Direito Civil Comentado - Art. 879, 880, 881 - continua
Do Pagamento Indevido - VARGAS, Paulo S. R.
Parte
Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
(Art. 233
ao 965) - Título VII – Dos Atos Unilaterais
(Art. 854
a 886) Capítulo III – Do Pagamento Indevido
Art. 879. Se aquele que indevidamente recebeu um imóvel o
tiver alienado em boa-fé, por título oneroso, responde somente pela quantia
recebida; mas, se agiu de má-fé, além do valor do imóvel, responde por perdas e
danos.
Parágrafo único. Se o imóvel foi alienado por título gratuito, ou se,
alienado por título oneroso, o terceiro adquirente agiu de má-fé, cabe ao que
pagou por erro o direito de reivindicação.
No
ritmo de Hamid Charaf Bdine Jr o dispositivo
contempla os casos em que o pagamento indevido compreende a transferência de um
imóvel ao credor. Nesse caso, o imóvel pode ser transferido a terceiro por esse
credor.
As soluções previstas neste artigo
variam conforme o terceiro adquirente esteja ou não de boa-fé e segundo a
transferência efetuada ao terceiro seja gratuita ou onerosa. As soluções serão
as seguintes: a) alienação onerosa feita de boa-fé a terceiro igualmente de
boa-fé. O credor que recebeu o imóvel indevidamente responde perante o devedor
que pagou apenas pela quantia recebida do terceiro pela aquisição do imóvel.
Não se cuida de determinar a restituição do valor do bem, pois o artigo
refere-se expressamente à quantia recebida, que só pode ser aquela recebida
pelo falso credor. Não se determina o pagamento do valor do próprio bem, pois,
nesse caso, o credor de boa-fé poderia ser obrigado a restituir mais do que
recebeu – i.é, o valor real do bem, e não aquilo que recebeu efetivamente; b) o
credor age de má-fé ao transferir o imóvel recebido incorretamente a terceira
pessoa. A segunda parte deste dispositivo impõe ao credor que recebe o imóvel e
o aliena de má-fé a obrigação de indenizar perdas e danos – ou seja, o montante
de seus prejuízos mais lucros cessantes. A má-fé tanto pode caracterizar-se em
razão do fato de o credor ter conhecimento de que o pagamento era indevido,
quanto do fato de o credor ter conhecimento de que o pagamento era indevido,
quanto do fato de o credor ter efetuado a alienação com o propósito de não
restituir o bem ao devedor que o entregou indevidamente, admitindo-se que só
posteriormente tenha tomado conhecimento da intenção do devedor de sustentar
que o pagamento era indevido, desconhecendo o fato até este momento. No caso de
o credor que recebeu o indevido ter agido de má-fé, ele responde perante aquele
que pagou pelo valor do imóvel – e não pelo valor recebido, como se verificaria
na hipótese anterior – além das perdas e danos; c) o credor transfere o imóvel
a terceiro gratuitamente ou a terceiro que adquire onerosamente, mas atuando de
má-fé. Nessas hipóteses, segundo a regra do parágrafo único deste dispositivo,
a reivindicação do imóvel a ser ajuizada pelo devedor que paga indevidamente
poderá atingir o terceiro; no caso da alienação gratuita, porque a
transferência do bem sem contraprestação justifica que o beneficiado ceda o bem
ao titular que dele foi privado por erro; no que se refere ao terceiro que
adquire de má-fé, porque o sistema do Código Civil não autoria que a má-fé seja
prestigiada em detrimento de quem age de boa-fé. Também nos casos em que o
credor não houver transferido o imóvel a terceiro, será possível que o devedor
que o entregou em pagamento indevido tenha sucesso na reivindicação.
Em todos esses casos, cabe a quem
pagou optar entre a reivindicação e o recebimento do valor. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud
Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de
10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 898
- Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 26/03/2020. Revista e atualizada nesta data
por VD).
No parecer de Ricardo Fiuza se quem
recebeu indevidamente o prédio vier a vende-lo de boa-fé deverá devolver
tão-somente o valor que valorar do valor do bem imóvel, deverá somar danos, se
existentes. Se doado gratuitamente ou vendido a terceiro de má-fé, o que pagou
por erro pode reivindicar o bem. Este artigo é correspondente ao art. 968 do
Código Civil de 1916 e deve merecer o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 455 apud
Maria Helena Diniz Código Civil
Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf,
Microsoft Word. Acesso em 26/03/2020,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
No dizer Luís
Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, quando a obrigação consiste na
transferência da propriedade de bem imóvel e o cumprimento dela é feito com
erro, configurando pagamento indevido, o enriquecedor pode requerer a repetição
do indébito. Embora o Código, neste capítulo, não seja expresso, se o
enriquecido tiver recebido o bem de má-fé fica obrigado pelo pagamento de
perdas e danos.
O
dispositivo cuida da hipótese em que o bem já tiver sido alienado pelo
enriquecido quando este for cobrado pelo enriquecedor. Neste caso, fica o
enriquecido obrigado a pagar ao enriquecedor o que recebeu pela alienação. Por
se tratar de dívida de valor, se o enriquecido agiu de boa-fé, a quantia
original somente deve ser acrescida de correção monetária, pois não há previsão
legal para a incidência de juros, exceto os juros moratórios relativos à
legislação processual, que incidem após a citação. Se o enriquecido recebeu o
imóvel de má-fé, i.é, ciente do erro cometido pelo alienante enriquecedor, fica
obrigado a pagar-lhe também as perdas e danos que se apurarem.
O
bem poderá ser reivindicado dos terceiros adquirentes em duas hipóteses: se o
tiverem recebido a título gratuito ou se o tiverem recebido de má-fé. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso
em 26.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art. 880. Fica isento de
restituir pagamento indevido aquele que, recebendo-o como parte de dívida
verdadeira, inutilizou o título, deixou prescrever a pretensão ou abriu mão das
garantias que asseguravam seu direito; mas aquele que pagou dispõe de ação
regressiva contra o verdadeiro devedor e seu fiador.
Segundo Hamid
Charaf Bdine Jr, nas hipóteses referidas neste artigo, a repetição do indébito
é afastada em razão de, por alguma razão, o pagamento indevido haver levado o
credor, de boa-fé, a se desfazer de algum direito de que era titular
verdadeiramente.
Assim, se a
dívida realmente existente deixar de ser realizável em decorrência do pagamento
indevido – o credor inutiliza o título, permite que ocorra a prescrição ou abre
mão das garantias -, ficará o devedor impossibilitado de postular a repetição.
Caberá a ele, porém, ajuizar ação regressiva em relação ao verdadeiro devedor e
seu fiador.
É certo que a disposição em
exame só incide se o credor agiu convencido de que recebia o que lhe era devido
– vale dizer, de boa-fé -, pois, do contrário, se agiu maliciosamente, não pode
ser dispensado da obrigação de restituir o recebimento do indébito. (Hamid Charaf Bdine Jr, apud
Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de
10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 898
- Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 26/03/2020. Revista e atualizada nesta data
por VD).
Como mostra
a doutrina este artigo trata da hipótese do recebimento de boa-fé de quem não é
o devedor, sendo a dívida verdadeira. O accipiens
que, ao receber de boa-fé, inutiliza o título ou deixa prescrever a ação, ou
ainda renuncia às garantias, não precisa restituir o pagamento. Quem pagou
erroneamente – o solvens – terá ação
regressiva contra o verdadeiro devedor e seu fiador. O dispositivo trata de
mera repetição do art. 969 do Código Civil de 1916, com pequena melhoria de
redação devendo a ele ser dado o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 455 apud
Maria Helena Diniz Código Civil
Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf,
Microsoft Word. Acesso em 26/03/2020,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Exemplificando
Luís
Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, se A deve a B determinada
quantia representada por título de crédito; se C efetua pagamento a B; se
B recebe o pagamento de C na suposição de que se trata de
pagamento da dívida de A; sem nessa
suposição, B inutiliza o título que
tinha contra A ou deixa prescrever a
pretensão contra A ou abre mão de
garantias que asseguravam o direito contra A;
se o pagamento que C fez a B for indevido, B fica isento de restituir a C
o que este pagou indevidamente.
Neste
caso, ocorre uma sub-rogação legal de C
nos direitos de B contra A. C poderá
cobrar de A o que pagou indevidamente
a B, salvo, obviamente, se tiver
ocorrido a prescrição. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso
em 26.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art. 881. Se o pagamento
indevido tiver consistido no desempenho de obrigação de fazer ou para eximir-se
da obrigação de não fazer, aquele que recebeu a prestação fica na obrigação de
indenizar o que a cumpriu, na medida do lucro obtido.
Na toda de Bdine Jr,
o pagamento não se aperfeiçoa apenas pela entrega de dinheiro ou bem, mas
também pela entrega de uma prestação de fazer ou não fazer. Nessas hipóteses,
também é possível verificar-se que a prestação não era devida, cabendo a
repetição. Contudo, não será possível a restituição da mesma espécie de
prestação recebida, de modo que o credor que recebeu o indevido indenizará
aquele que deu cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer.
Essa indenização, porém, não será
medida pela extensão dos prejuízos, mas pelo lucro obtido pelo credor. Assim,
será identificado o valor da vantagem obtida pelo credor e este será o montante
a indenizar ao devedor. pode ocorrer, portanto, que o prejuízo do devedor
ultrapasse o valor repetido, caso o fazer ou não fazer seja inferior, não
produza ao credor vantagem ao menos igual à de suas despesas. Nessa hipótese,
deixará de haver enriquecimento injusto do credor, que restituirá ao devedor o
enriquecimento obtido. No entanto, não estará o devedor integralmente
ressarcido dos danos suportados. (Hamid
Charaf Bdine Jr, apud Código Civil Comentado: Doutrina e
Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários
autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 899 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 26/03/2020.
Revista e atualizada nesta data por VD).
Para a doutrina de Fiuza, se o pagamento
indevido abranger obrigação de fazer (obrigação positiva) ou obrigação de não
fazer (obrigação negativa), quer sejam elas originadas de contrato ou de
decisão judicial (preceito cominatório, CPC 814 a 823, (antigos arts. 632 a 645
do CPC/1973), o accipiens deve
indenizar o solvens,
independentemente de ter recebido de boa ou má-fé. A indenização terá como base
o lucro obtido, pois se assim não fosse caracterizar-se-ia um enriquecimento
sem causa. Não havendo lucro do recebedor, não há que se falar em indenização,
uma vez que o locupletamento não ocorreria. Esse artigo não tem dispositivo
correspondente no Código Civil de 1916. (Direito
Civil - doutrina, Ricardo
Fiuza – p. 455 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012,
pdf, Microsoft Word. Acesso em 26/03/2020,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
No parecer de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a
repetição do indébito somente é possível nas obrigações de dar. Nas obrigações
de fazer e nas de não fazer, o enriquecedor somente pode pleitear indenização.
O cerne do dispositivo é a quantificação do valor da indenização: deve levar em
conta o proveito obtido pelo enriquecido. Proveito que é lucro no sentido mais
amplo. Assim, o fato de o enriquecedor ter despendido esforços em prol do
enriquecido não significa que este deva indenizar-lhe, uma vez que tais
esforços podem não resultar em ganhos efetivos para ele. (Luís Paulo Cotrim
Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso
em 26.03.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
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