Direito Civil Comentado - Art.
1.063, 1.064, 1065
Da Administração
- VARGAS, Paulo S. R.
Parte
Especial - Livro II – (Art. 966 ao 1.195) Capítulo IV –
Da
Sociedade Limitada – Seção III – Da administração
(Art.
1.060 ao 1.065) – vargasdigitador.blogspot.com
Art.
1.063. O exercício do cargo de administrador cessa pela
destituição, em qualquer tempo, do titular, ou pelo término do prazo se, fixado
no contrato u em ato separado, não houver recondução.
§
1º. Tratando-se de sócio nomeado administrador no
contrato, sua destituição somente se opera pela aprovação de titulares de
quotas correspondentes, no mínimo, a dois terços do capital social, salvo
disposição contratual diversa.
§
2º. A cessação do exercício do cargo de administrador
deve ser averbada no registro competente, mediante requerimento apresentado nos
dez dias seguintes ao da ocorrência.
3º.
A renúncia de administrador torna-se eficaz, em
relação à sociedade, desde o momento em que esta toma conhecimento da
comunicação escrita do renunciante; e, em relação a terceiros, após a averbação
e publicação.
Lecionando Barbosa Filho,
os administradores da sociedade limitada atuam, a partir de sua designação e da
posterior investidura, de conformidade com os poderes especificamente
atribuídos pela pessoa jurídica, durante um período de tempo mais ou menos
longo, determinado ou indeterminado, persistente, aqui, para atender à conveniência
dos sócios contratantes, ampla variabilidade. O administrador deixa de exercer
a gestão dos negócios sociais quando materializada uma de três hipóteses, todas
elas disciplinadas no presente artigo.
A destituição do
administrador corresponde à extinção forçada dos poderes antes conferidos, o
que deriva sempre de deliberação específica dos sócios, aprovada, em
conformidade com o disposto no inciso III do CC 1.071, pelo voto de titulares
de quotas iguais à maioria absoluta do capital social. Se é pretendida, porém,
a destituição de administrador designado pelo próprio contrato inscrito, deverá
ser obedecido um requisito especial de validade da deliberação, exigindo-se,
simplesmente, a observância de um quórum especial, de dois terços do
capital social, deixando-se de lado as graves restrições estabelecidas, no
âmbito das sociedades simples, pelo CC 1.019, pois não há, aqui, quando às
limitadas, a exigência de qualquer fundamentação específica para a deliberação
de destituição.
O texto do § 1º deste artigo
é deficiente e se refere apenas ao sócio-administrador, sem prever
expressamente a destituição de não sócio designado por cláusula contratual,
devendo, no entanto, as duas situações ser equiparadas, pois não seria lógico
aplicar, diante da necessidade de alteração contratual, o inciso I do CC 1.071
e exigir, em se tratando de não sócio, o quórum especial de três quartos
do capital social. Ademais, assinale-se que o legislador, em razão do § 1º
deste artigo, viabilizou a irremovibilidade concreta de administradores em
confronto com o exercício de controle majoritário, o que, por certo, gerará
discórdia e litígios de dificultosa solução. O § 2º impõe, ainda, como
providência imperiosa à pena eficácia da destituição, seja promovida a
averbação na inscrição original, respeitado o prazo de dez dias.
Deve-se alertar que, caso
não seja dada publicidade ao fato, a sociedade responderá, perante terceiros de
boa-fé, presente a aparência de regularidade da conduta do destituído, pelos
novos atos praticados e, caracterizado prejuízo efetivo, poderá, depois,
voltar-se contra o antigo administrador, postulando ressarcimento. A renúncia
do administrador, prevista no § 3º, implica a extinção voluntária dos poderes
de presentação, derivando de manifestação volitiva unilateral, a qual, para
ostentar plena eficácia, precisa preencher duas ordens de fatores.
Resta, num primeiro plano, necessária a cientificação formal da própria
sociedade, feita por meio de notificação judicial (CPC/1973, art. 867 – Seção X
– Dos Protestos, Notificações e Interpelações, correspondente ao CPC/2015, art.
301, Seção II - Da Notificação e da Interpelação) ou extrajudicial (art. 160 da
Lei n. 6.015/73), sem o que não se produzirão efeitos perante a pessoa
jurídica. Há de ser, em segundo lugar, promovida a averbação do ato de renúncia
na inscrição original da sociedade para que seus efeitos recaiam sobre
terceiros, emanando uma publicidade geral do ato registrário. O término do
prazo de vigência da designação feita resulta na automática extinção dos
poderes de gestão e constitui uma terceira e última hipótese de cessação do
exercício da gestão, desde que não tenha sido tomada nova deliberação de
prorrogação. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n.
10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e
atual., p. 1051-52. Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 29/06/2020. Revista e
atualizada nesta data por VD).
Historicamente, o capta
deste dispositivo, bem como o texto dos §§ P e 22, vieram a ser alterados por
emenda do Senador Gabriel Hermes. Na redação do caput, apenas foi
modificada a locução adverbial “em qualquer tempo”, quando a redação primitiva
era “em qualquer momento”. Os §§ 1º e 2º também foram modificados, para reduzir
o quórum de deliberação da destituição do administrador de três quartos
para dois terços dos votos dos sócios, assim como para indicar que a averbação
da cessação do exercício e dos poderes de gestão deve ser feita no registro
competente, uma vez que a sociedade simples também pode ser constituída sob a
forma de sociedade limitada. O Decreto n. 3.708/19 não continha norma
semelhante a respeito da destituição ou renúncia do gerente da sociedade
limitada.
Segundo Ricardo Fiuza, em
sua doutrina, o mandato para o exercício dos poderes de administração na
sociedade limitada pode ser por prazo determinado ou indeterminado. Tanto em um
caso como em outro, o gerente ou administrador pode ser destituído, a qualquer
tempo, pelos sócios que representem mais da metade do capital social (CC
1.076). Todavia, se os poderes de gestão tiverem sio conferidos pelo contrato a
um dos sócios, o administrador somente poderá ser destituído por deliberação de
sócios que representem dois terços do capital social, podendo o contrato,
contudo, dispor diversamente sobre essa questão. Sempre que ocorrer cessação do
exercício do cargo de administrador da sociedade, por término do prazo de
hipótese de renúncia, esta tem eficácia em relação à sociedade com a simples
comunicação escrita, mas somente terá eficácia perante terceiros após averbado
o ato no registro competente e sucessivamente publicado na imprensa oficial. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 553,
apud Maria Helena Diniz Código Civil
Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf,
Microsoft Word. Acesso em 29/06/2020,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Na pauta de Antônio Junqueira de
Azevedo e Modesto de S Barros Carvalhosa em relação ao Término da gestão do
administrador, o prazo de gestão, que tem início na data de sua investidura,
termina, segundo estabelece este CC 1.063, na data prevista no contrato social
ou no ato em separado de nomeação, se não for reconduzido ao cargo, podendo,
ainda, terminar antecipadamente, mediante a destituição do administrador.
O
Código Civil permite que o administrador eleito seja reconduzido ao cargo por
um número de vezes ilimitado. Havendo a recondução, aprovada pela assembleia ou
reunião de sócios, deverá o administrador cumprir novamente as formalidades de
investidura e publicidade da mesma pela averbação no registro próprio (CC
1.062).
O
órgão competente para a destituição do administrador será o mesmo competente
para a sua eleição, ou seja, a assembleia geral ou reunião dos sócios,
observado o quórum de destituição
previsto em cada caso, conforme seja o administrador sócio ou não sócio, ou
nomeado do contrato social ou em ato em separado.
A
deliberação de destituição do administrador pela reunião ou assembleia, seja
ele sócio ou não, é ato unilateral da sociedade que faz cessar o exercício das
funções de administração do destituído, e pode ser tomada a qualquer tempo, sem
que se exija qualquer justificativa da sociedade para esse ato.
Uma
vez deliberada a destituição do administrador eleito em reunião da assembleia
geral ou reunião de sócios, no mesmo ato deverá ser deliberada a eleição do
novo administrador que o substituirá, devendo o conclave determinar o prazo de
gestão do administrador eleito, salvo se este prazo já estiver previsto no contrato
social. Essa medida de imediata substituição do administrador destituído
impõe-se com fundamento no princípio de que a sociedade não pode ficar sem um
administrador, e somente pode ser dispensada a substituição imediata caso a
sociedade tenha mais um administrador e o(s) remanescente(s) tenha(m) os
poderes de representação necessários à continuidade dos negócios da sociedade
até que se realize nova eleição para substituição do destituído.
Conforme
o § 1º, tem de haver um quórum
necessário para a deliberação sobre a destituição de administrador. Como já
referido anteriormente, tratando-se de administrador sócio designado no
contrato social, este somente poderá ser destituído de seu cargo por
deliberação de quotistas que representem, no mínimo, dois terços do capital
social, podendo o contrato social aumentar ou reduzir esse quórum.
Se o administrador for
sócio, porém designado em ato em separado, incidirá a regra geral de quórum
para destituição dos administradores (CC 1.076, II c/c o CC 1.071, III),
requerendo-se a aprovação de quotistas representando mais da metade do capital
social.
Lembrando que o § 2º,
exige averbação no registro competente da cessação do cargo de administrador, o
Código civil inova ao exigir que se deve dar publicidade ao ato de destituição
do administrador dentro do prazo de dez dias da sua ocorrência, mediante a
averbação do competente registro.
O motivo determinante
dessa publicidade obrigatória (averbação) da cessação do exercício do cargo do
administrador é o mesmo que determina a publicidade obrigatória da sua investidura,
ou seja, para dar ciência e tornar oponível a terceiros a cessação do exercício
das funções de administração do destituído.
É importante notar que o
Código Civil não prescreve qualquer formalidade a ser cumprida para que a
destituição se torne efetiva, não exigindo, tal como o fez para a investidura,
que se proceda ao registro da destituição no livro da atas da administração.
Portanto, o ato unilateral da destituição, resultante da deliberação da
assembleia geral ou reunião de quotistas, não depende para sua eficácia de
aceitação por parte do administrador ou de qualquer outra formalidade, e terá
efeitos imediatos perante a sociedade e seus quotistas.
Essa destituição somente
será eficaz perante terceiros após a averbação do ato de destituição. Dessa
forma, até que seja levada à averbação no registro competente, a destituição do
administrador não poderá ser oposta a terceiros. Se o administrador destituído,
nesse ínterim, vier a praticar algum ato em nome da sociedade, esta não poderá
escusar-se de responder por ele frente aos terceiros, podendo, entretanto,
voltar-se posteriormente em regresso contra o destituído.
E finalmente, o § 3º, que
fala de hipotética renúncia do administrador ao respectivo cargo, determinando
o momento no qual se considerará eficaz essa renúncia em relação à sociedade. E
essa eficácia, perante a sociedade, iniciar-se-á no momento em que a sociedade
tomar conhecimento da comunicação escrita do renunciante, e perante terceiros,
somente após a averbação da renúncia no registro competente e de sua
publicação, nos termos do CC 1.152.
A renúncia é ato
unilateral do administrador e se aperfeiçoa com a simples recepção pela
sociedade do documento escrito do renunciante, não dependendo de qualquer ato
unilateral recíproco da sociedade para que se torne eficaz. Trata-se de um
direito do administrador renunciar ao seu cargo a qualquer tempo, sem a
necessidade de apontar a causa de sua renúncia. Corresponde ao direito da
sociedade de destituir o administrador de seu cargo ad nutum, por
deliberação em conclave, que também dispensa a fundamentação de justa causa.
Ainda, referente à
eficácia da renúncia perante a sociedade (§ 3º), o Código Civil de 2002 dispõe
ainda que, a renúncia do administrador será eficaz com relação à sociedade
desde o momento em que esta tomar conhecimento da comunicação escrita do
renunciante.
Observe-se,
primeiramente, que, para tornar-se eficaz a renúncia, deve-se fazer por meio de
documento escrito assinado pelo renunciante. Não terá qualquer efeito a
declaração verbal do renunciante feita em reunião da própria administração ou
em assembleia ou reunião de quotistas, ainda que da respectiva ata conste a sua
assinatura. Exige a lei que a renúncia se faça por documento autônomo, firmado
pelo administrador que se retira. E essa comunicação por escrito deve ser
encaminhada à sociedade. A renúncia somente será eficaz relativamente à
sociedade a partir do momento em que esta tomar conhecimento da comunicação
escrita do renunciante.
A redação do dispositivo
em comento parece adotar a teoria da cognição, ao subordinar a eficácia
da renúncia ao conhecimento efetivo pela sociedade do teor da comunicação por
escrito apresentada pelo renunciante. Esse entendimento, no entanto, geraria
extrema insegurança jurídica à prática dos negócios sociais. Isso porque o
efetivo conhecimento do teor dessa comunicação somente se daria quando da sua
leitura pelos órgãos competentes da sociedade, o que tornaria impossível
precisar com exatidão o momento em que se consideraria liberado o renunciante
do exercício de seu cargo. Ademais, tal interpretação permitiria à sociedade
protelar indefinidamente ou obstar a eficácia da renúncia.
Em vez disso, deve-se
presumir que a comunicação escrita da enviada pelo renunciante terá chegado ao
conhecimento da sociedade no momento da sua entrega na sede da companhia.
Impõe-se, aqui, a adoção da teoria da recepção. Não será necessário que
os órgãos competentes da sociedade tomem conhecimento efetivo do teor do
documento de renúncia. Basta que seja entregue na sede da companhia, mediante
comprovação do recebimento.
Nesse pondo, deveria o
Código Civil de 2002 ter adotado a mesma orientação do art. 151 da Lei
Societária (Lei n. 6.404/76), que, embora com redação muito semelhante à do
presente § 3º, deixa expresso que a renúncia do administrador torna-se eficaz
em relação à companhia desde o momento em que lhe for entregue a comunicação
por escrito do renunciante, sem deixar margem a quaisquer dúvidas quanto ao
momento em que cessa o exercício do cargo pelo administrador que se retira.
Ainda, quanto à eficácia
da renúncia perante terceiros (§ 3º), se a renúncia é eficaz perante a
sociedade desde o momento em que esta recebe a comunicação escrita do
renunciante, perante terceiros somente será eficaz depois de cumpridas as
formalidade de averbação junto ao registro competente e publicação na forma do
CC 1.152.
A norma não estabelece
prazo para a averbação da renúncia. Deve-se aplicar, no caso, o prazo geral de
trinta dias, previsto no § 1º do CC 1.151. Depois de averbada a renúncia, é
necessário que dela se dê notícia por publicação em diário oficial e em jornal
de grande circulação do local da sede da sociedade (CC 1.152).
O documento a ser levado
à averbação perante o registro próprio será o documento de renúncia firmado
pelo administrador que se retira. Esse é O documento que interessa à sociedade
e a terceiros e que deve ser averbado. A sociedade não está cumprindo o seu
dever de levar a registro a renúncia se apenas proceder à averbação da ata de
reunião do órgão da administração ou da assembleia geral ou reunião de quotistas
que apenas der notícia da renúncia.
Note-se que a publicação
oficial (CC 1.152) exigida pela norma será apenas da averbação do documento de
renúncia no registro competente, ou seja, da certidão fornecida por esse
órgão público, e não do inteiro teor da renúncia, cujos termos não necessitam
chegar ao público, por consistir em matéria reservada do interesse restrito da
sociedade e do renunciante.
A publicação oficial nos
jornais exigida pelo CC 1.152 tem o intuito de levar ao conhecimento de todos
os sócios da limitada, de seus credores e de terceiros que com ela mantenham
alguma relação, a modificação operada na administração da sociedade em razão da
renúncia, no intuito de melhor proteger os seus interesses relativamente à
sociedade. Sua função é levar a presunção legal do conhecimento pelo terceiro
do ato a partir do qual passam a correr os prazos de aquisição e de prescrição
de direitos por parte desses mesmos terceiros. Dessa forma, somente se tornará
eficaz a renúncia do administrador perante terceiros depois de completadas as
formalidades de averbação e de publicação oficial (CC 1.152).
Não obstante, conforme
dispõe o CC 1.151, se essas formalidades de publicidade forem retardadas pela
sociedade ou esta omitir-se em realiza-las, poderá o administrador renunciante,
na qualidade de interessado, substitutivamente, procedê-las, para a proteção
dos seus interesses individuais.
Quanto a Cessação da
responsabilidade dos administradores pelos atos regulares de administração
praticados – tanto daqueles administradores que têm cessada a sua função em
razão do término do prazo de gestão quando daqueles que são destituídos ou que
renunciam ao cargo – somente termina com a aprovação de suas contas pela
assembleia geral ou reunião de sócios (CC 1.071, I).
Ademais, permanece a
responsabilidade do administrador até o final do prazo prescricional da ação
que lhe pode ser movida por violação da lei ou do contrato social, que é de
três anos, contados da data da assembleia geral ou reunião de quotistas que
aprovar as suas contas (CC 206, § 3º, VII, b).
Por sua vez, para efeitos
falimentares, a responsabilidade patrimonial do administrador para com a
sociedade só se encerrará com o decurso do prazo de dois anos fixado pelo § 1º
do art. 82 da Lei de Falências e Recuperação de Empresas (Lei n. 11.101, de
9-2-2005). Para tanto, deve-se levar em conta a data de retirada do
administrador da sociedade e a sua responsabilidade para com os atos lesivos ao
interesse dos credores; situação essa que deverá ser apurada por meio de ação
ordinária, com todas as garantias inerentes ao princípio do devido processo
legal.
No que diz respeito aos
efeitos penais falimentares, a data em que cessar o exercício do cargo do
administrador – seja ela a do término do prazo de gestão ou a da destituição ou
da renúncia – poderá ser utilizada para indicar a inexistência de
responsabilidade do administrador face aos crimes eventualmente apurados fora
desse período. No entanto, deve-se deixar bem claro que, nos termos do art. 182
da Lei de Falências e Recuperação de Empresas (Lei n. 11.101, de 9-2-2005), a
prescrição dos crimes falimentares começa a correr somente a partir do dia da
decretação da falência, da concessão da recuperação judicial ou da homologação
do plano de recuperação extrajudicial. (Antônio Junqueira de Azevedo e Modesto de S
Barros Carvalhosa, encontrado no books.google.com.br, livro Comentários ao código civil v. 13, art.
1.063, acessado em 29.06.2020, corrigido e aplicadas as devidas
atualizações VD).
Art.
1.064. O uso da firma ou denominação social é privativo dos
administradores que tenham os necessários poderes.
Na consagração de Marcelo Fortes Barbosa Filho, como já exposto quando da análise do
CC 1.022, a sociedade, como pessoa jurídica, constitui um ente imaterial, de
existência ideal, não podendo, diretamente, relacionar-se com os demais
sujeitos de direito e, por si só, realizar as operações próprias à consecução
do objeto social. Todo e qualquer relacionamento da sociedade com terceiros,
por isso mesmo, é efetivado por intermédio de seus órgãos de administração,
cuja existência é obrigatória. A administração é integrada por membros
designados e devidamente investidos, os administradores, a quem é dado, como
atribuição privativa, presentar a sociedade, de conformidade com os poderes
conferidos, agindo pela pessoa jurídica, dando-lhe, então, vida e
possibilitando seja obtido sucesso patrimonial na realização do objeto social.
As operações mediadas pelos administradores induzem a aquisição de direitos
pela pessoa jurídica, tal qual o nascimento de obrigações, mediante a
celebração de contratos ou como consequência de atos unilaterais, vinculando-a.
nem todos os administradores ostentam, contudo, a atribuição de manter o
relacionamento da sociedade com terceiros; alguns deles atuam apenas
internamente, dispondo, de maneira concreta, por exemplo, sobre os bens de
capital e os recursos humanos, dotando-lhes da organização mais eficiente
possível. Aqueles administradores dotados de poderes específicos e suficientes,
quando atuam pela pessoa jurídica, precisam fazer uso de seu nome empresarial,
escolhido pelos sócios contratantes e mantido, conforme o disposto no CC 1.158,
sob a forma de firma ou denominação. Iniciam-se, assim, explicitamente, a
qualidade de administrador e a concretização de manifestação volitiva da pessoa
jurídica. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n.
10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e
atual., p. 1052. Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 29/06/2020. Revista e
atualizada nesta data por VD).
Segundo histórico a norma
é a mesma do projeto original. O art. 13 do Decreto n. 3.708/19 regulava o uso
da firma social pelos sócios-gerentes na sociedade limitada. Enquanto a
doutrina de Ricardo Fiuza aponta que os poderes de gestão na sociedade limitada
são exercidos mediante o uso da firma ou denominação social, i. é, o
administrador é aquele que representa ativa e passivamente a sociedade e que
pode assinar em seu nome. Compete privativamente aos administradores contratar
em nome da sociedade, apondo sua assinatura como representante legal. O sócio
que fizer uso da firma ou denominação social sem estar autorizado responde
pessoalmente pelos atos e obrigações que vier a assumir. A sociedade somente se
obriga quando regularmente representada por seus administradores. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 554,
apud Maria Helena Diniz Código Civil
Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf,
Microsoft Word. Acesso em 29/06/2020,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
No lecionar de Azevedo e
Carvalhosa, o artigo em comento trata da Gestão e representação da sociedade
limitada na vigência do Decreto n. 3.708/19, quando o contrato social devia
indicar quem eram os sócios-gerentes habilitados a fazer uso da firma social,
podendo livremente estabelecer as funções, atribuições e poderes de cada
sócio-gerente, bem como a necessidade ou não de representação conjunta da
sociedade por mais de um gerente. Na omissão do contrato, qualquer sócio podia,
isoladamente, representar a sociedade, bem como praticar representar a
sociedade, bem como praticar os atos de gestão necessários ao pleno
desenvolvimento das atividades sociais.
Da Gestão e representação
da sociedade limitada no Código Civil de 2002. O CC 997. VI, aplicável às
sociedades limitadas por remissão expressa do CC 1.054, determina que do
contrato social da limitada conste o nome das pessoas naturais incumbidas da
administração, bem como seus poderes e atribuições.
Como referido, o contrato
social da limitada poderá deixar de indicar as pessoas a quem incumbirá a
administração, desde que estabeleça que tal indicação será feita por ato em
separado, nos termos do CC 1.060. e desde que o ato em separado seja levado a registro
juntamente com o de constituição da sociedade, sob pena de considerar-se nulo o
contrato social, por falta de indicação de administrador.
A respeito da
administração, o contrato social deve ser completo, incluindo a forma de
distribuição dos poderes de gestão e de representação da sociedade entre os
administradores. Sendo o contrato social omisso sobre os poderes e as
atribuições que incumbem a cada administrador, deve-se entender que qualquer
dos nomeados está autorizado a representar a sociedade, bem como a praticar os
atos de gestão necessários a seu regular funcionamento. Essa solução é trazida
pelo CC 1.022, para as sociedades limitadas regidas supletivamente pelas regras
das sociedades simples, e pelo art. 144 da Lei das Sociedades Anônimas (Lei n.
6.404/76), para aquelas que, de acordo com seu contrato, são regidas
supletivamente pelo regime das companhias.
O contrato social poderá
fixar livremente a forma de representação da sociedade, podendo conferi-la a
apenas um administrador ou vários, agindo individualmente, ou ainda estabelecer
a representação em conjunto para quaisquer atos ou para atos específicos. Pode
ainda o contrato social delimitar o âmbito da representação de cada
administrador a determinados atos sociais.
Deve, ainda, o contrato
social estabelecer a forma como se dará a substituição dos administradores em
casos de ausência ou de impedimentos temporários, uma vez que o Código Civil
não contém regra sobre a matéria. Na omissão do contrato social a respeito,
ausente ou impedido temporariamente o administrador, qualquer outro
administrador poderá exercer as funções de administração e de representação do
administrador temporariamente afastado, aplicando-se também a essa situação a
regra do art. 144 da Lei das Sociedades Anônimas (Lei n. 6.404/76), ou do CC
1.022, conforme o caso.
Note-se que os poderes e
atribuições que incumbem a cada administrador devem estar expressos no contrato
social. Não pode prevalecer contra terceiros a distribuição de poderes e de
atribuições feita apenas em ato em separado. Isso porque o CC 1.060, § 2º, que
trata da averbação da nomeação do administrador por ato em separado no Registro
do Comércio, não exige que dela constem as atribuições e os poderes conferidos,
na pressuposição de que essa matéria deve constar do contrato social (CC 1.054
e 997, VI). Consequentemente, a averbação desse ato em separado não é
suficiente para dar a necessária publicidade da limitação de poderes e de
atribuições dos administradores. Nessa hipótese, não poderá a sociedade opor a
terceiros exceção à eficácia dos atos praticados pelo administrador com
fundamento no CC 1.015, parágrafo único, I.
Nesses casos, para que a
sociedade possa validamente opor-se à eficácia perante terceiros dos atos
praticados em seu nome pelo administrador, terá de provar que a atribuição
contratual de poderes ou atribuições era de conhecimento desse mesmo terceiro
(CC 1.015, II), ou que se tratava de operação evidentemente estranha aos
negócios da sociedade (CC 1.015, III).
O CC 1.064 dispõe ser o
uso da firma ou da denominação da sociedade privativo dos administradores que
tenham os necessários poderes. Trata-se aqui da regra específica sobre a
representação da sociedade. Como referido, afere-se se os administradores da
sociedade têm ou não poderes necessários para representa-la por meio da
verificação de seu contrato social. No silêncio deste, cada administrador pode
agir como se fosse o único representante da sociedade. O exercício desse poder
legal apenas encontrará restrições no objeto social e nas normas legais
pertinentes.
Há que distinguir, nesse
passo, entre gestão e representação da sociedade. A representação
consiste no poder de manifestar validamente em relação a terceiros a vontade
social. Gestão é o poder de deliberação e decisão dos administradores.
O poder de decisão cabe
aos administradores individualmente, respeitadas as limitações impostas pelo
contrato social. O poder de deliberação cabe normalmente à assembleia ou à
reunião dos sócios. Mas pode também haver deliberação dos administradores
incumbidos da gestão ordinária da sociedade, para o que se reunirão e tomarão
suas deliberações na forma que dispuser o contrato social (reunião da
diretoria).
O poder de representação
é mais amplo que o de gestão, pois compreende também a execução das decisões e
das deliberações, que são as manifestações de vontade surgidas no âmbito
interno da sociedade. As decisões e as deliberações não pressupõem
representação, ao passo que esta última requer, necessariamente, uma vontade
social que a legitime. A representação é sempre orgânica. Quem age é a
própria sociedade, e não seu representante legal. A vontade social, formada no
âmbito interno da sociedade, manifesta-se externamente por intermédio dos
administradores, conforme determina o CC 47.
Da indelegabilidade dos
poderes de representação dos administradores. O presente CC 1.064, veda
expressamente a delegação dos poderes de representação, privativos dos
administradores. Os administradores nomeados e investidos nos temos deste
artigo expressam a vontade social nos limites da competência de cada um, que
deverá ser estabelecida no contrato social.
Assim, não pode o
administrador delegar esses poderes a outro administrador, a terceiro ou a
sócio. Nem mesmo na ausência ou impedimento de algum administrador se permite
que haja tal delegação. Nesses casos o administrador ausente ou impedido deverá
ser substituído por mandatário devidamente constituído pela sociedade, com
poderes especificamente designados no instrumento de procuração, ou então ser substituído
na estrita forma do contrato social.
Essa indelegabilidade não
é apenas quando aos poderes de representação do administrador, mas também no
que concerne a seus poderes de gestão, estabelecidos no contrato social. Nesse
sentido se aplicam os preceitos expressos de indelegabilidade do CC 1.018 às
sociedades limitadas regidas supletivamente pelas regras das sociedades
simples, e do art. 139 da Lei n. 6.404/76 às sociedades limitadas cujo contrato
social tenha instituído a regência supletiva do regime das sociedades anônimas.
Assim, não poderá o
administrador delegar seus poderes a terceiro ou a sócio. Tampouco poderá a
assembleia ou a reunião de quotistas delegar ao administrador os poderes
decisórios que lhe são atribuídos pelo Código (CC 1.070) ou pelo contrato
social. Os poderes do administrador restringem-se à representação da sociedade
e às decisões relativas ao curso ordinário dos negócios.
Da constituição de
mandatários da sociedade – A vedação à delegação dos poderes dos
administradores da sociedades limitadas (CC 1.018 e art. 139 da lei n.
6.404/76) não obsta a que a sociedade, representada por seus administradores,
venha a constituir mandatários para a prática de atos específicos de
administração. A possibilidade de constituição de mandatários da sociedade é
expressamente prevista tanto no CC 1.018, aplicável subsidiariamente às
sociedades limitadas que optarem pela regência supletiva das regras das
sociedades simples, quanto no art. 144, parágrafo único, da Lei n. 6.404/76,
aplicável às limitadas regidas supletivamente pelo regime das companhias.
Não se trata aqui da
delegação de poderes de um administrador a um terceiro por ele escolhido, por
meio de um ato unilateral seu, mas sim de um negócio jurídico bilateral
(mandato), em que há duas partes – mandante (sociedade) e o mandatário -, tendo
por escopo estabelecer o poder de representação da sociedade para a prática de
determinados atos de administração.
O mandatário não é
delegado do administrador que representou a sociedade no ato de sua
constituição. É a sociedade que age por meio de seu órgão de representação (o
administrador), para constituir seu mandatário por mio do instrumento de
procuração próprio.
O negócio jurídico
bilateral do mandato pressupõe a existência de duas pessoas, a sociedade e o
procurador, e o encontro de vontade de ambos, regendo-se pelos CC 653 e ss. do
Código. Não se confunde com a representação orgânica da sociedade, onde há
apenas uma pessoa, a sociedade, corporificada por seu órgão (o administrador),
e que por meio dele manifesta sua vontade externamente.
Para a constituição do
procurador da sociedade é essencial o instrumento de mandato, que deve
especificar os poderes a ele conferidos (CC 1.018 e art. 144, do parágrafo
único, da Lei n. 6.404/76). Esse instrumento de procuração somente poderá ser
firmado por administrador que tenha poderes de representação para outorga de
procurações, de acordo com o contrato social. Sendo o mandato outorgado pela
sociedade, não é necessário que o administrador que firma a procuração tenha os
poderes e atribuições especificamente outorgados ao procurador. Não há relação
entre os poderes e atribuições do outorgado e os poderes e atribuições do
administrador que representa a sociedade no ato da outorga. Note-se, outrossim,
que o mandato outorgado ao procurador da sociedade é totalmente desvinculado da
pessoa do administrador orgânico que firmou a procuração, podendo não coincidir
um e outro. A extinção do mandato dar-se-á consoante as normas previstas no
Código Civil de 2002 que regem o mandato (CC 653 e ss.).
Da responsabilidade dos
administradores da sociedade limitada na vigência do Decreto n. 3.708/19, da
responsabilidade dos administradores vinha tratada nos arts. 10, 11 e 14. Os
sócios-gerentes não tinham qualquer responsabilidade pelos atos que praticassem
na administração da sociedade quando exercidos regularmente, nos limites de
seus poderes e sem violação da lei ou do contrato social. Tornavam-se, no
entanto, solidária e ilimitadamente responsáveis perante a sociedade e
terceiros quando violassem a lei ou o contrato social, ou ainda quando agissem
com excesso de mandato (art. 10 do Decreto n. 3.708/19).
Essas hipóteses de
responsabilidade pessoal dos gerentes elencadas no referido art. 10 do Decreto
n. 3.708/19 giravam em torno de atos que fossem abusivos lato sensu, ou
seja, atos praticados fora do exercício regular da administração.
Dentro desses atos
abusivos lato sensu, pode-se distinguir os praticados com desvio ou
abuso de poder, que se caracterizam quando o gerente, embora não agindo com
violação da lei ou do contração social, e praticando ato formalmente
inquestionável, extrapola a finalidade dos poderes de administração
conferidos pela lei, ferindo seu espírito, representando um ato frei legis
e não contra legem.
Por outro lado, também na
categoria de atos abusivos lato sensu, distinguem-se os praticados com
excesso de poder, em que o gerente não exerce com moderação as prerrogativas
que lhe são atribuídas pela lei ou pelo contrato social, fazendo-o contrariamente
ao interesse da sociedade, de seus sócios ou de terceiros. Trata-se de um ato contra
legem. Nesses casos incluem-se, v.g., os chamados ultra vires, ou
seja, praticados fora do objeto social.
O art. 11 do Decreto n.
3.708/19 completava a disposição do art. 10, impondo aos gerentes a
responsabilidade pessoal pelas perdas e danos provocados à sociedade ou a
terceiros por atos praticados com uso indevido ou desvio da firma social, sem
prejuízo da eventual responsabilidade criminal cabível. Esses atos acabavam
correspondendo às mesmas hipóteses de abuso ou excesso de poder referidos.
E o art. 14 do Decreto n.
3.708/19 exonerava o gerente de responsabilidade pelos atos por ele praticados
pessoalmente, sem fazer uso da firma social, se fossem contraídos em benefício
da sociedade e dentro dos limites dos poderes de gerência. Esses eram
considerados atos da sociedade, cabendo a pessoa jurídica a respectiva
responsabilidade.
Nos termos do art. 10 do
Decreto n. 3.708/19, os sócios não respondiam pessoalmente pelas obrigações
contraídas em nome da sociedade, mas eram responsáveis “para com esta e para
com terceiros, solidária e ilimitadamente pelo excesso de mandato e pelos atos
praticados com violação do contrato ou da lei”. Estando fixada a solidariedade
do gerente com a sociedade, impossível não concluir que esta ficava obrigada
perante terceiros pelos atos por este praticados com violação do contrato
social, dentre os quais se encontravam os atos ultra vires, já que estes
importam necessariamente em violação do contrato social.
Com efeito, tais atos,
estado fora, estado fora do âmbito de abrangência do objeto social e
representado operações não compreendidas nos negócios para os quais a sociedade
foi constituída, representavam infração ao contrato social, devendo a sociedade
por eles responder solidariamente com o gerente perante os terceiros (art. 10).
Os atos do gerente
praticados fora do objeto social obrigavam a sociedade, que não podia opor ao
terceiro qualquer exceção contra sua eficácia. Porém, se a sociedade viesse a
satisfazer a obrigação assumida para com o terceiro, ou indenizá-lo pelas
perdas e danos decorrentes do ato do gerente, teria contra este ação de
regresso, em razão da solidariedade fixada pelo art. 10 do Decreto n. 3.708/19.
Igual tratamento
mereciam, na vigência do diploma de 1919, os atos praticados pelos gerentes
que, embora estando dentro do objeto social, excediam os limites ou restrições
fixados pelo contrato social a seus poderes, e que, portanto, importavam em
violação do contrato social, pela qual respondiam solidariamente a sociedade e
o gerente (art. 10 do Decreto n. 3.708/19).
Embora a jurisprudência
não fosse pacifica a respeito, o entendimento decorrente do texto do art. 10 do
Decreto n. 3.708/19, que impunha a solidariedade entre o gerente e a sociedade
nos casos ali previstos, é o de que prevalecia o princípio da aparência,
sendo inoponível a terceiros quaisquer restrições do contrato social aos
poderes do gerente. Essas restrições prevaleciam apenas nas relações entre o
gerente e a sociedade, mas não entre a sociedade e os terceiros. Ficava a
sociedade responsável perante estes por quaisquer atos do gerente que violassem
o contrato social.
Da responsabilidade da
sociedade pelos atos ultra vires e pelos atos praticados com violação
dos poderes do administrador no contrato social – Os administradores são
responsáveis perante a sociedade pelos atos por eles praticados com violação da
lei ou do contrato social, ou mesmo por aqueles atos que, mesmo não implicando
tais violações, representem abuso de poder ou desvio de finalidade em prejuízo
da sociedade, de seus sócios ou de terceiros. Cabe analisar, ainda, em que
medida a sociedade pode ser compelida a responder por tais atos dos
administradores.
A solução dada pelo
Decreto n. 3.708/19 para os atos ultra vires e os praticados com
violação às restrições de poderes do administrador contidas no contrato social
era a de responsabilizar não apenas os administradores, mas também a sociedade
por esses atos, por força da disposição expressa do art. 10 do diploma de 1919,
muito embora houvesse alguma divergência doutrinária e jurisprudencial a
respeito.
A solução do Decreto n.
3.708/19, no entanto, não era a mesma da Lei de Sociedades Anônimas (Lei n.
6.404/76), que não contém disposição expressa sobre a responsabilidade da
sociedade pelos atos praticados pelo administrador com violação do objeto
social ou dos poderes a ele concedidos pelo estatuto.
Sob a égide da Lei n.
6.404/76 se poderia entender, em princípio, que os atos ultra vires ou
os praticados com violação das restrições de poderes contidas no contrato
social não obrigariam a sociedade. Isso porque o administrador somente atuaria
como órgão da sociedade quando agisse dentro dos limites da atividade para a
qual a sociedade foi constituída, representados pelo objeto social, e dentro
das limitações de poderes que lhe são impostas pelo estatuto social. Ademais,
tendo em vista o regime de publicação oficial (CC 289) e de publicidade, que é
representado pelo arquivamento no Registro do Comércio do estatuto social e
respectivas alterações, bem como das atas de assembleias gerais e reuniões do
conselho de administração de natureza relevante, existiria a presunção de
conhecimento pelos terceiros dessas restrições estatutárias.
Este rígido entendimento,
no entanto, não prevalece, tendo sido abrandado pela doutrina e pela
jurisprudência com a construção da teoria da aparência, com vistas à
proteção do terceiro de boa fé, pela qual se proíbe à companhia alegar a ineficácia
dos atos de seus administradores perante terceiros quando se verificar que, a
despeito das restrições estatutárias dos poderes do administrador, não é
razoável supor, à vista das circunstâncias, que o terceiros (de boa fé)
verifique antes os atos societários da companhia para só então confiar em sua
representação pelo administrador. Ademais, levava-se em conta a própria atitude
da sociedade com relação a seu administrador, que pode, em certas
circunstâncias, levar o terceiro de boa fé a crer na existência dos poderes de
representação deste último.
O CC 1.015, parágrafo
único, traz regra até então inexistente em nosso ordenamento jurídico, que
define os casos em que se podem considerar ineficazes perante a sociedade os
atos praticados pelo administrador em seu nome se: (i) o ato resultar de
infração à limitação de poderes do administrador que se encontrar devidamente
inscrita ou averbada no Registro do Comércio; (ii) o terceiro tinha, por
qualquer meio, conhecimento de que o administrador agia com excesso de poderes;
ou, ainda, (iii) a operação resultante do ato do administrador era
evidentemente estranha ao objeto social.
Nessas hipóteses o
terceiro prejudicado teria apenas ação de reparação pelos danos sofridos contra
o administrador (CC 1.016) que se desviou de sua conduta, não havendo, em
princípio, responsabilidade da sociedade. Cumpre ressaltar que o referido CC
1.015, parágrafo único, aplica-se não apenas às sociedades limitadas que tenham
optado pela regência supletiva das regras das sociedades simples, mas também,
por analogia, às que forem regidas supletivamente pela Lei das Sociedades
Anônimas. Isto porque essa lei não contém nenhum dispositivo a respeito, sendo
o Código Civil, nesse ponto, supletivo à própria Lei de Sociedades Anônimas (CC
1.089) e, por via indireta, também aplicável às sociedades limitadas regidas
subsidiariamente pela Lei do Anonimato.
Cabe, então, analisar em
que termos a sociedade limitada pode desobrigar-se pelos atos praticados por
seus administradores com excesso de poderes. Para que possam ser considerados
ineficazes perante a sociedade os atos praticados com excesso de poderes por
seus administradores nas hipóteses trazidas pelo CC 1.015, parágrafo único, é
necessária a configuração de uma das situações ali admitidas, não sendo
necessário o concurso de mais de uma delas para que se tome o ato do
administrador como ineficaz perante a sociedade.
Em regra, o CC 1.015,
parágrafo único, deve se aplicado. Porém, tendo em vista a proteção dos
terceiros de boa fé que contratam com a sociedade, e com fundamento na teoria
da aparência, cabe à jurisprudência interpretar essa regra para que não se
cometam graves injustiças contra terceiros de boa fé.
Com efeito, o apego ao
texto literal do CC 1.015 levaria, em muitos casos, a uma situação de extrema
injustiça material, impondo-se ao terceiro de boa-fé que contrata com a
sociedade, em qualquer situação, o ônus de, antes de firmar qualquer
compromisso, vir a certificar-se da averbação dos atos societários no registro
competente, o que não parece razoável em toda e qualquer circunstância.
A solução para a justa
interpretação do dispositivo parece estar na compatibilização do parágrafo
único do CC 1.015 com a regra geral do CC 422, que impõe aos contratos o princípio
da boa-fé. Trata-se, aqui, da boa fé objetiva, entendida como um dever de
conduta leal na conclusão do contrato, que pode impor ou então dispensar o
terceiro que contrata com a sociedade, em vista das circunstâncias concretas da
contratação, a prudência ou não de analisar previamente seus atos
constitutivos, suas alterações e respectivo registro, para só então contratar
com a sociedade.
Dessa forma, pelo princípio
da boa-fé objetiva (CC 422), não se pode exigir do terceiro o dever de
certificar-se acerca dos poderes conferidos aos administradores no contrato
social e o respectivo registro quando se tratar de atos ordinários de gestão da
sociedade, especialmente nos atos celebrados em massa, ou nos de adesão, ou
mesmo nos negócios singulares praticados no recinto de seus estabelecimentos
empresariais dentro da rotina da administração e da atividade empresarial da
sociedade. Protege-se, dessa forma, a boa-fé subjetiva do terceiro, ou seja,
seu estado de ignorância, tolerado pelo direito em benefício da segurança
jurídica dos negócios celebrados pela empresa, não obstante a falta de poderes
do administrador para a prática do ato em questão. Em tais hipóteses, portanto,
deve prevalecer a teoria da aparência.
Já naqueles atos de
administração extraordinária, presume-se que o terceiro que contrata com a
sociedade terá a diligência e a cautela necessárias, certificando-se da
existência dos poderes contratuais de representação do administrador. Ademais,
presume-se a cautela do terceiro quando este, em razão de sua profissão ou
organização empresarial, deva ter conhecimento dos limites dos poderes de
representação do administrador. Neste último caso, ainda que se trate de ato de
gestão ordinária, o terceiro profissional ou empresa dedicada à prática dos
negócios em questão não pode arguir boa fé subjetiva para impor a eficácia de
ato à sociedade. Resulta, nesses casos, que a sociedade não responde pelos atos
do administrador praticados com excesso ou desvio de poder. (Antônio Junqueira de
Azevedo e Modesto de S Barros Carvalhosa, encontrado no books.google.com.br,
livro Comentários
ao código civil v. 13, art. 1.064, acessado em 29.06.2020, corrigido e aplicadas
as devidas atualizações VD).
Art.
1.065. Ao término de cada exercício social, proceder-se-á à
elaboração do inventário, do balanço patrimonial e do balanço de resultado
econômico.
No ritmo de Marcelo Fortes Barbosa Filho, o exercício da administração precisa
ser transparente, conferindo-se credibilidade e segurança acerca da lisura dos
negócios celebrados e das práticas adotadas. Atendendo a tal necessidade, para
padronizar e regrar a prestação de contas da gestão social, algumas
demonstrações contábeis específicas tornaram-se obrigatórias, impondo, no
âmbito das sociedades limitadas, o dever dos administradores de promover sua
elaboração e viabilizar sua consulta. Dentre os principais direitos inerentes à
qualidade de sócio estão incluídos o de fiscalizar e o de avaliar a gestão, não
apenas considerados atos isolados, mas, também, tendo em conta o conjunto das
operações realizadas, o que só se concretiza, de maneira mais eficaz, com a
análise dos documentos enfocados. Há de ser elaborado, em primeiro lugar, um
inventário de todo o ativo, o que engloba tanto os bens de uso permanente
quanto aqueles destinados à transformação ou comercialização, compondo uma
enumeração consolidada com a avaliação de cada um de seus itens. É preciso, em
segundo lugar, como for reproduzido pelo CC 1.179, compor um balanço
patrimonial, expondo, considerada a data da apuração feita, a situação
patrimonial completa da pessoa jurídica, quantificados e discriminados, em
categorias contábeis, o ativo e o passivo, incluindo todos os créditos e todas
as dívidas existentes. Em terceiro lugar, exige-se a formulação de um balanço
de resultado econômico, a que corresponde um demonstrativo de lucros e
prejuízos auferidos no correr do exercício, instrumento essencial para que seja
possível deliberar sobre a destinação de tais valores, que, respeitado o
disposto no contrato social, deve ser endereçado, formando ou extinguindo
reservas e distribuindo ganhos ou perdas. A apresentação de tais demonstrações
contábeis ocorre sempre ao final de cada exercício social, tal como demarcado
pelo contrato inscrito, podendo, ou não, haver coincidência com o exercício
fiscal. Quando os administradores deixarem de promover a elaboração das
demonstrações assinaladas, restará configurada uma falta grave, passível de
responsabilização. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n.
10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e
atual., p. 1053. Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 29/06/2020. Revista e
atualizada nesta data por VD).
Historicamente, nenhuma
alteração foi promovida no enunciado desta norma na tramitação do projeto no
Congresso Nacional. O Decreto n. 3.708/19 nada dispunha sobre a contabilidade e
a elaboração do balanço patrimonial na sociedade limitada, obrigações estas que
eram reguladas pelos atos 10 a 14 do Código comercial de 1850.
Finalizando o capítulo,
Ricardo Fiuza em sua doutrina, constitui princípio fundamental do direito
societário que os administradores devem prestar contas dos atos da
administração em particular no que tange aos resultados anuais da sociedade
para conhecimento aos demais sócios. Assim, essa norma expressamente prevê a
obrigatoriedade de levantamento do balanço patrimonial no encerramento de cada
exercício anual, devendo ser realizado o inventário físico dos bens do ativo da
sociedade e a elaboração das contas de resultado econômico, representadas pelas
demonstrações financeiras do respectivo exercício. Os CC 1.179 a 1.195
estabelecem as normas gerais de contabilidade e escrituração aplicáveis às
sociedades empresárias. (Direito Civil -
doutrina, Ricardo
Fiuza – p. 554, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012,
pdf, Microsoft Word. Acesso em 29/06/2020,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Na interpretação dos
autores Antônio
Junqueira de Azevedo e Modesto de S Barros Carvalhosa, o Decreto n. 3.708/19
não continha regras sobre a prestação de contas dos sócios-gerentes. Embora
fosse silente a lei a respeito, diante do princípio geral de que todo aquele
que administra bens de terceiro deve prestar contas da sua administração,
sempre se entendeu indispensável essa prestação de contas nas limitadas, para
que todos os sócios fossem informados da forma pela qual foi gerido o capital
por eles investido, da situação do patrimônio da sociedade, bem como da
evolução dos resultados obtidos pela administração em determinado período da
atividade social. Assim, cabia ao contrato social da sociedade limitada
determinar a forma, o modo e o tempo da prestação de conta dos sócios-gerentes.
O
revogado Código Comercial de 1850, em seu art. 293, determinava que os sócios
administradores das sociedades comerciais eram obrigados a prestar contas
justificadas da sua administração a outros sócios, mas não dispunha sobre a
forma como deveriam ser prestadas essas contas. A Lei das Sociedades Anônimas
(Lei n. 6.404/76), por seu turno, trouxe regramento detalhado sobre as contas
que os administradores eram obrigados a elaborar e submeter à aprovação dos
acionistas, regulando a matéria em seus arts. 176 a 188, e determinou que
anualmente, nos quatro primeiros meses após o término do exercício social, a
assembleia geral ordinária dos acionistas se reunisse para apreciar as contas
dos administradores (art. 132, I e II), as quais deveriam ser postas à
disposição dos acionistas na sede da companhia (juntamente com o relatório da
administração sobre os negócios sociais e os principais fatos administrativos
do exercício findo, o parecer do conselho fiscal incluindo votos dissidentes,
se houvesse), mediante a publicação de avisos, na forma do art. 124, com um mês
de antecedência da assembleia geral (art. 133).
Tendo
sido a Lei de Sociedades Anônimas supletiva do revogado Decreto n. 3.708/19,
aplicavam-se às sociedades limitadas as referidas regras acerca da elaboração e
aprovação das contas dos administradores pelos sócios, com as adaptações
necessárias em razão do tipo societário e do porte da empresa, admitindo-se que
o contrato social dispusesse de forma diversa.
Da
prestação de contas dos administradores das sociedades limitadas no Código
Civil de 2002 – O imperativo do presente artigo destina-se, obviamente, à
administração. É ela a responsável pela elaboração das contas de inventario,
balanço patrimonial e balanço de resultado econômico que devem ser prestadas ao
final de cada exercício social aos sócios da sociedade limitada.
O
Código civil de 2002, nesse ponto, inova, com relação ao decreto de 1919, ao
trazer, no capítulo concernente às sociedades limitadas, dispositivo expresso
acerca da obrigação dos administradores de prestar contas dos seus atos ao
término de cada exercício social. E inova, ainda, ao trazer regramento próprio
acerca da escrituração das sociedades em geral, aplicável também às limitadas,
pretendendo, com isso, sobrepor-se às disposições da Lei de Sociedades
Anônimas, as quais, na ausência de disciplina específica sobre a matéria,
aplicavam-se, por analogia, a todas as demais sociedades comerciais.
Essa
inovação, no entanto, representa na verdade grande retrocesso na matéria
referente à elaboração das contas da sociedade. Isso porque, devido ao longo
processo legislativo a que se sujeitou o Código Civil de 2002, a redação aos
seus CC 1.179 a 1.195 encontra-se já defasada, espelhando a mesma terminologia
empregada pela Lei de Sociedades Anônimas anterior à Lei n. 6.404/76
(Decreto-Lei n. 2.627/40). Ademais, o regramento trazido pelo Código Civil de
2002 não é tão completo quanto o da Lei n. 6.404/76, faltando-lhe uma série de
minúcias já fartamente dispostas na Lei do Anonimato. Um exemplo claro é o
tratamento da forma de elaboração do balanço patrimonial e do balanço de
resultado econômico ou demonstração de lucros e perdas (CC 1.188, parágrafo
único, e CC 1.189), que no diploma de 2002 são legados à lei especial,
olvidando-se a regulação já existente na Lei das Sociedades Anônimas.
Da
prestação de contas anuais à assembleia geral ou reunião de quotistas (CC
1.078) – A administração da sociedade elaborará as contas do balanço
patrimonial (CC 1.188), balanço de resultado econômico (CC 1.189) e o
inventário do ativo e do passivo social (CC 1.187), devendo submetê-las à
aprovação da assembleia geral ou reunião de quotistas (CC 1.071, I) dentro do
período de quatro meses que sucede ao término de cada exercício social (CC
1.078)
O
conceito de exercício social está intimamente ligado à ideia de prestação de
contas e de distribuição de resultados. De fato, de uma forma simples
poderíamos dizer que é no término do exercício social que se reúnem os sócios
para saber quais os resultados dos negócios realizados durante o período então
findo, examinar a prestação de contas dos administradores e deliberar sobre a
quantia que cada um pode retirar a título de lucro. (Antônio Junqueira de
Azevedo e Modesto de S Barros Carvalhosa, encontrado no books.google.com.br,
livro Comentários
ao código civil v. 13, art. 1.065, acessado em 29.06.2020, corrigido e aplicadas
as devidas atualizações VD).
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