DIREITO CIVIL COMENTADO - Art. 207, 208, 209
– Da Decadência
- VARGAS, Paulo S. R.
Livro III – Dos Fatos
Jurídicos (art. 189 a 211)
Título IV – Da
Prescrição e da Decadência –
Capítulo II – Da
Decadência –
vargasdigitador.blogspot.com
Art 207. Salvo disposição legal em contrário,
não se aplicam à decadência as normas que impedem, suspendem ou interrompem a
prescrição. 1
1.
A
decadência corre contra todos
A regra geral é a de que a decadência
corre sempre contra todos, não se impedindo, suspendendo ou interrompendo a
fluência de seus prazos, salvo expressa disposição legal em contrário. É o que
ocorre, por exemplo, com os absolutamente incapazes (CC, art 208) e nas
relações consumeristas mencionadas no art 26, § 2º, do CC). (Direito
Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com em 09.02.2019,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).
Navegando com Roberto Gonçalves,
segundo Francisco Amaral, decadência é a perda do direito potestativo pela
inércia do seu titular no período determinado em lei. Seu objeto são os
direitos potestativos de qualquer espécie, disponíveis ou indisponíveis, direitos
que conferem ao respectivo titular o poder de influir ou determinar mudanças na
esfera jurídica de outrem, por ato unilateral, sem que haja dever
correspondente, apenas uma sujeição. (Roberto Gonçalves, Direito civil comentado, pdf – parte geral, v. 1, p. 533 –
Saraiva, 2010 – São Paulo).
Um dos critérios
usados pela doutrina para distinguir prescrição de decadência consiste em
considerar que, nesta, o prazo começa a fluir no momento em que o direito
nasce. Desse modo, no mesmo instante em que o agente adquire o direito já
começa a correr o prazo decadencial. O prazo prescricional, todavia, só se
inicia a partir do momento em que este tem o seu direito violado.
Também se diz que a
prescrição resulta exclusivamente da lei, enquanto a decadência pode resultar
da lei (legal), do testamento e do contrato (convencional).
O Código Civil de
1916 não se referia, expressamente, à decadência,
também denominada caducidade.
Englobava, indiscriminadamente, em um mesmo capítulo, as causas devidas à
fluência do tempo, aparecendo todas sob a denominação genérica de prescrição.
O Código de 2002,
contudo, inspirado no Código civil italiano, optou por uma fórmula segura de
distinção, considerando prescricionais somente
os prazos taxativamente discriminados na Parte Geral, nos arts. 205 (regra
geral) e 206 (regras especiais), sendo decadenciais
todos os demais, estabelecidos como complemento de cada artigo que rege a
matéria, tanto na Parte Geral como na Especial. Para evitar discussões sobre se
ação prescreve, ou não, adotou a tese da prescrição da pretensão, por ser considerada a mais condizente com o direito
processual contemporâneo.
Na decadência, que
é instituto do direito substantivo, há a perda de um direito previsto em lei. O
legislador estabelece que certo ato terá que ser exercido dentro de um
determinado tempo, fora do qual ele não poderá mais efetivar-se porque dele
decaiu o seu titular. A decadência se consubstancia, pois, no decurso
infrutífero de um termo prefixado para o exercício do direito. O tempo age em
relação à decadência como um requisito do ato, pelo que a própria decadência é
a sanção consequente da inobservância de um termo.
Segundo
entendimento da Comissão Revisora do Projeto que se transformou no atual Código
Civil, manifestado para justificar a desnecessidade de se definir decadência,
esta ocorre “quando um direito
potestativo não é exercido, extrajudicialmente ou judicialmente (nos casos
em que a lei – como sucede em matéria de anulação, desquite etc., - exige que o
direito de anular, o direito de desquitar-se só possa ser exercido e juízo, ao
contrário, por exemplo, do direito de resgate, na retrovenda, que se exerce
extrajudicialmente), dentro do prazo para exercê-lo, o que provoca a decadência
desse direito potestativo. Ora, os direitos potestativos são direitos sem
pretensão, pois são insuscetíveis de violação, já que a eles não se opõe um
dever de quem quer que seja, mas uma sujeição de alguém (o meu direito e anular
um negócio jurídico não pode ser violado pela parte a quem a anulação
prejudica, pois esta está apenas sujeita a sofrer as consequências da anulação
decretada pelo juiz, não tendo, portanto, dever algum que possa descumprir)”.
Na sequência,
aduziu a referida Comissão: “Logo, se a hipótese não é de violação de direito
(quando se exercer, judicialmente, o direito de anular um negócio jurídico, não
se está pedindo condenação de ninguém por violação de direito, mas, apenas,
exercendo um direito por via judicial), mas há prazo para exercer direito –
prazo esse que não é nem do art 205, nem do art 206, mas se encontra em outros
artigos -, esse prazo é de decadência” (José Carlos
Moreira Alves, A parte Geral do Projeto
de Código Civil brasileiro, p. 155-156, apud, Roberto Gonçalves,
Direito civil comentado, 2010 – pp. 532
- pdf – parte geral).
Prescreve o art
2017: “Salvo disposição legal em
contrário, não se aplicam à decadência as normas que impedem, suspendem ou
interrompem a prescrição”. Em princípio, pois, os prazos decadenciais são
fatais e peremptórios, pois não se suspendem, nem se interrompem. A inserção da
expressão “salvo disposição legal em
contrário” no aludido dispositivo tem a finalidade de definir que tal regra
não é absoluta, bem como de esclarecer que não são revogados os casos em que um
dispositivo legal, atualmente em vigor (como o art 26, § 2º, do CDC, p. ex.),
determine, para atender a hipótese especialíssima, a interrupção ou suspensão
de prazo de decadência.
Tal ressalva tem também o condão de
acentuar que a regra do art 207 é de caráter geral, só admitindo exceções por
lei, e não pela simples vontade das partes quando a lei não lhes dá tal
faculdade. (Roberto
Gonçalves, Direito civil comentado, pdf –
parte geral, v. 1, p. 533 – Saraiva, 2010 – São Paulo).
Art 208. Aplica-se à decadência o disposto nos
arts 195 e 198, I. 1
1.
Disposições
comuns entre a prescrição e a decadência
Apesar de o legislador do Código Civil
de 2002 ter trazido importante inovação ao fixar a distinção entre a prescrição
e a decadência, é inegável que ambos os institutos apresentam inúmeros pontos
de contato. A própria exposição de motivos do código afirma que “prescrição e decadência não se extrema
segundo rigorosos critérios lógico-formais, dependendo, sua distinção, não raro
de motivos de conveniência e utilidade social reconhecidos pela política
legislativa”. É justamente por conta dessa conveniência e utilidade social
que o legislador optou por estender à decadência ao direito de regresso contra
o assistente ou representante que der causa ou deixar de alegar a decadência
(CC, art 195) e a interrupção da contagem do prazo para os absolutamente
incapazes (CC, art 198, I). (Direito Civil Comentado, Luís
Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com em 09.02.2019, corrigido e aplicadas as devidas
atualizações (VD)).
Na sabedoria de Roberto Gonçalves,
temos que o art 208 determina que se aplique à decadência “o disposto nos arts 195 e 198, I”, que dizem respeito a incapazes.
Este dispositivo abre uma exceção com relação ao artigo anterior, não admitindo
a fluência de prazo decadencial contra os absolutamente incapazes (art 198, I),
bem como permitindo que os relativamente incapazes responsabilizem os
representantes e assistentes que derem causa à decadência, não a alegando
oportunamente em seu favor (art 195). (Roberto Gonçalves, Direito civil comentado, pdf – parte geral, v. 1, p. 533 –
Saraiva, 2010 – São Paulo).
Art 209. É nula a renúncia à decadência fixada
em lei. 1
1.
Nulidade
da renúncia à decadência fixada em lei
Diferentemente do que ocorre com a
prescrição, na omissão da lei, o legislador admite que as partes pactuem
livremente prazos específicos de decadência. Havendo, entretanto, prazo de
decadência expressamente previsto na lei, não existe essa possibilidade.
Naturalmente, portanto, se pode à vontade das partes criar prazos específicos
de decadência, por uma questão de coerência deve também poder renunciar a eles.
Por outro lado, para as situações em que o legislador expressamente fixou os
prazos de decadência, não cabe às partes renunciar a decadência que já se
operou. (Direito Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães
e Samuel Mezzalina, apud Direito.com em
09.02.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações (VD)).
O artigo 209
proclama: “É nula a renúncia à decadência
fixada em lei”. No diapasão de Roberto Gonçalves, a irrenunciabilidade
decorre da própria natureza da decadência. O fim predominante desta é o
interesse geral, sendo que os casos legalmente previstos versam sobre questões
de ordem pública. Daí a razão de não se admitir possam as partes afastar a
incidência da disposição legal.
O referido dispositivo, contudo,
considera irrenunciável apenas o prazo de decadência estabelecido em lei, e não
os convencionais, como o pactuado na retrovenda, em que, por exemplo, pode-se
estabelecer que o prazo de decadência do direito de resgate seja de um ano a
partir da compra e venda e, depois, renunciar-se a esse prazo, prorrogando-o em
até três anos, que é o limite máximo estabelecido em lei. (Roberto Gonçalves, Direito civil comentado, pdf – parte
geral, v. 1, p. 533-534 – Saraiva, 2010 – São Paulo).
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