quinta-feira, 29 de agosto de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 481, 482, 483 - Continua - Da compra e Venda - Disposições Gerais – VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 481, 482, 483 - Continua
- Da compra e Venda - Disposições Gerais –
VARGAS, Paulo S. R. 

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo I – Da Compra e Venda
Seção I – Disposições Gerais –
vargasdigitador.blogspot.com

Art. 481. Pelo contrato de compra e venda, um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe certo preço em dinheiro.

Clareando a mente com Nelson Rosenvald, aprende-se que com a edição do Código Civil de 2002, não houve alteração na sistemática do contrato de compra e venda. Reiterando o art. 1.122 do CC/1916 mantemo-nos filiados à concepção obrigacional da compra e venda, pela qual o acordo de vontades entre os contraentes não é suficiente para transmitir a propriedade, sendo necessária a tradição para a constituição de direitos reais sobre bens móveis (CC. 1.267) e o registro para o aperfeiçoamento de direitos reais imobiliários (CC. 1.245).

Nosso sistema seria uma espécie intermediária entre o sistema franco-italiano e o alemão. Aquele concebe a compra e venda coo acordo translativo de propriedade, sendo suficiente o consenso. A fórmula germânica requer dois contratos autônomos e sucessivos: o primeiro estabelecendo obrigações intersubjetivas; o segundo, um negócio abstrato, dotado de eficácia real, aperfeiçoado perante o registro com a finalidade de expurgar os vícios do contrato originário, além de gerar propriedade. No Brasil, de forma eclética, o contrato consubstancia o consenso, porém será integrado pela tradição ou registro.

Certamente, mantém-se acesa grande polêmica instaurada pelo genial Darcy Bessone ao discordar da compra e venda como mera obrigação de dar. Para o insigne doutrinador, o registrador apenas conclui o ato complexo de formação progressiva pela qual toda manifestação de transmissão do direito real já se exauriu no negócio jurídico. Vale dizer que o registro apenas concederia eficácia real à compra e venda, pois é desnecessária uma segunda manifestação de vontade do alienante, ao contrário do que se sucede no direito alemão. Com efeito, a obrigação demanda uma futura atuação do devedor, todavia, com a emissão da escritura de compra e venda, o alienante não precisará praticar uma nova conduta, eis que toda a carga recairá sobre o adquirente, no sentido de promover unilateralmente o registro do título, concluindo o ato complexo com a chancela estatal.

Nada obstante, a doutrina pátria mantém a tese obrigacional da compra e venda como negócio jurídico bilateral, no qual a obrigação do alienante consiste na entrega da coisa, enquanto a prestação do adquirente se traduz no pagamento de um preço. Assim como a troca e a doação, trata-se de contrato translativo, funcionando como título ou causa, enquanto a tradição e o registro são os modos de transmissão. Portanto, se o alienante promover sucessivas vendas e o primeiro comprador não cuidar de promover o registro, aquele que levar o título ao cartório do registro imobiliário será o proprietário, cabendo ao comprador primitivo o mero ajuizamento de ação indenizatória perante o alienante.

A coisa, o preço e o consenso são pressupostos de existência do negócio, sem os quais não haverá a hipótese de incidência para que a compra e venda penetre no mundo jurídico. Há uma troca de bens por dinheiro – aliás, o que distingue a venda da permuta -, que em regra dispensa solenidades, excepcionando-se a imposição de forma pública para alienação de imóveis de valor superior a trinta salários-mínimos (CC. 108).

Além da bilateralidade, a compra e venda é caracterizada como contrato oneroso, sendo de sua natureza a configuração de vantagens e sacrifícios recíprocos. Da onerosidade não decorre necessariamente a sua comutatividade, pois eventualmente se perfaz como contrato aleatório, em que ao menos uma das prestações é incerta ao tempo da contratação (CC. 458). Mesmo nas relações civis, admite-se a forma da contratação pela adesão (CC. 423), sendo passível de elaboração como contrato instantâneo – pagamento imediato (v.g., aquisição de chocolate em padaria) – ou como contrato de duração, com pactuação de pagamento diferido ou mediante execução sucessiva de diversas prestações periódicas. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 549-550 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 29/08/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Nos ensinamentos liberados por Ricardo Fiuza em sua Doutrina, tem-se o contrato de compra e venda como contrato bilateral, consensual, oneroso, comutativo ou aleatório, e, de modo geral, não solene (a depender do objeto), de efeitos meramente obrigacionais (obrigação ad tradendum) que serve como título de aquisição de coisa determinada mediante o pagamento do preço, definido e em dinheiro, obrigado o vendedor a transferir a propriedade do bem em favor do comprador. O sistema adotado acompanha o alemão (BGB, art. 433). A translatividade dominial se aperfeiçoa somente pela tradição (se o bem for móvel) ou pelo registro imobiliário (se o bem for imóvel).

A forma não será livre quando a validade da declaração de vontade depender de forma especial exigida por lei (CC. 108), como ocorre com a exigência de escritura pública, essencial à validade do negócio jurídico, na compra e venda de imóveis, de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País (CC.108) (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 259-260, apud Maria Helena Diniz, Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 29/08/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Em seu comentário ao artigo 481, Marco Túlio de Carvalho Rocha conceitua compra e venda. Para ele encontram-se os elementos essenciais desse negócio: a coisa (res), o acordo de vontade (consensus) e o preço (pretium).

Outro elemento importante deste conceito, segundo ele, é a explicitação dos principais efeitos deste contrato: obrigar o vendedor a transferir o domínio da coisa ao comprador; obrigar o comprador a pagar o preço ao vendedor. Desse modo, resta claro que a compra e venda não produz, por si só, a transferência da propriedade, que ocorre pela tradição: o registro em nome do comprador se se tratar de bem imóvel; a transferência da posse com o ânimo de transferir a propriedade, no caso de bem móvel.

O contrato de compra e venda é um contrato bilateral, consensual (em alguns casos, formal), oneroso: comutativo ou aleatório, de execução instantânea: imediata ou diferida.

Quanto às artes: a) capacidade: as partes podem ser capazes ou incapazes. Os incapazes devem ser devidamente assistidos ou representados.

Legitimação objetiva do vendedor: b) o vendedor deve ser o proprietário da coisa ou adquirir-lhe a propriedade até o momento da tradição. A venda a non domino pode configurar crime de estelionato, se houver dolo, nulidade absoluta por ilicitude do objeto, anulabilidade por dolo ou por erro ou descumprimento contratual se fosse do conhecimento do comprador que o bem pertencia a terceiro. a venda a non domino é ineficaz em relação ao vero domino.

Legitimação subjetiva do vendedor: c) um cônjuge não pode vender bens imóveis sem a anuência do outro sob pena de anulabilidade (CC. 1.649), exceto no regime da separação absoluta (CC. 1.647, I); no da participação final dos aquestos, se autorizada a livre disposição do pacto antenupcial (CC. 1.656); cônjuges não podem vender, uma para o outro, bens comuns (CC. 499); ascendentes devem obter a anuência de descendentes na venda a algum deles (CC. 496); a ação prescreve em 20 anos a contar do ato (Súmula 494 do STF), contudo, o CC. 179 reduziu o prazo para 2 anos a contar do ato); condômino de coisa indivisível tem direito de preferencia na venda de quinhão pertencente a outro condômino (CC. 504); direito de preferencia (CC. 513 a 520); o locatário de bem imóvel tem direito de preferencia para a aquisição do bem que aluga (Lei n. 8.245, art. 27); menores sujeitos a poder familiar dependem de autorização judicial para a venda de imóveis (CC. 1.691); demais incapazes dependem de autorização judicial na venda de móveis e de imóveis (CC. 1.748, IV, cc 1.774); os bens do falido somente podem ser vendidos com autorização do juiz da falência.

Existe legitimação objetiva e subjetiva do comprador: tutores, curadores, testamenteiros e administradores não podem adquirir bens, respectivamente, de seus pupilos, curatelados, que forem objeto do testamento ou que estejam sob sua administração (CC. 497, I e 1.749); mandatários não podem adquirir para si bens mediante a utilização do próprio mandato, salvo se houver autorização expressa para tanto (CC. 117 e Súmula 165, STF); servidores públicos não podem adquirir bens do ente público a que prestem serviços (CC. 497, II); Juízes, serventuários e auxiliares da justiça não podem adquirir que sejam objeto de feito em tramitação no local em que prestam serviços (art. 497, III); leiloeiros não podem adquirir bens que estejam leiloando (CC. 497, IV).

O preço da compra e venda consiste em dinheiro ou equivalente. No tocante ao poder liberatório os títulos de crédito são, em regra, pro soluto:

“Se, na ocasião de pagar, o devedor quer pagar com cheque, ou o credor recusa o cheque, e incorre em mora o devedor, ou o credor aceita o cheque, e não se pode pensar em mora: a responsabilidade pelo cheque, que nada tem com o negócio jurídico de que se irradiara a obrigação de pagar” (Pontes de Miranda. Tratado de direito privado, t. XXXVII, p. 229).

Caráter pro soluto do pagamento com cartão de crédito: REsp n. 1.133.410-RS, Min. Massami Uyeda, 3ª T., j. 16/3/2012.

Contra:

“o pagamento só poderá efetuar-se em apólices federais, estaduais ou municipais, se nisso convier o credor, ou tiver sido estipulado no contato. O mesmo sucederá no tocante ao pagamento mediante cheque, que é recebido pro solvendo e não pro soluto; se não houver provisão, o pagamento é ineficaz.” (Monteiro, Washington de Barros. Curso de direito civil, 4º v, p. 254, no mesmo sentido: Carvalho Santos, J. M. Código civil brasileiro interpretado, v. XII, p. 177. REsp n. 1.023.648-ES, 3ª T. Min. Humberto gomes de Barros, j. 17.03.2008).

O preço vil ou fictício torna a venda nula ou anulável se caracterizar: a) lesão (CC. 157; MP n. 2.172-32, de 23/8/01; b) estado de perigo (CC. 156); c) simulação (CC. 167); d) prática proibida (CC. 166, VII, ex.: “Lavagem de dinheiro”, Lei n. 9.613/98, “usura pecuniária ou real”, Lei n. a521/51, art. 4º, b, “concorrência desleal” Lei n. 884/94, art. 21, XVIII).

Se a contraprestação pela alienação do bem não for dinheiro o negócio não será de compra e venda. Se a contraprestação for dinheiro e uma coisa fica caracterizada a troca. Se for um serviço, o contrato será inominado. Se a contraprestação for composta de dinheiro e de uma coisa, o contrato poderá ser caracterizado como troca ou como compra e venda. Há dois critérios que podem ser utilizados para fazer essa distinção: o critério subjetivo e o objetivo. Pelo critério subjetivo, deve-se observar se o intuito de contratar daquele que recebe dinheiro e coisa é direcionado ao primeiro ou ao segundo, ou seja, qual dos dois bens, dinheiro ou coisa, o motivam a contratar. Se for a coisa, o negócio será compra e venda. Pelo critério objetivo, observa-se qual é o componente mais valioso, se o dinheiro ou a coisa que o acompanha. A escolha do critério a ser utilizado fica a cargo do intérprete, que deve verificar qual, no caso concreto, realiza a solução mais justa. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 29.08.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 482. A compra e venda, quando pura, considerar-se-á obrigatória e perfeita, desde que as partes acordarem no objeto e no preço.

Seguindo a esteira de Nelson Rosenvald, como exposto no tópico anterior, consenso, preço e coisa são os elementos constitutivos da compra e venda, quando constituída como negócio jurídico puro. Vale dizer: se pela autonomia privada as partes impõem a modalidade da condição (em princípio elemento acidental do negócio), a compra e venda se subordinará a um evento futuro e incerto. Tratando-se de condição suspensiva, enquanto não ocorrer o evento, há que cogitar apenas de um direito eventual, cuja eficácia é subordinada ao implemento da condição (CC. 125). Contudo, cuidando-se de condição resolutiva (v.g., propriedade resolúvel), o evento futuro suprimirá a eficácia do negócio jurídico, preservando-se as situações constituídas quando se tratar de contrato de duração (CC. 128).

a)   Com relação ao objeto, podemos considera-lo como bem ou coisa nos contratos
de compra e venda? A relação entre bem e coisa é de gênero e espécie. O termo bem abrange objetos corpóreos e incorpóreos, suscetíveis de apropriação, abrangendo qualquer utilidade de material ou ideal. Já a coisa é o bem economicamente apreciável e tangível, posto que é suscetível de apropriação pelo homem. Daí nossa preferência pela utilização do termo bem.

O bem móvel ou imóvel e passível de alienação é todo aquele que não se encontre fora do comércio, seja ele corpóreo ou incorpóreo, apenas com a ressalva de se empregar o termo cessão para a definição do contrato transmissivo de propriedade imaterial e intangível. Certamente, há que tomar cuidado quanto aos requisitos de validade de qualquer negócio jurídico (CC. 104), nulificando-se a venda em que o objeto seja indeterminado, ilícito ou impossível (CC. 166, II). Exemplo típico de ilicitude seria a venda de herança de pessoa viva (CC. 426), em que se cancelaria a própria unilateralidade, característica ínsita aos negócios jurídicos testamentários de transmissão de propriedade mortis causa.

b) O preço será necessariamente clausulado no contrato de compra e venda, traduzindo uma soma em dinheiro. Poderá inclusive o valor ser determinado por terceiro (CC. 485). Não necessariamente precisa ser determinado, sendo bastante a sua determinabilidade, mediante parâmetros.

Fundamental para a precisa caracterização da compra e venda é a justiça do preço. O sinalagma genético, demanda que ao tempo da constituição do contrato as prestações possuam um sentido de equivalência, sob pena de possível desconstituição, por anulabilidade, do negócio jurídico pela lesão (CC. 171). Tratando-se a expressão “prestação manifestamente desproporcional” (CC. 157) de conceito jurídico indeterminado, caberá ao magistrado preencher o desenho da norma, estipulando, nas circunstâncias do caso, qual é o sentido de desequilíbrio contratual frontalmente contrário ao princípio constitucional da proporcionalidade.

Mesmo que ao tempo da gênese do contrato o preço respeito o princípio da justiça contratual, poderá eventualmente ocorrer o fenômeno da onerosidade excessiva (DD. 478), com súbito sacrifício de uma das partes em razão da elevação imprevista do preço, estipulando o legislador a resolução contratual. Em outra passagem, observamos que a mobilidade das cláusulas gerais da função social (CC.421) e da boa-fé objetiva (CC. 422) permite que se afirme o princípio da conservação do negócio jurídico. Ou seja, a compra e venda poderá ser preservada pela modificação da cláusula com adequação do preço originário, no caso de lesão, ou pela revisão contratual mediante alteração do preço, tratando-se de onerosidade excessiva.

Observa-se que o legislador impôs como causa de invalidação do negócio dispositivo a inserção de cláusula que estipule o pagamento em ouro ou em moeda estrangeira, eis que o adimplemento se dará em moeda corrente (CC. 315 e 318). Ou seja, nada impede que a obrigação contratual seja fixada em moeda estrangeira, desde que convertida para a moeda nacional ao momento do pagamento.

c) Por fim, o consenso está embutido na expressão “as partes acordarem no objeto e no preço”. Quando do estudo da formação do contrato, percebemos que o acordo resulta da aceitação da proposta pelo oblato, ou da aquiescência, por qualquer um, da oferta ao público (CC. 429). Do consenso resulta a obrigação do vendedor de transferir a propriedade do bem em contraposição à obrigação do comprador de entregar determinada soa em dinheiro.

O consentimento exige que cada um dos contraentes possua a capacidade de fato ou negocial, ou seja, a aptidão para contrair obrigações de per si. Não se olvide de que certas hipóteses de compra e venda exigem, além do pressuposto subjetivo da capacidade de gozo, a legitimação específica. Ou seja, na venda de ascendentes a descendentes, de condôminos a estranhos ao condomínio, ou de um dos cônjuges a terceiros, não é bastante a capacidade plena, sendo necessária a integração de terceiros ao negócio (demais descendentes, condôminos e outro cônjuge), a fim de que se conceda poder de disposição e a compra e venda se constitua validamente. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 550-551 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 29/08/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

A doutrina apresentada por Ricardo Fiuza comenta sobre a compra e venda pura produzir efeitos imediatos, diversa da realizada a termo ou dependente de condição. Deflui da consensualidade, elemento essencial do contrato, quando ajustado o objeto do negócio e fixado o preço (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 260, apud Maria Helena Diniz, Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 29/08/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No entendimento de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o dispositivo enfatiza a natureza informal e obrigacional do contrato de compra e venda. Basta o acordo de vontades visando à alienação do bem por determinado preço para que o contrato se aperfeiçoe. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 29.08.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 483. A compra e venda pode ter por objeto coisa atual ou futura. Neste caso, ficará sem efeito o contrato se esta não vier a existir, salvo se a intenção das partes era de concluir contrato aleatório.

No pensar de Nelson Rosenvald, o bem do negociado poderá ser de existência atual ou futura. É bastante usual a alienação de imóveis em construção. Nos contratos aleatórios, é da própria essência do risco assumido por uma das partes a imposição de prestações que dependerão do acaso, seja pela sua exigibilidade (CC. 458), seja pela própria quantidade da coisa, como na venda de coisa futura (v.g., compra de safra ou de mercadorias em bolsa com preço fixo).

Aliás, a parte final do dispositivo enuncia a ineficácia superveniente do negócio jurídico pela inexistência da coisa adquirida, com ressalva do contrato aleatório. No particular, caberá distinguir entre a emptio spei (CC. 458) e a emptio rei speratae CC. 459). Caso a venda diga respeito à própria incerteza quanto à existência da coisa em si, o contrato é válido e o alienante receberá tudo aquilo que lhe fora prometido. Contudo, tratando-se de negócio aleatório referente á quantidade esperada (v.g., adquiro o que vier na sua rede de pescaria pelo valor X), caso nada venha, tratar-se-á de hipótese evidente de inexistência do negócio jurídico, com restituição de eventual adiantamento, na dicção do parágrafo único do CC. 459.

No mais, concedendo-se amplitude à letra da norma, pode-se ainda entender como coisa futura aquela que não é de titularidade do alienante ao tempo da conclusão do negócio jurídico, mas que, posteriormente adquirida pelo alienante, empresta eficácia superveniente ao negócio, como se o adquirente de boa-fé se convertesse em proprietário desde a data da tradição (CC. 1.268, § 1º). (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 552 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 29/08/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Quanto sob a visão de Ricardo Fiuza, a compra e venda tem por objeto, suscetível da translatividade do domínio (efeitos do art. 481), coisa atual, o que quer dizer existente ou de existência potencial dizendo respeito à coisa futura, sejam elas corpóreas ou incorpóreas. Neste último caso, o negócio jurídico ficará sem efeito, não vindo a existir a coisa, ressalvada a hipótese de o contrato ser aleatório, nos termos do CC. 458 e artigos subsequentes. A validade do negócio, diante de contrato aleatório, é trazida no novo texto, como inovação conveniente, útil e benéfica, considerando a intenção das partes. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 260, apud Maria Helena Diniz, Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 29/08/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Seguindo a orientação de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o fato de o bem não existir não impede o contrato de compra e venda. A venda de bem futuro ocorre frequentemente quando o vendedor dependa da especificação de pedido para que venha a fabricar o bem. Se o bem não vier a existir na época acordada para a sua entrega, sem que haja culpa por parte do vendedor, o contrato é extinto pela perda do objeto. Se, contudo, a inexistência do bem decorrer de culpa do vendedor, o caso será de descumprimento contratual e o submeterá ao pagamento de perdas e danos.

Nos contratos aleatórios, i. é, nos contratos em que as partes prevejam a possibilidade de a coisa vir ou não a existir, é válida a cláusula que obriga o comprador ao pagamento do preço mesmo que a coisa não venha a existir, por ter assumido este risco. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 29.08.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

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