sábado, 11 de abril de 2015

MANUAL DE PROCESSO PENAL – Capítulo 2- TIPOS DE PROCESSO PENAL – DIREITO PÁTRIO - VARGAS DIGITADOR

MANUAL DE PROCESSO PENAL – FERNANDO DA COSTA TOURINHO FILHO – 9ª Edição - Editora Saraiva – Capítulo 2- TIPOS DE PROCESSO PENAL – DIREITO PÁTRIO -  VARGAS DIGITADOR

Levando em conta os princípios que o informam, o Processo Penal pode ser acusatório, inquisitivo e misto.

No processo acusatório são traços profundamente marcantes: a) o contraditório, como garantia politicojurídica do cidadão; b) as partes acusadora e acusada, em decorrência do contraditório, encontram-se no mesmo pé de igualdade; c) o processo é público, fiscalizável pelo olho do povo (excepcionalmente se permite uma publicidade restrita ou especial); d) as funções de acusar, defender e julgar são atribuídas a pessoas distintas, e, logicamente, não é dado ao Juiz iniciar o processo sem provocação da parte (ne procedat judex ex officio -  o Juiz não pode dar início ao processo por sua própria vontade); e) o proce3sso pode ser oral ou escrito; f) existe, em decorrência do contraditório, igualdade de direitos e obrigações entre as partes, pois “non debet licere actori, quod reo non permititur” (não deve ser lícito ao autor o que não permitido ao réu); g) a iniciativa do processo cabe à parte acusadora, que poderá Sr o ofendido ou seu representante legal, qualquer cidadão do povo ou órgão do Estado. Presentemente, a função acusadora, em geral, cabe ao Ministério Público, mas o fato de a acusação ser conferida, também, ao ofendido, nos casos previstos em lei, ou a qualquer do povo, como na hipótese de impeachment, não desnatura o processo acusatório. Seus princípios imanentes continuam íntegros: publicidade, contraditório e, finalmente, acusação e jurisdição a cargo de pessoas distintas, “pues, la piedra de toque del sistema acusatorio es siempre la separación de acusador y juzgador” (cf. Garcia Velasco, Curso de derecho procesal penal, Ed. Universidad de Madrid, 1969, p. 8).

Nada obsta que o particular acuse. Mas o ideal é atribuir a função persecutória ao Ministério Público, como personificação da lei e representante da sociedade, permitindo-se excepcionalmente possa tal função ser exercida pelo ofendido (ação penal privada). Entre nós, também excepcionalmente, permite-se a qualquer do povo “denunciar” o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade, os Ministros de Estado e os comandantes da Marinha, Exército e Aeronáutica, nos crimes da mesma natureza conexos com os daqueles, bem como os Ministros do STF, o Procurador-Geral da República e o Advogado-Geral da União. Nesses casos, o processo e julgamento competem ao Senado Federal. Há outras hipóteses previstas no art. 10 da Lei n. 1.079/50, introduzidas pela Lei n. 10.028/2000, que possibilitam a qualquer do povo ou ao Ministério Público ofertar denúncia em relação a outras pessoas perante o STF, o STJ, os TRFs, os três ou mesmo perante os Tribunais de Justiça (arts. 41 e 41-A da Lei n. 1.079/50).

O processo de tipo inquisitório é a antítese do acusatório. Não há o contraditório, e por isso mesmo inexistem as regras da igualdade e liberdade processuais. As funções de acusar, defender e julgar encontraram-se enfeixadas numa só pessoa: o Juiz. É ele quem inicia, de ofício, o processo, quem recolhe as provas e, afinal, profere a decisão, podendo, no curso do processo, submeter o acusado a torturas, a fim de obter a rainha das provas: a confissão. O processo é secreto e escrito. Nenhuma garantia se confere ao acusado. Este aparece em uma situação de tal subordinação que se transfigura e se transmuda em objeto do processo e não em sujeito de direito.

O processo inquisitivo despontou em Roma, quando já se permitia ao Juiz iniciar o processo de ofício,e, ao atingir a Idade Média, por influência da Igreja, o processo per inquisitionem passou a dominar toda ou quase toda a Europa Continental, a partir do Concílio Lateranense, de 1215. Foi introduzido, na verdade, pelo Direito Canônico, mas, em seguida, viram os soberanos, nesse tipo de processo, uma arma poderosa, e por isso espalhou-se entre os Tribunais seculares.

Finalmente o processo de tipo misto. Desenvolve-se em três partes a) investigação preliminar, a cargo da Polícia Judiciária, sob a orientação do Ministério Público; b) instrução preparatória, a cargo do Juiz Instrutor; e c) fase do julgamento. Das duas primeiras não participa a Defesa. Na fase do julgamento, o processo se desenvolve contradictoirement.

Direito pátrio

No Direito pátrio, o sistema adotado é o acusatório. Não o processo acusatório puro, mas o acusatório não ortodoxo. Tanto é verdade que o Juiz pode requisitar abertura de inquérito, decretar de ofício prisão preventiva, conceder habeas corpus de ofício, determinar a realização da prova que bem quiser e entender etc. a acusação, nos crimes de ação pública, está a cargo do Ministério Público. Excepcionalmente, nos delitos de ação privada, comete-se à própria vítima o jus persequendi in judicio – direito de perseguir (acusar) em juízo. Pode também a vítima, nos crimes de ação pública, exercer a acusação, se, porventura, o órgão do Ministério Público não intentar a ação penal no prazo previsto em lei.

O processo é eminentemente contraditório. Não temos a figura do Juiz instrutor. A fase processual propriamente dita é precedida de uma fase preparatória, em que a Autoridade Policial procede a uma investigação não contraditória colhendo as primeiras informações a respeito do fato infringente da norma e da respectiva autoria. Com base nessa investigação preparatória, o acusador, seja o órgão do Ministério Público, seja a vítima, instaura o processo por meio da denúncia ou queixa. Já agora, em juízo, nascida a relação processual, o processo torna-se eminentemente contraditório, público e escrito (sendo que alguns atos são praticados oralmente, tais como debates em audiências ou sessão). O ônus da prova incumbe às partes, mas o Juiz não é um espectador inerte na sua produção, podendo, a qualquer instante, determinar, de ofício, quaisquer diligências para dirimir dúvida sobre ponto relevante.

Permite-se às partes uma gama de recursos, e, tutelando ainda mais o direito de liberdade, concedem-se à defesa recursos que lhe são exclusivos, como o protesto por novo Júri e os embargos infringentes e de nulidade. Não adotamos a revisão pro societate. Só o réu é que pode promovê-la.

Nas infrações penais de menor potencial ofensivo, assim consideradas todas as contravenções e os crimes apenados até o máximo de um ano, dês que não sujeitos a procedimentos especiais (ressalvadas as condutas tipificadas nos arts. 303, 306 e 308 do Código de Trânsito Brasileiro, que, embora apenadas com 2 ou 3 anos no seu grau máximo, são também consideradas de menor potencial ofensivo por força do parágrafo único do art. 291 do citado diploma), será possível a transação, sob os olhos do Juiz, entre o Acusador e o autor do fato, sujeitando-se este a uma multa ou pena restritiva de direito, sem gerar reincidência.


Hoje, em face da nova redação dada ao art. 61 da Lei n. 9.099/95 pela Lei n. 11.313, de 28-6-2006, são infrações de menor potencial ofensivo todas as contravenções e os crimes cuja pena máxima não exceda a 2 anos, sujeitos ou não a procedimento especial, ressalvados os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, conforme o art. 41 da Lei n. 11.340, de 7-8-2006.

Nenhum comentário:

Postar um comentário