sexta-feira, 29 de agosto de 2014

RESENHA CRÍTICA - DOS EFEITOS SUCESSÓRIOS DA PATERNIDADE SOCIOAFETIVA - VARGAS, Paulo S.R. - DIREITO FAMESC - 7º PERÍODO - PROFESSOR FELIPE - DIREITO CIVIL VI - VARGAS DIGITADOR EM 29-08-2014

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DOS EFEITOS SUCESSÓRIOS
DA PATERNIDADE SOCIOAFETIVA

RESENHA CRÍTICA


VARGAS, Paulo S.R.

1 – VALMÔR SCOTT JR, e mail: jr.3000@hotmail.com pós-graduando em Direito Civil pela Universidade Federal de Santa Maria (RS), apresenta-nos um belo e útil trabalho, publicado em: Revista Sociais & Humanas, Santa Maria, v. 23, m. 2, jul/dez, 2010, pp 35-46, com o título em epígrafe.

2 – Abrange o Autor, assunto atual e polêmico junto à sociedade e de âmbito jurídico, alcançando o Direito Cível,  repercutindo no Direito de Família e no Direito das Sucessões. Remete-se às mudanças sociais do Século XX através da Revolução Industrial e da presença marcante da mulher no conceito patriarcal, ajustando o afeto como principal elemento de formação da família.

3 – Traz a menção à Carta Magna de 1988 e ao Código Civil de 2002, que não trouxeram positivadas a norma reguladora da posse do estado de filho como elo para definir a paternidade. Lembra aqui, a elaboração de construção e fundamentação pela doutrina e jurisprudência  na busca de considerar o sentimento paternofilial contínuo, como determinante de paternidade, inclusive por terceiro, denominado pai socioafetivo e, ainda que não possua vínculo biológico e/ou jurídico  surgem os direitos sucessórios.

4 – Ante o exposto, SCOTT JR aponta a ramificação da família tradicional para tipos de arranjos familiares com várias vertentes de afetividade-comum entre seus membros. Essa diversidade familiar, diz o autor, é constitucionalmente protegida em várias partes das normas jurídicas brasileiras, a começar pelo art. 226 §6º da Constituição Federal de 1988, quando apresenta um conceito aberto de família, sem delimitações.

5. Na segunda parte da sua apresentação, o Autor estuda a paternidade e filiação socioafetiva e a importância da posse do estado de filho como elo caracterizador da relação paternofilial, apontando a lacuna deixada pelo Sistema de Normas Brasileiro, mas, ainda assim, escrita pela doutrina e jurisprudência como fruto de convivência, acima da biológica, dando ênfase como elemento primordial de aceitação ao parentesco civil.

6 – Estudados, então, o afeto, como ponto de convergência aos três títulos fundamentais no Direito de Família, sejam: “família, paternidade e sucessão hereditária”, concentrou-se o Autor nas análises e discussões encontradas pela doutrina e jurisprudência, como fito garantidor dos efeitos sucessórios ao filho fruto do amor, do afeto e da compreensão. Senão, vejamos:
7 – Analisando a identidade paterna, subdividindo-a em três partes: “biológica, jurídica e socioafetiva”, SCOTT JR lamenta o fato da impossibilidade da ocorrência constante, devido à própria realidade social, ainda que seja óbvia a constância da paternidade em todo vínculo de relacionamento, diuturnamente.

8 – Sucede, afirma ele, as diferenças entre pai e filho, muita vez, tornarem-se problema jurídico, surgindo uma terceira pessoa no relacionamento, que não o pai genético. Nesse diapasão, sempre pensando a criança enquanto sujeito de direito, apoia-se, inicialmente, na Lei 8.069/90, o ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (Brasil, 2000), seguindo a citação de BRAUNER (1992, p. 66): “[...] referido diploma legal veio reconhecer a criança como sujeito de direitos, garantindo-lhe proteção integral, reafirmando a igualdade entre os filhos, sejam eles resultantes de uniões matrimoniais ou não, proibindo qualquer tipo de discriminação”.

9 – A paternidade socioafetiva, não é assunto novo. Hoje é difundido o reconhecimento de fato sempiterno e buscado somente agora na evolução legislativa e doutrina especializada brasileira. Legalmente recepcionada pela Carta Maior de 1988, considerada uma das mais avançadas do mundo, em matéria de família, já absorvida pelo Código Civil de 2002, tem como ponto principal de ligação o fator não biológico, mas a socioafetividade.

10 – No conceito de pai, aponta VELOSO, 1977, p. 215: “Quem acolhe, protege, cuida, emenda, repreende, veste, alimenta, ama e cria uma criança é pai. Pai de fato, mas, sem dúvida, pai. ‘Pai de Criação’, tem posse de estado com relação ao ‘filho de criação’. Havendo na relação, realidade sociológica e afetiva que o Direito tem de enxergar, socorrer. O que cria, o que fica no lugar do pai, tem direitos e deveres para com a criança, observado o que for melhor para os interesses desta.”

11 – Cabe ao pai assumir, na afetividade do vínculo, os deveres de realização dos direitos fundamentais da pessoa em formação, apontados na Constituição Federal de 1988, em seu artigo nº 227, o qual reza “o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar”.

12 – Afirma SCOTT JR., constatar-se a paternidade, definitivamente, através da afetividade, buscando, também, esta certeza, no princípio jurídico com força normativa, impondo deveres e obrigações aos membros da família, alçando o dever de afetividade, além do afeto psicológico.

13 – Por sobre a supremacia da paternidade presumida do Século XX e ainda em vigor no Código Civil de 2002, e além do teste de DNA, que possui vínculo biológico, prevalece sobre qualquer outro tipo de paternidade, a identidade paterna que a criança possui, seja a do terceiro que ela adota como pai em seus sentimentos e que prevalece sobre qualquer outro que o Estado queira impor.

14 – O Direito, na função de regular os fatos sociais, deve acompanhar a evolução da sociedade. O legislador em sua percepção, opta pela paternidade socioafetiva, trazendo no art. 227 §6º da CF/88, o conceito aberto e inclusivo de paternidade, ao assegurar igualdade plena a todos os filhos, indiscriminadamente, havidos ou não dentro do casamento. Trazendo  a fundamentação no Princípio da Proteção Integral da Criança no convívio familiar.

15 – Desconsidera-se, assim, o descabimento de uma ação de investigação de paternidade, já que o objetivo da ação é estabelecer vínculo, e não desfazê-lo. A evolução legislativa trazida pela Lei Maior, passando a estabelecer a relação filial legítima e a biológica isonômicas, como consta no artigo nº 1.596 do Código Civil de 2002, expandindo e abrigando os filhos de qualquer origem em igualdade de direitos, sejam eles adotivos, de inseminação artificial heteróloga e até os oriundos da posse do estado de filho.

16 – Vários dispositivos do Código Civil, como já vimos, optam pela paternidade socioafetiva. Como é o caso do artigo número 1593, v.g, que considera “parentesco natural e civil, resultante de consanguinidade ou de outra origem”. Constata-se aqui, ideia de inclusão, perdendo assim a biológica sua primazia, considerando a paternidade de qualquer origem, preservando dessa forma a Dignidade da Pessoa Humana. Trazendo em benefício da sociedade a expurgação da ilegitimidade de filhos espúrios, adulterinos, ilegais ou incestuosos, sob a pena de inconstitucionalidade.

17 – O artigo 1605, do Código Civil de 2002, ascende à posse do estado de filho, quando alude ao fato de haver um começo de prova proveniente dos pais ou presunções verificadas em cada caso, dispensando outras provas da situação de fato. Abre-se, aqui, um leque de opções, isentando-se o Código Civil, sequer de exemplificar espécie de presunção, o que nos deixa a conclusão e faculdade de incluir-se na experiência brasileira como a posse do estado de filiação, o filho de criação e a adoção de fato.

18 – Face a todo o exposto, podemos concluir ser a paternidade, mais que um dado genético, um complexo de direitos e deveres cabíveis a uma pessoa, em razão do estado de filiação.

19 – Cabe ressaltar não ser a paternidade socioafetiva uma regra. Caberá ao juiz avaliar o caso concreto e observar a relação de afeto entre pai e filho e optar pela permanência ou não deste vínculo afetivo. É responsabilidade do juiz os efeitos irreversíveis de sua decisão na vida de um infante e na construção desses laços afetivos.

20 – Segundo BOEIRA (2001, p.54),

“a posse do estado de filho revela a constância social da relação paterno filial, caracterizando uma paternidade que existe, não pelo simples fator biológico ou por força de presunção legal, mas em decorrência de elementos que somente estão presentes, juntos de uma convivência afetiva. Cresce, pois, a relevância da noção de posse do estado de filho em todas as legislações modernas, o que demonstra a inviabilidade de uma aberração total pelo princípio da verdade biológica.”


21 – Concluindo a crítica, porém, não dando por encerrada a discussão, ressalta-se que tanto a Constituição Federal, como o Estatuto da Criança e do adolescente, apontaram para a valorização da paternidade socioafetiva e, portanto, da posse do estado de filho, primeiramente na determinação da paternidade através do vínculo de afeto, e, depois, pela realidade biológica e/ou legal. É importante considerar que dessa forma, acabou por surgir vários questionamentos em relação aos fatos que estão a caminho, por exemplo, quanto à situação, no direito das sucessões, daquela criança que foi criada por terceiro como seu filho.

22 – A resposta a esta pergunta vem a ser o ponto alto deste trabalho, visto que o direito não apresenta de maneira clara uma solução, contudo, é possível construir um posicionamento que satisfaça a esta indagação, em função de considerar o filho socioafetivo como herdeiro necessário, nas mesmas condições dos demais filhos.

23 – Ora, a relação paternofilial, decorrente do vínculo socioafetivo é entendida pelo ordenamento jurídico pátrio, como paternidade e filiação. Como visto até o momento, o princípio da afetividade e a posse do estado de filho, com seus elementos constitutivos e diante o disposto no artigo 227, §6º da CF, que traz em seu bojo o princípio da igualdade entre os filhos, proibindo, como citado alhures, designações discriminatórias relativas à filiação.



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