Direito Civil Comentado - 1.375,
1.376, 1.377
Da Superfície (Da extinção de
concessão) – VARGAS, Paulo S. R.
- Parte Especial – Livro III – Título IV – Da Superfície (Art. 1.369 a 1.377) - digitadorvargas@outlook.com - vargasdigitador.blogpot.com
Art. 1.375. Extinta a concessão, o proprietário passará a ter a propriedade plena sobre o terreno, construção ou plantação, independentemente de indenização, se as partes não houverem estipulado o contrário.
Como já visto e agora comprovado no comentário de Francisco Eduardo Loureiro, o art.. 24 do Estatuto da Cidade contém preceito de conteúdo semelhante, embora com redação superior. No escrutínio ao CC 1.369, foi apontado que o direito real de superfície suspende o princípio da acessão, pelo qual o dono do solo fica pertencendo tudo o que nele adere e não pode ser retirado sem fratura (superfícies solo cedit). Extinta a superfície, por qualquer das causas previstas no artigo antecedente, inclusive as não explicitadas pelo legislador, incide novamente o princípio da acessão com toda a sua força. A propriedade plena se consolida nas mãos do concedente, e construções e plantações tornam a ser acessões, incorporando-se ao solo e seguindo sua titularidade e seu regime jurídico. Decorre daí o dever do superficiário de não somente construir e plantar, mas também de conservar, para restituir a acessão em bom estado ao concedente.
Não se aplica ao caso o regime da acessão inversa, prevista no CC 1.255, parágrafo único, já comentado, pois o superficiário, por força de disposição contratual, tem inequívoca ciência de que constrói ou planta em terreno alheio e do termo final de seu direito real, bem como do correlato dever de restituição da coisa ao concedente. A quebra do dever de restituição enseja ao concedente o direito de reaver a coisa por via possessória ou petitória, invocando o ius possessionis ou o ius possidendi. A posse do superficiário, que era direta e justa, com a quebra do dever de devolução se torna injusta, porque precária, configurando esbulho. Conta daí o prazo de ano e dia previsto no art. 558 do CPC, para que obtenha o concedente liminar na ação de reintegração de posse.
Reza o artigo em exame que as construções e plantações se incorporam de forma jurídica ao solo independentemente de indenização, se as partes não houverem estipulado o contrário. A regra é dispositiva e tem aplicação em caráter supletivo, no silêncio da convenção. Na omissão do contrato, não faz o superficiário jus à indenização por construções ou plantações que erigiu. A regra, porém, comporta temperamento. Caso se prove - e o ônus cabe ao superficiário - que, apesar da omissão das partes, a perda das acessões sem direito à indenização não integrava o sinalagma do contrato, prevalecem os princípios de ordem pública do equilíbrio contratual, boa-fé objetiva e função social do contrato, devendo ser calculada indenização, para evitar o enriquecimento sem causa do concedente.
Caso seja estipulado o direito à indenização, ou decorra este dos princípios imperativos anteriormente referidos, restam ainda algumas questões relevantes a serem examinadas. A primeira delas é o valor da indenização, a ser calculado, no silêncio do título, usando, por analogia, os critérios do CC 1.222, já comentado. Se a acessão foi construída ou plantada de boa-fé, em razão da previsão contratual, indeniza-se por seu valor atual, contemporâneo o tempo do pagamento. Arca o concedente com o ônus da depreciação da acessão, mas tem a seu favor a vantagem de eventual valorização, em comparação com o investimento feito. Caso, porém, a acessão esteja em desacordo com o previsto no título, a regra é distinta. Por força do que dispõe a parte final do CC 1.255, o superficiário perde para o concedente as acessões, sem direito a indenização. Mais uma vez, a regra é temperada por boa-fé objetiva e vedação do enriquecimento sem causa, portanto pequenas diferenças, que não afetem a utilidade da coisa ou o interesse do concedente, não podem acarretar sanção desproporcional ao inadimplemento. A segunda questão é a da incidência de eventual direito de retenção do superficiário, até que lhe seja paga a indenização. Desde que as construções e plantação tenham sido feitas de boa-fé, e normalmente o serão, em razão da previsão contratual, aplica-se por analogia a regra do CC 1.219. Remete-se o leitor ao quanto se disse no comentário ao CC 1.255, que aqui se aplica. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.430-31. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 07/12/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).
João Vitor Cainelli Bortoluzzo, publicado em outubro de 2015, no site Jus.com.br, “Comentários acerca do direito de superfície no ordenamento jurídico brasileiro”, diz que em relação à extinção do direito de superfície, previu o Código Civil atual duas possibilidades de ocorrência, quais sejam, a promovida antes do termo final, quando o superficiário der ao terreno destinação diversa daquela para que foi concedida, bem como a consolidada em consequência de uma possível desapropriação. Neste ponto, cumpre-se destacar que, caso a extinção ocorra em virtude da primeira possibilidade estabelecida pelo Código, de acordo com o CC 1.375, o proprietário passará a ter a propriedade plena sobre o terreno, construção ou plantação, independentemente de indenização, se as partes não houverem estipulado o contrário. De outro tanto, caso a extinção se consolide em virtude da segunda hipótese prevista no código, conforme disposto no CC 1.376, a indenização caberá ao proprietário e ao superficiário, no valor correspondente ao direito real de cada um. (João Vitor Cainelli Bortoluzzo, fez publicar em outubro de 2015, no site Jus.com.br, “Comentários acerca do direito de superfície no ordenamento jurídico brasileiro” acessado em 07.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Historicamente assim era a redação original do dispositivo contido no corpo do projeto: “Extinta a superfície, o proprietário passará a ter o domínio pleno sobre o terreno, construção ou plantação, independentemente de indenização, se as partes não houverem estipulado o contrário”. O Relator-Geral no Senado, Senador Josaphat Marinho, por meio da Emenda n. 152, modificou sua roupagem passando a apresentar a composição atual. Naquela ocasião, apresentou o Senador a justificativa de que convém não empregar linguagem geradora de confusão, sobretudo no corpo de lei. No caso, em verdade, o que se extingue não é a superfície, e sim a relação jurídica que sobre ela incide. Tanto que, no CC 1.369, o projeto alude à “concessão da superfície”, gratuita ou onerosa. A emenda, pois, além de impedir equívoco, uniformizou a linguagem do projeto, como registrou o relator Ricardo Fiuza, ao acatá-la, apostando em sua Doutrina que tudo o que o superficiário vier a incorporar ao solo, via de regra, passará a pertencer ao proprietário concedente, sem qualquer ônus, após a extinção da concessão, i.é, independentemente de indenização. A inversão dessa regra dependerá sempre de cláusula expressa. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 705, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 07/12/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Nos apontamentos de Eduardo Sócrates Castanheira
Sarmento filho, conta, “Do Direito de Superfície
na Legislação Brasileira”, que o direito de superfície se extingue nas
seguintes hipóteses: a) término do prazo; b) perecimento do solo; c) dar
destinação diversa da contratada; d) desapropriação; e) distrato f) renúncia g)
pela reunião na mesma pessoa da qualidade de fundiário e de superficiário. A
extinção não gera direito de indenização para o superficiário para cobrir os
gastos tidos com a construção ou plantação, salvo estipulação em contrário, na
forma do CC 1375.
J. Miguel Lobato
Gómez considera não ser possível o pacto que atribua a construção ao
superficiário, findo o prazo de vigência do contrato: “Apesar de todas
estas razoáveis considerações, parece mais ajustado ao direito pensar , como
faz intuitivamente a maioria dos autores que se ocupam do tema, que o pacto em
contrário a que aludem estas normas se refere à indenização em favor do
superficiário e não à reversão do edificado. (posição do legislador espanhol no
artigo 289, 3 do Tr de 1992). Não vê, todavia, nenhum inconveniente, seja de
ordem econômica, seja de natureza técnica, para que isto não possa ser
contratado, sendo, por vezes, necessário para a consecução de resultados
sociais a que se presta a utilização do direito superficiário, como no exemplo
citado no capítulo referente ao alcance prático do instituto.
Quanto ao aspecto registral, há sistemas registrais, como o
alemão e o suíço, que adotam a solução de considerar o direito de superfície
quase que um imóvel distinto, abrindo-se matrícula para essa nova forma de
propriedade. Ao término do contrato essa matrícula autônoma seria encerrada,
voltando-se a utilizar aquela originalmente aberta. Apesar de advogar essa ideia,
Frederico Viegas, reconhece que, diante da legislação em vigor, não se pode
imaginar um fólio registral autônomo para o direito de superfície.
Como direito real que é, a superfície será constituída pelo
registro na matrícula do imóvel que irá abrigar esse novo direito. Por outro
lado, no momento da extinção do direito, bastará fazer uma averbação dando
conta desse fato, como se verifica da simples leitura dos artigos 1369 do
Código Civil, artigo 24, 2º, EC , 167, I, 39 e 167, II, 20, da LRP.
(Eduardo Sócrates Castanheira Sarmento filho, conta, “Do Direito de Superfície na Legislação Brasileira”,
publicado no site irib.org.br, Instituto de
Registro Imobiliário do Brasil, acessado em 07.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas
atualizações VD).
Art. 1.376. No caso de extinção do direito de
superfície em consequência de desapropriação, a indenização cabe ao
proprietário e ao superficiário, no valor correspondente ao direito de cada um.
Segundo entendimento de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a
desapropriação extingue o direito de superfície e, tendo em vista a transmissão
de direitos inerentes à propriedade ao superficiário, a este também caberá
indenização, que corresponderá ao valor do seu direito real.
Enunciado 322 do Conselho da Justiça Federal: “O
momento da desapropriação e as condições da concessão superficiária serão
considerados para fins da divisão do montante indenizatório (CC 1.376),
constituindo-se litisconsórcio passivo necessário simples entre proprietário e
superficiário”. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acessado
em 07.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
No preceito de Francisco Eduardo Loureiro, o artigo tem dupla incidência. Primeiro, diz que a desapropriação, como modo originário de aquisição da propriedade, leva à extinção do direito real de superfície, que não sobrevive com o expropriante. Segundo, confirma o direito real de superfície ter valor patrimonial, e, por isso, a indenização paga pelo expropriante pela aquisição compulsória do domínio pleno deve ser rateada proporcionalmente entre concedente e superficiário, na medida do direito de cada um sobre o imóvel. Esse rateio leva em conta o prazo restante do direito real de superfície, assim como eventual solarium pago pelo superficiário e o montante do investimento por ele feito, bem como a previsão de indenização quando da extinção do direito real. Todos esses elementos servem para modular o valor da superfície e do direito do concedente. Aliás, ainda que não existisse o dispositivo, seria ele aplicável, em razão da incidência do preceito constitucional da justa indenização e para evitar o enriquecimento sem causa do concedente em desfavor do superficiário. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.432. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 07/12/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).
Em dissertação apresentada à Escola Politécnica da USP, para obtenção do Título de Mestre em engenharia, Yuko Akiyama, São Paulo, 2006, publicado no site teses.usp.br, 27/11/2006, intitulada “Valor do direito de superfície: Orientação para construção dos contratos de concessão”, o autor aponta às pp 80 em diante, que as variáveis estruturais são aquelas geradas no ambiente do próprio empreendimento, tais como operação e administração das atividades do empreendimento. Portanto, o superficiário pode corrigir distorções no curso do desenvolvimento e evidentemente ele mesmo deve tomar esse tipo de risco.
O critério de cálculo de valor de indenização na eventual ocasião de resolução do contrato também deve ser explícito no contrato, para salvaguardar a qualidade econômica do negócio do superficiário. A última proposta para a introdução de mecanismo de proteção do valor do direito de superfície é a inserção de cláusula compromissória conforme disposta na Lei Nº 9.307, de 23 de setembro de 1996, comumente conhecido como Lei de Arbitragem. Apesar de todas as medidas tomadas para se evitar conflito no contrato, poderão ocorrer litígios entre as partes no curso da concessão. Caso estes ocorram, as partes poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios sobre direito, equidade e critério das partes (art. 1º e 2º de Lei 9.307/96). A cláusula compromissória é a convenção através da qual as partes em um contrato comprometem-se a submeter à arbitragem os litígios que possam vir a surgir, relativamente a tal contrato. Tal cláusula deve ser estipulada por escrito, inserta no próprio contrato ou em documento apartado que a ele se refira (art. 4º de Lei 9.307/96).
A arbitragem de composição de conflito será feita por algum órgão arbitral institucional ou entidade especializada, que devem ser estabelecidos na cláusula compromissória. Segundo Carmona (2004, p 45), a decisão final dos árbitros produzirá os mesmos efeitos da sentença estatal e essa sentença arbitral não precisa mais passar pelo controle prévio dos órgãos do Estado para receber a oficialização que lhe era outorgada pela sentença de homologação. Portanto, a solução de litígios poderá ser mais ágil, favorecendo aos interessados. Para o superficiário comprador que adquiriu o direito de superfície existente, além do valor pago para o superficiário vendedor, os custos da aquisição tais como as despesas legais e comerciais e o valor pago para o proprietário fundeiro (O pagamento para o proprietário fundeiro no momento da transferência pode ocorrer somente no caso do direito de superfície do Estatuto da Cidade) compõem seus investimentos. O aumento desses custos de formatação e implantação provoca o aumento do nível de investimentos financiamento de produção, seja com uma captação de recursos do mercado. Porém, vale salientar que nessa configuração, a devolução do principal e o pagamento de serviço de dívida podem ocorrer no ciclo operacional, e consequentemente, o nível de retornos. A programação de produção, propaganda e comercialização durante o ciclo de implantação também pode alterar a configuração da equação de fundos.
Não há limitação à finalidade referente ao direito de superfície do Código Civil de 2002, enquanto que o Estatuto da Cidade explícita seu uso como instrumento da política urbana, visando ao melhor aproveitamento do terreno urbano do ponto de vista socioeconômico. Pode-se prever que seria comum destinar o uso da superfície expressamente pela cláusula no contrato. Isso acontece porque, o proprietário fundeiro, de terrenos urbanos em especial, tem obrigação de deixar seus terrenos atenderem à sua função social. Portanto, a capacidade do superficiário de executar a implantação e operar o empreendimento durante a concessão é o ponto relevante na sua escolha como concessionário. Assim sendo, do ponto de vista do proprietário fundeiro, a concessão estaria mais protegida quando o destino do uso ou a ocupação do terreno estejam explicitados no contrato Da mesma forma, a obrigação do superficiário em executar um determinado projeto de construção pode ser incorporado ao contrato, bem como a restrição sobre a execução de reforma das construções. O prazo da concessão e a extensão do ciclo de implantação são parâmetros que impõem extensão ao ciclo operacional. Conforme analisado nesta Dissertação, o prazo da concessão deve contemplar o ciclo de implantação e o ciclo operacional visando a compatibilidade com o alcance econômico pretendido do negócio.
O Código Civil de 2002 permite apenas o prazo da concessão por tempo determinado, enquanto o Estatuto da Cidade admite a concessão por tempo indeterminado. Nesse caso, as possíveis causas de rompimento da concessão devem estar estipuladas no contrato. Porém, o prazo indeterminado da concessão abrange a dificuldade na viabilização do negócio. O valor da concessão do direito de superfície deve ser arbitrado e o pagamento da concessão pode ser feito à vista ou em parcelas. Quando de em parcelas, seu valor seria aquele equivalente, economicamente, ao valor da concessão à vista.
A finalidade do contrato restringe o tipo de uso do terreno e a estruturação do empreendimento. Tanto o Código Civil de 2002 quanto o Estatuto da Cidade dispõem sobre a alteração do uso como causa resolutiva da concessão. Os juristas compreendem que as leis não permitem a alteração unilateral da parte do superficiário. Desde que haja acordo do proprietário fundeiro, a alteração ou a modificação do uso do terreno no curso do contrato são lícitas. Também, se existir o acordo do proprietário fundeiro, alterações ou modificações do projeto ou reformas no curso do contrato podem ser consideradas como lícitas. De qualquer forma, recomenda-se inserir uma cláusula pela qual o superficiário guarda o direito de renegociação sobre essas restrições para eventuais necessidades. Porém, o mais correto seria formatar um empreendimento consistente antes de se chegar ao contrato da concessão. Na verdade, as restrições sobre as atividades e os projetos das construções são, praticamente, uma configuração do empreendimento do superficiário. A questão mais importante nesse aspecto não é a inserção da cláusula de renegociação, mas sim, a eficácia do instrumento contratual na preservação do valor do direito de superfície. Para isso, o superficiário deve seguir a rotina aqui proposta, buscando a configuração final, fundamentada através da análise, antes de se fechar o contrato.
A indenização no final da concessão pode ser considerada como sendo a contrapartida pelo repasse das construções incorporadas pelo superficiário. Consequentemente, o INDf (Índice fundiário), deve corresponder a esse valor nessa data. Porém, não há como fixar o INDf no contrato: o estado das construções entregues influencia seus valores, e antes de tudo, as construções nem existiam no momento do ato. Mesmo que se incorpore o estado das construções que devem ser entregues e também um critério de cálculo ao contrato, o estabelecimento de um critério pertinente é um ponto controvertido.
Extinta a concessão do direito de
superfície, o empreendimento baseado nesse direito passa a
pertencer, exclusivamente, ao
proprietário do terreno.
Teoricamente, o valor
das construções deve estar
relacionado à sua
contribuição na geração
da renda do empreendimento para o proprietário. Para
isso, há necessidade de arbitrar [i] a sua expectativa de geração
de renda do
empreendimento após o
final da concessão; [ii] a
fração de contribuição das
construções nessa geração
de renda e
[iii] o padrão
de remuneração pretendido para a
operação. Tecnicamente, é possível
arbitrar a geração
da renda, enxergando
um novo ciclo operacional denominado de período de
exaustão, onde o empreendimento seja capaz de gerar renda no
mesmo patamar do
ciclo operacional. Esta
renda será mantida
em padrões
homogêneos nesse novo ciclo e deverão ocorrer investimentos em reciclagem no início do período. Todavia, o problema é a arbitragem de fração da contribuição das construções nessa geração da receita. Os componentes físicos do empreendimento são as construções (inclusive os equipamentos) e o terreno. Porém, não há como se isolar a renda proveniente das construções e daquela referente ao terreno, pois a renda do empreendimento é gerada em função de interações de todos os elementos, corpóreos e incorpóreos, que participaram do empreendimento. Haveria que se considerar a contribuição dos elementos incorpóreos, tais como projeto, gerenciamento ou administração, também essenciais à geração de renda.
Entretanto, não há critério exato e universal para definir a fração de contribuição de cada um desses elementos. Por outro lado, o custo de reprodução das construções na data da extinção da concessão também não é uma referência pertinente para o cálculo do INDf, pois o custo não se vincula, obrigatoriamente, à capacidade de geração de renda do empreendimento.
Do ponto de vista econômico do superficiário, a indenização se constitui em uma parte de retornos esperados para o superficiário. Portanto, o que é importante na arbitragem do INDf é o alcance do resultado pretendido para o seu negócio. A relação entre o resultado disponível, como sendo o retorno principal e o valor da indenização no final da concessão, como sendo o complemento de retornos, é ligada com a extensão do ciclo operacional. Quando o resultado disponível produzido através da operação do empreendimento for suficiente para a recuperação da capacidade de investimentos do superficiário, não haveria a necessidade de receber a indenização economicamente. Contudo, seria difícil o proprietário fundeiro aceitar este critério econômico de cálculo de INDf, pois sua aceitação significa o compartilhamento dos riscos do negócio do superficiário. Além disso, do ponto de vista do objetivo do direito de superfície, o pagamento da indenização no final da concessão pode ser um fator desestimulante de concessão de superfície, pois o pagamento deste desfaz a vantagem econômica da parte do proprietário fundeiro que permite ao proprietário fundeiro utilizar seu terreno sem necessidade de investir seus recursos. Ou, se o proprietário reservar uma parte do pagamento recebido do superficiário durante a concessão para pagar a indenização no fim desta, na prática, o próprio superficiário está pagando a indenização, fazendo fundo de reserva na mão do proprietário fundeiro. Se for assim, não há sentido em receber a indenização no final da concessão, pois o superficiário estaria pagando um maior montante para o proprietário fundeiro durante a concessão, estendendo seu prazo de recuperação de capacidade de investimento. Assim sendo, a solução mais saudável seria estipular no contrato que, no final da concessão, o terreno seja devolvido na condição original, ou seja, vazio. Se o proprietário fundeiro prefere a devolução do terreno com as construções, o superficiário pode negociar o valor das construções referindo-se o custo de demolição. Nesse caso, o valor das construções não se constitui a indenização; é um outro negócio entre as partes. Dessa forma, para ambas as partes, o que seria mais coerente e correto é estipular o prazo da concessão adequado na forma que o superficiário possa alcançar o resultado do negócio desejado, exclusivamente através da operação do empreendimento, sem a indenização no final da concessão. Outrossim, não é recomendável a concessão do direito de superfície por tempo indeterminado, permitida pelo Estatuto da Cidade. É totalmente inviável o alcance do negócio do superficiário nessa condição no ato da concessão.
Portanto, para que o superficiário possa salvaguardar seu alcance econômico, ele deve guardar o direito de receber a indenização no final da concessão, ou seja na ocasião de rompimento da concessão. Porém, como discutido agora, não há como definir o valor no contrato, nem seria viável a aceitação da parte do proprietário fundeiro o critério de cálculo do INDf no contrato. Dessa forma, do ponto de vista econômico para o superficiário, a concessão por tempo indeterminado inviabiliza seu negócio. Assim sendo, recomenda-se que a concessão seja por tempo determinado.
A indenização no final da concessão não tem sido considerada como causa resolutiva das propriedades superficiárias nessa Dissertação. Na hipótese contrária que a admite como causa resolutiva, o descumprimento de pagamento da indenização provoca uma relação jurídica polêmica. Para tal situação, podem-se considerar as seguintes duas situações: [i] Não extinguir o direito de superfície. O superficiário continua a ser proprietário das construções e ter domínio útil do terreno; [ii] O direito de superfície se extingue. Porém, o superficiário continua a ser proprietário das construções e terá direito de retenção do terreno. Até o momento, não há jurisprudência que oriente tal situação.
Também, nessa hipótese, teoricamente, o valor do direito de superfície no final da concessão deve corresponder ao valor da indenização. Porém, mais uma vez, volta o problema técnico e econômico em arbitrar o INDf. Portanto, mesmo ao se admitir o pagamento da indenização como causa resolutiva, o tratamento prático da indenização no final da concessão não se altera, ou seja, seria correto trabalhar sem indenização no final da concessão. (Yuko Akiyama, São Paulo, 2006, publicado no site teses.usp.br, 27/11/2006, intitulada “Valor do direito de superfície: Orientação para construção dos contratos de concessão”, acessado em 07.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art. 1.377. 0 direito de superfície, constituído por pessoa jurídica de direito público interno, rege-se por este Código, no que não for diversamente disciplinado em lei especial.
Na balada de Francisco Eduardo Loureiro, o artigo tem imediata conexão com os arts. 21 a 24 da Lei n. 10.257/2001 (Estatuto da Cidade), que também disciplinam o direito de superfície. As regras do Estatuto da Cidade não foram revogadas pelo Código Civil de 2002, mas incidem apenas nos casos em que a superfície seja constituída por pessoas jurídicas de direito público interno. Há, portanto, dois regimes jurídicos distintos. Um para os casos nos quais a superfície é constituída por pessoas jurídicas de direito público interno, regulada de modo primário pelos arts. 21 a 24 do Estatuto da Cidade e de modo supletivo, no preenchimento de lacunas, pelo atual Código Civil. Outro regime jurídico para os casos nos quais a superfície é constituída entre pessoas naturais ou jurídicas de direito privado, regulada de modo primário pelo Código Civil de 2002 e de modo supletivo, no preenchimento de lacunas, pelo Estatuto da Cidade. O Centro de Estudos Jurídicos - CEJ, da Justiça Federal, que se reuniu no STJ para discutir o Código Civil de 2002, firmou o seguinte, em sua primeira jornada, realizada no ano de 2002: “ Enunciado n. 93: As normas previstas no Código Civil sobre direito de superfície não revogam as relativas a direito de superfície constantes do Estatuto da Cidade (Lei n. 10.257/2001) por ser instrumento de política de desenvolvimento urbano”.
Essa conclusão comporta temperamento. Não resta dúvida, como aponta Ricardo Pereira Lira, que “o direito de superfície contemplado no Estatuto cia Cidade é um instituto de vocação diversa daquele previsto no Código Civil de 2002, voltado aquele para as necessidades do desenvolvimento urbano, editado como categoria necessária à organização regular e equânime dos assentamentos urbanos, como fator de institucionalização da função social da cidade. No Código Civil de 2002, o direito de superfície será um instrumento destinado a atender interesses e necessidades privados” (“ O direito de superfície no novo Código Civil”. In: Revista Forense, 2003, v. 364, p. 265).
Reafirma-se a existência de duplo regime jurídico do direito de superfície, um regido pelo Código Civil, envolvendo exclusivamente direito privado, e outro pelo Estatuto da Cidade, envolvendo pessoas jurídicas de direito público interno. Ambos são direitos reais, apenas aplicáveis a situações distintas, com regras diferentes, em razão do princípio da especialidade do art. 2° da LICC. Embora haja alguma controvérsia, a superfície do Estatuto da Cidade é também direito real, porque reúne todas as suas características, apenas não havendo - porque dispensável - a utilização do termo sacramental direito real. Não tipifica direito de superfície, apesar de alguma divergência na doutrina, a concessão do direito real de uso prevista no art. 7º do Decreto-lei n. 271/67, pois não enseja a suspensão do princípio da acessão. Em tal regime jurídico, a construção, tão logo feita, incorpora-se à propriedade do dono do chão, cabendo ao usuário apenas dela extrair o proveito - usar e gozar - durante certo período. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.432-33. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 07/12/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).
Encerrando esse bloco, no juízo de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, atento ao princípio da função social da propriedade, o Código civil faculta a constituição de direito de superfície às pessoas jurídicas de direito público, além de regê-las quando não forem disciplinadas de forma diversa por lei específica. O Estatuto da Cidade ocupa-se do instituto da superfície apenas no que tange aos imóveis urbanos, considerando a legislação urbanística aplicável, conforme art. 21 da Lei 10.257/2001. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acessado em 07.12.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Como explica Fábio Salomão Lemos, em seu artigo “Uso do direito de superfície no Estatuto da Cidade e no Código
Civil”, publicado no site da Conjur.com.br, em 03 de julho de 2008, dentre outros instrumentos voltados para o alcance da Função
Social da Propriedade, o Estatuto da Cidade regulamentou pela primeira vez em
nosso ordenamento jurídico o direito de superfície, visando acima de tudo o
incentivo à utilização do solo urbano de forma a buscar a promoção da função
social da propriedade, bem como a melhoria da qualidade de vida nos grandes
centros. Nesse diapasão a
propriedade deixa de ser vista como uma prerrogativa de um direito subjetivo,
para ser analisada como relação jurídica, ou seja, o proprietário passou a ter
obrigações a cumprir para com a propriedade e os demais membros do corpo
social, e o principal deles é exatamente o uso desta.
Da forma como foi traçado no Estatuto da Cidade, o direito de superfície
permite de acordo com o artigo 21 o uso do solo, do subsolo e do espaço aéreo:
"Artigo 21. O proprietário urbano poderá conceder a outrem o direito de
superfície do seu terreno, por tempo determinado ou indeterminado, mediante
escritura pública registrada no cartório de registro de imóveis. § 1º O direito
de superfície abrange o direito de utilizar o solo, o subsolo ou o espaço aéreo
relativo ao terreno, na forma estabelecida no contrato respectivo, atendida a
legislação urbanística".
Assim sendo, está, nos moldes acima traçados, presumidamente autorizado
o uso do subsolo e do espaço aéreo. É, portanto, uma decorrência da lei. Isso
se explica facilmente em razão de o Estatuto ser voltado para a promoção de
políticas urbanas, ou seja, edificar, fazer construções na área objeto do
direito em comento. Ora, edificar é admitir, inegavelmente, tanto a utilização
do subsolo, na medida em que é neste que se fixam as fundações, ou mesmo os
andares subterrâneos; bem como, o uso do espaço aéreo, posto que o soerguimento
de obras faz uso deste.
O Código Civil, na medida em que permite sua concessão também para
imóveis rurais, teve maior amplitude quando cotejado ao Estatuto da Cidade. No
entanto, de acordo com aquele, apenas o uso do solo estaria abarcado pela
concessão de tal direito, devendo o uso do subsolo e do espaço aéreo estar
previsto ou no instrumento de concessão ou ser uma decorrência da natureza
desta. "CC 1.369. O proprietário pode conceder a outrem o direito de
construir ou de plantar em seu terreno, por tempo determinado, mediante
escritura pública devidamente registrada no Cartório de Registro de Imóveis.
Parágrafo único. O direito de superfície não autoriza obra no subsolo, salvo se
for inerente ao objeto da concessão".
Sendo o código civil uma lei posterior, teria este o condão de revogar
os dispositivos do Estatuto da Cidade, na medida em que regula a matéria de
forma distinta? Seria um caso de aplicação do artigo 2°, §1º da LICC? Parte da
doutrina afirma que sim, haja vista o posicionamento de J. Miguel Lobato Gómez
que em texto científico assim afirmou: “lex posterior anterior derogat.
Princípio este último que, uma vez promulgado o novo Código Civil, vai atuar no
sentido inverso revogando as normas especiais anteriores do Estatuto da Cidade,
que na mesma matéria, sejam incompatíveis com a lei posterior, ainda que geral.
[...] no caso de existir normas conflitantes entre ambos corpos legais, que
tenham a finalidade de regulamentar relações de Direito privado em cuja criação
intervenha a livre e espontânea vontade das partes, será aplicável preferentemente
o Código Civil, independentemente de sua utilização como direito supletivo caso
de existir lagunas na legislação urbanística.
Portanto, aplicando a mais estrita lógica jurídica e a salvo o interes
público, deve ser aceito que o Código Civil revoga as normas do EC que
sejam contrarias a seus dispositivos”. Maria Helena Diniz, por sua vez, admite
a coexistência de ambos os diplomas e assim escreve sobre o tema: “O direito de
superfície não autoriza que se faça obra em subsolo, exceto se isso for
inerente ao objeto da concessão feita (v.g, abertura de poço artesiano e
canalização de suas águas até o local das plantações) ou para atender a
legislação urbanística (Lei 10.257/2001, arts. 21 a 24)”.
Em nossa opinião maior razão assiste a este último posicionamento, de
sorte que ambos os diplomas normativos, Código Civil e Estatuto da Cidade,
permanecem em vigor. No Estatuto da Cidade o uso do subsolo e do espaço aéreo
tem conteúdo transcendental ao simples interesse do particular, posto que o
mencionado diploma foi elaborado com olhos na promoção social e no
desenvolvimento salutar do espaço urbano, e, em sendo necessário a utilização
de áreas que vão além ou aquém da superfície, o uso não poderia ser impedido
alegando-se que tal prerrogativa não havia sido estabelecida no ato de
contratação.
Esta inclusive foi a orientação adotada no Enunciado 93 da I Jornada de
Direito Civil promovida pelo Conselho da Justiça Federal: "93 — Art.
1.369: As normas previstas no Código Civil sobre direito de superfície não
revogam as relativas a direito de superfície constantes do Estatuto da Cidade
(Lei n. 10.257/2001) por ser instrumento de política de desenvolvimento
urbano". (Fábio Salomão Lemos, em seu artigo “Uso do direito de superfície no Estatuto da
Cidade e no Código Civil”, publicado no site da
Conjur.com.br, em 03 de julho de 2008. Acessado em 07/12/2020,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Finalizando o Título IV, historicamente o dispositivo em tela art. 1.377, não foi alvo de qualquer espécie de alteração, seja por parte do Senado Federal, seja por parte da Câmara dos Deputados, no período final de tramitação do projeto. A redação atual é a mesma do anteprojeto, cujo Livro III, referente ao Direito das Coisas, ficou a cargo do eminente Ebert Vianna Chamoun. Em sua Doutrina Ricardo Fiuza aponta que às pessoas jurídicas de direito público interno aplica-se quanto ao direito de superfície, no que couber, o NCC em tudo aquilo que não for disciplinado por leis especiais (v.g., Lei n. 4.504/64; Lei n. 9.636/98; Dec.-lei n. 271/67; Lei n. 4.947/66; Lei n. 8.629/93) em sede de concessão de terras públicas e respectivo direito de uso. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 706, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 07/12/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
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