Direito Civil Comentado
- Art. 593, 594, 595 - continua
- Da
Prestação de Serviço - VARGAS, Paulo S. R.
Parte
Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI
– Das Várias Espécies de Contrato
(art. 481 a 853) Capítulo VII – Da Prestação
de serviço
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Art. 593.
A
prestação de serviço, que não estiver sujeita às leis trabalhistas ou a lei
especial, reger-se-á pelas disposições deste Capítulo.
No
magistério de Nelson Rosenvald, quando do estudo da locação, observamos que no
direito romano havia três modalidades de negócios jurídicos a ela ligados: a locatio
rei (atual locação); locatio operis (atual empreitada); e a locatio
operarum (atual prestação de serviços). Nesta última, um sujeito –
normalmente escravo – colocava os seus serviços à disposição de outrem, em
determinado período, em troca de retribuição. Enquanto o Código Civil de 1916,
por apego à tradição, ainda adotava a expressa “locação de serviço”, o Código
Civil de 2002 intitula o Capítulo VII dos contratos em espécie como “prestação
de serviço”.
Aliás, o
trabalho se insere nos direitos da personalidade do ser humano, atributo
essencial que se vincula à sua própria existência, pois a partir dele se
alcança o “mínimo vital” e o patrimônio mínimo”, que atribuem à pessoa especial
dignidade e lhe permitem diferenciar-se dos objetos, que são instrumentalizados
a serviço de outrem.
Diferencia-se
a prestação de serviços da empreitada. Em comum, incide uma atividade pessoal
em favor de outrem. Mas, na empreitada, aquele que promete obra deve o
resultado concluído, pois toda a sua atividade é dirigida àquela finalidade.
Quem promete serviço deve a atividade em si, ou seja, uma obrigação de meio em
que cada fração da atividade representa o seu adimplemento
Ao tempo da
votação do texto pela Câmara dos deputados, alguns chegaram a questionar a
manutenção da prestação de serviço, eis que a matéria seria objeto de tratamento
pela legislação trabalhista ou pelo contrato de empreitada. Porém, entre as
atividades exercitadas com vínculo empregatício e as realizadas mediante
empreitada, há ainda um considerável espaço de atividades autônomas que não se
confundem com aquelas.
No Brasil, a
Consolidação das Leis Trabalhistas é um desdobramento do direito civil,
alcançando autonomia pela necessidade de tutela ao trabalhador, visto como
vulnerável. O Código Civil só incidirá quando o serviço realizado não detiver a
característica da subordinação hierárquica que atrai a incidência da CLT (art.
3º). Toda relação de emprego é qualificada por uma subordinação jurídica
(funcional), com sujeição do empregado às ordens legítimas emanadas do
empregador. O prestador de serviços não se emprega nem se faz empregado, pois
não se afirma o estado de dependência econômica e submissão a ordens. Inexiste
direção técnica e controle sobre o modo de execução do serviço prestado, pois a
sua natureza é eventual.
Enfim, na
essência, não há distinção entre o contrato de trabalho e a prestação de
serviços civil. Apenas há uma especialização da matéria com legislação adequada
e consubstanciada em normas de ordem pública para a proteção social do contrato
de trabalho. Na dúvida entre a existência de autonomia ou subordinação,
prefere-se a relação de trabalho, tendo-se em consideração a tutela do
hipossuficiente.
A outro
giro, o fenômeno da terceirização de serviços resulta da contratação de um
serviço especializado com redução de custos, em razão da natureza autônoma do
vínculo que se forma entre o tomador e o prestador de serviços, já que aquele
transfere os encargos sociais para a pessoa jurídica prestadora que contratará
os empregados. Em suma, as atividades-meio das empresas são terceirizadas – com
descentralização operacional – a fim de que elas possam exercer com maior
afinco e competitividade a sua atividade-fim. O Enunciado n. 321 do Tribunal
Superior do Trabalho regula e limita a contratação de trabalhadores por
interposta pessoa a serviços ligados à atividade-meio do tomador.
Outrossim, a prestação de
serviço será remetida às regras do Código de Defesa do Consumidor quando o
prestador se enquadrar no conceito do fornecedor habitual de serviço em suas
relações com o consumidor vulnerável. Aplicam-se os arts. 2º e 3º da Lei n.
8.078/90 e, subsidiariamente, adotamos o Código Civil naquilo que não conflite
com a legislação especial. Portanto, um serviço de marcenaria ou uma consulta
médica serão simultaneamente apanhados pela regulamentação privada e consumeirista.
(ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e
Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários
autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 634 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 28/10/2019.
Revista e atualizada nesta data por VD).
Existe um
histórico antes da complementação da doutrina exposta por Ricardo Fiuza a
partir da primeira votação do texto pela Câmara dos Deputados em 1984, com uma
proposta apresentada pelo Deputado Tancredo Neves de supressão de todo o
Capítulo VII, ao argumento de que as hipóteses de “prestação de serviços”, ou
seriam regidas pelas leis trabalhistas, ou pelas normas que regem a empreitada,
nada, assim, lhe restando de próprio. A emenda veio a ser rejeitada pelo então
relator geral, o Deputado Ernani Sátyro que assim justificou: “Entre as
atividades exercidas e caracterizadas pelo ‘vínculo empregatício’ (às quais
correspondem ‘salários’) e as atividades executadas em razão de ‘empreitada’ ~
ainda resta um vasto campo de atividades autônomas irredutíveis àquelas duas.
Não se pode sequer afirmar, categoricamente ~ que esse resto estará coberto
pelas leis especiais, dada a multiplicidade dos tipos de atividade que compõem
o instituto da ‘prestação de serviços’. O ilustre civilista Orlando Gomes,
distinguindo claramente esse contrato, tanto da empreitada como do contrato de
trabalho, enumera nada menos de 5 grandes categorias de serviços subordinados a
essa parte do Código Civil (cfr. Contratos, Rio, Capítulo 24, pp. 326 e
ss. Quando mais não seja, por uma razão de prudência, é aconselhável se
mantenham as disposições do Código Civil pertinentes à prestação de serviços, a
qual se distingue pela ausência de vínculo de subordinação trabalhista, e
pressupõe atividade autônoma, retribuída ou não, no mais das vezes de breve
duração, caracterizadas pela autonomia de quem presta o serviço e livremente
convenciona a sua ‘retribuição’, sem ficar adstrito as normas cogentes do
Direito do Trabalho, como as relativas aos ‘contratos coletivos’. Trata-se,
além do mais, de um domínio em que prevalece o princípio da autonomia da
vontade, a salvo de restrições como as que, por motivos de ordem pública,
vigoram no Direito do Trabalho. De outro lado, não nos parece que, dada a
especificidade da matéria, se possa sujeitar todas as hipóteses de prestação de
serviço ao contrato de empreitada, como pretende o ilustre autor da emenda,
que, para tal fim, também oferece a Emenda n. 443, a qual importa no
reconhecimento da distinção. Não se pode, pensamos nós, afirmar que a
disciplina autônoma da ‘prestação de serviços considerada superarem em nossa
época. Ao contrário, Contratos de trabalho e de empreitada, novas exigências de
‘serviços autônomos, dos quais o Código não pode fazer abstração. Não tem
sentido data vênia, afirmar-se que a supressão dos contratos de
prestação de serviços seja uma exigência dos novos tempos. Para demonstrar a
improcedência dessa tese bastará lembrar que o Código Civil italiano, que é de
1943, apesar de nele se conter toda a legislação do trabalho, reserva título
especial (Tít. III do Livro 52) ao trabalho autônomo, abrangendo a prestação de
trabalhos intelectuais (arts 2.222 usque 2.238). A mesma distinção se
encontra no recentíssimo Código Civil português, que é de novembro de 1966,
havendo nele o Capítulo VIII do Título II (Dos contratos em especial) destinado
ao ‘Contrato de trabalho’, e o Capítulo IX para a ‘prestação de serviços’, uma
de cujas modalidades seria a empreitada (cfr artigo 1.552). O que se
deve considerar em desuso é apenas a expressão ‘locação de serviços’,
substituída no Projeto por ‘prestação de serviço’”. A redação atual é a mesma
do projeto.
Na doutrina
de Ricardo Fiuza, o CC/2002 arrola a prestação de serviço, como contrato civil
autônomo, separando-a da locação. Constitui-se na contratação de pessoa, com
qualificação técnica para um serviço específico, prestando-o por período
determinado, mediante remuneração. A atividade contratada não se caracteriza
habitual em sua prestação ao contratante e é exercida pelo prestador de serviço
com autonomia técnica e sem qualquer subordinação de poder (sujeição hierárquica)
ou dependência econômica em relação ao tomador do referido serviço. A prestação
de serviço é, assim, matéria de contrato na esfera do direito civil, não se
achando incluída do direito laboral ou em lei extravagante. (Jorge Lages Salono. Aspectos
dos contratos de prestação de serviços. São Paulo, Ed. Juarez de Oliveira,
1999) (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 318 apud
Maria Helena Diniz Código Civil
Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf,
Microsoft Word. Acesso em 28/10/2019,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Na
contribuição de Marco Túlio de Carvalho Rocha, prestação de serviço é o contato mediante
o qual uma pessoa se obriga a prestar um serviço a outra em troca de
determinada remuneração, executando-o com independência técnica, sem
subordinação hierárquica ou em caráter eventual.
Equivale
à “locação de serviços do Código Civil de 1916” – são regidos pelos mencionados
dispositivos os contratos que não se ajustam ao conceito de contrato de
trabalho, por não haver subordinação técnica, dependência econômica entre as
partes, ou por falta de continuidade (trabalho eventual).
Aplica-se:
a) trabalho autônomo (profissões liberais); b) trabalho eventual (biscate); c)
trabalho prestado por pessoas jurídicas (prestadoras de serviços de limpeza,
segurança, administração imobiliária, informática, conservação de elevadores
etc.).
A
prestação de sérvio é contrato bilateral, onerosa, consensual, de duração, e intuitu
personae (CC 605, ressalvada a hipótese do CC 609). (Marco Túlio de
Carvalho Rocha apud Direito.com acesso
em 28.10.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art. 594.
Toda
a espécie de serviço ou trabalho lícito, material ou imaterial, pode ser
contratada mediante retribuição.
No
entendimento de Nelson Rosenvald, a prestação de serviços compreende ampla gama
de atividades lícitas realizadas por aquele que pratica um serviço
especializado e eventual, abrangendo o exercício remunerado de um ofício (v.g.,
bombeiro, carpinteiro); de um profissional liberal (v.g., advogado,
médico); e de empresas especializadas (v.g., dedetização, vigilância)
que terceirizam serviços. Em síntese, obrigações de fazer, alcançando condutas
físicas (materiais) ou intelectuais (imateriais).
Tratando-se
de atividade ilícita – nesse sentido abrangendo aquela que fere os bons
costumes -, o negócio jurídico será reputado nulo, a teor do CC 166, II e III.
No Código
Civil, a prestação de serviços alcança uma faixa residual de trabalhos que não
é regulamentada pela legislação trabalhista ou estatutária, abarcando o
trabalho autônomo, o eventual (v.g., biscateiro) e o trabalho levado a
efeito por pessoas jurídicas. É o campo em que prepondera a autonomia privada,
pois alguém livremente convenciona a sua retribuição sem se submeter às normas
cogentes da legislação especial.
A prestação de serviço é um
contrato bilateral que gera direitos e obrigações para ambas as partes; oneroso,
pois os sacrifícios e vantagens são recíprocos, sendo a remuneração do
prestador do serviço inerente ao contrato; sinalagmático, pressupondo um
perfeito equilíbrio entre prestação e contraprestação; normalmente realizado intuitu
personae. Por fim, é contrato consensual e não solene, aperfeiçoando-se
mediante simples acordo de vontades, sem a necessidade de adoção de
formalidades. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e
Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários
autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 635 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 28/10/2019.
Revista e atualizada nesta data por VD).
No dizer de Ricardo
Fiuza, a norma oferece o conceito do contrato de prestação de serviços, a
partir da licitude do trabalho a ser executado, material ou imaterial. Toda
espécie de serviço ou trabalho lícito pode ser objeto do contrato, pelo qual o
prestador recebe, em contraprestação devida, a remuneração que atenderá a
natureza ou especificidade do serviço ajustado. A diversidade ampla de
serviços, a ensejar essa espécie de contrato, demonstra o seu largo espectro,
envolvendo inúmeros ofícios técnicos e atividades profissionais. E um contrato,
essencialmente, do cotidiano, a refletir relações eventuais em face das
necessidades episódicas de determinados serviços. É um contrato consensual, que
impõe obrigações recíprocas, com comutatividade das prestações, oneroso, não
solene e, de regra, personalíssimo. (Direito
Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 318 apud Maria Helena Diniz Código
Civil Comentado já impresso pdf 16ª
ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 28/10/2019, corrigido e
aplicadas as devidas atualizações VD).
Na contemplação de Marco Túlio de Carvalho Rocha, como em todo negócio
jurídico, o objeto do contrato de prestação de serviço deve ser idôneo, i.é,
não pode corresponder a atividade considerada ilegal nem imoral, sob pena de
nulidade.
Segundo
a regulação do Código Civil brasileiro, a prestação de serviço é, no Brasil,
sempre remunerada. A prestação de serviço gratuita configura contrato atípico. (Marco Túlio de
Carvalho Rocha apud Direito.com acesso
em 28.10.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art. 595. No contrato de prestação de
serviço, quando qualquer das partes não souber ler, nem escrever, o instrumento
poderá ser assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas.
Como apresenta Nelson
Rosenvald, temos aqui mais uma norma de tutela ao hipossuficiente, resguardando
o contratante analfabeto. A exigência da forma escrita e ad probationem, pois
o negócio jurídico permanece não solene e consensual, na medida em que a simples
prestação do serviço é bastante para acarretar a aplicação do Código Civil.
Aliás, é suficiente o instrumento particular.
A assinatura a rogo será
conferida por pessoa de confiança do analfabeto, pois subscreverá o documento
na presença de duas testemunhas. Aqui há uma inovação substancial do Código
Civil, pois na vigência do Código Civil de 1916 (art. 1.217) eram necessárias
quatro testemunhas, procedimento que desafia a diretriz atual da operabilidade
e efetividade das regras civis. (ROSENVALD
Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n.
10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e
atual., p. 635 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 28/10/2019. Revista e
atualizada nesta data por VD).
Na doutrina apresentada
por Ricardo Fiuza, não solene o contrato, tendo em conta o seu objeto, a
própria natureza de trabalho autônomo, quando o simples consenso das partes o
aperfeiçoa, sem exigir forma especial, a prestação de serviço pode, entretanto,
ser expressada por escrito. Na hipótese, é suficiente o instrumento particular,
mesmo que qualquer das partes não seja alfabetizada. Preceitua a norma que,
nesse caso, alguém a substitua, assinando a seu rogo, com a participação de
duas testemunhas instrumentais. Desse modo, o só fato de alei indicar que o
instrumento contratual poderá ser escrito e assinado a rogo, quando qualquer
das partes não souber nem ler, nem escrever, não o transmuda em solene. (Direito
Civil - doutrina, Ricardo
Fiuza – p. 319 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012,
pdf, Microsoft Word. Acesso em 28/10/2019,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Na visão de Marco Túlio de Carvalho Rocha, as partes do contrato de prestação de
serviço são o prestador do serviço, executante ou locador do serviço e, de
outro lado, o tomador do serviço, solicitante ou locatário.
O prestador do
serviço deve ser maior de dezesseis anos. O inciso XXXIII do art. 7º da
Constituição Federal proíbe o trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores
de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na
condição de aprendiz, a partir de catorze anos.
Se o prestador não
possuir habilitação ou outro requisito exigido pela lei, mas tiver agido de
boa-fé, somente poderá cobrar valor razoável pelos benefícios gerados. Não terá
direito à compensação se tiver contrariado lei de ordem pública (CC 606).
O
contrato de prestação de serviço é consensual, i.é, sua forma é livre. Pode ser
provado por testemunhas independentemente de começo de prova por escrito (RT,
176/705, 189/273, 192/673, 193/744; RF 98/382). Se uma das partes não souber
ler nem escrever poderá ser firmado contrato escrito, a rogo, com a presença de
duas testemunhas. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso
em 28.10.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
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