sexta-feira, 24 de abril de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 936, 937, 938 - continua Da Obrigação de Indenizar - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 936, 937, 938 - continua
Da Obrigação de Indenizar - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
(Art. 233 ao 965) - Título IX – Da Responsabilidade Civil
(Art. 927 a 954) Capítulo I – Da Obrigação de Indenizar
– vargasdigitador.blogspot.com

Art. 936. O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar culpa da vítima ou força maior.

Segundo parecer de Cláudio Luiz Bueno De Godoy, no dispositivo em comento o Código Civil de 2002 contempla a hipótese que hoje é expressamente de responsabilidade sem culpa, pelo fato da coisa, no caso o animal que provoca dano ao dono ou detentor imputável. Bem de ver, todavia, que o Código Civil persistiu na consagração de hipóteses específicas de responsabilidade pelo fato da coisa, furtando-se ao estabelecimento de uma regra geral a propósito, como há, por exemplo, no Código francês (art. 1.384, I, parte final), o que seria de grande valia para o enfrentamento de casos frequentes, como o são os de acidente de automóveis.

De toda sorte, explicita o preceito que o dono ou detentor do animal responde pelos danos por ele provocados, salvo se provar ocorrência de culpa da vítima ou de força maior, demonstração de que o Código Civil, malgrado não o tenha feito de forma sistemática, reconheceu a existência de excludentes mesmo à responsabilidade sem culpa. Quanto à culpa da vítima, deve ela ser exclusiva para afastar a responsabilidade do dono ou detentor (sobre a culpa concorrente, ver comentário ao CC 945). No que toca à força maior, fato necessário e inevitável (CC 393, parágrafo único), móvel da quebra do nexo causal, por identidade de motivos e consequências, deve-se considerar aí abarcado o caso fortuito, sempre, porém, quando estranho à atividade ou vontade do dono ou detentor, ou estranho, enfim, ao risco que há na guarde de animais (fortuito externo), como pode ser o roubo, mas não o rompimento de cerca, por exemplo.

Tais excludentes, de alguma forma, já estavam contidas nos incisos II a IV do art. 1.527 do CC/1916. O problema estava, a rigor, em seu inciso I, que possibilitava ao dono ou detentor se eximir quando provasse que guardava e vigiava o animal com cuidado preciso. Tratava-se de caso, verdadeiramente, de responsabilidade dos pais, cabia a prova da vigilância precisa. É o que não se repete e faz a diferença na nova redação do preceito. Admitida a teoria do risco, não mais há lugar para o dono ou detentor provar que cuidava do animal. De mais a mais, como já se entendia à luz de uma interpretação evoluída do art. 1.527, se o dano ocorreu, e não por fortuito ou culpa da vítima, foi mesmo porque o dono ou detentor não vigiava o animal com cuidado preciso.

A responsabilidade, no caso, é de quem detém o poder de direção sobre o animal, em regra do proprietário, mesmo que alguém por ele o faça, como seu empregado ou preposto, o que, então, não modifica sua responsabilidade. Maior dificuldade haverá quando a guarda for entregue a terceiro que tenha exclusivo poder de direção, sem ordens diretas do proprietário, como o locatário, comodatário ou depositário, por isso a quem, exclusivamente, para Caio Mário da Silva Pereira (Responsabilidade civil, 9 ed. Rio de Janeiro, forense, 1999, p. 110), deve-se imputar a responsabilidade pela reparação. A orientação, porém, parece confrontar com a tese firmada na Súmula n. 492 do STF, por alguns discutida (ver crítica de Venosa, Sílvio de Salvo. Direito civil, 3 ed. São Paulo, Atlas, 2003, v. IV, p. 69-70), mas que responsabiliza solidariamente a locadora de veículos com o locatário, por danos provocados em acidentes. Responsabilidade solidária pode haver, aí sim, sem nenhuma dúvida, da concessionaria que explora estradas ou rodovias e por isso deve cuidar delas, garantindo que não as invadam animais cuja presença ponha em risco os transeuntes. (Cláudio Luiz Bueno De Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 941-42 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 24/04/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

No entender de Ricardo Fiuza, trata-se de típica responsabilidade indireta, com presunção da culpa do dono ou detentor do animal, presunção juris tantum por admitir prova em contrário, referente à culpa da vítima e à força maior. A força maior é excludente da responsabilidade, prevista no CC 393 deste Código, como o “fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir”, sem que seja realizada distinção do caso fortuito neste dispositivo; a principal característica dessa excludente da responsabilidade é a inevitabilidade do evento. Muito debatida foi essa espécie de responsabilidade civil, que em princípio deve caber àquele que causa o dano; mas, no caso, é exatamente a pessoa que concorre para o dano, porque não cuidou, como devia, do animal que lhe pertence. Essa é a chamada culpa in custodiendo, modalidade da culpa ira vigilando, que se presume, já que a pessoa descuida do animal que tem sob sua guarda, ou seja, não o vigia com o devido cuidado. Importa verificar a guarda ou poder de direção ou comando, de modo que são responsáveis pelo animal tanto seu dono como seu detentor. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 483, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 24/04/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Os autores Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, falam da responsabilidade objetiva pelo fato da coisa. Haverá responsabilidade do dono ou detentor do animal pelos danos que ele causar. Aqui, apesar de o legislador não ter afirmado que o dono ou detentor do animal responde independentemente de culpa, não há dúvidas da natureza objetiva de sua responsabilidade. Isso porque, o legislador explicitamente afirmou que apenas não haverá responsabilização se o dono ou detentor do animal provar culpa da vítima ou força maior. Ou seja, apenas não haverá responsabilidade se o dono do animal provar a quebra do nexo de causalidade entre o dano causado e o fato do animal. Ao não admitir que a responsabilidade seja afastada por força de qualquer excludente de culpabilidade, o legislador indiretamente deixou explícito que a prova da culpa é irrelevante para a responsabilização do dono ou detentor do animal. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 24.04.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 937. O dono de edifício ou construção responde pelos danos que resultarem de sua ruína, se esta provier de falta de reparos, cuja necessidade fosse manifesta.

No entender de Cláudio Luiz Bueno De Godoy, o dispositivo repete integralmente a redação do art. 1.528 do CC/1916, instituindo mais um caso de responsabilidade pelo fato da coisa, agora inanimada, mas deixando de explicitá-la como objetiva, tal qual fez no artigo antecedente. Trata o preceito em comento, na verdade, da responsabilidade por dano infecto, que, porém, já naquela anterior Código Civil, se entendia independente de culpa ou, ao menos, indutiva de uma presunção de culpa, posto que relativa.

A hipótese, já na anterior legislação, aludia ao dano provocado pela ruína de prédio, frise-se, decorrente da falta de reparos cuja necessidade fosse manifesta, assenta-se, contudo, como o fez a jurisprudência, o argumento sempre levantado de que, se ruína houve, e não proveniente de fortuito ou culpa da vítima, decerto então o foi porque havia reparos cuja necessidade era manifesta. Mais ou menos, a rigor, o que se dava com o cuidado preciso na guarda de animal, todavia o que o atual Código ajustou, sem fazê-lo, lamentavelmente, com o dano infecto e a exigência de reparos de necessidade manifesta. De toda sorte, impende prestigiar solução que já se preconizava na direção da responsabilidade sem culpa, oriunda do dever de segurança afeto ao dono do prédio e à construção, tanto mais pelo risco especial de que esta se reveste.

Acrescente-se que a responsabilidade é solidária do dono do edifício e do construtor, além de atinente à ruína total ou parcial, como se deve compreender o desprendimento de partes do prédio, como a queda de marquise, telhas e semelhantes. (Cláudio Luiz Bueno De Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 944 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 24/04/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Vê-se na doutrina de Ricardo Fiuza, o dono do edifício ou da obra em construção é responsável pelos danos resultantes de sua ruína, desde que proveniente de manifesta falta de reparos, mas disporá de ação de regresso contra o empreiteiro para dele haver a indenização paga aos atingidos pelos efeitos danosos daquela ruína, conforme o CC 618: “Nos contratos de empreitada de edifícios ou outras construções consideráveis, o empreiteiro de materiais e execução responderá, durante o prazo irredutível de cinco anos, pela solidez e segurança do trabalho, assim em razão dos materiais, como do solo”, devendo ser citado o parágrafo único deste dispositivo, pelo qual: “Decairá do direito assegurado neste artigo o dono da obra que não propuser a ação contra o empreiteiro, nos cento e oitenta dias seguintes ao aparecimento do vício ou defeito”. Há corwute de pensamento segundo a qual a responsabilidade até o momento da entrega do edifício é do construtor, salvo prova da culpa por parte do proprietário, e existe outra pela qual a responsabilidade do proprietário existe em qualquer caso em razão de sua culpa ira elegendo (v. José de Aguiar Dias, Da responsabilidade civil, 6 ed. Rio de Janeiro, Forense, 1979, v. 1, p. 363/7). Entendemos que, em razão deste artigo, a responsabilidade do dono ou proprietário do edifício, esteja ou não em construção, sempre existe, podendo alcançar também o construtor ou empreiteiro, na conformidade do CC 618. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 483, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 24/04/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Da responsabilidade pela ruína de edifício, conforme Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o dono do edifício é responsável pela sua solidez e segurança, respondendo pelos danos causados que resultarem de sua ruína, total ou parcial, desde que a ruína tenha sido causa por falta de reparos cuja necessidade fosse manifesta. Note-se, que o legislador apenas afirmou que haverá responsabilidade caso a ruína tenha decorrido de ausência de reparos cuja necessidade fosse manifesta. Os reparos cuja necessidade não possa ser percebida por um leigo não darão ensejo a responsabilidade, uma vez que não é razoável exigir do proprietário conhecimentos técnicos específicos que permitam constatar a necessidade de reparos que não sejam evidentes e manifestos. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 24.04.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 938. Aquele que habitar prédio, ou parte dele, responde pelo dano proveniente das coisas que dele caírem ou forem lançadas em lugar indevido.

Na conta de Cláudio Luiz Bueno De Godoy, o preceito cuida dos effusis et dejectis, ação originária do direito romano e cabível para a reparação de danos provocados pelo que caísse ou fosse arremessado do interior de uma habitação. Tem-se aí, já mesmo de acordo com o que se vinha entendendo acerca de igual previsão do CC/1916, responsabilidade sem culpa, pelo mesmo fundamento do preceito anterior, qual seja o dever de segurança que deve permear a guarda do que guarnece uma habitação. Impende somente observar que, agora, o nexo de imputação da responsabilidade não está na propriedade da coisa, mas especificamente na sua guarda, pelo que se responsabiliza quem habita o prédio.

Da redação do anterior art. 1.529 apenas se substituiu a expressão casa por prédio, mais consentânea com a diversidade de construções hoje habitadas e donde podem provir coisas caídas ou arremessadas. Mas a dúvida persiste, o que o atual CC não se deu a solucionar, com relação aos condomínios edilícios, em que algo pode cair ou ser arremessado sem que se identifique de qual unidade autônoma. Se já se defendeu que cada unidade autônoma deve ser considerada casa, ou hoje prédio, na dicção da lei, porque é objeto de propriedade exclusiva, assim respondendo seu respectivo morador, vale lembrar que a própria actio de effusis et dejectis, na sua origem, previa a responsabilidade solidária quando fossem vários os moradores da casa, com regresso contra o causador direto. Daí se defender que, no caso dos condomínios em edifícios, haja a responsabilização, quando não identificada a unidade de onde caíram ou foram arremessadas coisas, de todos os possíveis envolvidos, portanto todos os moradores, abraçada a tese da causalidade alternativa, e posto que assegurado posterior e eventual regresso.

É certo todavia que a jurisprudência, atenta à necessidade de reparação integral da vítima e preocupada com a dificuldade na identificação de todos os moradores, vem mesmo responsabilizando, nos casos mencionados, o próprio condomínio, a que se entrevê afeto, e portanto estendendo o fundamento do nexo de imputação, o dever de cuidado para que eventos como o ora em comento não aconteçam. Entende-se, porém, que devam ainda ser ressalvadas aquelas hipóteses em que a coisa caída ou arremessada não poderia, fisicamente, tê-lo sido de alguma ou algumas unidades. Pense-se em um prédio com unidades de frente e fundos, sendo que algum transeunte vem a ser atingido enquanto caminha pela calçada da fachada do edifício, de forma que seria impossível que viesse das unidades dos fundos coisa caída ou arremessada a ponto de provocar o dano. Em hipótese como essa, e sempre desde que não identificada a unidade de onde tenha caído a coisa, quando responde o respectivo morador, considera-se que deva se limitar a responsabilização respectiva aos moradores ou, como vêm decidindo os tribunais, aos condôminos das unidades, na hipótese figurada, de frente.

Por fim, cabe ainda anotar que, assentada a responsabilidade da guarda da coisa, ela se estende a qualquer habitante do prédio ou casa, portanto independentemente de qual seja o título da ocupação, eis que a qualquer deles, pelo fato em si de residir no local, cabe o dever de velar pelo que guarneça o local. (Cláudio Luiz Bueno De Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 945 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 24/04/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

No entender de Ricardo Fiuza, a responsabilidade por fato das coisas é também indireta e funda-se no princípio da guarda, de poder efetivo sobre a coisa no momento do evento danoso. Desse modo, a determinação do guardião é fundamental nesta espécie de responsabilidade civil (v. Caio Mário da Silva Pereira. Responsabilidade civil, 9 ed. Rio de Janeiro, Forense, 1998, p. 101-7). Presume-se ser o proprietário do prédio o guardião da coisa, mas a vítima nem sempre pode voltar-se contra o proprietário. Assim, se a guarda foi transferida pela locação, pelo comodato ou pelo depósito, transfere-se a responsabilidade para o locatário, o comodatário ou depositário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 484, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 24/04/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No raciocínio de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, diz-se da responsabilidade objetiva pela queda de coisas: Aquele que habitar prédio ou parte dele é responsável pelos danos provenientes de coisas caírem ou forem lançadas. Tal responsabilidade é objetiva e fundada na simples regra de que ninguém pode deliberadamente colocar em risco a segurança da coletividade.

Quanto à Responsabilidade do condomínio, não sendo possível identificar precisamente de onde partiu a coisa que caiu e causou um dano, a responsabilidade deve recair sobre o condomínio. Nesse sentido: “Na impossibilidade de identificar o causador, o condomínio responde pelos danos resultantes de objetos lançados sobre prédio vizinho". (STJ, 3ª T., REsp n. 246.830-SP, j. 22.2.05, rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJU 14.3.05). (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 24.04.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

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