terça-feira, 1 de dezembro de 2020

Direito Civil Comentado - 1.368-B Da Propriedade Fiduciária – (Incluído pela Lei n. 13.043, de 2014). VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado - 1.368-B

Da Propriedade Fiduciária – VARGAS, Paulo S. R.

- Parte Especial –  Livro IIITítulo III – Capítulo IX – Da Propriedade Fiduciária - (Art. 1.361 a 1.368-A,B,C,D,E) digitadorvargas@outlook.com

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Art. 1.368-B. A alienação fiduciária em garantia de bem móvel ou imóvel confere direito real de aquisição ao fiduciante, seu cessionário ou sucessor. (Incluído pela Lei n. 13.043, de 2014).

Parágrafo único. O credor fiduciário que se tornar proprietário pleno do bem, por efeito de realização da garantia, mediante consolidação da propriedade, adjudicação, dação ou outra forma pela qual lhe tenha sido transmitida a propriedade plena, passa a responder pelo pagamento dos tributos sobre a propriedade e a posse, taxas, despesas condominiais e quaisquer outros encargos, tributários ou não, incidentes sobre o objeto da garantia, a partir da data em que vier a ser imitido na posse direta do bem. (Incluído pela Lei n. 13.043, de 2014).

Segundo ensaio publicado por Éder Rodrigues de Souza, em novembro de 2017, no site  colegioregistralrs.org.br., intitulado “A alienação fiduciária de bens imóveis”, a natureza da garantia fiduciária sobe bens imóveis e do contrato que lhe serve de veículo tem como foco a análise da alienação fiduciária de bem imóvel e a  sua  conceituação  como  um  verdadeiro  veículo  de  constituição  do  direito  real  de garantia,    consistente    na    propriedade    fiduciária. Por    meio    de    um estudo jurisprudencial  e  doutrinário,  desde  a  definição  da  propriedade  plena  e  suas características,  passando  pela  propriedade  resolúvel  e,  por  fim,  pelo  contrato  de alienação   fiduciária,   são   abordados   temas   de   extrema   relevância   para   a compreensão deste que é um instituto de grande utilização no meio negocial. Ainda com  base  na  leitura  da  Lei  9514/97,  mais  especificamente  do  seu  art.  38,  sem  se distanciar,  é  claro,  da  interpretação  sistêmica  e  condizente  com  o  ordenamento jurídico   nacional,   procura-se   responder   importante questionamento   sobre   a necessidade  ou  desnecessidade  da  lavratura  de  escritura  pública  para  fins  de alienação fiduciária de bens imóveis.

O  ingresso  e  a  confecção  de  contratos de alienação fiduciária  de bens imóveis  são  recorrentes  na  atividade  notarial  e  registral,  notadamente  aqueles intermediados por instituições financeiras. Destinam-se, em regra, à consecução de contratos  de  mútuo,  daí  a  sua  natureza  acessória.  Nessa  relação  de  direito  real, o devedor fiduciante detém o direito de reivindicar a propriedade após o adimplemento de  uma  dívida  contratada  com  o  credor  fiduciário que,  por  sua  vez,  detém  a propriedade resolúvel daquele bem. Não há se negar a natureza obrigacional do contrato de alienação fiduciária, que se traduz no veículo que concede suporte formal à constituição da propriedade fiduciária,  essa  sim  um  direito  real.  Assim,  é  importante  ressaltar  a  natureza obrigacional decorrente da celebração de tal contrato e a natureza real do direito de garantia constituído com o seu registro.

Para se entender o referido contrato e o direito real em questão é necessário que  se  tenha em  mente  as  características  que  diferenciam  a  propriedade  plena  da propriedade resolúvel sobre bens imóveis, essa última como aquela resultante de um contrato de alienação fiduciária. Segundo o Código Civil de 2002, em seu CC 1.225, inciso I, a propriedade é um direito real e, por conseguinte, a propriedade resolúvel também  o  é. A  diferença  essencial  entre  ambas  está no fato  de  que  a  propriedade resolúvel,  vista  sob  o  enfoque  do  contrato  de  alienação  fiduciária, tem  como finalidade  a  garantia  de  uma  dívida contraída  pelo  devedor  fiduciante  frente  ao credor fiduciário. 

O  estudo intenta, mais especificamente, verificar a necessidade ou não da celebração do contrato por meio de escritura pública, conforme o disposto no art.  38  da  Lei  9514/97  e o  CC  108. O  direito  real  de propriedade  vem  expresso  no  CC  1.225,  inciso  I, e é tido como o direito real por excelência, pois é aquele mais amplo da pessoa em relação à coisa (VENOSA, 2012).E isso se dá em virtude de nele se materializarem todas as características inerentes aos direitos reais, ou seja, de sua titularidade decorrem as faculdades de usar, gozar, dispor e reivindicar. Cabe dizer que tais faculdades também se  encontram presentes nos demais direitos  reais,  mas não  em  sua  totalidade,  pois  sempre  lhes  faltarão uma  ou  outra. Ou seja, no usufruto estarão presentes as faculdades de usar, gozar e reivindicar a coisa de quem a injustamente possua ou detenha, mas não terá o usufrutuário a sua disponibilidade.  Da  mesma  forma,  aquele  que  tenha  o  direito  de  uso,  para  o  qual faltará a faculdade de gozo e a faculdade de dispor. E assim, acontece com cada um dos direitos reais, em maior ou menor grau. Entende-se a faculdade de usar como “colocar a coisa a serviço do seu titular sem  alterar-lhe a substância” (VENOSA,  P.  170,  2012).  Assim,  poderá  o  titular  do direito  real  servir-se  da  coisa,  direta  ou  indiretamente,  de  acordo  com  a  sua natureza. O exemplo clássico é do proprietário de um imóvel que o habita ou permite que terceiro o faça, como no caso da locação ou do comodato. Gozar  ou  fruir se  materializa  pela  percepção  dos  frutos  advindos  do  bem, sejam  naturais  ou  civis.  Por  meio  dessa  faculdade,  o  usufrutuário,  por  exemplo,  é  detentor do direito de receber os aluguéis por ventura advindos da locação do imóvel objeto  do  usufruto;  ou  o  titular  do  direito  de  superfície  em  relação  ao  produto  da plantação que se tenha sobre o terreno. Dispor, como assinala Venosa (P. 170, 2012), é o poder mais abrangente, pois aquele  que  o  detém,  pode também  usar  e  gozar.  Ter  o  poder  de  dispor  do  bem  é poder  aliená-lo  ou  mesmo  gravá-lo.  É  inerente  ao  proprietário,  pois,  diferente  das demais faculdades, essa se relaciona apenas com este e não com o usufrutuário, o promissário comprador etc. Direito  de reivindicar  é  uma  das  outras  faculdades  dos  direitos  reais.  Em virtude   dessa   faculdade,   poderá   o   titular   do   direito   real   valer-se   da   ação reivindicatória  perante  aquele  que  possua  ou  detenha  injustamente  a  coisa.  É importante  destacar  que  não  é  uma  faculdade  exclusiva  do  direito  de  propriedade, como  entendem  alguns  autores,  mas  inerente  a  todos  os  direitos  reais,  ainda  que sejam esses direitos reais limitados. 

Recurso   Especial.   Ação   Petitória.   Ação   reivindicatória. Usufruto. Direito Real Limitado. Usufrutuário. Legitimidade   e   Interesse.   1.   Cuida-se   que   ação   denominada "petitória-reivindicatória" proposta por usufrutuário, na qual busca garantir o seu direito de usufruto vitalício sobre o imóvel. 2. Cinge-se a controvérsia a definir   se   o   usufrutuário   tem   legitimidade/interesse   para   propor   ação petitória/reivindicatória para fazer prevalecer o seu direito de usufruto sobre o  bem.  3.  O  usufrutuário na  condição  de  possuidor  direto  do  bem pode valer-se   das   ações   possessórias   contra   o   possuidor   indireto   (nuproprietário) e - na condição de titular de um direito real limitado (usufruto) - também  tem  legitimidade/interesse  para  a  propositura  de  ações  de  caráter petitório,  tal  como  a  reivindicatória,  contra  o  nuproprietário  ou  contra terceiros. 4. Recurso especial provido. RECURSO  ESPECIAL  Nº  1.202.843 - PR  (2010/0137288-9);  RELATOR  : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA (BRASIL, 2014).

Enfim,  ao se  afirmar que  no  direito  de  propriedade  estão  consubstanciadas todas essas faculdades, pode se concluir, com reservas, que este é um direito real absoluto.   Diz-se   com   reservas   porque   o   é   dentro   dos   limites   impostos   pelo ordenamento.  Assim,  o  caráter  amplo  e  abrangente  do  direito  de  propriedade  no concernente   às   faculdades   encontra   limites   no   próprio   conjunto   de   normas positivadas, sejam elas infraconstitucionais ou advindas da própria constituição. São  exemplos  de  normas  limitadoras  do  direito  de  propriedade  aquelas relativas à sua função social, como o artigo 186 da Constituição Federal de 1988, in verbis: “Art.  186.  A  função  social  é  cumprida  quando  a  propriedade  rural  atende, simultaneamente, segundo critérios e  graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos: I -aproveitamento racional e adequado; II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; III - observância  das  disposições  que  regulam  as  relações  de  trabalho; (BRASIL, 1988).

Pode-se  citar,  também, como  norma  limitadora  ao  direito  de  propriedade o CC 1.299, que assim prescreve: “Art.  1.229.  A  propriedade  do  solo  abrange  a  do  espaço  aéreo  e  subsolo  correspondentes,  em  altura  e  profundidade  úteis  ao  seu  exercício,  não podendo  o  proprietário  opor-se  a  atividades  que  sejam  realizadas,  por terceiros,  a  uma  altura  ou  profundidade  tais, que  não  tenha  ele  interesse legítimo em impedi-las. (BRASIL, 2002).

Apesar de limitarem o exercício da propriedade, tais normas não tiram o seu caráter absoluto, pois não se trata aqui do absolutismo puro e simples de um direito, o que não seria algo suportável no Estado Democrático de Direito. Não há de se tolerar na  sociedade  um  direito  descurado  dos  demais,  alheio  àqueles com  que  se relaciona,  direta  ou  indiretamente,  o  seu  titular,  sejam  eles  da  titularidade  de particulares ou mesmo do próprio Estado. Nesse sentido, Farias e Rosenvald: [...] o absolutismo dos direitos reais não decorre do Poder ilimitado de seus titulares  sobre  os  bens  que  se  submetem  a  sua  autoridade.    muito,  a ciência  do  direito  relativizou  a  sacralidade  da  propriedade.  Como  qualquer outro   direito   fundamental   o   ordenamento   jurídico   a   submete   a   uma ponderação  de  valores,  eis  que  em  um  Estado  Democrático  de  Direito marcado  pela  pluralidade,  não    espaço  para  dogmas.  (ROSENVALD,  P. 2, 2010).

São atributos do   direito   de   propriedade   a   sua perpetuidade   e   a   sua elasticidade.  É  perpétuo “...no sentido de que não pode simplesmente se extinguir pelo não uso.” (VENOSA,  P.  172,  2012).  Já a  sua  elasticidade  é  notada  quando  a propriedade,  até  então  vinculada  a  direitos  reais  limitados,  como  o  usufruto  ou  o penhor, por exemplo, se desvincula destes. Num primeiro momento seu âmbito está restrito e, ao se livrar dessas limitações, volta a ser plena. Pela impossibilidade de se estabelecer um direito real onde outro da mesma natureza    esteja  presente,  tem-se  o  atributo  da  exclusividade  (ROSENVALD,  P. 193,  2010).  Cristiano  Chaves  de  Farias e  Nelson  Rosenvald  ensinam  que  a exclusividade  está  presente  ainda  que  haja  uma  pluralidade  de  sujeitos,  como no condomínio  tradicional.  Os  consagrados  juristas  o  fazem com  base  na  distinção entre  o  direito  subjetivo  de  propriedade,  consubstanciado  essencialmente  pela relação entre o seu titular e a coletividade, e o domínio, que se traduz nos poderes que  ele  exerce  sobre  a  coisa.  Assim,  ainda  que  haja  mais  de  um  sujeito,  por possuírem apenas cotas abstratas, tornam-se donos de uma cota parte e do todo ao

mesmo tempo (ROSENVALD, P. 193, 2010). Dessa forma, entende-se que o atributo da exclusividade não é mitigado pela pluralidade  de  titulares  do  direito  de  propriedade  sobre  determinado  bem,  uma  vez que a unidade do domínio não é afastada.

A propriedade resolúvel como visto, uma das características é a sua perpetuidade. É perpétua porque se estende no tempo, sem limitações sofridas pelo comportamento passivo  do  seu  titular.  Quando  se  perde  o  bem  pela  usucapião,  destaca-se pelo comportamento  positivo  do  possuidor  usucapiente  e  não  pela  passividade  do proprietário. Entretanto, o seu caráter perpétuo é mitigado com a previsão em nosso ordenamento jurídico da propriedade resolúvel, prevista nos CC 1.359 e 1.360 do Código Civil de 2002.

Art.  1.359.  Resolvida  a  propriedade  pelo  implemento  da  condição  ou  pelo advento   do   termo,   entendem-se   também   resolvidos   os   direitos   reais concedidos  na  sua  pendência,  e o  proprietário,  em  cujo  favor  se  opera  a resolução, pode reivindicar a coisa do poder de quem a possua ou detenha. 

Art.  1.360.  Se  a  propriedade  se  resolver  por  outra  causa  superveniente,  o possuidor,  que  a  tiver  adquirido  por  título  anterior  à  sua  resolução,  será considerado  proprietário  perfeito,  restando  à  pessoa,  em  cujo  benefício houve  a  resolução,  ação  contra  aquele  cuja  propriedade  se  resolveu  para haver a própria coisa ou o seu valor. (BRASIL, 2002).

Conforme os ensinamentos de Sílvio de Salvo Venosa, o titular sabe, ou deve saber, que de algum modo a propriedade pode se resolver, ou seja, pode findar-se.  E  tal  resolução  se  dará  com  o  implemento  de  condição  ou  advento  de  termo (VENOSA, P. 395, 2002), o que deve estar expressamente previsto no contrato. O CC 121 define condição como “a cláusula que, derivando  exclusivamente  da  vontade  das  partes,  subordina  o  efeito  do  negócio jurídico a evento futuro e incerto.” (BRASIL, 2002). Dessa forma, tem-se a condição como a conjugação de um fato futuro e a sua incerteza,  além  da  sua  derivação  exclusiva  da  vontade  das  partes. É  importante, para  a  compreensão  da  propriedade  resolúvel,  que  se  diferencie  a  condição suspensiva da condição resolutiva. A primeira, como o próprio nome diz, suspende o exercício  de  determinado  direito  até  o  seu  implemento.    a  segunda,  na  qual  se funda  a  propriedade  resolúvel,  tem  como  efeito  a  cessação  do  direito  após  o implemento da condição, ou seja, a aquisição do direito se dá de plano e cessa com a ocorrência da condição. Sílvio de Salvo Venosa assim discorre sobre essa última espécie: No caso de condição resolutiva, dá-se de plano, desde logo, a aquisição do direito.  A  aquisição  é  inversa  à  condição  suspensiva.  O  implemento da condição resolutiva “resolve” o direito em questão, isto é, faz cessar seus efeitos,  extingue-se.  A  obrigação  é  desde  logo  exigível,  mas  o  implemento restitui  as  partes  ao  estado  anterior.  A  retroatividade  das  condições  é  aqui mais  patente  porque  o  direito  sob  condição  resolutiva  é  limitado,  podendo-se até dizer, ainda que impropriamente, mas para melhor compreensão, que se trata de um direito “temporário”. Com o implemento, apagam-se os traços

do direito. A cláusula resolutiva, por ser limitação ao direito, deve constar do Registro Público porque, se assim não for, terceiros não serão obrigados a respeitá-la,   não   sendo   atingidos,   de   qualquer   forma,   os   atos   de administração. (VENOSA, P. 510, 2015). Já  o  termo  consiste  na  fixação  da  eficácia  do  negócio jurídico  no  tempo.  No termo,  o  evento,  assim  como  na  condição,  é  futuro,  porém,  é  certo.  Venosa  faz  a distinção  entre  condição  e  termo,  demonstrando,  no  entanto,  que  guardam  estrita relação: Na  condição,  tem-se  em mira  evento  futuro  e  incerto;  no  termo,  considera-se evento futuro e certo. Tanto que, na condição, o implemento desta pode falhar  e  o  direito  nunca  vir  a  se  consubstanciar;  o  termo  é  inexorável  e sempre  ocorrerá.  No  termo,  o  direito  é  futuro,  mas  diferido,  porque  não impede  a  sua  aquisição,  cuja eficácia  é  apenas  suspensa.  (VENOSA,  P. 517, 2015).

Na propriedade sujeita a condição ou termo têm-se as figuras do proprietário atual  e  do  proprietário  diferido.  O  primeiro  exerce  a  propriedade  atual  da  coisa, enquanto o segundo tem um direito eventual sobre ele, sob condição ou termo. Assim,  com  o  implemento  do  termo  ou  a  condição  tal  como  pactuados,  a propriedade  se  resolverá,  desaparecerá  como  se  jamais  houvesse  existido.  Com isso, a propriedade retornará àquele que a transmitiu, o proprietário diferido. Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald fazem, ainda, uma distinção entre  a  propriedade  resolúvel  e  a  propriedade  ad  tempus (ROSENVALD,  P.  371,

2010). Nessa  última não    uma  previsão  contratual  quanto à  eficácia  do  negócio jurídico;   há,   na verdade,   uma   causa   superveniente,   que   não   resulta   em retroatividade,  ou  seja,  a  propriedade  não  retorna  ao  status  quo  ante.  Assim, permanecem  válidos  os  atos  praticados  pelo  proprietário  antes  da  extinção  da propriedade. A  propriedade ad  tempus surge  nas transmissões  gratuitas  e  pode-se  citar como exemplo a revogação da doação por ingratidão do donatário.

A propriedade fiduciária sobre bem imóvel é  espécie  de  propriedade  resolúvel  e,  portanto,  está adstrita  a  uma  condição futura  à  perda  de sua  eficácia.  Insere-se  no  rol  de  direitos reais  constantes do CC  1.225 e  se  presta  à  garantia  do adimplemento de uma dívida, pressupondo a existência de um credor fiduciário e um devedor fiduciante. Importante ressaltar  que  mesmo  antes  das  alterações  trazidas  pela  Lei 13.043/2014, não  restava  dúvidas  quanto à natureza  real  da  propriedade fiduciária, apesar de estar ela alocada de forma implícita no inc. I do CC 1.225:  “Art. 1.225. São direitos reais: I - a propriedade;...”. Apesar da taxatividade, que  afirma serem de  natureza  real somente  aqueles direitos  que  a lei assim defina, sendo   vedado   às   partes   convencionar   a   transformação   de   direitos   de naturezas  diversas  em  direitos  reais,  como espécie  de  propriedade,  não havia que se negar à  propriedade fiduciária o  seu  caráter  real, ainda  que  constasse  de forma implícita no inciso I retro citado. De  toda  forma,  o  CC  1.368-B  fulminou  qualquer

margem de dúvida  quanto  à  natureza  real  da  propriedade  fiduciária ao afirmar textualmente  que “A  alienação  fiduciária  em  garantia  de  bem  móvel  ou  imóvel confere direito real de aquisição ao fiduciante, seu cessionário ou sucessor. (Incluído pela  Lei    13.043,  de  2014)”. Com  a  inclusão  desse  artigo,  temos  uma  bipartição dos efeitos da alienação fiduciária, pois de um lado tem-se o direito real de garantia conferido  ao  credor  fiduciário  e  de  outro  o  direito  real  de  aquisição  do  devedor fiduciante. É a  propriedade  fiduciária,  portanto,  um  direito  real  de  garantia  que  se materializa pela transferência da propriedade ao credor fiduciário, o que a difere da hipoteca,  do  penhor  ou  da  anticrese,  outras  modalidades  de  direitos  reais  de garantia previstos no Código Civil. Os bens que sirvam a uma dessas hipóteses de garantia  permanecem  na  propriedade  do  devedor,  ao  passo  que  na  propriedade fiduciária,  que  se    com  a  alienação  fiduciária,  transfere-se ao  devedor  a  sua titularidade.  Trata-se  de  uma  propriedade  resolúvel,  condicionada  a  sua  eficácia  a um  evento  futuro,  ou  seja,  ao  adimplemento  da  obrigação  contraída  pelo  devedor fiduciante.  Quitada  a dívida,  a  propriedade  se  resolverá,  retornando  o  bem  à situação jurídica anterior à alienação fiduciária. Com  o  seu  registro,    o  desdobramento  da  posse.  Ao  credor fiduciário é atribuída  a  posse  indireta  da  coisa,  enquanto  ao  devedor fiduciante é  atribuída  a posse direta. O   desdobramento   (bipartição)   da   posse   é   consequente   ao   fato   da transferência da propriedade fiduciária do bem ao credor, eis que a coisa se conserva no poder imediato do devedor fiduciante (art. 1.361, § 2º, do CC), podendo  usar  e  gozar  o  bem,  segundo  a  sua  destinação,  mas  às  suas expensas   e   seus   riscos,   responsabilizando-se   por   eventual   perda, destruição ou deterioração do objeto, na qualidade de depositário (CC 1.363). O credor fiduciário adquire a posse indireta da coisa, sendo limitada a  sua  propriedade,  posto  que  duas  das  mais  importantes  faculdades dominiais sobejaram concentradas com o devedor fiduciante, quais sejam: o uso e a fruição. (FARIAS, ROSENVALD, P. 384, 2010). A transferência da propriedade do devedor fiduciante ao credor fiduciário, por óbvio, é temporária, uma vez que o seu intuito não é a transmissão em si, mas tão somente  a  garantia  de  que  irá  adimplir  com  a  dívida  contratada.  Dessa  forma, apesar  de  o  devedor  fiduciante  se  ver  despido  de  sua  titularidade  sobre  a  coisa, também não a tem de forma plena o credor fiduciário. 

Adriano Stanley tece algumas considerações sobre o caráter resolúvel da propriedade fiduciária. Quando  um  devedor  transfere  ao  credor  a  propriedade  de  um  bem  de  seu patrimônio  em  garantia  de  um  débito,  não  o  faz  com  o  intuito  de  não  mais reaver  esta  propriedade.  Pelo  contrário.  Se  o  devedor  deixa  a  propriedade de um bem seu em garantia ao credor, aquele devedor confia que, uma vez paga a sua dívida, o credor lhe devolverá esta propriedade (daí o nome de propriedade fiduciária: propriedade entrega em fidúcia; confiança). Assim, a esta   propriedade   que   é   transmitida   temporariamente   ao   credor,   para garantir  o  adimplemento  da  obrigação  dá-se  o  nome  de propriedade resolúvel.  Exatamente  porque,  adimplida  a  obrigação  pelo  devedor  ao credor,  não  existe  mais  razão  alguma  para  que  este  continue  com  a propriedade  da  coisa,  devendo  restituí-la.  Ela  se  resolve,  pois.  (STANLEY,

P. 222, 2015). A despeito do citado CC 1.368-B que prevê que ao devedor restará o direito de aquisição sobre o bem, o respeitado autor sustenta que a propriedade não deixa de ser de sua titularidade. E segue o raciocínio ao afirmar que, da mesma forma que o  credor  fiduciário, o  devedor  fiduciante exerce  a  propriedade,  apesar  de  suas faculdades se manterem suspensas. E termina por definir a propriedade conferida a esse   último   como propriedade   superveniente   em contraponto   à   propriedade

resolúvel da qual é titular o credor fiduciário. (STANLEY, P. 222, 2015). (Éder Rodrigues de Souza, publicado em novembro de 2017, no site  colegioregistralrs.org.br., intitulado “A alienação fiduciária de bens imóveis”,  acessado em 01.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Seguindo a linha de raciocínio de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, em função de tal modificação, o credor fiduciante passou a ter direito real de aquisição da coisa dada em garantia – alienação fiduciária – podendo, desta maneira, tornar-se ser seu titular pleno, passando a responder, a partir de sua emissão na posse direta do bem, pelas denominadas obrigações propter rem, ou seja, aquelas incidentes diretamente sobre o bem, tais como taxas condominiais e demais tributos específicos. Destarte, embora o CC 1.225 aponte os direitos reais de forma exaustiva (numerus clausus), a lei poderá vir a enuncia-los expressamente, como se cuida do presente caso, passando a somar-se ao rol daqueles ali já existentes. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com acesso em 01.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão do Eminente Professor André Lopes Cavalcante, em verdadeira aula publicada em 17 de novembro de 2014 no site dizerodireito.com.br., têm-se as “Alterações da Lei 13.043/2014 no Regime da Alienação Fiduciária”. Dispõe sobre os fundos de índice de renda fixa, sobre a responsabilidade tributária na integralização de cotas de fundos ou clubes de investimento por meio da entrega de ativos financeiros, sobre a tributação das operações de empréstimos de ativos financeiros e sobre a isenção de imposto sobre a renda na alienação de ações de empresas pequenas e médias; prorroga o prazo de que trata a Lei n.° 12.431, de 24 de junho de 2011; altera as Leis n.° 10.179, de 6 de fevereiro de 2001, 12.431, de 24 de junho de 2011, 9.718, de 27 de novembro de 1998, 10.637, de 30 de dezembro de 2002, 10.833, de 29 de dezembro de 2003, 12.996, de 18 de junho de 2014, 11.941, de 27 de maio de 2009, 12.249, de 11 de junho de 2010, 10.522, de 19 de julho de 2002, 12.546, de 14 de dezembro de 2011, 11.774, de 17 de setembro de 2008, 12.350, de 20 de dezembro de 2010, 9.430, de 27 de dezembro de 1996, 11.977, de 7 de julho de 2009, 12.409, de 25 de maio de 2011, 5.895, de 19 de junho de 1973, 11.948, de 16 de junho de 2009, 12.380, de 10 de janeiro de 2011, 12.087, de 11 de novembro de 2009, 12.712, de 30 de agosto de 2012, 12.096, de 24 de novembro de 2009, 11.079, de 30 de dezembro de 2004, 11.488, de 15 de junho de 2007, 6.830, de 22 de setembro de 1980, 9.532, de 10 de dezembro de 1997, 11.196, de 21 de novembro de 2005, 10.147, de 21 de dezembro de 2000, 12.860, de 11 de setembro de 2013, 9.393, de 19 de dezembro de 1996, 9.250, de 26 de dezembro de 1995, 12.598, de 21 de março de 2012, 12.715, de 17 de setembro de 2012, 11.371, de 28 de novembro de 2006, 9.481, de 13 de agosto de 1997, 12.688, de 18 de julho de 2012, 12.101, de 27 de novembro de 2009, 11.438, de 29 de dezembro de 2006, 11.478, de 29 de maio de 2007, 12.973, de 13 de maio de 2014, 11.033, de 21 de dezembro de 2004, 9.782, de 26 de janeiro de 1999, 11.972, de 6 de julho de 2009, 5.991, de 17 de dezembro de 1973, 10.406, de 10 de janeiro de 2002, 9.514, de 20 de novembro de 1997, 11.775, de 17 de setembro de 2008, 10.150, de 21 de dezembro de 2000, e 10.865, de 30 de abril de 2004, e o Decreto-Lei n.° 911, de 1º de outubro de 1969; revoga dispositivos do Decreto-Lei n.° 1.569, de 8 de agosto de 1977, das Leis n° 5.010, de 30 de maio de 1966, e 8.666, de 21 de junho de 1993, da Medida Provisória n.° 2.158-35, de 24 de agosto de 2001, e do Decreto-Lei n.° 1.598, de 26 de dezembro de 1977; e dá outras providências.


Como visto acima, a Lei n.° 13.043/2014 tratou sobre diversos assuntos. Neste post será analisado apenas a alteração promovida pela nova Lei no regime da ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. Para que fique melhor de entender o que mudou, começa-se explicando em que consiste a alienação fiduciária, suas espécies, seu procedimento e, assim, quando chegar-se nas partes alteradas será destacado para o leitor.

“A alienação fiduciária em garantia é um contrato instrumental em que uma das partes, em confiança, aliena a outra a propriedade de um determinado bem, ficando esta parte (uma instituição financeira, em regra) obrigada a devolver àquela o bem que lhe foi alienado quando verificada a ocorrência de determinado fato.” (RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Direito Empresarial Esquematizado. São Paulo: Método, 2012, p. 565).

O Código Civil de 2002 trata de forma genérica sobre a propriedade fiduciária em seus arts. 1.361 a 1.368-B. Existem, no entanto, leis específicas que também regem o tema: a) alienação fiduciária envolvendo bens imóveis: Lei nº 9.514/97; b) alienação fiduciária de bens móveis no âmbito do mercado financeiro e de capitais: Lei nº 4.728/65 e Decreto-Lei nº 911/69. É o caso, por exemplo, de um automóvel comprado por meio de financiamento bancário com garantia de alienação fiduciária.

Nas hipóteses em que houver legislação específica, as regras do CC-2002 aplicam-se apenas de forma subsidiária:

Art. 1.368-A. As demais espécies de propriedade fiduciária ou de titularidade fiduciária submetem-se à disciplina específica das respectivas leis especiais, somente se aplicando as disposições deste Código naquilo que não for incompatível com a legislação especial.

 Resumindo:

Alienação fiduciária de bens MÓVEIS fungíveis e infungíveis quando o credor fiduciário for instituição financeira

Alienação fiduciária de bens MÓVEIS infungíveis quando o credor fiduciário for pessoa natural ou jurídica (sem ser banco)

 

 

Alienação fiduciária de bens IMÓVEIS

 

Lei nº 4.728/65

Decreto-Lei nº 911/69

 

 

Código Civil de 2002

(arts. 1.361 a 1.368-B)

 

 

   Lei nº 9.514/97

Alienação Fiduciária de Bens Móveis no Âmbito do Mercado Financeiro e de Capitais (DL 911/69). Imagine-se a seguinte situação hipotética: Antônio quer comprar um carro de R$ 30.000,00, mas somente possui R$ 10.000,00. Antônio procura o Banco “X”, que celebra com ele contrato de financiamento com garantia de alienação fiduciária.

Assim, o Banco “X” empresta R$ 20.000,00 a Antônio, que compra o veículo. Como garantia do pagamento do empréstimo, a propriedade resolúvel do carro ficará com o Banco “X” e a posse direta com Antônio.

Em outras palavras, Antônio ficará andando com o carro, mas no documento, a propriedade do automóvel é do Banco “X” (constará “alienado fiduciariamente ao Banco X”). Diz-se que o banco tem a propriedade resolúvel porque, uma vez pago o empréstimo, a propriedade do carro pelo banco “resolve-se” (acaba) e o automóvel passa a pertencer a Antônio. 

Havendo mora por parte do mutuário, o procedimento será o seguinte (regulado pelo DL 911/69): No contrato de alienação fiduciária, a mora decorre do simples vencimento do prazo para pagamento, mas a lei exige que o credor (mutuante) demonstre a ocorrência desse atraso notificando o devedor. Assim, o credor deverá fazer a notificação extrajudicial do devedor de que este se encontra em débito, comprovando, assim, a mora. Essa notificação é indispensável para que o credor possa ajuizar ação de busca e apreensão. Confira:

Súmula 72 do STJ: A comprovação da mora é imprescindível à busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente.

A notificação ao devedor é feita por meio de carta registrada com aviso de recebimento. Logo, não precisa ser realizada por intermédio do Cartório de RTD. Esa foi uma das mudanças operadas pela Lei nº 13.043/2014 no § 2º do DL 911/69. O objetivo da alteração foi o de reduzir o custo da notificação, permitindo que seja feita por mera emissão de carta via Correios, evitando assim que a instituição financeira tenha que pagar os emolumentos para os titulares de Cartórios. Também não precisa, o AR, ser assinado pelo próprio destinatário. Apesar de não estar expressamente prevista no DL 911/59, a jurisprudência do STJ já entendia que a notificação não precisava ser pessoal, bastando que fosse entregue no endereço do devedor.

Para o ajuizamento da ação, após comprovar a mora, o mutuante (Banco “X”) poderá ingressar com uma ação de busca e apreensão requerendo que lhe seja entregue o bem (art. 3º do DL 911/69). Essa busca e apreensão prevista no DL 911/69 é uma ação especial autônoma e independente de qualquer procedimento posterior.

O juiz fará uma concessão da liminar, i.é, concederá a busca e apreensão de forma liminar (sem ouvir o devedor), desde que comprovada a mora ou o inadimplemento do devedor (art. 3º do DL 911/69). A Lei 13.043/2014 alterou o caput do art. 3º do DL 911/69, deixando expressamente previsto que a concessão liminar da busca e apreensão pode ocorrer no plantão judiciário. 

Apesar de a nova redação do art. 3º utilizar a expressão “podendo ser apreciada”, o que poderia indicar uma faculdade do juiz, a leitura mais adequada do dispositivo é a de que, estando presentes os requisitos legais, o magistrado tem o poder-dever de apreciar e conceder a liminar.

Inserção de restrições sobre o veículo: Se o bem objeto da alienação fiduciária for um veículo, caso seja concedida a liminar na busca e apreensão, uma medida de grande eficácia para conseguir localizar e recuperar o bem é inserir uma restrição judicial no “registro” do veículo.

Pensando nisso, a Lei n.° 13.043/2014 acrescentou o § 9º ao art. 3º do DL 911/69 estipulando que o juiz, ao decretar a busca e apreensão de veículo, deverá inserir uma restrição judicial na base de dados do RENAVAM. 

RENAVAM significa Registro Nacional de Veículos Automotores e consiste em um banco de dados que funciona como um registro de todos os veículos existentes no Brasil. Cada veículo recebe um número identificador que é chamado de “código RENAVAM” e lá são registradas todas as informações sobre a “vida” do automóvel, desde o momento da sua fabricação ou importação, passando pelo emplacamento, mudanças de proprietário, alterações em sua cor e características, até o instante em que o veículo sai de circulação.

O Poder Judiciário mantém convênio com o DENATRAN por meio do qual os magistrados possuem acesso ao sistema informatizado do RENAVAM. Assim, o juiz pode digitar seu login e sua senha, entrar na página interna do RENAVAM e inserir restrições judiciais incidentes sobre os veículos objeto do processo. Assim, quando o carro for parado em uma blitz ou for realizar uma inspeção de rotina no DETRAN, aparecerá aquela informação no sistema e o veículo será apreendido e entregue à Justiça.

Dessa forma, quando o juiz decreta a busca e apreensão, ele próprio, com sua senha, deverá inserir diretamente a restrição judicial no RENAVAM. Caso ele não tenha acesso à base de dados, deverá expedir um ofício ao DETRAN para que: I – Registre o gravame referente à decretação da busca e apreensão do veículo; e II – retire o gravame após a apreensão do veículo. (§§ 9º e 10 do art. 3º do DL 011/69, acrescentados pela Lei n. 13.043/2014).

Da apreensão do Bem: Caso o bem seja localizado em comarca diferente da qual onde está tramitando a ação (v.g., o processo tramita em Belo Horizonte e o carro foi encontrado em Lavras), a parte interessada poderá requerer diretamente ao juízo dessa comarca pedindo a apreensão do veículo, bastando que em tal requerimento conste a cópia da petição inicial da ação e, quando for o caso, a cópia do despacho que concedeu a busca e apreensão do veículo (§ 12 do art. 3º do DL 911/69, acrescentado pela Lei n. 13.043/2014). A apreensão do veículo será imediatamente comunicada ao juízo, que intimará a instituição financeira para retirá-lo do local depositado no prazo máximo de 48 horas (§ 13 do art. 3º do DL 911/69, acrescentado pela Lei n. 13.043/2014). O devedor, por ocasião do cumprimento do mandado de busca e apreensão, deverá entregar o bem e seus respectivos documentos (§ 14 do art. 3º do DL 911/69, acrescentado pela Lei n. 13.043/2014). 

Da possibilidade de pagamento integral da dívida: No prazo de 5 dias após o cumprimento da liminar (apreensão do bem), o devedor fiduciante poderá pagar a integralidade da dívida pendente, segundo os valores apresentados pelo credor fiduciário na inicial, hipótese na qual o bem lhe será restituído livre do ônus (§ 2º do art. 3º do DL 911/69). Veja o dispositivo legal:

Art. 3º (...)

 

§ 1º Cinco dias após executada a liminar mencionada no caput, consolidar-se-ão a propriedade e a posse plena e exclusiva do bem no patrimônio do credor fiduciário, cabendo às repartições competentes, quando for o caso, expedir novo certificado de registro de propriedade em nome do credor, ou de terceiro por ele indicado, livre do ônus da propriedade fiduciária. (Redação dada pela Lei 10.931/2004).

 

§ 2º No prazo do § 1º, o devedor fiduciante poderá pagar a integralidade da dívida pendente, segundo os valores apresentados pelo credor fiduciário na inicial, hipótese na qual o bem lhe será restituído livre do ônus. (Redação dada pela Lei 10.931/2004)

 

 

Do que se entende por “integralidade da dívida pendente”: Para que o devedor tenha de volta o bem, ele deverá pagar todo o valor do financiamento, v.g., Antônio financiou o veículo em 60 parcelas. A partir da 20ª prestação ele começou a não mais pagar. Estão vencidas 5 parcelas.

Para ter de volta o bem ele terá que pagar todo o financiamento restante (40 parcelas). Todo o débito.

Segundo decidiu o STJ, a Lei n.° 10.931/2004, que alterou o DL 911/69, não mais faculta ao devedor a possibilidade de purgação de mora, ou seja, não mais permite que ele pague somente as prestações vencidas.

Para que o devedor fiduciante consiga ter o bem de volta, ele terá que pagar a integralidade da dívida, ou seja, tanto as parcelas vencidas quanto as vincendas (mais os encargos), no prazo de 5 dias após a execução da liminar. No exemplo, Antônio terá que pagar, em 5 dias, as 40 parcelas restantes.

O devedor purga a mora quando ele oferece ao devedor as prestações que estão vencidas e mais o valor dos prejuízos que este sofreu (art. 401, I, do CC). Nesse caso, purgando a mora, o devedor consegue evitar as consequências do inadimplemento. Ocorre que na alienação fiduciária em garantia, a Lei n.° 10.931/2004 passou a não mais permitir a purgação da mora. 

Vale ressaltar que o tema acima foi decidido em sede de recurso repetitivo, tendo o STJ firmado a seguinte conclusão, que será aplicada em todos os processos semelhantes:


Nos contratos firmados na vigência da Lei n.° 10.931/2004, que alterou o art. 3º, §§ 1º e 2º, do Decreto-lei 911/1969, compete ao devedor, no prazo de cinco dias após a execução da liminar na ação de busca e apreensão, pagar a integralidade da dívida – entendida esta como os valores apresentados e comprovados pelo credor na inicial –, sob pena de consolidação da propriedade do bem móvel objeto de alienação fiduciária. STJ. 2ª Seção. REsp 1.418.593-MS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 14/5/2014 (recurso repetitivo).

 


Antes da Lei n.° 10.931/2004 era permitida a purgação da mora, desde que o devedor já tivesse pago no mínimo 40% do valor financiado. Tal entendimento estava, inclusive, consagrado em um enunciado do STJ:

Súmula 284-STJ: A purga da mora, nos contratos de alienação fiduciária, só é permitida quando já pagos pelo menos 40% (quarenta por cento) do valor financiado.

A súmula 284-STJ ainda é válida - Para contratos anteriores à Lei 10.931/2004: SIM. Para contratos posteriores à Lei 10.931/2004: NÃO. 

Da Contestação: No prazo de 15 dias após o cumprimento da liminar (apreensão do bem), o devedor fiduciante apresentará resposta (uma espécie de contestação). 

Obs. 1: a resposta poderá ser apresentada ainda que o devedor tenha decidido pagar a integralidade da dívida, caso entenda ter havido pagamento a maior e deseje a restituição.

Obs. 2: nesta defesa apresentada pelo devedor, é possível que ele invoque a ilegalidade das cláusulas contratuais (ex: juros remuneratórios abusivos). Se ficar provado que o contrato era abusivo, isso justificaria o inadimplemento e descaracterizaria a mora.

Da venda do Bem: Se houve o inadimplemento ou mora e o bem foi apreendido, o credor (proprietário fiduciário) poderá vender a coisa a terceiros, independentemente de leilão, hasta pública, avaliação prévia ou qualquer outra medida judicial ou extrajudicial, salvo disposição expressa em contrário prevista no contrato (art. 2º do DL 911/69). O preço da venda, i. é, o valor apurado com a alienação, deverá ser utilizado para pagar os débitos do devedor para com o credor e também para custear as despesas decorrentes da cobrança dessa dívida. Se após o pagamento da dívida ainda sobrar dinheiro esse saldo apurado deverá ser entregue ao devedor.

Alienação fiduciária em garantia de bem móvel ou imóvel confere direito real de aquisição ao fiduciante, seu cessionário ou sucessor (CC 1.368-B, inserido pela Lei n. 13.043/2014. O credor fiduciário que e tornar proprietário pleno do bem, por efeito de realização da garantia, mediante consolidação da propriedade, adjudicação, dação ou outra forma pela qual lhe tenha sido transmitida a propriedade plena, passa a responder pelo pagamento dos tributos sobre a propriedade e a posse, taxas, despesas condominiais e quaisquer outros encargos, tributário ou não, incidentes sobre o bem objeto da garantia, a partir da data em que vier a ser imitido na posse direta do bem (parágrafo único do CC 1.368-B inserido pela Lei n. 13.043/2014). Da alienação fiduciária de bens imóveis:

Art. 26 (...), § 4º Quando o fiduciante, ou seu cessionário, ou seu representante legal ou procurador encontrar-se em local ignorado, incerto ou inacessível, o fato será certificado pelo serventuário encarregado da diligência e informado ao oficial de Registro de Imóveis, que, à vista da certidão, promoverá a intimação por edital publicado durante 3 (três) dias, pelo menos, em um dos jornais de maior circulação local ou noutro de comarca de fácil acesso, se no local não houver imprensa diária, contado o prazo para purgação da mora da data da última publicação do edital. (André Lopes Cavalcante, em verdadeira aula publicada em 17 de novembro de 2014 no site dizerodireito.com.br., têm-se as “Alterações da Lei 13.043 de 14 de novembro de 2014, no Regime da Alienação Fiduciária”, acessado em 01.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

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