Direito Civil Comentado
- Art. 481, 482, 483 - Continua
- Da compra e Venda -
Disposições Gerais –
VARGAS, Paulo S. R.
Parte
Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI
– Das Várias Espécies de Contrato
(art. 481 a 853) Capítulo I – Da Compra e
Venda
Seção I –
Disposições Gerais –
vargasdigitador.blogspot.com
Art. 481. Pelo contrato de compra e
venda, um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o
outro, a pagar-lhe certo preço em dinheiro.
Clareando a mente
com Nelson Rosenvald, aprende-se que com a edição do Código Civil de 2002, não
houve alteração na sistemática do contrato de compra e venda. Reiterando o art.
1.122 do CC/1916 mantemo-nos filiados à concepção obrigacional da compra e venda,
pela qual o acordo de vontades entre os contraentes não é suficiente para
transmitir a propriedade, sendo necessária a tradição para a constituição de
direitos reais sobre bens móveis (CC. 1.267) e o registro para o
aperfeiçoamento de direitos reais imobiliários (CC. 1.245).
Nosso sistema seria
uma espécie intermediária entre o sistema franco-italiano e o alemão. Aquele
concebe a compra e venda coo acordo translativo de propriedade, sendo
suficiente o consenso. A fórmula germânica requer dois contratos autônomos e
sucessivos: o primeiro estabelecendo obrigações intersubjetivas; o segundo, um
negócio abstrato, dotado de eficácia real, aperfeiçoado perante o registro com
a finalidade de expurgar os vícios do contrato originário, além de gerar
propriedade. No Brasil, de forma eclética, o contrato consubstancia o consenso,
porém será integrado pela tradição ou registro.
Certamente,
mantém-se acesa grande polêmica instaurada pelo genial Darcy Bessone ao
discordar da compra e venda como mera obrigação de dar. Para o insigne
doutrinador, o registrador apenas conclui o ato complexo de formação
progressiva pela qual toda manifestação de transmissão do direito real já se
exauriu no negócio jurídico. Vale dizer que o registro apenas concederia
eficácia real à compra e venda, pois é desnecessária uma segunda manifestação
de vontade do alienante, ao contrário do que se sucede no direito alemão. Com
efeito, a obrigação demanda uma futura atuação do devedor, todavia, com a
emissão da escritura de compra e venda, o alienante não precisará praticar uma
nova conduta, eis que toda a carga recairá sobre o adquirente, no sentido de
promover unilateralmente o registro do título, concluindo o ato complexo com a
chancela estatal.
Nada obstante, a
doutrina pátria mantém a tese obrigacional da compra e venda como negócio
jurídico bilateral, no qual a obrigação do alienante consiste na entrega da
coisa, enquanto a prestação do adquirente se traduz no pagamento de um preço.
Assim como a troca e a doação, trata-se de contrato translativo, funcionando
como título ou causa, enquanto a tradição e o registro são os modos
de transmissão. Portanto, se o alienante promover sucessivas vendas e o
primeiro comprador não cuidar de promover o registro, aquele que levar o título
ao cartório do registro imobiliário será o proprietário, cabendo ao comprador
primitivo o mero ajuizamento de ação indenizatória perante o alienante.
A coisa, o preço e o
consenso são pressupostos de existência do negócio, sem os quais não haverá a
hipótese de incidência para que a compra e venda penetre no mundo jurídico. Há
uma troca de bens por dinheiro – aliás, o que distingue a venda da permuta -,
que em regra dispensa solenidades, excepcionando-se a imposição de forma
pública para alienação de imóveis de valor superior a trinta salários-mínimos
(CC. 108).
Além da
bilateralidade, a compra e venda é caracterizada como contrato oneroso, sendo
de sua natureza a configuração de vantagens e sacrifícios recíprocos. Da
onerosidade não decorre necessariamente a sua comutatividade, pois
eventualmente se perfaz como contrato aleatório, em que ao menos uma das
prestações é incerta ao tempo da contratação (CC. 458). Mesmo nas relações
civis, admite-se a forma da contratação pela adesão (CC. 423), sendo passível
de elaboração como contrato instantâneo – pagamento imediato (v.g.,
aquisição de chocolate em padaria) – ou como contrato de duração, com pactuação
de pagamento diferido ou mediante execução sucessiva de diversas prestações
periódicas. (ROSENVALD
Nelson, apud Código Civil Comentado:
Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar
Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 549-550 - Barueri, SP:
Manole, 2010. Acesso 29/08/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).
Nos ensinamentos
liberados por Ricardo Fiuza em sua Doutrina, tem-se o contrato de compra e
venda como contrato bilateral, consensual, oneroso, comutativo ou aleatório, e,
de modo geral, não solene (a depender do objeto), de efeitos meramente
obrigacionais (obrigação ad tradendum) que serve como título de
aquisição de coisa determinada mediante o pagamento do preço, definido e em
dinheiro, obrigado o vendedor a transferir a propriedade do bem em favor do
comprador. O sistema adotado acompanha o alemão (BGB, art. 433). A
translatividade dominial se aperfeiçoa somente pela tradição (se o bem for
móvel) ou pelo registro imobiliário (se o bem for imóvel).
A
forma não será livre quando a validade da declaração de vontade depender de
forma especial exigida por lei (CC. 108), como ocorre com a exigência de
escritura pública, essencial à validade do negócio jurídico, na compra e venda
de imóveis, de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no
País (CC.108) (Direito Civil -
doutrina, Ricardo
Fiuza – p. 259-260, apud Maria Helena
Diniz, Código Civil Comentado já impresso
pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 29/08/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Em
seu comentário ao artigo 481, Marco Túlio de Carvalho Rocha conceitua compra e
venda. Para ele encontram-se os elementos essenciais desse
negócio: a coisa (res), o acordo de vontade (consensus) e o
preço (pretium).
Outro elemento importante deste conceito,
segundo ele, é a explicitação dos principais efeitos deste contrato: obrigar o
vendedor a transferir o domínio da coisa ao comprador; obrigar o comprador a
pagar o preço ao vendedor. Desse modo, resta claro que a compra e venda não
produz, por si só, a transferência da propriedade, que ocorre pela tradição: o
registro em nome do comprador se se tratar de bem imóvel; a transferência da
posse com o ânimo de transferir a propriedade, no caso de bem móvel.
O contrato de compra e venda é um contrato
bilateral, consensual (em alguns casos, formal), oneroso: comutativo ou
aleatório, de execução instantânea: imediata ou diferida.
Quanto às artes: a) capacidade: as
partes podem ser capazes ou incapazes. Os incapazes devem ser devidamente
assistidos ou representados.
Legitimação objetiva do vendedor: b) o
vendedor deve ser o proprietário da coisa ou adquirir-lhe a propriedade até o
momento da tradição. A venda
a non domino pode configurar
crime de estelionato, se houver dolo, nulidade absoluta por ilicitude do
objeto, anulabilidade por dolo ou por erro ou descumprimento contratual se
fosse do conhecimento do comprador que o bem pertencia a terceiro. a venda a non domino é ineficaz em relação ao vero domino.
Legitimação subjetiva do vendedor: c)
um cônjuge não pode vender bens imóveis sem a anuência do outro sob pena de
anulabilidade (CC. 1.649), exceto no regime da separação absoluta (CC. 1.647,
I); no da participação final dos aquestos, se autorizada a livre disposição do
pacto antenupcial (CC. 1.656); cônjuges não podem vender, uma para o outro,
bens comuns (CC. 499); ascendentes devem obter a anuência de descendentes na
venda a algum deles (CC. 496); a ação prescreve em 20 anos a contar do ato
(Súmula 494 do STF), contudo, o CC. 179 reduziu o prazo para 2 anos a contar do
ato); condômino de coisa indivisível tem direito de preferencia na venda de
quinhão pertencente a outro condômino (CC. 504); direito de preferencia (CC. 513
a 520); o locatário de bem imóvel tem direito de preferencia para a aquisição
do bem que aluga (Lei n. 8.245, art. 27); menores sujeitos a poder familiar
dependem de autorização judicial para a venda de imóveis (CC. 1.691); demais
incapazes dependem de autorização judicial na venda de móveis e de imóveis (CC.
1.748, IV, cc 1.774); os bens do falido somente podem ser vendidos com
autorização do juiz da falência.
Existe legitimação objetiva e subjetiva
do comprador: tutores, curadores, testamenteiros e administradores não podem
adquirir bens, respectivamente, de seus pupilos, curatelados, que forem objeto
do testamento ou que estejam sob sua administração (CC. 497, I e 1.749);
mandatários não podem adquirir para si bens mediante a utilização do próprio
mandato, salvo se houver autorização expressa para tanto (CC. 117 e Súmula 165,
STF); servidores públicos não podem adquirir bens do ente público a que prestem
serviços (CC. 497, II); Juízes, serventuários e auxiliares da justiça não podem
adquirir que sejam objeto de feito em tramitação no local em que prestam
serviços (art. 497, III); leiloeiros não podem adquirir bens que estejam
leiloando (CC. 497, IV).
O preço da compra e venda consiste em
dinheiro ou equivalente. No tocante ao poder liberatório os títulos de crédito
são, em regra, pro
soluto:
“Se, na ocasião de pagar, o devedor
quer pagar com cheque, ou o credor recusa o cheque, e incorre em mora o
devedor, ou o credor aceita o cheque, e não se pode pensar em mora: a
responsabilidade pelo cheque, que nada tem com o negócio jurídico de que se
irradiara a obrigação de pagar” (Pontes de Miranda. Tratado de direito privado,
t. XXXVII, p. 229).
Caráter pro soluto do pagamento com cartão de crédito: REsp n.
1.133.410-RS, Min. Massami Uyeda, 3ª T., j. 16/3/2012.
Contra:
“o pagamento só poderá efetuar-se em
apólices federais, estaduais ou municipais, se nisso convier o credor, ou tiver
sido estipulado no contato. O mesmo sucederá no tocante ao pagamento mediante
cheque, que é recebido pro
solvendo e não pro soluto; se não
houver provisão, o pagamento é ineficaz.” (Monteiro, Washington de Barros. Curso de direito civil, 4º v, p. 254, no mesmo sentido: Carvalho Santos, J.
M. Código civil brasileiro
interpretado, v. XII, p. 177. REsp
n. 1.023.648-ES, 3ª T. Min. Humberto gomes de Barros, j. 17.03.2008).
O preço vil ou fictício torna a venda
nula ou anulável se caracterizar: a) lesão (CC. 157; MP n. 2.172-32, de
23/8/01; b) estado de perigo (CC. 156); c) simulação (CC. 167); d) prática
proibida (CC. 166, VII, ex.: “Lavagem de dinheiro”, Lei n. 9.613/98, “usura pecuniária
ou real”, Lei n. a521/51, art. 4º, b, “concorrência desleal” Lei n. 884/94,
art. 21, XVIII).
Se a contraprestação pela alienação do
bem não for dinheiro o negócio não será de compra e venda. Se a contraprestação
for dinheiro e uma coisa fica caracterizada a troca. Se for um serviço, o
contrato será inominado. Se a contraprestação for composta de dinheiro e de uma
coisa, o contrato poderá ser caracterizado como troca ou como compra e venda.
Há dois critérios que podem ser utilizados para fazer essa distinção: o
critério subjetivo e o objetivo. Pelo critério subjetivo, deve-se observar se o
intuito de contratar daquele que recebe dinheiro e coisa é direcionado ao
primeiro ou ao segundo, ou seja, qual dos dois bens, dinheiro ou coisa, o
motivam a contratar. Se for a coisa, o negócio será compra e venda. Pelo
critério objetivo, observa-se qual é o componente mais valioso, se o dinheiro
ou a coisa que o acompanha. A escolha do critério a ser utilizado fica a cargo
do intérprete, que deve verificar qual, no caso concreto, realiza a solução
mais justa. (Marco Túlio de Carvalho Rocha
apud Direito.com acesso em 29.08.2019, corrigido e aplicadas
as devidas atualizações VD).
Art. 482.
A
compra e venda, quando pura, considerar-se-á obrigatória e perfeita, desde que
as partes acordarem no objeto e no preço.
Seguindo a esteira de Nelson Rosenvald, como exposto no tópico
anterior, consenso, preço e coisa são os elementos constitutivos da compra e
venda, quando constituída como negócio jurídico puro. Vale dizer: se pela
autonomia privada as partes impõem a modalidade da condição (em princípio
elemento acidental do negócio), a compra e venda se subordinará a um evento futuro
e incerto. Tratando-se de condição suspensiva, enquanto não ocorrer o evento, há
que cogitar apenas de um direito eventual, cuja eficácia é subordinada ao
implemento da condição (CC. 125). Contudo, cuidando-se de condição resolutiva (v.g.,
propriedade resolúvel), o evento futuro suprimirá a eficácia do negócio jurídico,
preservando-se as situações constituídas quando se tratar de contrato de duração
(CC. 128).
a) Com relação ao objeto, podemos considera-lo como bem ou
coisa nos contratos
de compra e venda? A relação entre bem e coisa
é de gênero e espécie. O termo bem abrange objetos corpóreos e incorpóreos, suscetíveis
de apropriação, abrangendo qualquer utilidade de material ou ideal. Já a coisa
é o bem economicamente apreciável e tangível, posto que é suscetível de apropriação
pelo homem. Daí nossa preferência pela utilização do termo bem.
O bem móvel ou imóvel e passível de alienação é
todo aquele que não se encontre fora do comércio, seja ele corpóreo ou incorpóreo,
apenas com a ressalva de se empregar o termo cessão para a definição do
contrato transmissivo de propriedade imaterial e intangível. Certamente, há que
tomar cuidado quanto aos requisitos de validade de qualquer negócio jurídico (CC.
104), nulificando-se a venda em que o objeto seja indeterminado, ilícito ou impossível
(CC. 166, II). Exemplo típico de ilicitude seria a venda de herança de pessoa
viva (CC. 426), em que se cancelaria a própria unilateralidade, característica
ínsita aos negócios jurídicos testamentários de transmissão de propriedade mortis
causa.
b) O preço será necessariamente clausulado no
contrato de compra e venda, traduzindo uma soma em dinheiro. Poderá inclusive o
valor ser determinado por terceiro (CC. 485). Não necessariamente precisa ser
determinado, sendo bastante a sua determinabilidade, mediante parâmetros.
Fundamental para a precisa caracterização da
compra e venda é a justiça do preço. O sinalagma genético, demanda que ao tempo
da constituição do contrato as prestações possuam um sentido de equivalência,
sob pena de possível desconstituição, por anulabilidade, do negócio jurídico pela
lesão (CC. 171). Tratando-se a expressão “prestação manifestamente desproporcional”
(CC. 157) de conceito jurídico indeterminado, caberá ao magistrado preencher o
desenho da norma, estipulando, nas circunstâncias do caso, qual é o sentido de
desequilíbrio contratual frontalmente contrário ao princípio constitucional da
proporcionalidade.
Mesmo que ao tempo da gênese do contrato o preço
respeito o princípio da justiça contratual, poderá eventualmente ocorrer o fenômeno
da onerosidade excessiva (DD. 478), com súbito sacrifício de uma das partes em razão
da elevação imprevista do preço, estipulando o legislador a resolução
contratual. Em outra passagem, observamos que a mobilidade das cláusulas gerais
da função social (CC.421) e da boa-fé objetiva (CC. 422) permite que se afirme
o princípio da conservação do negócio jurídico. Ou seja, a compra e venda
poderá ser preservada pela modificação da cláusula com adequação do preço originário,
no caso de lesão, ou pela revisão contratual mediante alteração do preço,
tratando-se de onerosidade excessiva.
Observa-se que o legislador impôs como causa de
invalidação do negócio dispositivo a inserção de cláusula que estipule o
pagamento em ouro ou em moeda estrangeira, eis que o adimplemento se dará em
moeda corrente (CC. 315 e 318). Ou seja, nada impede que a obrigação contratual
seja fixada em moeda estrangeira, desde que convertida para a moeda nacional ao
momento do pagamento.
c) Por fim, o consenso está embutido na expressão
“as partes acordarem no objeto e no preço”. Quando do estudo da formação
do contrato, percebemos que o acordo resulta da aceitação da proposta pelo
oblato, ou da aquiescência, por qualquer um, da oferta ao público (CC. 429). Do
consenso resulta a obrigação do vendedor de transferir a propriedade do bem em contraposição
à obrigação do comprador de entregar determinada soa em dinheiro.
O consentimento
exige que cada um dos contraentes possua a capacidade de fato ou negocial, ou
seja, a aptidão para contrair obrigações de per si. Não se olvide de que
certas hipóteses de compra e venda exigem, além do pressuposto subjetivo da
capacidade de gozo, a legitimação específica. Ou seja, na venda de ascendentes
a descendentes, de condôminos a estranhos ao condomínio, ou de um dos cônjuges a
terceiros, não é bastante a capacidade plena, sendo necessária a integração de
terceiros ao negócio (demais descendentes, condôminos e outro cônjuge), a fim
de que se conceda poder de disposição e a compra e venda se constitua
validamente. (ROSENVALD
Nelson, apud Código Civil Comentado:
Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar
Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 550-551 - Barueri, SP:
Manole, 2010. Acesso 29/08/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).
A doutrina apresentada por Ricardo Fiuza comenta sobre a compra e
venda pura produzir efeitos imediatos, diversa da realizada a termo ou
dependente de condição. Deflui da consensualidade, elemento essencial do
contrato, quando ajustado o objeto do negócio e fixado o preço (Direito Civil - doutrina, Ricardo
Fiuza – p. 260, apud Maria Helena
Diniz, Código Civil Comentado já impresso
pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 29/08/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
No entendimento de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o dispositivo enfatiza a
natureza informal e obrigacional do contrato de compra e venda. Basta o acordo
de vontades visando à alienação do bem por determinado preço para que o
contrato se aperfeiçoe. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso
em 29.08.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art. 483. A compra e venda pode ter por objeto coisa atual ou futura. Neste caso,
ficará sem efeito o contrato se esta não vier a existir, salvo se a intenção das
partes era de concluir contrato aleatório.
No pensar de Nelson Rosenvald, o bem do negociado poderá ser de existência
atual ou futura. É bastante usual a alienação de imóveis em construção. Nos contratos
aleatórios, é da própria essência do risco assumido por uma das partes a imposição
de prestações que dependerão do acaso, seja pela sua exigibilidade (CC. 458), seja
pela própria quantidade da coisa, como na venda de coisa futura (v.g.,
compra de safra ou de mercadorias em bolsa com preço fixo).
Aliás, a parte final do dispositivo enuncia a ineficácia superveniente
do negócio jurídico pela inexistência da coisa adquirida, com ressalva do
contrato aleatório. No particular, caberá distinguir entre a emptio spei
(CC. 458) e a emptio rei speratae CC. 459). Caso a venda diga respeito à
própria incerteza quanto à existência da coisa em si, o contrato é válido e o
alienante receberá tudo aquilo que lhe fora prometido. Contudo, tratando-se de
negócio aleatório referente á quantidade esperada (v.g., adquiro o que
vier na sua rede de pescaria pelo valor X), caso nada venha, tratar-se-á de hipótese
evidente de inexistência do negócio jurídico, com restituição de eventual
adiantamento, na dicção do parágrafo único do CC. 459.
No mais, concedendo-se
amplitude à letra da norma, pode-se ainda entender como coisa futura
aquela que não é de titularidade do alienante ao tempo da conclusão do negócio jurídico,
mas que, posteriormente adquirida pelo alienante, empresta eficácia
superveniente ao negócio, como se o adquirente de boa-fé se convertesse em
proprietário desde a data da tradição (CC. 1.268, § 1º). (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e
Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários
autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 552 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 29/08/2019.
Revista e atualizada nesta data por VD).
Quanto sob a visão de Ricardo Fiuza, a compra e venda tem por
objeto, suscetível da translatividade do domínio (efeitos do art. 481), coisa
atual, o que quer dizer existente ou de existência potencial dizendo respeito à
coisa futura, sejam elas corpóreas ou incorpóreas. Neste último caso, o negócio
jurídico ficará sem efeito, não vindo a existir a coisa, ressalvada a hipótese de
o contrato ser aleatório, nos termos do CC. 458 e artigos subsequentes. A validade
do negócio, diante de contrato aleatório, é trazida no novo texto, como
inovação conveniente, útil e benéfica, considerando a intenção das partes. (Direito Civil - doutrina, Ricardo
Fiuza – p. 260, apud Maria Helena
Diniz, Código Civil Comentado já impresso
pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 29/08/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Seguindo a orientação de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o fato de o bem não existir não impede o contrato
de compra e venda. A venda de bem futuro ocorre frequentemente quando o
vendedor dependa da especificação de pedido para que venha a fabricar o bem. Se
o bem não vier a existir na época acordada para a sua entrega, sem que haja
culpa por parte do vendedor, o contrato é extinto pela perda do objeto. Se, contudo,
a inexistência do bem decorrer de culpa do vendedor, o caso será de
descumprimento contratual e o submeterá ao pagamento de perdas e danos.
Nos contratos aleatórios, i. é, nos
contratos em que as partes prevejam a possibilidade de a coisa vir ou não a
existir, é válida a cláusula que obriga o comprador ao pagamento do preço mesmo
que a coisa não venha a existir, por ter assumido este risco. (Marco Túlio de
Carvalho Rocha
apud Direito.com acesso em 29.08.2019, corrigido e aplicadas
as devidas atualizações VD).
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