quarta-feira, 3 de março de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.545, 1.546, 1.547 Das Provas do Casamento - VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.545, 1.546, 1.547

Das Provas do Casamento - VARGAS, Paulo S. R.

 -  Parte Especial –  Livro IV – Do Direito de Família –

Título I – Do Direito Pessoal – Subtítulo I – Do casamento –

Capítulo VII – Das Provas do Casamento – (Art. 1.543 a 1.547) - 

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 Art. 1.545. O casamento de pessoas que, na posse do estado de casadas, não possam manifestar vontade, ou tenham falecido, não se pode contestar em prejuízo da prole comum, salvo mediante certidão do Registro Civil que prove que já era casada alguma delas, quando contraiu o casamento impugnado.

Ao se pronunciar Milton Paulo de Carvalho Filho, assente o presente artigo tratar-se da posse do estado de casados. A posse, como sabido, é a situação de fato e, quando ela se refere à convivência de um casal como marido e mulher, exterioriza o casamento. Washington de Barros Monteiro conceitua a posse do estado de casados como a situação de duas pessoas que sempre se comportaram, privada e publicamente, como marido e mulher, que sempre se encontraram no gozo recíproco da situação de esposos; como tais se apresentaram perante a sociedade e no círculo familiar; consideram-nos todos como marido e mulher (Curso de direito civil - direito de família. São Paulo, Saraiva, 1994, v. II).

A posse do estado de casados compreende os seguintes elementos: nomem, que significa a utilização por um dos companheiros do patronímico do outro; tractatus, que consiste no tratamento recíproco de ambos como se casados fossem; e, finalmente, fama, que implica o reconhecimento geral, por parte da sociedade, da condição de cônjuges.

A posse do estado de casados é prova indireta do casamento, como afirmado em comentário ao CC 1.543. E o que o artigo visa a evitar é que o casamento provado dessa forma, cujos cônjuges faleceram, ou, se vivos, não conseguem manifestar vontade, seja contestado quando em prejuízo de prole comum. Contudo, a norma, que buscava ver cessada a discriminação nas relações de filiação (distinção entre filhos legítimos e ilegítimos), vinculando a legitimidade ao casamento, acabou por perder a finalidade, em razão da isonomia hoje existente entre os filhos, imposta tanto pela Constituição Federal (art. 227, § 6º) como decorrente do disposto nos CC 1.596 e CC 1.723. Edson Fachin assevera que, entretanto, o artigo deve ter leitura diversa, devendo ser informada, necessariamente, pelo disposto no Estatuto da Criança e do Adolescente e pela Constituição Federal, já que a proteção da prole deve atentar para o princípio do melhor interesse da criança e não se limitar ao aspecto patrimonialista (Código Civil comentado, São Paulo, Atlas, 2003, v. XV). 

A presunção de casamento que decorre da posse do estado de casados só pode ser afastada por rigorosa impugnação, em face da existência de casamento anterior, a ser comprovado mediante a exibição da certidão de casamento. Essa prova indireta do casamento também valerá para as pessoas que não possam manifestar vontade, como aquelas atingidas por moléstia mental, as ausentes, assim reconhecidas por sentença, e os incapazes (art. 3º), desde que representados por curador. (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.660-61.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 03/03/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Acompanhando os comentários sobre a Doutrina de Ricardo Fiuza:

• A redação do artigo é praticamente a mesma da contida no Código Civil de 1916. Não houve modificação de conteúdo. Acrescentou-se apenas a possibilidade de aplicação do dispositivo na hipótese de pessoas vivas, mas que não possam manifestar vontade. Essa modificação atendeu a posição largamente difundida na doutrina, porque em ambos os casos não há a possibilidade de indicação de onde se acha registrado o assento de casamento.

• A posse do estado de casado é a situação de duas pessoas que vivem, publicamente, como marido e mulher, sendo como tais, geralmente, considerados na sociedade (cf. Clóvis Beviláqua, Código Civil dos Estados Unidos do Brasil comentado. Rio de Janeiro, Livr. Francisco Alves, 1917, v. 2, p. 60 e 61). Resulta, portanto, de três elementos: a) nomen; b) tractatus; c) fama. O primeiro é o fato de se denominarem marido e mulher; o segundo, de se tratarem nessa qualidade, e o terceiro é o reconhecimento público da situação de casados.

• Inadmite-se presunção de casamento. A posse do estado de casado será, entretanto, relevante em situação de falta da certidão do registro do casamento e na impossibilidade de sua demonstração por outra prova supletória. Não se admite, contudo, a alegação do estado se houver prova do casamento de qualquer das pessoas, mediante certidão.

• O disposto neste artigo perde força ante a igualdade dos filhos estabelecida no CC 1.596 deste Código, em atendimento ao mandamento constitucional do § 6~ do art. 227, e ao reconhecimento de efeitos jurídicos à união estável, CC 1.723 e ss do novo Código Civil. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 780, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 03/03/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Para a visão lúcida de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o dispositivo restringe a possibilidade de nulificação de casamentos de pessoas que já tenham falecido ou que tenham se tornado incapazes se, em ambos os casos, estivessem ou estejam na posse de estado de casadas e se da nulificação decorrer prejuízo para os filhos comuns. Em tal caso, a impugnação do casamento somente pode ocorrer em razão de bigamia, i.é, se houver prova de que algum dos cônjuges já era casado ao tempo em que contraiu o casamento impugnado.

A posse de estado foi criada pelos romanos, para o reconhecimento e a estabilização de vínculos matrimoniais e filiais, mas sua sistematização foi feita pelos canonistas, que distinguiram seus elementos: nomen, Tractatus e fama. Segundo CARBONIER, o nome, diferentemente de seu significado atual, referia-se a uma nominativo pelo pai o pelo marido: o fato de o pai designar o filho ou a mulher como tais; o tratactus era o reconhecimento voluntário da filiação ou do casamento; a fama, o reconhecimento público. (CARBONIER, Jean. Droit Civil: la Famille: l’entant, le couple. 21. ed. Paris: PUF, 2002, p. 215).

O instituto perdeu importância no período que se seguiu ao Concílio de Trento, com o surgimento dos registros paroquiais, mas voltou a ter relevância a partir de 1685, na França, para efeito de reconhecimento de casamentos e vínculos de filiação de não-católicos.

Com a Revolução Francesa, a posse de estado passou à condição de prova do estado de filiação prevista na Lei de 2 de Brumário, ano II. Depois, o Código civil de 1804 tornou-a elemento de prova do casamento (Arts. 195 a 197) e da filiação legítima (art. 322).

Com origem no Código Civil de 1916, o dispositivo visava a proteção do vínculo matrimonial e leva em consideração a impossibilidade de os cônjuges defenderem o vínculo, em razão de incapacidade ou de falecimento.

Atualmente, tornou-se ineficaz. O enunciado condiciona a restrição à possibilidade de prejuízo para os filhos comuns do casal cujo casamento é impugnado. Tais prejuízos advinham, na ordem jurídica revogada, do distinto tratamento concedido a filhos matrimoniais e não-matrimoniais, que chegava à exclusão destes de direitos hereditários. A Constituição de 1988, como se sabe, estabeleceu a igualdade jurídica entre os filhos, independentemente do relacionamento existente entre os pais. Desse modo, não há hipótese de “prejuízo” para a “prole comum”, se o casamento dos pais vier a ser nulificado e, portanto, a regra é ineficaz, não tem como ser aplicada, no direito brasileiro vigente. É inócua. (Marco Túlio de Carvalho Rocha Mestre e Doutor em Direito Civil pela FDUFMG, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.545, acessado em 03.03.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.546. Quando a prova da celebração legal do casamento resultar de processo judicial, o registro da sentença no livro do Registro Civil produzirá, tanto no que toca aos cônjuges como no que respeita aos filhos, todos os efeitos civis desde a data do casamento.

No dizer de Milton Paulo de Carvalho Filho, o artigo se estabelece a partir de que momento a sentença que reconhece a existência do casamento produz efeitos. Provada a celebração legal do casamento em processo judicial (ação declaratória), deverá a sentença ser registrada no livro do Registro Civil para que produza efeitos, tanto relativamente aos cônjuges quanto aos filhos. Esses efeitos decorrentes do registro da decisão retroagirão à data do casamento, não podendo, contudo, prejudicar terceiros. Como ressalta Silvio Rodrigues (Comentários ao Código Civil. São Paulo, Saraiva, 2003, v. XVII), a regra tinha importância maior no passado que atualmente, pois a retroatividade beneficiava os filhos já nascidos, que eram legítimos desde a data de celebração. Com a superveniência da regra constitucional que estabelece igualdade entre todos os filhos (art. 227, § 6º, da CF), o artigo perdeu parte de seu alcance. (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.661.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 03/03/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Lecionando Marco Túlio de Carvalho Rocha, a prova da celebração do casamento resulta de processo judicial quando o casamento é nuncupativo (CC 1.540 e CC 1.541), se o ato da celebração tiver sido extraviado antes de registrado ou se tiver havido a perda do registro (parágrafo único do CC 1.543).

Em todos esses casos, os efeitos civis retroagem à data da celebração. A retroação não prejudica direitos adquiridos por terceiros de boa-fé.  (Marco Túlio de Carvalho Rocha Mestre e Doutor em Direito Civil pela FDUFMG, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.546, acessado em 03.03.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Defende Washington Santana em seu artigo intitulado “Responsabilidade Civil no Código Civil” subintitulado “Estudo acerca da responsabilidade Civil à luz do Novo Código Civil Brasileiro”, comentários ao CC 1.546, publicado em 10 de dezembro de 2002, no site direitonet.com.br., o ser humano é, por excelência, uma criatura racional. Tal atributo, necessariamente, gera efeitos múltiplos, dentre os quais aqueles que determinam a sua liberdade e o seu caráter socializante.

Historicamente, o desenvolvimento da civilização tem como cerne de sua existência uma ordem social fundada no regramento das condutas, exatamente porque a liberdade decorrente da racionalidade humana pode agir em desconformidade com a estabilidade social.

Destarte, a transgressão das regras de convívio exige o acionamento dos mecanismos de controle social, tal qual o direito, no sentido de promover a sanção adequada ao caso hipoteticamente previsto, a fim de restabelecer o equilíbrio e a ordem social.

A imposição de normas jurídicas urge como uma forma de se coibirem condutas contrárias à manutenção da estrutura das instituições sociais, revelando-se como um modo de restrição à liberdade de agir. O descumprimento de tais normas enseja ao infrator o ônus da reparação, caso seja apurada a sua responsabilidade civil ou criminal.

Na órbita do direito privado, a resposta ao cometimento de um ilícito pode ser obtida através de ação própria de reparação de danos, seguida dos adequados procedimentos atinentes ao devido processo legal, até final pronunciamento judicial, dado por sentença, declarando a culpa do réu. É a responsabilidade civil pela culpa aquiliana.

A apuração de tal responsabilidade visa devolver a vítima do evento nocivo ao estado em que se encontrava antes da ocorrência do ato ilícito. É, inobstante a reparação das condutas danosas, um meio de se prevenir a proliferação das mesmas.

Decerto que o ressarcimento dos danos causados a alguém é fato plenamente assimilado no direito pátrio. Como decorrência da lógica jurídica aplicável às mais variadas condutas, foram estabelecidos alguns pressupostos responsáveis pela averiguação da responsabilidade civil e da obrigação de indenizar, quais sejam: a ação ou omissão do agente, a culpa ou o dolo do mesmo e o nexo de causalidade entre a conduta subjetiva e o fato danoso.

O nosso Código Civil, no artigo 159, assim dispõe:

"Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imperícia, violar direito ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano".

A interpretação mais serena que se deve dar ao presente dispositivo gravita em torno da conduta levada a cabo da má-fé ou que contrarie a proibição legal (a ação), à não-realização de algo a que o agente estava obrigado, por dever legal, a fazê-lo (a negligência), bem como ao erro de profissional na realização de seu mister, gerando o prejuízo experimentado pela vítima (a imperícia).

Vê-se que o preceito evidenciado pelo Código Civil de 1916, atualmente em vigor, contempla a responsabilidade civil aquiliana, ou seja, aquela fundada na culpa. Em outras palavras, não são elementos bastantes para a apuração da responsabilidade civil apenas a verificação do dano e a comprovação da relação causa e efeito entre este e a conduta ilícita. A leitura do dispositivo supra exige, igualmente, a apuração da culpa do agente.

Apenas excepcionalmente é que se encontra disseminado em nosso ordenamento jurídico privado a responsabilidade objetiva, reportando-se a poucos casos prescritos em lei, considerando que os mesmos se enquadram em uma espécie de culpa presumida. É a chamada teoria do risco, segundo a qual todo dano deve ser indenizado, independentemente da culpa, e nas seguintes situações:

1 - queda ou lançamento de coisa em lugar indevido, na forma do artigo 1.546 do Código Civil;

2 - comportamento culposo de preposto de farmacêutico, na forma do artigo 1.546 do Código Civil;

3 - acidentes de trabalho, de acordo com a Lei 5.316, de 14- 9-1967, e Decreto n° 61.784, de 28.11.1967;

4 - acidentes em estradas de ferro, Lei n° 2.681, de 01-12-1912 e, por analogia, os acidentes em transportes coletivos;

5 - navegação aérea, Código Brasileiro do Ar, Lei 7.565, de 19.12.1986;

6 - acidentes causados por danos nucleares, artigo 21, XXIII, "c", da Constituição Federal.

Sem dúvida alguma, responsabilidade objetiva mostra-se extremamente benéfica ao cidadão comum, que não dispõe de meios de comprovar suas alegações em decorrência da dificuldade na obtenção da prova. Como exemplo, temos o atual Código de Defesa do Consumidor, em que está prevista a inversão do ônus da prova. É fabricante, por exemplo, que vai ter de demonstrar que seus produtos são confiáveis e que o defeito ocorreu em decorrência do mau uso do equipamento pelo próprio consumidor. É a evolução do Direito, tornando mais justa a produção da prova.

Importa observar que no regime de direito público, aplicável aos entes integrantes da administração pública direta e indireta, além de seus concessionários e permissionários, conforme o disposto no artigo 37 da Constituição Federal de 1988, a averiguação da responsabilidade assume caráter objetivo, bastando, tão somente, a existência da relação de causalidade entre o dano experimentado pela vítima e o ato ilícito atributivo de competência estatal, para que surja a obrigação de indenizar.

Contudo, o advento do Novo Código Civil (lei 10.406/02) trouxe, para o direito privado, no tocante ao direito de indenizar, pelo menos aparentemente, a estrutura material instituída no regime público. A importância desta nova preceituação exige uma certa reflexão, posto que os instrumentos articulados em torno da responsabilidade civil deverão redimensionar os seus conceitos, inclusive em se tratando dos danos de caráter moral.

As bases de sustentação do direito à indenização relativa à prática de atos ilícitos, no direito civil, como já demonstrado, referem-se aos pressupostos inerentes à teoria da culpa aquiliana.

Assim sendo, o atual regime, salvo em casos especiais que admitem a teoria do risco, só reconhece o direito da pessoa lesada quando esta vier a provar a culpa do agente que cometeu o ilícito.

A evolução das relações jurídicas, porém, veio impulsionar a construção de uma nova estrutura capaz de coibir os abusos efetivamente praticados na esfera do direito privado. O clamor da sociedade por uma regulação menos defasada de seus tratos acabou por trazer a lúmen uma nova codificação, uma nova maneira de pensar o direito de indenizar.

GUILHERME COUTO DE CASTRO, com muita propriedade, justifica a necessidade da existência do instituto nas entranhas do nosso ordenamento, verbis: “Em vários casos, a opção legislativa será não a de pôr em relevo a falha de comportamento, mas sim o dano, atento primordialmente à necessidade reparatória. Em tais casos, pode o ato ser lícito ou ilícito, pode ou não haver conduta culposa, porém, aferido o necessário liame jurídico entre conduta e dano, existe obrigação de indenizar.”

Desta feita, surgiu o Novo Código Civil, já não tão de vanguarda em alguns de seus conceitos, contudo adotando posicionamentos mais condizentes com a moderna realidade.

Acerca da responsabilidade civil, assim disciplina o Novo Código:

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Cabe, à guisa da menção aos artigos 186 e 187 do mesmo dispositivo, transcrevê-los:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

Duas importantes inovações ao atual código devem ser consideradas: a primeira, concernente à adoção clara, em termos genéricos de conduta, a teoria da responsabilidade objetiva, pelo exposto no parágrafo único do art. 927, “haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa”; a segunda, por estar o dano exclusivamente moral incluído no enquadramento legal, nos termos do art. 186, visto que desde há muito a matéria tem sido objeto de discussão jurisprudencial.

A princípio, no que pertine à implantação da responsabilidade objetiva na órbita das relações privadas, ressalte-se que a intenção do legislador foi mesmo a de contemplar a teoria da culpa presumida, sendo suficiente para a sua constatação tão somente a ocorrência da lesão e a sua autoria. Entretanto, ao mesmo tempo que concede tal direito, o limita, quando estipula que o ilícito deve ser acobertado pelos ditames do Código, desde que o caso averiguado esteja definido em lei ou a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, riscos a outrem. Por isso que tal normativo deve ser compreendido sob o aspecto da responsabilidade civil objetiva mitigada. A exemplo do que ocorre com o fenômeno das normas constitucionais programáticas, enquanto não viger lei específica sobre determinado ato ilícito, não poderá o julgador atuar conforme a nova ordem. Ademais, a conduta consubstanciada em atividades que implicam riscos não restou clarividente, o que leva a crer que tal imperativo deva ser regulamentado, sob pena de se configurarem hipóteses contrárias à manutenção da segurança jurídica necessária ao processo.

Em relação aos danos não patrimoniais, a questão é ainda mais complexa, porquanto tais hipóteses, se difíceis de tratar em um ambiente fundado na comprovação da culpa, muito menos quando se tem em mente um regime desagregado da mesma.

Com efeito, simples leitura do artigo 186 o faz em muito similar ao conteúdo do art. 159 do atual código. A rigor, a delimitação do que seja ato ilícito, contida naquele dispositivo, parece, a priori, expressar uma antinomia com o comando exarado no art. 927. Na realidade, a responsabilidade objetiva, como já dito, assume aspecto limitado, e, ao nosso ver, tal limitação implica uma exceção à regra geral da teoria da culpa civil. E, acompanhando essa tendência, é de se esperar que a reparação do dano moral se atenha mesmo à comprovação da culpa.

Pelo exposto, só está certo que os presentes normativos, ao se manifestarem restritivamente, devem ainda adiar a aplicação de seus preceitos, eis que condicionam o enquadramento dos atos ilícitos à sorte de lei específica que discrimine a matéria, ou pelo menos a direcione. Por enquanto, até que se efetive tal situação, continuará a ser aplicado o direito de indenizar que caduca, embora na vigência do novo código. (Washington Santana, em: “Responsabilidade Civil no Código Civil” subintitulado “Estudo acerca da responsabilidade Civil à luz do Novo Código Civil Brasileiro”, comentários ao CC 1.546, publicado em 10 de dezembro de 2002, no site direitonet.com.br., acessado em 03.03.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.547. Na dúvida entre as provas favoráveis e contrárias, julgar-se-á pelo casamento, se os cônjuges, cujo casamento se impugna, viverem ou tiverem vivido na posse do estado de casados.

Dando sentido à sua visão, Milton Paulo de Carvalho Filho entende que quando a prova sobre a existência do casamento deixar dúvidas, autoriza a lei que o julgador decida em favor do casamento. A regra do in dubio pro matrimonio é tratada neste artigo. Poderá ser aplicada quando a prova sobre a celebração do casamento se apresentar duvidosa (não convincente) ou contraditória (conflitante). Penderá sempre em favor de sua comprovação se os cônjuges vivem ou tiverem vivido na posse do estado de casados. Segundo ensina Washington de Barros Monteiro, reportando-se à lição de Clóvis Bevilaqua, esse princípio se funda em duas fortes razões: a) nas sociedades cultas, os casamentos devem ser tratados com benevolência, porque constituem o alicerce das famílias e, portanto, da própria sociedade; b) a segunda razão inspira-se na equidade, que recomenda, em caso de dúvida, se oriente o aplicador da lei pela solução mais benigna. Iníquo seria, efetivamente, que, num caso duvidoso, se preferisse solução contrária à legitimidade ou à existência do casamento (Curso de direito civil - direito de família. São Paulo, Saraiva, 1994, v. II). Ressalte-se, por fim, que essa regra tem aplicação limitada às questões relativas à prova do casamento, em razão da falta ou perda do registro, não tendo incidência nas questões referentes à validade ou invalidade do casamento, já que estas são tratadas pelo disposto nos arts. 1.548 a 1.564. (Milton Paulo de Carvalho Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.661-62.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 03/03/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

“A família decorrente do casamento e sua repercussão no código Civil de 2002. Esta é a tese apresentada à banca examinadora do PUC/SP, por Oswaldo Peregrina Rodrigues, no ano de 2005, para obtenção do título de Doutor. Nesse texto legal, encontra-se outra situação na qual se pode demonstrar a existência de um relacionamento como conjugal, ainda que se descartem princípios e formalidades essenciais, como fito de proteger a família, ou seja, entre aqueles e esta, prefere-se a opção pelo vínculo familial. Daí, outra consideração que se fará é a decorrente do CC1.546 vigente, que assim estatui: “Quando a prova da celebração legal do casamento resultar de processo judicial, o registro da sentença no livro do Registro Civil produzirá, tanto no que toca aos cônjuges como no que respeita aos filhos, todos os efeitos civis desde a data do casamento”. Mais uma exceção à regra geral determinada no CC 1.543, caput do mesmo Códex, possibilitada por eu próprio parágrafo único.

Sobre isso discorre Eduardo de Oliveira Leite: “O artigo consagra os efeitos da retroação sentencial mas, mais que isso, chancela a dimensão do afeto em detrimento do puro estéril formalismo”; é a preferência pelo afeto e pela dignidade dos parceiros, afastando meras formalidades legais.

A última situação a ser considerada é a relacionada ao artigo 1.547 da Lei Civil de 2002, que estabelece o princípio do in dubio pro matrimonio. “(...) que se aplica quanto à dúvida sobre existência de celebração, vale dizer, se foi ou não efetivada a cerimonia de que não se apresenta registro, ou impossível se mostra a consecução da prova correspondente. Não se discute, pois, nesse plano, validade de casamento, mas apenas existência”.

Como alerta Silvio rodrigues, “(...) é pressuposto para a aplicação do texto ocorrer litigio sobre a existência do casamento, sem que haja prova convincente de um ou de outro lado. Efetivamente, assim o é, pois expressa o sobredito CC 1.547: “Na dúvida entre as provas favoráveis e contrárias, julgar-se-á pelo casamento, se os cônjuges, cujo casamento se impugna, viverem ou tiverem vivido na posse do estado de casados”.

Assim sendo, controvertidas as provas coligidas aos autos em que se debate a existência ou não de um matrimonio, o magistrado deverá inclinar-se pela primeira, ou seja, in dubio pro matrimonio; novamente, prevalece a família constituída, em face de formalidades matrimoniais. (Oswaldo Peregrina Rodrigues “A família decorrente do casamento e sua repercussão no código Civil de 2002. Tese apresentada à banca examinadora  da PUC/SP, no ano de 2005, para obtenção do título de Doutor. Acessado comentários Item 4.9 O registro do casamento, às pp. 228-29 em 03.03.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No dizer do Mestre Carvalho Rocha, a regra concretiza o princípio da conservação do casamento. Dúvida sobre a existência válida do casamento decorre da falta ou da perda do registro (CC 1.543, parágrafo único). No processo de justificação, que visa a suprir a falta da certidão do registro, as provas podem ser contraditórias. Se as contradições forem tais que não permitam ao juiz concluir pela existência ou não do casamento, deverá observar se o supostos cônjuges vivem ou viveram na posse de estado de casados. Em caso afirmativo, deverá julgar pela existência do casamento. (Marco Túlio de Carvalho Rocha Mestre e Doutor em Direito Civil pela FDUFMG, apud  Direito.com, comentários ao CC 1.547, acessado em 03.03.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No encerramento do Capítulo VIII – Das Provas do Casamento – apresenta-se a Doutrina do relator Ricardo Fiuza, na íntegra: “O Artigo 206. do Código Civil de 1916 tem idêntica disposição. A Posse do estado de casado pode ser invocada como fator decisivo quando as pessoas favoráveis e contrárias ao casamento estiverem em grau de equivalência. Nesse caso, decidir-se-á em favor do casamento (in favore matrimonii). Nada mais se disse (nota VG). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 780, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 03/03/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

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