Direito Civil Comentado - Art. 846,
847, 848, - continua
- DA TRANSAÇÃO - VARGAS, Paulo S. R.
Parte
Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título
VI – Das Várias Espécies de Contrato
(Art. 481 a 853) Capítulo XIX – Da Transação
– Seção III – (art. 840 a 850) –
vargasdigitador.blogspot.com
Art. 846. A transação
concernente a obrigações resultantes de delito não extingue a ação penal
pública.
Analisando Claudio Luiz Bueno de Godoy, o artigo presente repete a regra que
já continha o art. 1.033 do CC/1916 e, a rigor, se inspira no princípio,
consagrado no art. 935, da relativa independência das jurisdições civil e
penal. Assim que, nos crimes de ação penal pública, a transação civil que acaso
se consume não inibe o Ministério Público de ofertar denúncia, se assim o
entender. Em diversos termos, a transação sobre os efeitos civis indenizatórios
decorrentes da prática de um ilícito não afeta o ofensor, se for o caso, da
atividade persecutória estatal. Porém, vale acentuar, mesmo nos delitos de ação
penal privada, dispõe o art. 104, parágrafo único do Código Penal, que o
recebimento, pelo ofendido, da indenização dos danos provocados pelo ilícito
não implica tácita renúncia ao direito de queixa. Apenas se deve ressalvar,
ante a superveniência da lei n. 9.099/95, que, nas infrações penais de menor
potencial ofensivo, como tal compreendidas as contravenções e os crimes punidos
com pena não superior a dois anos (art. 61), sendo a ação penal de iniciativa
privada ou pública condicionada à representação, aí então implicará respectiva
renúncia o acordo sobre a composição dos danos civis, mas desde que reduzida a
escrito e homologada pelo juízo, na forma da referida Lei dos Juizados
Especiais Criminais (art. 74, caput e
parágrafo único). Posto que se admita a redução extrajudicial a escrito (Ada
Pellegrini Grinover; Antônio Magalhães Gomes filho; Antonio Sacarance
Fernandes; Luiz Flávio Gomes. Juizados
Especiais Criminais. São Paulo, Revista dos Tribunais, 1996, p. 117),
dispõe o art. 74, parágrafo único, da LJEC que o acordo homologado gera a
renúncia do direito de queixa ou de representação. (Claudio
Luiz Bueno de Godoy, apud Código
Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002.
Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 870 - Barueri,
SP: Manole, 2010. Acesso 11/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).
Há um histórico na pauta de Ricardo Fiuza, onde mostra ser que este era
o texto original proposto pela Câmara: “Art. 846. A transação concernente a
obrigações resultantes de delito não perime a ação penal pública”. Quando da
apreciação pelo Senado, emenda da lavra do eminente Senador Josaphat Marinho
substituiu o verbo “perimir” por extinguir, conferindo maior clareza ao texto e
expurgando-o de termos e expressões pouco usadas.
Para a doutrina, a ação penal pública (a competência é do Estado, como
titular exclusivo do direito de punir, em que a acusação cabe ao Ministério
Público) não se extinguirá sendo a transação feita em razão das obrigações
oriundas do ato criminoso. Este dispositivo corresponde ao art. 1.033 do Código
Civil de 1916. (Direito
Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 443 apud Maria Helena Diniz Código
Civil Comentado já impresso pdf 16ª
ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 11/03/2020, corrigido e
aplicadas as devidas atualizações VD).
Na “elucidação” de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira,
conforme o CC 935, há uma relativa independência entre a responsabilidade civil
e a criminal decorrentes do mesmo fato. Nos termos do CC 935, embora a sentença
criminal possa ter repercussão na esfera cível, a sentença cível não tem
influência no juízo criminal. Desse modo, a transação que tenha como objeto a
reparação cível relativa a fato que seja também objeto de persecução criminal em
nada afeta essa. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 11.03.2020, corrigido e
aplicadas as devidas atualizações VD).
O Mestre Carlos
Roberto Gonçalves, buscado para deslindar o acima exposto, esclarecendo o CC
846 que “a transação concernente a
obrigações resultantes de delito não extingue a ação penal pública”. O
dispositivo é considerado ocioso, uma vez que a transação só pode versar sobre
direitos patrimoniais de caráter privado. A responsabilidade civil é
independente da criminal (CC 935). Mesmo que o fato seja, ao mesmo tempo,
ilícito penal e ilícito civil, por ter o ato criminoso causado danos
patrimoniais à vítima, pode a reparação ser objeto de transação, sem acarretar,
com isso, a extinção da ação penal movida pela justiça pública, salvo se a
transação foi efetuada com essa finalidade, nos casos em que a legislação penal
especial admite tal efeito. Assim, a composição amigável, pela qual o motorista
causador de um acidente de veículos indeniza a vítima, não produz
necessariamente o efeito de sustar o andamento da ação penal. (Carlos Roberto
Gonçalves. Direito Civil Brasileiro 3 –
Contratos e Atos Unilaterais) Resultado 1 de 1 deste Livro para comentário
ao CC 935 em comparação ao CC 846, Busca feita em 07/03/2020 no
books.google.com.br por VD reproduzido em
11.03.2020).
O mencionado CC
846 refere-se somente à ação penal pública, pois se o titular da ação penal for
o particular, admite-se a transação de caráter patrimonial, da qual resulte a
não interposição ou retirada da queixa. A transação que a Lei n. 9.099/95
permite na Justiça criminal para infrações de jurídica nova, de que a coisa é
objeto, não podendo ser envolvida nos efeitos da obligatio anterior” ¹7³. (Carlos Roberto
Gonçalves. Direito Civil Brasileiro 3 –
Contratos e Atos Unilaterais) Resultado 1 de 1 deste Livro para comentário
ao CC 935 em comparação ao CC 846, Busca feita em 07/03/2020 no
books.google.com.br por VD reproduzido em
11.03.2020).
Art. 847. É
admissível, na transação, a pena convencional.
Lecionando Claudio Luiz Bueno de
Godoy, o artigo em comento consagra, a exemplo do que fazia seu precedente, no
CC/1916, a possibilidade de se estabelecer, na transação, pena convencional. Ou
melhor, garante-se, no dispositivo, a prerrogativa de as partes inserirem na
transação uma cláusula penal, sob qualquer de suas modalidades, ou funções,
portanto quer a moratória, quer a compensatória, ou ambas, simultaneamente, o
que não se veda, dada a diversidade de sua pertinência.
A rigor, como já o
justificava Clóvis Beviláqua (Código
Civil comentado, 4 ed. Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1934, v. IV, p.
195), o preceito contendo a regra em comento fazia sentido no CC/1916 porque lá
era reputada a transação como uma forma de extinção das obrigações, e não
propriamente em contrato. Mas agora, explicitada a natureza contratual da
transação, de resto como já se observou no comentário ao CC 840, a norma
presente perde muito ou toda sua razão de ser, evidenciando-se a ociosidade de
se dizer cabível cláusula penal no que, afinal, é um contrato. Aliás, a
doutrina anterior ao Código Civil de 2002 já assentava inútil a regra caso o
CC/1916 considerasse a transação um contrato, o que agora se deu.
De toda sorte, aplica-se aqui todo o regramento da cláusula penal,
estabelecido nos CC 408 a 416, a que se remete o leitor. Deve-se acrescentar,
ainda, que a transação pode também conter, além da cláusula penal, uma garantia
especial, seja ela real, seja convencional. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e
Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários
autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 871 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 11/03/2020.
Revista e atualizada nesta data por VD).
Na pauta da Doutrina de
Ricardo Fiuza, este dispositivo admite pena convencional (o mesmo que pena
contratual, que é a sanção que fixa no contrato as perdas e danos) na
transação. E mera reprodução do Art. 1.034 do Código Civil de 1916, sem nenhuma
alteração, nem mesmo de ordem redacional; deve, pois, receber o mesmo
tratamento doutrinário. (Direito Civil -
doutrina, Ricardo
Fiuza – p. 444 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012,
pdf, Microsoft Word. Acesso em 11/03/2020,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
No sentir
de Luís
Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, uma vez que o Código Civil de 2002
evidenciou o caráter contratual da transação, é clara a admissibilidade de
cláusula penal, nos termos dos CC 408 a 416. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 11.03.2020, corrigido e aplicadas
as devidas atualizações VD).
Art. 848. Sendo nula
qualquer das cláusulas da transação, nula será esta.
Parágrafo
único. Quando a transação versar sobre diversos direitos contestados,
independentes entre si, o fato de não prevalecer em relação a um não
prejudicará os demais.
Segundo Claudio Luiz Bueno
de Godoy, a norma em questão, que também já se continha no art. 1.026 do
CC/1916, contempla a exceção ao princípio que, para os negócios jurídicos em
geral, vem insculpido no dispositivo do CC 184, na parte geral. É eu, como lá
se estabelece, a invalidade parcial e um negócio jurídico não o prejudicará na
sua parte válida, se separável. Assim, por exemplo, num contrato, a invalidade
de uma cláusula não invalida o contrato por inteiro, salvo, é evidente, se se
tratar de uma cláusula que lhe seja essencial. Pense-se numa compra e venda, em
que a cláusula do preço seja inválida. Decerto que, então, prejudica-se o
ajuste completo. Mas, separável a disposição inválida, persistem as demais. Não
é, porém, o que sucede, portanto excepcionalmente, com a transação.
Nessa espécie contratual,
a nulidade de qualquer de suas cláusulas contamina todo o negócio. A regra
constitui um corolário da característica de indivisibilidade da transação. Ou
seja, a transação representa um negócio uno que, animado pelo propósito de se
efetivarem concessões recíprocas, pode estampar, em determinada cláusula
contratual, a razão específica da renúncia de uma das partes ao que supõe ser
direito seu. Daí que, sendo inválida qualquer das cláusulas, a transação se
invalida completamente. Em diversos termos, a transação envolve um bloco de
disposições não destacáveis ou separáveis, porquanto lhe é subjacente um
conjunto de concessões interligadas de forma uma, incindível. Em cada
disposição haverá motivo específico de concessões suportadas por um equilíbrio
encontrado pelas partes, que se quebra com a invalidação de qualquer dos
preceitos estabelecidos pelos transatores. Essa a razão de ser do artigo em
questão.
É certo que, como está em seu parágrafo único, por vezes pode
haver, num mesmo instrumento de transação, concessões recíprocas envolvendo
relações obrigacionais independentes entre si. Em diversos termos, seriam como
que transações distintas, apenas que materialmente reunidas num só instrumento.
Aí, sim, a invalidade de uma não prejudica a outra. Mas importa que os direitos
sobre os quais as partes transacionam sejam independentes e autônomos entre si,
tanto quanto que cada qual dos ajustes não tenha como causa a entabulação do
outro, quando então se retoma a regra do caput.
(Claudio
Luiz Bueno de Godoy, apud Código
Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002.
Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 871 - Barueri,
SP: Manole, 2010. Acesso 11/03/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).
Fixando na doutrina de Ricardo Fiuza, a
indivisibilidade é da essência da transação. Ela deve formar um todo,
abrangendo o negócio jurídico a que se refere, com os elementos que a compõem,
em sua totalidade. A nulidade de uma das cláusulas provoca a nulidade da
obrigação (RT, 146/296). A transação,
quando abranger vários dos direitos independentes entre si e contestados, não
tendo validade sobre um, não prejudicará os outros (RT 239/194). O artigo é mera repetição do antigo 1.026 do CC/1916,
com pequena melhoria de redação, devendo a ele ser dado o mesmo tratamento
doutrinário. (Direito Civil -
doutrina, Ricardo
Fiuza – p. 444 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012,
pdf, Microsoft Word. Acesso em 11/03/2020,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Na contribuição de Luís Paulo Cotrim
Guimarães e Samuel Mezzalira, em regra, conforme o CC 184, a nulidade de uma
cláusula somente atinge a totalidade do negócio se se tratar de cláusula
essencial. É essencial a cláusula determinante da realização do negócio, aquela
que, se faltasse, o negócio não teria sido realizado pela perda do interesse de
qualquer das partes. Assim, por exemplo, aquela que, se faltasse, o negócio não
teria sido realizado pela perda do interesse de qualquer das partes. Assim, por
exemplo, numa venda conjunta de uma biblioteca, o fato de um dos livros que a
compõem não pertencer ao vendedor, não nulifica a anulação.
Relativamente à
transação, o tratamento legal é distinto. Por importar transações recíprocas, a
transação é reputada uma é indivisível e a nulidade de uma parte alcança o
todo.
O
parágrafo único ressalva a hipótese de a transação cuidar de direitos
independentes entre si. Direitos entre os quais não haja conexão nem sejam
tratados de forma conexa no negócio da transação. A hipótese é factível uma vez
que a legislação processual admite a cumulação de pedidos diversos, sem conexão
por situação de fato ou de direito, contra o mesmo réu. É possível que uma
parte cumule ao pedido de cobrança de obrigação negocial o pedido de condenação
do réu a indenizar-lhe por danos causados por acidente que não tenha relação
com o negócio jurídico. Podem realizar transação que envolva ambos os pedidos.
A transação será, ordinariamente, uma e sujeita à regra do caput, pois o ganho de uma parte em relação a um pedido
pressupõe-se relacionado à perda que suportará em relação ao outro. S, no
entanto, a intenção das partes restar manifesta no sentido de considerar
autonomamente as obrigações, então, excepcionalmente, a nulidade relativa a uma
parte da transação não afetará a outra. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso
em 11.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
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