DIREITO CIVIL
COMENTADO - Art. 368, 369, 370
Da
Compensação – VARGAS, Paulo S. R.
Parte
Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título
III – DO ADIMPLEMENTO E EXTINÇÃO DAS OBRIGAÇÕES
(art. 304 a 388) Capítulo VII – Da Compensação
–
-
vargasdigitador.blogspot.com
Art. 368. Se duas pessoas forem ao mesmo tempo
credor e devedor uma da outra, as duas obrigações extinguem-se, até onde se
compensarem.
O
artigo contém a própria definição de compensação: meio de pagamento pelo qual a
obrigação do devedor em relação ao credor extingue-se segundo o valor de outra
obrigação devida pelo mesmo credor ao mesmo devedor. A esta explicação dada por
Bdine Jr., segue inclusive um exemplo clássico. Senão, vejamos: Essa extinção
ocorre até que sejam iguais os valores dos débitos respectivos. A regra
representa o reconhecimento de que se A deve R$ 1.000,00 a B, que, por sua vez,
deve R$ 500,00 a A, considera-se o crédito do primeiro quitado parcialmente,
para que subsista apenas um saldo de R$ 500,00 (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e
Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários
autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 390 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 27/05/2019.
Revista e atualizada nesta data por VD).
Sílvio de Salvo Venosa
ensina que, “no tocante à obrigação prescrita, se a prescrição operou antes da
coexistência das dívidas, não pode a dívida ser compensada, porque há
inexigibilidade e porque a prescrição extingue a pretensão. No entanto, se os
dois créditos coexistiram antes de se escoar o prazo de prescrição, houve compensação
de pleno direito. Cabe ao juiz tão somente declará-la [...]” (Direito civil: teoria geral das obrigações e
dos contratos. 3.ed., Atlas, p. 301).
Neste mesmo sentido, o
que doutrinam Miguel Maria de Serpa Lopes (Curso
de direito civil: obrigações em geral, v. III, Freitas Bastos, 5.ed., p.
250) e Euclides de Mesquita (A
compensação no direito civil brasileiro. São Paulo, Editora Universitária
de Direito, p. 94-5).
Assim, para se decidir
pela possibilidade ou não da pretendida compensação, necessário se torna saber
se, no momento em que o crédito exequendo tornou-se exigível, o lapso
prescricional do crédito do agravante ainda se encontrava em curso ou não. (I
TACSP, AI, n. 1.249.290-7, rel. Des. Ary Bauer, j. 21.20.2003).
Mais claro impossível.
Como aponta a doutrina de Ricardo Fiuza, compensação é um encontro de créditos
entre duas pessoas ao mesmo tempo credoras e devedoras, uma da outra, a fim de
extinguir total ou parcialmente as dívidas até a concorrente quantia.
A compensação pode ser
legal, convencional ou judicial. É legal quando determinada em lei e não pode
se recusada por uma das partes. O juiz não pode declará-la de ofício, porque
deve ser alegada, mas seus efeitos retroagem à data em que se verificou. E
convencional se resulta de contrato entre as partes, e assim depende do acordo
seu modo de ser, sua extensão e efeitos. A judicial é resultado de reconvenção
(v. arts. 314 a 318 do CPC/1973.
Estes artigos encontram correspondência no CPC/2015, nos arts. 146, 343 e 487,
respectivamente, nota VD). (Direito
Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 202, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª
ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 27/05/2019, corrigido e aplicadas as
devidas atualizações VD).
Na esteira de Guimarães
e Mezzalina, a compensação é forma de extinção de obrigações, quando duas
pessoas forem, reciprocamente credora e devedora. São requisitos da
compensação: (i) cada uma das partes deve ser credora e devedora da obrigação
principal; (ii) o objeto das obrigações deve ser coisas fungíveis, de mesma
espécie e qualidade; (iii) as dívidas devem ser vencidas, exigíveis e líquidas;
(iv) sobre as prestações não pode recair direito de terceiros.
Os autores explicam que
a compensação, à exceção dos casos convencionais, decorre da lei. Assim, não se
faz necessário que haja a capacidade de partes para que ela se opere; mesmo
créditos de incapazes podem ser objeto de compensação. Vale esclarecer ainda
que, mesmo nos casos em que o juiz é forçado a decidir sobre a questão, a
compensação mantém seu caráter legal. Nessa hipótese, a sentença do juiz é,
meramente, declaratória, pois reconhece um determinado fato que se operou por
força de lei (a compensação).
Seguindo o raciocínio
dos autores, não obstante a compensação decorra de lei, não poderá o juiz
decidi-la de ofício, sem que alguma das partes a invoque. afinal, se até mesmo
pode haver a renúncia à compensação (CC 375), não haveria razão para que
houvesse pronunciamento judicial de ofício nesse sentido. A sentença, nesses
casos, tem efeitos ex tunc. Na
compensação parcial, há apenas a extinção da obrigação de menor valor,
subsistindo a maior, pelo saldo. As obrigações naturais não são compensáveis,
dada a inexistência da ação a ampará-las.
No mesmo diapasão dos
autores, a compensação pode se dar de forma convencional, mediante ajuste entre
as partes. Em casos tais, pode se acordar, por exemplo, a compensação entre
obrigações que não sejam fungíveis entre si ou que sejam ilíquidas. Para ser
válida, basta que estejam presentes a capacidade das partes e o direito de
livre disposição da coisa.
Dentre as diversas
funções exercidas pela compensação, há que se destacar o privilegio que é
garantido ao credor-devedor de ficar desobrigado de cumprir a obrigação devida
perante a contraparte e sofrer os riscos da eventual insolvência. Com a
possibilidade da compensação, o credor-devedor fica livre de um possível concurso
de credores, no caso de falência ou insolvência do outro sujeito da relação
obrigacional.
“Súmula
TJSP 1. O compromissário comprador de imóvel, mesmo inadimplente, pode pedir a
rescisão do contrato e reaver as quantias pagas, admitida a compensação com
gastos próprios de administração e propaganda feitos pelo compromissário vendedor,
assim como com o valor que se arbitrar pelo tempo de ocupação do bem” (Direito
Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães
e Samuel Mezzalina, apud Direito.com acesso
em 27.05.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art. 369. A compensação efetua-se entre dívidas líquidas,
vencidas e de coisas fungíveis.
A liquidez da dívida,
como ensinado por Guimarães e Mezzalina, não exige a menção expressa de seu
valor do título, mas tão somente que este tenha sua existência aferível, independentemente
de qualquer processo de apuração. Nem mesmo a contestação do devedor, em
eventual ação judicial, compromete a liquidez da dívida. Ilustrativamente, uma
obrigação decorrente de pleito indenizatório é ilíquida, enquanto não houver a
devida apuração, a despeito de já ser reconhecido o direito do credor à
indenização.
Nas obrigações de coisa incerta,
continuam os autores, somente poderá haver a compensação no caso de a escolha,
em ambas as obrigações, caber aos respectivos devedores. Do contrário, caso a
escolha dependa dos credores, haverá a necessidade de manifestação de vontade
destes, o que retira a liquidez da dívida. O vencimento da dívida pode se dar
tanto pelo escoamento do prazo, como elo seu vencimento antecipado. (Direito
Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com acesso em 27.05.2019,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Acerca da prescrição de uma das
obrigações, Pereira esclarece eu “[c]ontrovertem
os autores se a obrigação prescrita comporta a compensação. Dentro da variedade
de opiniões, o que deve prevalecer e a conjugação do requisito da exigibilidade
com o efeito automático da compensação. Assim, se a prescrição se completou
antes da coexistência das dívidas, aquele a quem ela beneficia pode opor-se à
compensação, sob o fundamento de que a prescrição extingue a pretensão
(Anspruch), e, portanto, falta o requisito da exigibilidade para que aquela se
efetue. Mas se os dois créditos coexistiram, antes de escoar-se o prazo
prescricional, operou a compensação ipso iure, e premiu as obrigações; a prescrição que venha a completar-se
ulteriormente não mais atua sobre os débitos desaparecidos”. (Pereira, Caio
Mário da Silva. Teoria Geral das
Obrigações, Rio de Janeiro: Forense, op. cit., pp. 260-261) (Direito
Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães
e Samuel Mezzalina, apud Direito.com acesso em 27.05.2019,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
No entendimento de
Bdine Jr., o art. 369, para serem compensados, os débitos devem ser líquidos,
ou seja, devem referir-se a importância determinada. Devem, ainda, estar
vencidos, i.é, ser passíveis de exigência imediata. E, finalmente, devem ser
fungíveis entre si. Vale dizer, os débitos devem compreender prestações que
podem ser substituídas umas pelas outras (CC 85).
Em determinadas
situações, porém, é possível identificar compensação entre dívidas ilíquidas.
Isso se verificará por imposição judicial, quando, em um processo de
conhecimento – que compreenda dívidas desprovidas de certeza e liquidez -, no
qual exista reconvenção. Ao se verificar que o autor é credor do réu, tanto
quanto este é credor daquele, sem que os respectivos débitos estejam liquidados,
o juiz poderá acolher os pedidos de ambos e determinar que se compensem por
ocasião da execução, após a liquidação. Não se deve, porém, confundir essa
situação com aquela em que o credor de um débito vencido e líquido,
representado por título judicial, pretende receber o valor devido e o réu
afirma que não pagará a importância, porque o título tem origem em venda de
determinado estabelecimento comercial que tem dívidas remanescentes com
terceiros – ilíquidas e não vencidas -, as quais deseja compensar. Nesse último
exemplo, a situação é de suspensão da exigibilidade da cambial em virtude do
inadimplemento contratual do credor, que deve tornar boa a venda e, portanto,
não pode permitir que o devedor – adquirente do estabelecimento -, tenha que
arcar com débito de sua responsabilidade. A suspensão da exigibilidade estará
amparada no disposto do art. 476 (Hamid Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n.
10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e
atual., p. 396 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 28/05/2019. Revista e
atualizada nesta data por VD).
Quatro são os
requisitos da compensação legal, no raiar de Ricardo Fiuza: a) Reciprocidade de
dívidas; as partes devem ser concomitantemente credoras e devedoras umas das
outas; b) liquidez das dívidas: a dívida é líquida quando é certa, quanto à sua
existência, e determinada, quanto à sua quantia, i.é, quando consta o que é
devido e quanto é devido. Assim é que a contestação da dívida em juízo retira-lhe
o requisito de liquidez, porque a certeza da sua existência depende da sentença
que decidir o pleito. Mas, se a sentença reconhece a dívida, fica ipso facto declarada a compensação, que
retroagem ao tempo do vencimento respectivo; c) exigibilidade das dívidas: se a
compensação equivale ao pagamento e este só pode ser exigido quando a dívida
estiver vencida, também a compensação só se pode operar entre dívidas vencidas;
d) coisas fungíveis: só se pode compensar coisas fungíveis, ou seja, aquelas que
podem ser substituídas por outras de mesma espécie, qualidade e quantidade (Direito Civil - doutrina, Ricardo
Fiuza – p. 202, apud Maria Helena
Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª
ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 28/05/2019, corrigido e aplicadas as
devidas atualizações VD).
Art. 370. Embora sejam do mesmo gênero as coisas fungíveis,
objeto das duas prestações, não se compensarão, verificando-se que diferem na
qualidade, quando especificada no contrato.
Este
dispositivo estabelece uma exceção ao artigo anterior, na visão de Bdine Jr.,
pois impede que dívidas líquidas, vencidas e fungíveis sejam compensadas se a
qualidade delas diferir – ou seja, se uma for muito superior à outra – e se
essa qualidade estiver especificada no contrato. Note-se que os requisitos são
cumulativos: deve haver diferença na qualidade das dívidas e ela deve estar
especificada no contrato (Hamid
Charaf Bdine Jr, apud Código Civil
Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord.
Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 398 - Barueri, SP:
Manole, 2010. Acesso 28/05/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).
Segundo
a doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, já em 1916 anotava o mestre João Luiz
Alves que “só se podem compensar coisas fungíveis, da mesma qualidade. Não
seria pagar, entregar um cavalo, em vez de um boi; não se pode, por isso,
compensar a obrigação de dar um cavalo com a de entregar um boi” (Código Civil anotado, cit., p. 682).
O
art. 370 vem esclarecer o caráter de fungibilidade recíproca, indispensável
para que se possam compensar as obrigações. Se no contrato se especifica a
qualidade das prestações, embora do mesmo gênero, não poderão ser compensadas
se diferirem uma da outra (Direito
Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 203, apud Maria Helena Diniz, Novo Código Civil Comentado doc, 16ª
ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 28/05/2019, corrigido e aplicadas as
devidas atualizações VD).
No entendimento de Guimarães e Mezzalina, não basta que as
obrigações sejam fungíveis em si mesmas. Elas devem também ser fungíveis entre
si ou homogêneas. Ficam excluídas, portanto, as obrigações que tenham prestação
de coisa certa e determinada. Nessa linha, se o contrato especificar
determinadas qualidades da obrigação, perder-se-á a fungibilidade das
obrigações entre si.
Caso
a obrigação venha a se tornar fungível (ex.: obrigação de dar coisa certa que
se converta em obrigação pecuniária), poderá haver compensação. Pela referência
do Código a coisas e em razão do requisito da fungibilidade das prestações
entre si, as obrigações de fazer não podem ser objeto de compensação (Direito
Civil Comentado, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalina, apud Direito.com acesso
em 28.05.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
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