleceu o contraditório. Se o
contraditório, ainda, não se iniciou, deverá ser aberto sob o procedimento
ordinário.
Logo, o importante é se verificar se houve ou não a
realização da audiência do procedimento antigo.
CURSO DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL III – VARGAS
DIGITADOR
TEORIA GERAL DO DIREITO PROCESSUAL CIVIL E
PROCESSO DE CONHEMENTO
HUMBERTO THEODORO JUNIOR
§ 53. PROCEDIMENTO SUMÁRIO
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