Direito Civil Comentado - Art.
1.058, 1.059
Da
Sociedade Limitada – Das Quotas -
VARGAS, Paulo S. R.
Parte
Especial - Livro II – (Art. 966 ao 1.195) Capítulo IV –
Da
Sociedade Limitada – Seção II – Das Quotas
(Art.
1.055 ao 1.059) – vargasdigitador.blogspot.com
Art.
1.058. Não integralizada a quota de sócio remisso, os
outros sócios podem, sem prejuízo do disposto no art. 1.004 e seu parágrafo
único, tomá-la para si ou transferi-la a terceiros, excluindo o primitivo
titular e devolvendo-lhe o que houver pago, deduzidos os juros da mora, as
prestações estabelecidas no contrato mais as despesas.
No ritmo de Barbosa Filho, quando celebrado o contrato de
sociedade pode ser estabelecido um prazo para a completa integralização do
capital, assumindo, então, todos ou alguns dos sócios dívidas correspondentes
perante a sociedade (pessoa jurídica). O inadimplemento da obrigação referida
faz nascer a figura do sócio remisso, tendo o presente artigo cuidado da
hipótese e fornecido tratamento prático e ágil, aprimorando aquele já constante
do art. 7º do agora revogado Decreto n. 3.708/19. Aplicado o CC 1.004 e
efetivada, portanto, para a constituição em mora do sócio inadimplente, a
notificação com prazo de trinta dias, os demais sócios poderão, mediante
deliberação tomada por maioria, alterar o contrato à revelia do remisso,
forçando uma reformulação do ajuste original, surgindo, em consequência, no
âmbito das sociedades limitadas, cinco possibilidades.
Em primeiro lugar, é possível excluir o sócio remisso, efetivando
a partilha proporcional, ou não, da quota não integralizada; mantêm-se, então,
o capital contratado e o quadro social inicial, alterado unicamente pela
subtração do remisso.
Em segundo lugar, pode ser emitida deliberação sobre a alienação
forçada da quota do remisso a um terceiro, estranho à contratação original, que
se obriga a completar o capital, operando-se uma pura e simples substituição no
quadro social.
Em terceiro lugar, caso seja considerado conveniente e diante da
quebra de confiança caracterizada, pode ser deliberada a mera exclusão do
remisso, reduzindo-se o valor do capital social. Nessas três hipóteses, há uma
denúncia parcial do contrato de sociedade, rescindido com relação ao remisso,
provocando uma modificação coativa do quadro social.
Em quarto lugar, abre-se espaço para a redução da quota do
remisso, caracterizada uma integralização parcial, tendo sempre em conta os
valores ou os bens já conferidos à pessoa jurídica, mantendo-se a presentação
do inadimplente no quadro social, mas com uma participação menos acentuada,
reduzindo-se, aqui também, o capital social.
Em quinto lugar, mantido o
remisso na mesma posição original, a pessoa jurídica, conforme decidido por
maioria, pode postular, em juízo, a cobrança dos valores correspondentes à
quota contratada e o pagamento de uma indenização, a título de ressarcimento
pela mora concretizada. Esta última solução, porém, não fornece um desenlace
imediato ao problema surgido e sujeita os sócios à responsabilidade solidária
prevista no CC 1.052, sendo, por isso, acredita-se, a menos recomendável. Caso
se opere a exclusão do remisso, será necessário, em todo caso, para que a
sociedade não se locuplete indevidamente, devolver-lhe os valores pagos, feitas
as deduções correspondentes aos juros moratórios e às despesas suportadas pela
sociedade, e os valores decorrentes da aplicação de eventual cláusula penal,
incluída expressamente no instrumento contratual inscrito. (Marcelo
Fortes Barbosa Filho, apud Código
Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002.
Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1047-48.
Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 25/06/2020. Revista e atualizada nesta data
por VD).
No histórico, a Emenda de redação apresentada pelo Relator na fase
final de tramitação do projeto na Câmara dos Deputados substituiu a expressão
“estranhos” por “terceiros”, mais adequada à exata compreensão do sentido da
norma. O Decreto n. 3.708/19, no art. 72, estabelecia procedimento idêntico em
face da inadimplência de sócio na integralização do capital.
Em sua Doutrina, Ricardo Fiuza aponta ser o sócio remisso, aquele
que não cumpre sua obrigação principal de integralizar o capital subscrito, que
deixa de pagar as quotas que se comprometeu a adquirir. O contrato social deve
fixar um prazo para que o valor das quotas subscritas seja realizado, mediante pagamento
à sociedade. Se o sócio não cumpre essa obrigação no prazo previsto, os demais
sócios podem, como primeira opção, subscrever e integralizar, entre si, as
quotas do sócio remisso, ou, como segunda opção, admitir novo sócio, que
assumirá a obrigação de integralizar o capital que faltar. Se o sócio remisso
já tiver integralizado, parcialmente, o montante correspondente às quotas
subscritas, a sociedade deverá devolver o valor pago, deduzido dos juros
moratórios, de outras prestações ou danos que foram assumidos pela sociedade em
virtude da inadimplência do sócio remisso, mais as despesas realizadas com a
cobrança do pagamento necessário à integralização do capital. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 551,
apud Maria Helena Diniz Código Civil
Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf,
Microsoft Word. Acesso em 25/06/2020,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Em seu artigo Caso fortuito e força maior frente a técnica securitária, Flávio de Queiroz Bezerra Cavalcanti, que merecem algumas
observações prévias: A humanidade sempre conviveu e sempre conviverá, com
situações que escapam a sua previsibilidade ou, mesmo sendo previsíveis,
irresistíveis para os recursos disponíveis. Infortúnios e catástrofes são uma
constante ao lado do homem.
Afora a
insatisfação pela falibilidade, e o sentimento religioso alimentado, esses
acontecimentos repercutem sobre a vida das pessoas e seus patrimônios, bem como
impedem o cumprimento dos deveres jurídicos, surgindo o problema de atribuição
desses riscos. Desde cedo surge, consequentemente, a necessidade de regular
juridicamente a repercussão de fatos imprevisíveis ou irresistíveis.
Os ordenamentos constatam a existência
desses fatos e lhes regulamentam sobre uma ideia base de que, não sendo os
efeitos atribuíveis ao sujeito passivo, não pode o mesmo arcar com as
consequências advindas. Em outros termos, o efeito decorre, por nexo de
causalidade, de fato estranho à conduta do sujeito passivo, descabendo atribuir
a este o resultado negativo. Não se põe na sua esfera jurídica o efeito
negativo que não lhe é atribuível. Desenvolvem-se, dentro dessa ideia geral, os
conceitos de caso fortuito, força maior, fato de terceiro, ato do príncipe etc.
A textura de todos assenta-se na ideia geral, grosseiramente sintetizada acima,
de que não sendo evitável o efeito não se pode atribuí-lo àquele que não
cumpriu seu dever por fato estranho e superior.
Nessa linha, por mero exemplo, o
disposto no art. 1.058, parágrafo único, do Código Civil Brasileiro. Ocorre,
todavia, que a humanidade não se limitou a aguardar a atuação divina para
proteção em face de fatos dessa espécie. Desenvolveu, paralelamente, técnicas e
instrumentos minimizadores dos efeitos. Na impossibilidade de prever, em
particular, a ocorrência de um desses fenômenos, aprendeu e apurou técnicas
para torná-los previsíveis, balizar seus efeitos, calcular a regularidade de
sua repetição e as somas necessárias para suportar os efeitos patrimoniais. Terminou-se,
assim por estabelecer meios estatísticos, permitindo avaliar probabilidades de
ocorrência dos fatos e, consequentemente, a massa de recursos para fazer frente
às necessidades. Chega-se, desta maneira, ao seguro como meio apto para
socializar e minimizar os riscos.
Constata-se, nesse diapasão, que
grande parte das situações da humanidade não se encontram, atualmente, no campo
do imprevisível. Situam-se no campo do risco, dentro de estatísticas e lei de
probabilidades. A morte pela queda de um raio não é algo imprevisível ou
decorrente dos desígnios de Tupã ou seus sucedâneos. É uma chance, um percentual,
um risco estatístico e calculável, ainda que impossível de se evitar
totalmente, ou de se saber sobre quem o raio cairá. A técnica desenvolvida, e
constantemente aprimorada, permite a expansão da proteção securitária ofertada,
de molde a, diante da inevitabilidade dos acontecimentos, tornar possível a
supressão dos seus efeitos negativos, ao menos na esfera patrimonial.
Há, ainda, um outro aspecto enfrentado
mais adiante. Não se pode olvidar, também, que grande parte das atividades
humanas são atualmente desenvolvidas de forma técnica e profissional, seja por
pessoas naturais, seja (em volumes economicamente bastante superiores) por
pessoas jurídicas, em atenção ao seus objetos sociais. Em sendo a atividade
profissionalmente desenvolvida, a antevisão dos riscos normais ou excepcionais
é algo plenamente possível (exigível, parece-nos) face ao cabedal de
conhecimentos técnicos e a acumulação de experiência.
A questão revolvida no presente diz
respeito à conjugação desses vetores, querendo discutir se os mesmos
influenciam os conceitos que possuímos de caso fortuito, força maior e
similares. Elegidos esses fenômenos como excludentes de responsabilidade,
parecem imprescindível esta análise, até porque, adianta-se, não é admissível
simplesmente atribuí-los o condão de excludentes quando, em verdade, estão
diante de situações de imprevidência (diferente de imprevisão), economia de
custos, assunção voluntária de riscos etc. Não se pode, na época atual, com
enorme elevação de riscos, permitir que a falta de cautela, mormente em
atividades empresariais, permita a desoneração do dever de ressarcir o
atingido, deixando para este os efeitos negativos.
Caso fortuito e força maior – CERNE,
sem
pretender aqui uma análise exauriente das graves questões atinentes ao caso
fortuito e força maior o que, por si só, exigiria trabalho específico e de
maior fôlego. Importa, para os objetivos firmados, reter o núcleo dessas
questões ou, menos pretensiosamente, a ideia geral que as preside, enquanto
excludentes de responsabilidade por descumprimento de dever jurídico.
O Código Civil brasileiro prevê: “Art.
1058 – O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito, ou
força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado, exceto
nos casos dos arts. 955, 956 e 957.
Parágrafo único- O caso fortuito ou de
força maior, verifica-se no fato necessário cujos efeitos não era possível
evitar, ou impedir".
Ao tempo que os elege como excludentes
de dever indenizatório, ideia, de regra, mantida nos diplomas legais, por
quebra de nexo causal, o Código traça suas linhas conceituais de forma
notavelmente sintética. Do conceito legal, e de resto do quanto encontra-se em
doutrina, constatou-se residir a caracterização do caso fortuito e força maior
na articulação de duas ideias, ambas indispensáveis: a) fato inescapável
("fato necessário"), e b) impossibilidade de evitar ou impedir os
efeitos deste fato ("cujos efeitos não era possível evitar, ou
impedir").
Quando o fato não é necessário, sendo
decorrente de má-conduta do sujeito passivo, ou de outrem por quem ele
responde, não se depara com caso fortuito ou força maior e sim com simples e
pura inexecução. Nem a impossibilidade subjetiva, vale dizer, para aquele
determinado sujeito passivo, de acordo com suas condições individuais de
patrimônio, disponibilidade ou técnica, é suficiente para caracterizar o fato
necessário. Fato necessário, para atender a exigência da lei, é aquele que
objetivamente é para todos) teria ocorrido de igual maneira. A admissão dessas
excludentes todavia, não decorre tão somente de um fato necessário. É preciso,
como claramente se deduz da norma legal, que os efeitos (danosos ou negativos)
não possam ser evitados ou impedidos.
Neste ponto, aliás, reside o núcleo
central das ideias de força maior ou caso fortuito. O sujeito passivo não tem
como evitar ou impedir os efeitos do fato necessário, sendo descabido, fora das
hipóteses legais, que por ele responda. Nessas oportunidades, o fato não se
revela como necessário e sim decorrente da conduta do devedor que, ao se
encontrar em mora, provocou-o, ou ao menos permitiu sua ocorrência.
A caracterização do caso fortuito ou
força maior exige de maneira imprescindível que os efeitos não possam ser
evitados ou impedidos pelo devedor. Agostinho Alvim, com sua sempre notável
clareza, situa este requisito na ideia do "fato necessário", asseverando: "A análise
da definição do Código consistirá, principalmente, no estudo da necessariedade
do fato, cujos efeitos não seja possível evitar ou impedir.”
Há na prática, muito equívoco, acerca
do que se deva entender por fato necessário.
A geada, o roubo à mão armada, o
atraso de trens, como fatos necessários. Nem sempre. A necessariedade do fato
há de ser estudada em função da impossibilidade do cumprimento da obrigação e
não abstratamente. Supõe-se que uma pessoa, durante certo lapso de tempo,
guarde em casa uma grande soma, que deve entregar a alguém, e ladrões,
sabedores do fato, roubem o dinheiro, em condições tais que fosse impossível
impedir. Nesta hipótese, a não ser que as circunstâncias especiais do caso
aconselhem outra solução, não se poderá admitir a escusa, com base em caso
fortuito. Com efeito, se não era possível a defesa atual contra os ladrões, era
possível, em todo o caso, prevenir o acontecimento, recolhendo a um Banco, pelo
tempo que fosse necessário, a importante soma que se tinha em casa.
Outro exemplo: alguém, obrigado a
estar numa cidade às tantas horas, deixa de comparecer e escusa-se com o atraso
do trem. É claro que não lhe era possível impedir o atraso; mas uma simples
cautela da sua parte teria evitado que a obrigação não fosse cumprida. Prevendo
a possibilidade de atraso, o devedor teria cumprido a obrigação se fosse de
véspera, ou em outro trem, mais cedo.
Em nenhum desses casos terá havido no
sentido legal, impossibilidade de afastar o evento que impediu de cumprir a
obrigação, e isso porque o não-cumprimento se deu, em ambos os casos, por
imprevidência, ou falta de cautela". Conquanto, a questão deva ser
deslocada para a segunda parte do dispositivo legal, não há o que discordar das
conclusões acima. A possibilidade de supressão dos efeitos elide a
caracterização das excludentes de caso fortuito e força maior. Não é diversa a
ideia que se encontra em outros juristas de escol, como se vê, por exemplo, nas
anotações de Pontes de Miranda: "Fato necessário está, aí, por fato cuja
determinação se procede sem que o devedor possa afastar, em suas consequências.
Se o fato é necessário, mas o devedor pode evitar ou impedir os seus efeitos,
não há caso fortuito por força maior.
A Lei frisa o elemento da
inevitabilidade das consequências. Não se trata de ser impossível evitar ou
impedir o casus, mas sim os efeitos do casus. Igual confirmação se
obtém do exame do tratamento pretoriano, posto que a nota caracterizadora, pelo
entendimento amplamente predominante do Superior Tribunal de Justiça, é a
inevitabilidade e não a imprevisibilidade. A inevitabilidade, sempre destacada,
é, como anotado por Pontes de Miranda, dos efeitos. Efeitos, acrescenta, lesivos
ao patrimônio do credor.
Efeitos impossíveis de evitar ou impedir. O fato
necessário, ou seja, aquilo que torna impossível evitar ou impedir, não parece
oferecer maior dificuldade conceitual, merecendo atenção o que são estes
efeitos, não-impedidos ou evitados por pura impossibilidade. De uma forma
excessivamente singela, pode-se dizer que o efeito a ser evitado seria o
descumprimento. De fato, houvesse o cumprimento, não haveria o porque se falar
de caso fortuito ou força maior. Não parece que o simples fato de não ter sido
possível cumprir (leia-se, evitar ou impedir o não cumprimento) seja bastante
para caracterizar o caso fortuito ou força maior.
O dever jurídico, ao não ser cumprido,
provoca uma redução no patrimônio do credor. É exatamente o que, de regra, leva
a parte inadimplente a ser obrigada a indenizar, recompor o patrimônio,
reduzido pelo não cumprimento. A constatação de caso fortuito ou força maior
obstaculiza a conversão do dever inicial em dever indenizatório.
De forma finalística, portanto, parece
que o efeito é o dano. A lei não diz, e, não quis dizer: se não pôde ser
cumprido. Os termos legais são: "o devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou
força maior..." (CC 1058, caput).
É razoável entender
que, se é possível evitar ou impedir o prejuízo (efeito), não há como se
caracterizar o caso fortuito ou força maior, ou seja, mesmo que a parte não
tenha podido cumprir o dever, quando ela pode evitar o prejuízo, não se trata
de caso fortuito ou força maior.
A técnica securitária e o desaparecimento dos efeitos. Os contratos de seguro têm por função
básica proteger o segurado ou terceiro beneficiado de eventos danosos. Traçada
a cobertura da apólice, a ocorrência dos fatos previstos, ou não excluídos,
enseja o ressarcimento do dano, dentro do valor segurado. Seja em uma concepção
mais tradicional, como contrato aleatório, seja na posição mais inovadora, de
contrato comutativo, no qual a prestação da seguradora é certa,
garantia, a função do contrato é suprimir os efeitos do ato danoso, ao
menos quanto ao seu conteúdo econômico. Observa-se, assim, que
a razão de ser do contrato de seguro vem de encontro ao ponto nodal da questão.
O seguro suprime os efeitos econômicos dos fatos imprevisíveis (em particular)
ou irresistíveis. Ora, em havendo apólice cobrindo o fato ocorrido, estava
disponível para o contratante o instrumento jurídico para evitar o efeito
danoso.
Em outros termos, quando o mercado
segurador oferece cobertura que garanta os riscos, não se pode dizer que esses
riscos se situam no âmbito da imprevisibilidade ou da inevitabilidade. Não
apenas se trata de acontecimento previsível (em geral) como sua incidência já
foi estatisticamente apurada, submetida a cálculos atuariais e colocado sob
proteção contratual. Não podem, por outro lado, serem vistos como inevitáveis.
O fato em si pode até ser inevitável. Mas suas consequências, diferentemente,
são evitáveis. E, ante o exposto, a lei desejou caracterizar como caso fortuito
ou força maior as situações em que o prejuízo é inevitável. O fato que dispõe
de proteção securitária tem suas consequências evitáveis, não podendo ser
invocável, o caso fortuito ou força maior pela parte, quando do seu
acontecimento.
Fundamentos do dever de ressarcir e fundamentos das
excludentes - descompasso evolutivo. Não se pode olvidar que as ideias de caso
fortuito e força maior, tais quais postas no Código Civil, foram pensadas e
reguladas dentro de um determinado sistema de responsabilidade civil. Este,
atualmente, não é mais exclusivo e sim cada vez mais enfraquecido. A textura do
caso fortuito e força maior está, dessa maneira, intimamente ligada à ideia de
culpa, elemento primordial da responsabilidade subjetiva acolhida no Código
Civil brasileiro. São os mesmos excludentes da responsabilidade civil por
quebrarem o nexo de causalidade, impedindo estabelecer relação de causa e
consequência entre uma ilicitude e um fato. Afastam a culpa do agente, como
elemento provocador do dano, conforme síntese feliz de Vieira Netto, para a
cátedra paranaense: "O que desejamos acentuar ainda, ao finalizar estas
observações, é que esse fortuito – na época do contratualismo e da culpa –
resume-se ao fato inevitável, irremovível, como se vê do art. 1.058, parágrafo
único do Código”. Sem dúvida aqui também se debatem o subjetivismo (fortuito =
não culpa), de que são partidários Ribas, Spencer Vampré, Espínola e outros, e
a corrente objetiva, representada entre nós em Carvalho de Mendonça (M.I), Lacerda
e outros. (131).
Na Responsabilidade Contratual a
culpa é presumível pelo descumprimento. A presença de caso fortuito ou força
maior mostra a inocorrência do ilícito relativo. Nos mesmos moldes, essas ideias
são aplicáveis quando se alteram os pressupostos da responsabilidade civil? Não
parece possível manter os conceitos sem sofrerem também alterações evolutivas.
O caso fortuito e a força maior
permanecem, como excludentes. Não, todavia, quando eliminarem a culpa do
agente, pela não ocorrência de ilícito. São excludentes, e como tal invocáveis,
quando o resultado danoso econômico não puder ser imputado à esfera de conduta
do agente. Da mesma forma que as raízes mais fortes da responsabilidade civil
se firmam hoje em prognósticos econômicos: risco-proveito, alocação de custos,
repartição dos ônus etc., o fundamento de validade das excludentes também se
situará em plano diverso d’outrora.
Há força maior ou caso fortuito quando
for externo, fora da linha de atuação do sujeito. Vale dizer, quando o
resultado econômico negativo experimentado por outrem não possa se vincular a
ele. Quando, ao contrário, o resultado econômico a ele possa se ligar, não há
quebra de nexo causal. Explicitamente, quando, v.g., o dano decorreu da não contratação de um seguro, não se pode
falar em exclusão do nexo causal. Mesmo que se trate de um fato da natureza a
danificar uma obra em curso, v.g., uma enchente, o dano não encontra aí razão
de sua ocorrência. Encontra causa de existir na não contratação de seguro para
amparar aquela situação, salvo, obviamente, em não existindo apólice com
cobertura desse jaez. Deixar que evolua a ideia de responsabilidade civil, sem
paralelamente efetuar nova leitura das excludentes, é provocar grave e
inadequado descompasso científico entre dois conceitos interdependentes
ontologicamente.
Em reforço- rápida lembrança da ideia de dano. Uma breve recordação as questões aqui
expostas. Comumente se confunde dano com objeto atingido. Sabe-se, porém, que o
dano não é o bem da vida lesado e sim o efeito decorrente da lesão. Nas palavras
do mais festejado jurista na matéria, com apoio na doutrina de Hans Alberto
Fischer, o dano tem uma concepção jurídica própria e "vem a ser o prejuízo
sofrido pelo sujeito de direitos em consequência da violação destes por fato
alheio." Cuida-se, assim, sempre de
efeitos, não do objeto. Evitando-se o efeito, evita-se o dano, em sentido
técnico. Reparar o dano é tentar apagar seus efeitos. Caso fortuito e força
maior, nesse diapasão, é aquilo que torna inevitável o dano, vale dizer, o
efeito da lesão.
Roubo de cargas – situação paradigmática. A situação que enfeixa
as ideias resumidamente defendidas no presente, é a referente aos roubos de
carga em transporte. O Superior Tribunal de Justiça, via de regra, acolhe o
roubo como caso fortuito: "Automóvel.
Roubo ocorrido em posto de lavagem. Força maior. Isenção de responsabilidade. O
fato de o artigo 14, § 3º do Código de Defesa do Consumidor não se referir ao
caso fortuito e à força maior, ao arrolar as causas de isenção de
responsabilidade do fornecedor de serviços, não significa que, no sistema por
ele instituído, não possam ser invocadas.
Aplicação do artigo 1.058 do Código
Civil. A inevitabilidade e não a imprevisibilidade é que efetivamente mais
importa para caracterizar o fortuito. E aquela há de entender-se dentro de
certa relatividade, tendo-se o acontecimento como inevitável em função do que
seria razoável exigir-se." (RESP 120647/SP). E assim tem tratado o roubo de
cargas transportadas, e.g.: "Direito
Civil. Transporte de mercadorias. Roubo. Força Maior. Exclusão da
responsabilidade do transportador de indenizar regressivamente a seguradora que
cobriu os prejuízos do contratante do transporte. Precedentes da corte. Recurso
desacolhido. A presunção de culpa de transportadora pode ser ilidida pela prova
da ocorrência de força maior, como tal se qualificando o roubo de mercadoria
transportada, com ameaça de arma de fogo, comprovada a atenção da ré nas
cautelas e precauções a que esta obrigada no cumprimento do contrato de
transporte."
"Transporte
de mercadoria. Roubo da carga durante o trajeto do veículo.
Responsabilidade do transportador. Força maior. A presunção de culpa do
transportador pode ser elidida pela prova da ocorrência de força maior (Decreto
n.º 2.681/912, art. 1º., par. 1º) O roubo da mercadoria em trânsito, uma vez
comprovado que o transportador não se desviou das cautelas e precauções a que
esta obrigado, configura força maior, suscetível, portanto, de excluir a
responsabilidade, nos termos da regra jurídica acima referida. Recurso não
conhecido". (RESP
43735/SP).
Entendimento diverso pode ser colhido
em outros tribunais, v.g.: "Seguro-
transporte de mercadorias- ação de seguradora contra transportadora- roubo da
coisa transportada – irrelevância – responsabilidade caracterizada. O transporte de mercadorias é obrigação de
resultado, e não pode quem assuma tal incumbência, safar-se da obrigação de
reparar o dano escudado na ação criminosa de terceiros."(Ap. 339.991 – 7ª
Câmara –1º TACSP- j. 23.4.85 –in RT 597/129)
"indenização
– ressarcimento de danos -transporte de carga – risco previsível – estrada
preferida por assaltantes- transportadora já havia sido vítima de casos iguais
– cautelas não tomadas – inocorrência de caso fortuito ou força maior – artigo
1.058 do Código Civil – reembolso devido à proprietária da carga – procedência
da ação – recurso não provido.
(...)
A
rigor, portanto, ainda que admitida a possível ocorrência de assalto, não pode
o apelante escapulir à responsabilidade alegando força maior (Revista dos
Tribunais 571/129). É entendimento uniforme que o transportador assume a
obrigação de resultado, qual seja, a de entregar a mercadoria no local de
destino, assumindo, também, elementarmente, o dever de guarda e custódia das
mercadorias transportadas "(RT 578/155). O dever da ré e do denunciado em
reembolsar a autora é inarredável e foi corretamente fixado na respeitável
sentença que não comporta nenhum reparo."(Ap. 394.021- 6ª Câmara Esp. 1º
TAC SP –J 06.07.88 in JTACSP- LEX 113/154).
Em verdade, e infelizmente, o roubo de
cargas transportadas é fato absolutamente previsível e com riqueza de dados
estatísticos. Em excelente trabalho sobre o tema, no qual pugna com fortes
argumentos pela responsabilidade do transportador em caso de furto ou roubo da
carga, Maurício Silveira, destaca a "precisão de informações dominadas
pelo mercado transportador", passando a demonstrar detalhadamente os
números referentes ao problema.
A razão da não contratação de seguros
com esta cobertura se situa em outro ponto, qual seja, em razões econômicas.
Augusto Hauber Gameiro destaca: "A última hipótese de que trata esta
pesquisa é a de existir um desinteresse natural por parte de alguns
transportadores, referente à utilização de seguros para cargas, ou seja, além
dos problemas citados até o momento – que podem impedir e/ou dificultar o
acesso das empresas transportadoras ao seguro – devem existir, também, casos em
que tais serviços não são demandados, simplesmente por não interessarem aos
potenciais demandantes. Na realidade, a própria concepção de gerência de risco
prevê a opção pela retenção do risco pelo do "não-seguro".
Como já comentado no início deste
item, a escolha pelo "não-seguro" faz parte da concepção de gerência
de risco, que implica em uma decisão voluntária por parte dos indivíduos
("desinteresse" pelo seguro)." Consequentemente, para a
situação na qual o evento é previsível, há apuração estatística de suas
probabilidades e existe apólice de seguro para fazer desaparecer os efeitos
danosos. A não contratação se localiza na esfera da decisão econômica, maior
lucro ou maior competitividade, transferindo o risco para o usuário do serviço
de transporte, caso mantido o atual posicionamento.
Em reforço, Maurício Silveira destaca,
em outro ângulo, a incongruência da existência de cobertura securitária com a
aceitação da caracterização de caso fortuito ou força maior, a realçar com
exação: "Já o RCFDC – Seguro Facultativo de Responsabilidade Civil por Desaparecimento de Carga – é um produto
disponível no mercado segurador que permite ao transportador garantir-se contra
a responsabilidade civil exsurgida do roubo de mercadoria sob sua custódia. Reitera-se,
neste momento, o questionamento se é sensato existir um seguro de responsabilidade
civil por fato equiparável juridicamente à força maior, pois, se essa
equiparação fosse consistente, a resposta certamente seria negativa, já o risco
assegurado seria impossível, nulo, nenhum, inexistente. E o risco é a causa e o
objeto do contrato de seguro (art. 1.432, do Código Civil). Mas, já se
salientou anteriormente, o produto existe e muitos transportadores contratam
esse seguro. Outros, à sombra da impunidade que alberga a mencionada
equiparação maniqueísta entre o roubo e a força maior, economizam o prêmio que
dispenderiam para a sua contratação." Nesse quadro, não há como acolher o
efeito decorrente de furto ou roubo de carga como caso fortuito ou força maior.
A não contratação de seguro desse jaez é mera opção econômica, acarretando para
o transportador responsabilidade na ocorrência do evento. De igual forma,
entendemos em todas as hipóteses nas quais há cobertura securitária para impedir
o efeito danoso e ela não é a contratada. Ao buscar aparentes vantagens
econômicas, traz o sujeito para si os riscos de sua opção, mormente quando o
fato se enquadra como elemento da infortunística própria de sua atividade
empresarial. (Flávio
de Queiroz Bezerra Cavalcanti,
artigo Caso fortuito e força maior
frente a técnica securitária, publicado em 04/2002, site
jus.com.br. Acesso em 25/06/2020, corrigido e aplicadas as devidas
atualizações VD).
Art.
1.059. Os sócios serão obrigados à reposição dos lucros e
das quantias retiradas, a qualquer título, ainda que autorizados pelo contrato,
quando tais lucros ou quantia se distribuírem com prejuízo do capital.
Encerrando o Capítulo com Barbosa Filho, uma vez constituída uma
sociedade limitada e composto, por meio da contribuição patrimonial fornecida
por cada sócio, o capital social, ele é oferecido como única garantia do
pagamento das dívidas sociais. Resguarda-se, por isso, de maneira rigorosa, em
nome da proteção dos credores, a integridade do capital das limitadas, pois não
é viável, normalmente, adotado tal tipo, atingir o patrimônio pessoal dos sócios.
Nesse sentido, resta proibida a distribuição de quantias aos sócios, qualquer que
seja o motivo proposto e alegado, sempre que a operação onerar o capital social
e for feita, portanto, em detrimento da garantia oferecida ao pagamento das
dívidas sociais. A vulneração do capital social materializa, evidentemente, um
ilícito e sujeita os sócios, prejudicada a posição dos credores da pessoa
jurídica, à reposição dos valores recebidos indevidamente, para recompor o
capital original, tal como já havia sido quantificado no instrumento contratual
inscrito. Diante da lapidação da garantia oferecida ao pagamento das dívidas
sociais, os próprios credores estarão legitimados a postular a devolução
prevista no texto legal, devendo, também, ser considerada nula a cláusula
contratual autorizativa de pagamentos prejudiciais ao capital, não podendo dela
serem extraídos efeitos. Acrescenta-se, por fim, aqui, a possibilidade de
aplicação do CC 1.009, dada a omissão do regramento específico da sociedade
limitada, quando caracterizada a distribuição de lucros fictícios,
responsabilizando-se, então, solidariamente, os administradores e os sócios
beneficiados, estes últimos desde que, ao menos, pudessem ter conhecido a
irregularidade. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n.
10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e
atual., p. 1048. Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 25/06/2020. Revista e
atualizada nesta data por VD).
O
histórico diz que o enunciado por esta disposição foi objeto de emenda de
redação na fase final de tramitação do projeto na Câmara dos Deputados, para
adequação. Da terminologia jurídica e aperfeiçoamento do conteúdo do projeto
original Regra praticamente idêntica encontrava-se prevista no art. 92 do
Decreto n. 3.708/19.
Em sua doutrina,
Ricardo Fiuza confirma que os sócios têm direito à percepção dos lucros gerados
pela sociedade, após levantados e apurados no balanço patrimonial anual.
Ocorrendo situações em que a distribuição de lucros inexistentes ou a retirada,
a qualquer título, de valores seja feita com prejuízo ou desfalque do capital,
mesmo que tal possibilidade esteja prevista no contrato social, ficam os sócios
obrigados a repor em favor da sociedade o que indevidamente receberam. Essa
disposição tem como finalidade resguardar os direitos de terceiros que
contrataram com a sociedade tomando como critério para a concessão ou
atribuição de crédito o montante do capital social. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 551, apud Maria
Helena Diniz Código Civil Comentado
já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 25/06/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Sob o prisma de (Antônio Junqueira de Azevedo e
Modesto de S Barros Carvalhosa, o art. 9º, segunda parte, do Decreto n.
3.708/19, já previa a reposição dos dividendos e das quantias retiradas a
qualquer título que fossem distribuídos em prejuízo do capital. Como se infere da
redação do referido art. 9º, não exigia o diploma de 1919 que o sócio houvesse
recebido os dividendos ou demais retiradas de má-fé para que tivesse este a
obrigação de repor as quantias retiradas. No caso desse art. 9º, segunda parte
do decreto de 1919 não é relevante a configuração da má-fé no recebimento dos
dividendos ou das demais quantias. O requisito do dispositivo é objetivo: terem
sido os dividendos e demais quantias distribuídos em prejuízo do capital
realizado.
A propósito, a lição de Cunha Peixoto, sobre a
segunda parte do art. 9º do Decreto n. 3.708/19: “(...) redigido de maneira
ampla, este dispositivo abrange, sem nenhuma dúvida, o pagamento de juros,
independentemente de haver a sociedade produzido lucro, visto como eles só
poderiam sair do capital”.
Assim, tratou o Código Civil de 2002 de manter a
mesma abrangência com relação à matéria, englobando não apenas a distribuição
de lucros em prejuízo do capital, mas também os demais desfalques que poderiam
ocorrer, tais como o pagamento de juros.
A redação do artigo 1.059, em comento, é bastante
semelhante à redação do referido artigo 9º, segunda parte, do Decreto 3.708/19.
O CC/2002 é um pouco mais acurado ao mencionar “Lucros” em lugar de
“dividendos” como constava no decreto de 1919, sem, no entanto, trazer qualquer
alteração de fundo com o presente dispositivo. Em verdade, simplesmente manteve
o preceito já previsto no referido art. 9º, segunda parte do decreto de 1919.
Lucros, dividendo e capital social – o conceito de
lucros assenta-se no de capital social, da mesma forma como o conceito de
perda. Lucros é a parte do patrimônio líquido que supera o capital social;
perda, ao contrário, é a parte do capital social que supera o patrimônio
líquido. Como consequência, a situação de lucro ou perda não se fraciona nem se
isola de exercício para exercício. Assim, quando se fala em lucros quer-se
dizer uma verificação periódica dos lucros e das perdas. Porém, esse princípio
da anualidade da verificação dos resultados não prevalece para a distribuição
de dividendos. Estes somente podem ser distribuídos se a situação acumulada dos
diversos exercícios anteriores da sociedade apresentarem um resultado positivo
em relação ao capital social. Se, ao contrário, as perdas acumuladas
anteriormente superam o patrimônio líquido da sociedade, não pode haver
distribuição de lucros.
Dessa forma, constituiria ato ilegal a distribuição
de resultados positivamente apurados num exercício, se houve resultados
negativos acumulados nos anos anteriores, que se equivalham ou mesmo superem o
lucro do exercício mais recente. Vale lembrar que dividendo é o montante do
lucro que se divide pelo número de quotas. É a parcela do lucros relativa a
cada quota. É o rendimento anual da quota.
Este CC 1059 baseia-se, essencialmente, no princípio
da integridade do capital social, visando à proteção dos interesses dos
credores, dos sócios e da própria sociedade, no tocante ao regime de
distribuição de lucros. Proíbe este dispositivo, portanto, a distribuição de
lucros fictícios. O desfalque do capital social para a distribuição de lucros
ou qualquer outro benefício aos sócios é, portanto, expressamente vedado.
O capital social não é formado por uma massa
destacada do patrimônio ou ainda por uma parte do ativo social. Ao contrário, o
capital social deve ser entendido como um débito da sociedade diante dos sócios
e, por isso, consta do passivo do balanço, embora não exigível. É uma ficção
jurídica cuja criação foi motivada visando a salvaguarda dos credores da
sociedade. Não devem, assim, os lucros e prejuízos do exercício social ser
creditados ou diminuídos da conta do capital, mas colocados em posição especial
no balanço.
A origem do princípio da integridade do capital
social está, portanto, na ideia de manutenção da estabilidade social e da
segurança no cumprimento das obrigações assumidas pela sociedade. A modificação
do capital social da sociedade limitada deve se dar por meio de aumentos ou
reduções na forma determinada pelo CC 1.081 a 1.084.
Em virtude da omissão do CC/2002, no capítulo de
sociedades limitadas, relativamente às responsabilidades dos administradores
por atos com que tenham agido com culpa, devem ser aplicadas às sociedades
limitadas o disposto no CC 1.009. Ainda que, eventualmente, a sociedade
limitada tenha optado pela regência supletiva da lei societária em matéria
organizacional (conforme faculta o parágrafo único do CC 1.053), com relação à
responsabilidade dos administradores devem ser aplicadas as disposições da
sociedade simples, previstas no referido CC 1.009.
Não cabe a aplicação do art. 177, VI, do Código
Penal de 1940 para os administradores das sociedades limitadas nos casos de
distribuição de lucros fictícios. Isto porque os administradores das sociedades
limitadas não se enquadram no tipo penal previsto no referido dispositivo.
Essa norma aplica-se apenas aos administradores das
sociedades por ações, não cabendo interpretação extensiva, ainda que a
aplicação dessa norma aos casos dos administradores das sociedades limitadas
pudesse parecer razoável.
No âmbito do direito penal, a interpretação
extensiva da norma não é cabível, em virtude do princípio da taxatividade
(estrita legalidade). É o que ensina Celso Delmanto: “(...) ao juiz que vai
aplicar leis penais é proibido o emprego da analogia ou da interpretação com
efeitos extensivos para incriminar algum fato ou tornar mais severa sua
punição. As eventuais falhas da lei incriminadora não podem ser preenchidas
pelo juiz, pois é vedado a este completar o trabalho do legislador para punir
alguém”.
Desse modo, ainda que
a sociedade limitada tenha optado pela regência supletiva da Lei Societária,
não se pode aplicar aos seus administradores, em caso de distribuição de lucros
fictícios, o disposto no art. 177, VI, do Código Penal, que somente deve ser
aplicado aos administradores das sociedades anônimas. (Antônio Junqueira de Azevedo e Modesto de S Barros Carvalhosa,
encontrado no books.google.com.br, livro Comentários ao código civil v. 13,
acessado em 25.05.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
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