Art. 1.639. É licito aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular, quanto aos seus bens, o que lhes aprouver.
§
1º
O regime de bens entre os cônjuges começa a vigorar desde a data do casamento.
§
2º É
admissível alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em pedido
motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e
ressalvados os direitos de terceiros.
Nas Disposições Gerais, Cotrim e Mezzalira conceituam: Regime de bens é o conjunto das normas que regulam as relações patrimoniais entre os cônjuges e entre si e os cônjuges e terceiros.
Doutrinariamente, faz-se a distinção entre um regime matrimonial primário e os regimes secundários. Essa distinção doutrinária leva em conta as regras que concernem aos regimes de bens, em geral (“regime matrimonial primário”, “estatuto patrimonial de base”) e as regras específicas, que se referem a cada regime específico (“regime matrimonial secundário”).
As regras do regime primário dizem respeito à obrigação de contribuir para os encargos da família, às limitações matrimoniais, à responsabilidade por dívidas e à proteção do bem de família (Oliveira, José Lamartine Correa de; Muniz, Francisco José Ferreira. Direito de Família: Direito Matrimonial. Porto Alegre: Fabris, 1990, p. 340 e ss.).
As regras do regime secundário dispõem sobre a propriedade e a administração dos bens (CC 1.665) e até mesmo sobre a proporção da colaboração de cada cônjuge para as despesas comuns (CC1.688).
Autonomia para estabelecer o pacto antenupcial. O CC 1.639, positiva o princípio da autonomia da vontade em matéria de regime de bens. Os cônjuges são livres para estipular regras conforme suas necessidades e intenções. A escolha do regime de bens enquadra-se, pois, em sua liberdade negocial e a estipulação das regras, ainda quando optam por meramente assumir modelo estabelecido na lei, é negócio jurídico bilateral que se faz mediante o “pacto antenupcial”.
Tal liberdade negocial tem limites, com todo negócio jurídico, em normas de caráter cogente, que visam à proteção do interesse público, como o CC 1.641, que impõe aos nubentes, nos casos nele previstos, o regime da separação de bens.
Do início da eficácia do regime de bens. A escolha do regime de bens é feita quando da entrega do pedido de habilitação para o casamento ao oficial do Registro Civil. Se os nubentes desejarem adotar outro regime que não seja o regime de bens legal supletivo (o regime da comunhão parcial de bens), devem, antes da habilitação, lavrar escritura pública em que documentem sua escolha e, se desejarem, estipulem cláusulas peculiares ao casamento que irão realizar.
O pacto antenupcial, como é chamado, é negócio jurídico sob a condição suspensiva de o casamento ver a se realizar. Sua eficácia inicia-se, portanto, nos termos do dispositivo comentado na data da celebração do casamento.
Infelizmente, a mesma clareza não existe na lei quanto ao termo final da eficácia do pacto antenupcial. O problema se põe quando a dissolução ocorre mediante divórcio. Há três posições: a) uma corrente defende que a extinção do regime se dá no momento em que cessa a comunhão de vida entre os cônjuges, o que ocorre, via de regra, quando finda a coabitação, com a separação de fato. O argumento central é que desfeita a comunhão de vida, nada mais há que justifique a permanência do regime de bens (Pereira, Sérgio Gishkow. A separação de fato dos cônjuges e sua influência nos bens adquiridos posteriormente. Ajuris, p. 259-267). No mesmo sentido: TJDF, AC n. 2000.07.1.002.546-8, 1ª T., Rel. des. Hermenegildo Gonçalves, DJU 16.03.2004; TJMG, AC n. 1.0479.03.066.555-4/002, Rel. Des. Kildare Gonçalves, j. 22.09.2005. Contra esse entendimento, confira, por todos: Leite, Eduardo de Oliveira. Aquisição de bens durante a separação de fato. Revista de direito Civil, n. 59, jan-mar./1992, p. 139-149; b) Outra corrente defende que o termo final da eficácia do pacto antenupcial ocorre com a decretação judicial da separação de corpos, conforme o art. 8º da Lei n. 6.515/77, que estaria em vigor, não teria sido revogado pelo Código Civil, por se tratar de regra processual (Pereira, Áurea Pimentel. Divórcio e separação judicial no novo Código Civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Renovar; Soares, Orlando. Direito de Família. Rio de Janeiro: Forense, 2004). c) Outra, finalmente, defende que a extinção do regime de bens se dá com o trânsito em julgado da sentença que determina sua alteração ou da que dissolve a sociedade conjugal (CC 1.571, 1.576; TJMG, AC n. 1.0702.02.007337-6/001, Rel. Des. Vanessa Verdolim Andrade, j. 12.04.2005).
Da mutabilidade do regime de bens. Como negócio jurídico que é, o regime de bens pode ser alterado pelos cônjuges. A legislação anterior não admitia a mutação do regime. O cerceamento da liberdade contratual dos cônjuges era justificada para se evitar que o marido exercesse coação sobre a mulher. A evolução dos costumes e a consagração da igualdade dos cônjuges tornam a limitação arbitrária e, pois, a mutabilidade do regime encontra-se em consonância com os princípios.
Quanto à forma da alteração do regime de bens. O receio de abusos atraiu a exigência formal de ser feita a alteração em juízo. O dispositivo exige que os cônjuges declinem cada qual sua motivação e atribui ao juiz o poder de investigar a procedência desses motivos.
O cuidado é excessivo e, sem justificativa plausível, fere a liberdade de estipular dos cônjuges. Como qualquer ato jurídico, deve haver o controle de sua legalidade mediante a confrontação com as normas de observância obrigatória para a generalidade dos negócios jurídicos. O motivo suficiente para alterar qualquer negócio é a livre manifestação da vontade, a conformidade da declaração com a vontade íntima da parte.
A permissão de mudança do regime de bens inclui os pactos antenupciais realizados antes da vigência do Código civil, pois não há nessa faculdade ofensa a direito adquirido (ninguém possui direito adquirido à proibição de alterar o regime de bens).
ALTERAÇÃO DE REGIME DE CASAMENTO – LEI NOVA VERSUS LEI ANTIGA – POSSIBILIDADE DA CONVERSÃO. A atual disposição que cuida da mutabilidade do regime de bens – CC 1.639, § 2º - é norma cogente, editada na esteira da evolução da própria vida social, assim como em 1977 o divórcio foi promulgado com o mesmo proposito e ninguém poderia afirmar que a dissolução da sociedade conjugal só estaria ao alcance daqueles que se casassem após a vigência da lei divorcista (TJRS, Apelação Cível n. 70006709950, 7ª C. Cível, Rel. des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, j. 22.10.2003, in Revista Brasileira de Direito de Família, ano VI, n. 25, ago./set. 2004, p. 76-85).
No mesmo sentido: TJMG, Ap. Cív. 351.825-5, p. 04.12.2003. TJMG. Ap. Cív. 1.0518.03.038304-7/001, 4ª C. Cív., Rel. Des. Moreira Diniz, DJMG 17.09.2004, RBDFam 27/110.
Contra: DIREITO CIVIL. ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS. CASAMENTO CELEBRADO NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. Se à época do casamento adotava-se o princípio da imutabilidade do regime de bens no casamento, de acordo com o ordenamento jurídico vigente, não se pode pretender, em ração da ressalva expressa do CC 2.039, que no CC 1.639, § 2º, do mesmo diploma legal, alcance as relações patrimoniais relativa aos casamentos celebrados em data anterior à sua vigência (TJMG, Ap. Cív. 024.03.182.864-3, j. 24.08.2004).
No mesmo sentido: TJSC, apelação Cível n. 2002.024919-4, 2ª CDCiv., Rel. des. Luiz Carlos Freyesleben j. 27.03.2003, in Revista Brasileira de Direito de Família, ano VI, n. 25, ago./set. 2004, p. 94-101.
Da retroatividade e irretroatividade da alteração do regime de bens. Controverte-se sobre a possibilidade de os efeitos do novo regime de bens escolhido pelos cônjuges retroagir para alcançar as situações anteriores à alteração. O Código Civil, expressamente, excluiu a retroatividade relativamente a terceiros, mas nada dispôs quanto a ela em relação aos próprios cônjuges.
A opinião dominante é no sentido de admiti-la desde que esta tenha sido a vontade exteriorizada pelos cônjuges:
ALTERAÇÃO DE REGIME DE BENS DO CASAMENTO – POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. 1. (...) 2. A alteração do regime de bens pode ser promovida a qualquer tempo, de regra com efeito ex tunc, ressalvados direitos de terceiros, inexistindo qualquer obstáculo legal à alteração de regime de bens de casamentos anteriores à vigência do Código Civil de 2002. Inteligência do CC 2.039. Recurso provido (TJRS, AC 70009665415, 7ª C. Cív., Rel. Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, DOERS 14.10.2004, RBDFam 27/115).
No mesmo sentido: Pereira, Sérgio Gishkow. A alteração do regime de bens: possibilidade de retroagir. RBDFam, Porto Alegre, n. 23, abr-maio, 2004, p. 68.
Finalmente, tem-se admitido até mesmo a alteração do regime obrigatório de bens quando desaparecida a causa que justificou a imposição:
DIREITO DE FAMÍLIA – ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS – POSSIBILIDADE COM ADVENTO DO ARTIGO 1.639, PARÁGRAFO 2º, DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. MUTABILIDADE DO REGIME DE BENS, CUJOS EFEITOS PERDURAM DURANTE A VIGÊNCIA DO NOVO CÓDIGO CIVIL. VONTDE E DELIBERALIDADE DOS CÔNJUGES. DESAPARECIMENTO DA CUSA QUE DETERMINOU A SEPARAÇÃO LEGAL DE BENS. INEXISTÊNCIA DE PREJUÍZOS. DIREITOS DE TERCEIROS RESGUARDADOS (TJMG, Ap. Cív. n. 1.0459.04.018.578-5/001, Rel. Des. Brandão Teixeira, j. 22.02.2005). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apud Direito.com, comentários ao CC 1.639, acessado em 22.04.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
No histórico que antecede a doutrina de Ricardo Fiuza, consta que • Durante a passagem pelo Senado Federal foi acrescentado o segundo parágrafo ao dispositivo, passando a redigir-se da seguinte forma: “E lícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular, quanto aos seus bens, o que lhes aprouver. § 1º O regime de bens entre os cônjuges começa a vigorar desde a data do casamento, e é irrevogável. § 2º É admissível alteração parcial do regime de bens, mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros”. Retornando, em seguida, o projeto à Câmara, deu o Deputado Ricardo Fiuza nova redação ao § 1º , suprimindo a frase final, que estabelecia a irrevogabilidade do regime de bens.
Então, em sua Doutrina Ricardo Fiuza comenta Maria Helena Diniz • Regime de bens é o conjunto de princípios e normas referentes ao patrimônio dos cônjuges, que regulam os interesses econômicos oriundos do casamento, podendo ser chamado de “estatuto patrimonial” da sociedade conjugal (v. Maria Helena Diniz, Curso de direito civil brasileiro, 16. cd., São Paulo, Saraiva, 2001, v. 5, p. 135 e 136).
• Em regra geral vigora o princípio da autonomia da vontade, ou liberdade, quanto à escolha pelos nubentes de um regime de bens tipificado em lei ou de um regime misto ou, ainda, de regras especiais, desde que a convenção não prejudique os direitos conjugais ou paternos, ou outra disposição absoluta de lei, casos em que a convenção será havida como nula. Essa autonomia na escolha de regras mistas ou especiais advém do caput deste dispositivo, inobstante o art. 1.640, parágrafo único, estabeleça que os nubentes, no processo de habilitação, possam escolher qualquer dos regimes tipificados neste Código. No entanto, há exceções a esse principio, dispostas expressamente em lei, referentes à separação obrigatória (art. 1.641, I a III).
• A vigência do regime de bens é efeito jurídico do casamento, cessando sua eficácia com a dissolução da sociedade conjugal (art. 1.576).
• O regime de bens era imutável sob a égide do Código Civil anterior (art. 230). Tal irrevogabilidade tinha em vista proteger os cônjuges e terceiros, mas o princípio impedia a modificação das relações patrimoniais entre os consortes, que, passado algum tempo após o casamento, podem arrepender-se da escolha do estatuto patrimonial. Além disso, as regras patrimoniais entre os cônjuges não têm cunho institucional, tanto assim que os nubentes podem regular essas relações do modo que lhes aprouver (v. Orlando Gomes, Direito de família, 11. ed., Rio de Janeiro, Forense, 1999, p. 174). No entanto, aquelas finalidades da irrevogabilidade do regime de bens — proteção aos cônjuges e a terceiros — podem ser alcançadas em sistema que permite a modificação do estatuto patrimonial no curso do casamento. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 838-39, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 22/04/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Valdirene Laginski, em artigo fala da Modificação do Regime de Bens no Código Civil: O Código Civil Brasileiro anterior à Lei nº 10.406/02 (atual código em vigência), apresentava três formas de regimes de bens no casamento, a saber: comunhão universal, separação parcial e separação total de bens. O Código atual acrescentou uma novidade, a participação final nos aquestos, ou seja, a participação nos bens adquiridos durante a constância do casamento por um dos cônjuges.
Nesse novo regime, os bens adquiridos durante o casamento pertencem exclusivamente ao cônjuge que os adquiriu, e que poderá administrar seu patrimônio de forma unilateral e autônoma. Contudo, esses bens serão divididos no momento de eventual separação do casal.
No que dizia respeito ao regime de bens, o Código anterior previa que, uma vez escolhido o regime pelos cônjuges, a decisão se tornava irrevogável. Porém, a nova legislação civil inovou e acrescentou uma novidade no parágrafo segundo do CC 1.639, ao permitir que o regime adotado pelos cônjuges possa ser alterado a qualquer momento. Vejamos:
CC 1.639 (...) Parágrafo segundo – é admissível a alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos o cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros.
No entanto, a mudança de regime somente poderá ser efetuada mediante o ajuizamento de uma ação judicial, na qual os cônjuges, de comum acordo, apresentarão suas justificativas aptas a ensejar a alteração desejada. A alteração do regime será averbada no cartório de registro, após a manifestação do Ministério Público e a devida homologação pelo Poder Judiciário.
Segundo as palavras do ilustre Desembargador do TJRS e Presidente do IBDFAM-RS, Luiz Felipe Brasil dos Santos, em artigo intitulado “A mutabilidade dos regimes de bens”:
“Inovando profundamente na matéria, o Código Civil de 2002 subverte o sistema anterior, e passa a admitir a alteração do regime de bens no curso do casamento, nas condições postas pelo CC 1.639, § 2º. Sinale-se que, desta forma, o ordenamento jurídico nacional, na linha das legislações mais recentes, faz com que a autonomia de vontade dos cônjuges, no que diz com o ajuste dos efeitos patrimoniais do casamento, amplie-se consideravelmente, não se manifestando apenas no momento anterior ao matrimonio, através da pactuação do regime de bens que adotarão ao casar – momento em que, pelo consagrado princípio da livre estipulação (CC 1.639, caput), poderão escolher (salvante as hipóteses em quem é obrigatório o regime da separação de bens – CC 1.641) o regime de bens que melhor lhes aprouver – como podendo vir a modificar, ante circunstâncias que a extraordinária dinâmica da vida venha a lhes apresentar, a escolha feita naquele momento precedente”. (Artigo publicado no site migalhas. com.br).
Porém, cumpre observar que para efetuar a alteração do regime, os cônjuges devem demonstrar que tal alteração, em hipótese alguma, afetará direitos de terceiros, sob pena de indeferimento do pedido. Neste passo, importante a atuação do Ministério Público e análise cuidadosa pelo magistrado dos fatos elencados como motivadores da alteração requerida.
Mas, ainda há muita divergência entre os juristas no que diz respeito à aplicação do artigo supra mencionado. Duas correntes doutrinárias estão interpretando o referido artigo de maneiras diferentes. Para uma corrente o regime adotado antes da vigência do novo Código Civil é imutável, e, para outra, mais inovadora, o regime pode ser alterado com base na nova lei.
Contudo, a divergência de opiniões ao interpretar a legislação não deve ser levada a efeito. A alteração do regime deve ser interpretada de maneira que venha a beneficiar os casais que se uniram antes da vigência do novo Código e queiram alterar o regime, desde que adotadas as cautelas para resguardar direitos de herdeiros e terceiros interessados.
Por outro lado, impende ressaltar que a alteração do regime para adotar a separação total de bens, só afetará os bens adquiridos após a homologação do regime pelo juiz. A alteração do regime não afetará os bens constituídos sob o regime antigo, patrimônio comum, que só poderá ser partilhado mediante eventual separação do casal.
Conforme já ressaltado, a alteração do regime de bens deve ser analisada cautelosamente pelo magistrado para evitar que terceiros saiam prejudicados, haja vista que um dos cônjuges pode intencionalmente transferir todos os seus bens para o outro objetivando lesionar eventuais credores.
Porém, se posteriormente restar comprovado que a alteração do regime se deu nestas condições, ou seja, com o objetivo de prejudicar terceiros interessados, estes poderão se socorrer de ação anulatória, antes de consumada a prescrição.
Mas, ainda é cediço para se chegar a uma conclusão definitiva sobre a aplicação do parágrafo segundo do CC 1.639, o que só ocorrerá com a manifestação de nossos Tribunais Superiores com a análise concreta de situações levadas a juízo.
Nesse sentido, importante trazer à baila acórdão proferido pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que em recente decisão se manifestou no sentido de que o parágrafo segundo do artigo 1.639 do Código atual, pode ser aplicado para alterar o regime de bens a qualquer tempo.
PEDIDO DE ALVARÁ JUDICIAL. PEDIDO DE AUTORIZAÇÃO PARA LAVRAR ESCRITURA PÚBLICA DE PACTO ANTENUPCIAL. POSSIBILIDADE JURIDICA DA ALTERAÇÃO DE REGIME DESNECESSIDADE DE ESCRITURA PÚBLICA. 1. Não tendo havido pacto antenupcial, o regime de bens do casamento é o da comunhão parcial sendo nula a convenção acerca do regime de bens, quando não constante de escritura pública, e constitui mero erro material na certidão de casamento a referência ao regime da comunhão universal. Inteligência do CC 1.640. 2. A pretensão deduzida pelos recorrentes que pretendem adotar o regime da comunhão universal de bens é possível juridicamente, consoante estabelece o CC 1.639, § 2º e as razões postas pelas partes são bastante ponderáveis, constituindo o pedido motivado de que trata a lei e que foi formulado pelo casal. Assim, cabe ao julgador a quo apreciar o mérito do pedido e, sendo deferida a alteração de regime, desnecessário será lavrar escritura pública, sendo bastante a expedição do competente mandado judicial. O pacto antenupcial é ato notarial; a alteração do regime matrimonial é ato judicial. 3. (Sublinhe-se) A alteração do regime de bens pode ser promovida a qualquer tempo, de regra com efeito ex tunc, ressalvados direitos de terceiros. Inteligência do CC 2.039. 4. (Sublinhe-se) É possível alterar o regime de bens de casamentos anteriores à vigência do Código Civil de 2002. Recurso provido. Ap. Cível n. 70 006 423 891, Farroupilhas – RS – Sétima Câmara Cível do TJRS (grifou).
De acordo com o acórdão acima transcrito, é possível aplicar a disposição constante no parágrafo segundo do artigo 1.639 do Código atual para alterar o regime de bens, inclusive para os casamentos realizados sob a égide do código anterior, ora revogado. (Valdirene Laginski, Advogada do escritório Pacheco Neto Sanden e Teisseire Advogados, com atuação nas áreas cível e trabalhista, em artigo fala da Modificação do Regime de Bens no Código Civil, site laginski.adv.br/artigos. Acessado em 22/04/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art.
1.640. Não
havendo convenção, ou sendo ela nula ou ineficaz, vigorará, quanto aos bens
entre os cônjuges, o regime da comunhão parcial.
Parágrafo único. Poderão os nubentes, no processo de habilitação, optar por qualquer dos regimes que este código regula. Quanto à forma, reduzir-se-á a termo a opção pela comunhão parcial, fazendo-se o pacto antenupcial po escritura pública nas demais escolhas.
Segundo o histórico que antecede a doutrina de Ricardo Fiuza, produzido pelo grupo reviso: • O caput do artigo é exatamente o mesmo desde a elaboração do projeto. O parágrafo único, cuja redação original era a seguinte: “Poderão os nubentes, no processo de habilitação, optar pelo regime da comunhão universal, sendo a opção reduzida a termo”, foi emendado pelo Senado Federal, passando a redigir-se: “Poderão os nubentes, no processo de habilitação, optar por qualquer dos regimes que este código regula, reduzindo-se a termo a preferência”. Retomando, em seguida. o projeto à Câmara, deu o Deputado Ricardo Fiuza nova redação ao parágrafo único, mantido o texto do caput, já que a redução a termo no processo de habilitação é providência a ser adotada apenas no caso da opção pelo regime da comunhão parcial de bens, por tratar-se do regime legal; nos demais casos, a escolha deverá ser manifestada por meio de escritura pública.
A produção final da Doutrina do Relator Ricardo Fiuza • A forma do estatuto patrimonial é solene — escritura pública, conforme este artigo e o art. 1.653. Na falta de pacto antenupcial, o regime legal é o da comunhão parcial de bens. A nulidade ou ineficácia do pacto antenupcial não invalida o casamento, que, neste caso vigorará sob o regime legal, da comunhão parcial de bens. Como referido anteriormente, devem ser havidas como inválidas as cláusulas que violem norma legal imperativa ou cogente, em prejuízo de direitos conjugais ou paternos, como por exemplo a renúncia ao direito-dever de fidelidade, a privação de um dos cônjuges quanto ao exercício do poder parental, a venda de imóvel, em regime que não seja o da separação absoluta de bens, sem a outorga conjugal. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 839-40, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 22/04/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
No lecionar do Mestre Marco Túlio de Carvalho Rocha, o artigo 1.640 institui o regime da comunhão parcial como o regime legal supletivo. Vale dizer, o regime de bens resulta sempre de opção feita pelos nubentes. Quando estes não manifestam o desejo de assumir outro, presume-se que tenham optado pelo regime da comunhão parcial de bens.
O regime legal supletivo é igualmente aplicável no caso de vir a ser anulado o casamento (a nulidade do casamento implica a do pacto, pois este é acessório daquele, salvo o caso de putatividade) ou o pacto antenupcial feito pelos interessados para a escolha de outro regime.
O dispositivo faz referencia à forma que se deve adotar em tais opções: a) para regular as relações econômicas do casamento segundo o regime da comunhão parcial de bens, basta aos nubentes expressar sua intenção no próprio termo de habitação; b) para regular as relações econômicas do casamento segundo outro regime, inclusive com a possibilidade de instituição de regras não previstas nos modelos legais, devem os nubentes mandar lavrar escritura pública; c) finalmente, o regime legal obrigatório da separação de bens, previsto no artigo 1.641 é instituído independentemente de qualquer manifestação de vontade dos nubentes, pois o é por força de lei (ex lege). (Mestre, Advogado, Procurador e Professor Marco Túlio de Carvalho Rocha, apud Direito.com, comentários ao CC 1.640, acessado em 22.04.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
No dizer de Pedro Henrique de Almeida Alves, em artigo “A comunhão de bens nos regimes de separação obrigatória: um grande paradoxo”, trata-se o artigo de breve, porém aprofundada análise aos nuances da partilha de bens na Separação Obrigatória de Bens quando ha aquisição de bens após o casamento. uma análise sobre a antiga, porém vigente Súmula 377 do STF.
A escolha pelo regime de bens é um fato
jurídico cujos efeitos são um dos mais comuns e importantes dentre todos
definidos nas Leis Civis. Muitos nubentes, quiçá pela tranquilidade da paixão
vivenciada ou pelos custos extras de um pacto nupcial, não se aprofundam no
tema e resolvem, em quase unanimidade, pelo regime legal, isto é, o da comunhão
parcial de bens, assim definido após pela Lei 6.515/77.
Entretanto, entender as peculiaridades
que cercam os regimes de bens é fundamental para uma adequada orientação e
sobre as consequências efetivas para o casal na gestão do patrimônio comum ou
amealhado, tendo em vista que os casamentos, infelizmente, estão cada vez mais
efêmeros.
Dentre
os tipos de regime de bens elencados taxativamente no nosso Código Civil,
artigo 1.639 e seguintes, o regime de separação obrigatória de bens,
popularmente denominado de “separação legal”, é provavelmente um dos mais
desconhecidos e complexos dentre os regimes.
O
legislador definiu regras rígidas para os casamentos entre pessoas maiores de
setenta anos, além dos que dependerem, para casar, de anuência judicial, como
aquelas pessoas não emancipadas e menores de 18 anos ou aquelas pessoas que
contraírem o matrimônio com incorrendo em uma das causas suspensivas da celebração
do casamento, determinando, nesses casos, que, por precaução, mas
obrigatoriamente, o regime de bens que deverá ser adotado é o da separação de
bens, privando-os da liberdade na escolha do regime, por força do artigo 1.641
do Código Civil.
Nada obstante as determinações legais de
separação obrigatória o Conselho da Justiça Federal (CJF), assim como diversos
julgados dos nossos Tribunais superiores, já entenderam que no caso das causas
suspensivas do inciso I e III do artigo 1.641, podem os cônjuges proceder a
alteração do regime, desde que superada a causa que o impôs, de igual modo,
como adiante será demonstrado, alguns julgados já vêm entendendo que cessada a
causa suspensiva automaticamente o regime de separação obrigatória torna-se de
comunhão parcial de bens, sem necessidade de averbação posterior.
Por outro lado, o regime obrigatório de
separação de bens possui uma peculiaridade específica não regida em lei, mas
compreendida pela nossa jurisprudência desde 1964, ainda sob a égide do art.
258 do Código Civil de 1916, que surgiu com a edição da súmula 377 do STF, que
assim determinava:
“Súmula 377 do STF: No regime de
separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do
casamento”.
A finalidade inicial de edição do
enunciado foi a de evitar a ocorrência de enriquecimento sem causa de um
consorte em detrimento do outro. Impondo dessa maneira a justa e equânime
partilha do patrimônio amealhado mediante esforço comum e que, muitas
vezes, era registrado só em nome de um dos cônjuges.
Ademais, outro ponto que torna razoável
tal súmula é que, no regime imposto, não há liberdade de escolha do regime
matrimonial, muita das vezes, verdadeira punição aos consortes, mas que
pretende, sobretudo, no caso do casamento com elevada idade dos noivos (maiores
de setenta anos), é resguardar o patrimônio já adquirido pelos noivos, evitar
os casamentos de mero interesse financeiro e ainda impedir a confusão entre
patrimônios que até aquele momento que dependa de partilha (art. 1.523, inciso
III do C.C.).
Em que pese a edição da súmula ainda sob
a vigência do Código Civil de 1916, é importante ressaltar que a mesma foi
recepcionada pelos reclames do novo Codex. Primeiro, porque a redação do artigo
1641 do código atual é quase idêntica à do parágrafo único do artigo 258 do
Código Beviláqua, em segundo lugar, é que o artigo 1.647 do Código Civil, o
qual poderia levantar dúvidas quanto a validade atual da súmula, refere-se,
exclusivamente, a separação de bens estipulada, ou seja, a separação de bens
convencional, incidental a pacto nupcial, na forma que se observa:
“Art. 1647. Estipulada a
separação de bens, estes permanecerão sob a administração exclusiva de cada um
dos cônjuges, que os poderá livremente alienar e gravar de ônus real”.
Nesse esteio, é patente a compreensão da
manutenção da súmula 377 do STF, ainda em tempos atuais, concluindo-se que as
mesmas razões que invocaram os Ministros do Supremo, em 1964, a editarem a
súmula permanecem até os dias de hoje, não havendo motivo para a sua
inaplicabilidade, a qual foi perfeitamente recepcionada pela Constituição
Federal de 1988, considerando os princípios da isonomia e da razoabilidade, uma
vez que a intenção do legislador era a de precaução com os terceiros, dotados
de algum interesse nos bens pré-constituídos de um dos nubentes, mas sem
intenção de prejudicar os cônjuges na aquisição patrimonial de novos bens.
De tal sorte, por incidência da citada
súmula, em caso de divórcio, os bens adquiridos durante a união deverão ser
divididos pelos cônjuges, ao contrário dos bens anteriores, que pertencerão,
exclusivamente, àquele que o adquiriu, ficando implícito um esforço comum, nos
bens adquiridos após o casamento pelo regime da separação obrigatória.
Vale ressaltar que, nada obstante, não
raros julgados determinarem a necessidade de comprovação do “esforço comum”
para aquisição de bens adquiridos na constância do casamento, entendo,
juntamente com grande parte da doutrina, que o “esforço” em questão não é
apenas financeiro, mas também imaterial, derivados da “comunhão plena de vida”
como cláusula geral de direito de família (CC 1.511 do Código Civil),
possuindo, portanto, presunção iuris
tantum, sendo o ônus da prova inverso nesse caso.
Com efeito, esse é também o entendimento
atual do Superior Tribunal de Justiça, nos seus julgados recentes manifesta
indelével posicionamento pela vigência atual da súmula 377 do STF , Conforme se
vê a ementa no recente julgamento em 24.04.2012 do AgRg no REsp 1008684/RJ, de relatoria do Min. Antônio Carlos Ferreira, in verbis:
“A partilha dos bens adquiridos na
constância da sociedade conjugal, erigida sob a forma de separação legal de
bens (art. 258, parágrafo único, I, do CC/1916), não exige a comprovação ou
demonstração de comunhão de esforços na formação desse patrimônio, qual é
presumida, à luz do entendimento cristalizado na Súmula n.377/STF".
É de bom alvitre lembrar que, a
desnecessidade de comprovação do esforço comum não torna os bens adquiridos na
constância da união, mas com proventos exclusivos da venda de bens particulares
de um dos cônjuges, como bens sujeitos a meação, eis que nesse caso houve mera
sub-rogação de patrimônio e não aquisição, porém, o ônus da prova, em
consonância ao que vem sendo decidido, continuará invertido.
Ao que tange o direito sucessório no
regime de separação obrigatória de bens, a incidência da súmula 377 do STF
também vem sendo, gradualmente, aplicada no caso de falecimento de qualquer um
dos cônjuges, na existência de herdeiros universais.
Em contrapartida, é importante lembrar da
existência de nova corrente jurisprudencial entendendo que, em razão da
existência do pacto antenupcial, que declara a vontade das partes em uma
separação obrigatória de bens, o cônjuge não seria herdeiro ou meeiro em
hipótese alguma, se assim previamente definido em pacto.
Essa vertente baseia-se no argumento de
ser lícito aos nubentes celebrarem, através do pacto antinupcial (art. 1.653
C.C), a livre disposição de seus bens em acordo com seus interesses, salvo se
houver confronto com as disposições legais. Sendo assim, os consortes não
podem, mediante pacto antinupcial, afastar a incidência do CC 1.641, o qual
determina os casos que serão observados o regime de separação obrigatória,
todavia, podem, sim, afastar a incidência da Súmula 377, tratando-se de
elemento da autonomia da vontade com eficaz mecanismo de gestão patrimonial que
deverá ser respeitado pelo Poder Judiciário, caso exista.
O Tribunal de Justiça do Estado do Rio de
Janeiro, na Apelação Cível n.º 2007.001.24640, também ao posicionar-se
sobre a atual súmula do art. 377, declarando nula a transferência de dinheiro
do falecido à ex-cônjuge, em observância a parte disponível para resguardo do
valor dos herdeiros necessários, expôs a sua orientação sobre o pacto
antinupcial, transcrevendo parte do julgado, abaixo:
“Não havendo pacto antenupcial firmado
pelos cônjuges, todos os bens adquiridos por um ou ambos os cônjuges, se
comunicam, mesmo no regime de separação legal de bens, porque apenas os bens
anteriores ao casamento são incomunicáveis.
As doações, ou presentes, não podem
servir de disfarce para burlar a restrição contida na lei material civil. A
frieza da Lei Material Civil deve ser seguida pelos estudiosos de aplicadores
de Direito
(...).
Dessa forma, deve haver a devolução por
parte da ré/2ª apelante, de metade de todo valor em dinheiro que lhe foi doado
(...)”
Segundo
pesquisa realizada em 2012 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), os casamentos no Brasil duram, em média, 15 anos. Se comparadas com
levantamentos anteriores, quando o tempo médio era de 17 anos, registra-se que
as uniões no país estão menos duradouras.
Enunciado 262 do Conselho de Justiça
Federal, aprovado na III Jornada de Direito Civil: “A obrigatoriedade da
separação de bens, nas hipóteses previstas nos incs. I e II do art. 1641 do
Código Civil, não impede a alteração do regime, desde que superada a causa que
o impôs”.
RE 8.984/51 – Ementa: “O regime Legal de
Separação Patrimonial não proíbe que os cônjuges se associem , e reúnam
os bens adquiridos por sua atividade comum”
Precedentes: EREsp 1171820/PR, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 26/08/2015, DJe 21/09/2015;
AgRg no AREsp 675912/SC, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 02/06/2015, DJe 11/06/2015;
REsp 1403419/MG, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS
CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/11/2014, DJe 14/11/2014;
REsp 1369860/PR, Rel. Ministro SIDNEI BENETI,
Rel. p/ Acórdão Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado
em 19/08/2014, DJe 04/09/2014; REsp 646259/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em
22/06/2010, DJe 24/08/2010.
A clausula geral de “comunhão plena de vida”, como norma-princípio que remete as relações familiares a seus valores éticos e afetivos aparece, de logo, inserida no primeiro artigo do Livro de Direito de Família (artigo 1.511 do Código Civil), a dizer que “o casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade dos direitos e deveres dos cônjuges STJ, AgRg no AREsp 650.390/SP, Rel. ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/10/2015, DJe 03/11/2015. (Pedro Henrique de Almeida Alves, em artigo “A comunhão de bens nos regimes de separação obrigatória: um grande paradoxo”, publicado em junho de 2017 no site jus.com.br, acessado em 22.04.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art.
1.641. É obrigatório o regime da separação de
bens no casamento:
I –
das pessoas que o contraírem com inobservância das
causas suspensivas da celebração do casamento;
II –
da pessoa maior de setenta anos;
III
– de todos os que dependerem, para casar, de suprimento
judicial.
Segundo
o lecionar dos autores Luiz Paulo Cotrim
Guimarães e Samuel Mezzalira, as causas suspensivas do casamento encontram-se
listadas no CC 1.523. são causas que impõem, nos termos do artigo comentado, o
regime da separação de bens, com a finalidade de se evitar a confusão
patrimonial que ocorreria se o viúvo ou o divorciado viessem a se casar antes
de realizada a partilha de bens de seu cônjuge anterior. Com o mesmo objetivo,
impõe-se a separação de bens ao casamento do tutor ou curador e seus
descendentes, ascendentes, irmãos, cunhados ou sobrinhos, com a pessoa tutelada
ou curatelada, enquanto não cessar a tutela ou curatela e não forem prestadas
as respectivas contas.
Visam, igualmente, a evitar a confusão de sangue a (turbatio
sanguinis) que poderia ocorrer caso a mulher viesse a contrair novo
matrimonio antes de 10 meses a contar da dissolução do casamento anterior por
morte, divórcio ou anulação.
A imposição do regime da separação de bens aos maiores de
70 anos é tida como inconstitucional, por contrariar os arts. 1º, III, e 5º, I
da CF. Neste sentido, há diversos julgados: TJSP, Ap. Cív. 007.512-4/2-00, Rel.
Des. Cezar Peluso, j. 118.08.1998, Revista Brasileira de Direito de Família 1/98;
TJMG, Ap. Cív. 243.087-4/00, Rel. Des. Lucas Sávio Gomes, j. 13.06.2002, Minas
Gerais, 18.09.2002, p. 1. A doutrina pronuncia-se igualmente neste sentido. Por
todos Leite, Eduardo de Oliveira. Direito Civil aplicado: Direito de Família,
v. 5. São Paulo: RT, 2005, p. 301.
A idade madura não determina, por si, a incapacidade. É
grave violência à dignidade da pessoa impedir que exerça o direito à escolha do
regime de bens do casamento que pretende realizar. Se incapaz, as restrições
são maiores, chegando à nulidade absoluta do próprio matrimonio.
Dependem de suprimento judicial para casar o menor sob
tutela, o curatelado relativamente incapaz a quem seja reconhecida capacidade
matrimonial e o menor não emancipado se algum de seus pais no exercício do
poder familiar se opuser ao casamento.
A Súmula 377 do Supremo Tribunal Federal estabelece que no regime obrigatório da separação de bens, comunicam-se os bens adquiridos na constância do casamento. Esta Súmula fundamentou-se no art. 259 do Código Civil de 1916. Uma vez que tal artigo, muito criticado pela doutrina de então, não foi repetido no Código Civil de 2002, deveria ser tida por superada. Contudo, doutrina e jurisprudência continuam a admiti-la. (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, apud Direito.com, comentários ao CC 1.641, acessado em 22.04.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Segundo o Histórico, o presente dispositivo, no texto original do projeto, mantido inicialmente pela Câmara dos Deputados, tinha a seguinte redação: “É obrigatório o regime da separação de bens no casamento, sem a comunhão de aquestos: (...) II — do maior de sessenta e da maior de cinquenta anos”. Foi posteriormente emendado pelo Senado Federal, para o fim de ajustá-lo aos ditames do art. 52, inciso 1. da Constituição, de modo a igualar o limite de idade do homem e da mulher quanto à obrigatoriedade do regime de separação de bens. Em outra emenda, realizada na fase final de tramitação do projeto perante a Câmara dos Deputados, foi alterado o caput do dispositivo, para suprimir a sua parte final: sem a comunhão de aquestos. constando da respectiva justificativa que, “em se tratando de regime de separação de bens, os aquestos provenientes do esforço comum devem se comunicar, em exegese que se afeiçoa à evolução do pensamento jurídico e repudia o enriquecimento sem causa, estando sumulada pelo Supremo Tribunal Federal (Súmula 377)”.
Daí a Doutrina com os comentários finais do Deputado Ricardo Fiuza • A redação original do projeto, aprovada inicialmente pelo Senado Federal, vedava expressamente a comunicação dos bens adquiridos durante o casamento, no regime obrigatório da separação de bens.
• Na fase final de tramitação do projeto, perante a Câmara dos Deputados. foi suprimida aquela vedação expressa. Tal supressão foi embasada na Súmula 377 do STF: “No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento”, e teve a finalidade de evitar o enriquecimento ilícito daquele que tem os bens em seu nome, embora as respectivas aquisições sejam provenientes de esforço comum.
• Doutrinariamente, a modificação teve fundamento na lição de Washington de Barros Monteiro, que entende ser acertado, diante do estabelecimento de sociedade de fato ou comunhão de interesses, a comunicação dos bens adquiridos pelo esforço comum, já que “não há razão para que os bens fiquem pertencendo exclusivamente a um deles, desde que representam trabalho e economia de ambos” (Curso de direito civil, 36. cd., São Paulo, Saraiva, 2001, p. 184).
•
A manutenção do inciso II foi justificada pelo Senador Josaphat Marinho não em
razão de suspeita de casamento por interesse, nem de espírito patrimonialista,
mas de prudência legislativa em favor das pessoas e de suas famílias ,
considerando a idade dos nubentes. (Direito
Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 840, apud Maria Helena Diniz Código
Civil Comentado já impresso pdf 16ª
ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 22/04/2021, corrigido e aplicadas as devidas
atualizações VD).
Segundo Thiago Felipe Vargas Simões, estabelece o artigo 1.641, II do Código Civil, com nova redação dada pela Lei n.º 12.344, de 09 de dezembro de 2010: O Supremo Tribunal Federal, diante da possibilidade de alguns que estivessem munidos de má-fé, agindo dolosamente para enriquecer-se ilícita e desproporcionalmente, editou a Súmula 377, enunciando que:
“No
regime da separação legal de bens comunicam-se aos adquiridos na constância do
casamento.”
Paulo Lôbo, tratando do tema em voga diz, mesmo se apenas um dos nubentes estiver com mais de 60 anos, obrigatório será o regime da separação de bens. Expõe ainda que “essa hipótese é atentatória ao princípio constitucional da pessoa humana, por reduzir sua autonomia como pessoa e constrangê-lo a tutela reducionista, além de estabelecer restrição à liberdade de contrair matrimônio, que a Constituição não faz. Consequentemente, é inconstitucional esse ônus.”.
Já para Francisco José Cahali, “ao deixar o novo Código de reproduzir a nefasta disposição que se continha no art. 259 do Código revogado, a Súmula 377 do STF, originada na interpretação daquela previsão, deixará de ter aplicação. (…). Esse entendimento funda-se no fato de que a inclusão ou exclusão de bens na comunhão representa tipicamente efeito próprio de determinado regime patrimonial, no caso, de separação obrigatória.”.
De certo que a questão suscita divergências e enfoques doutrinários que
os justifiquem. Todavia, um ponto importante não pode passar em branco: a
violação de princípios tratados nos artigos 1º, III (da dignidade da pessoa
humana), 3º, I (da solidariedade – haja vista a República brasileira objetivar
a construção de uma sociedade justa, livre de preconceitos e solidária) e 5º, I
e X, todos da Constituição Federal.
A jurisprudência vem se manifestando da seguinte forma:
“CASAMENTO.
SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA. SÚMULA Nº 377, DO STF. PRECEDENTES DO STJ. Recurso provido para admitir a comunhão de aquestos, mesmo em regime de
separação obrigatória, pelo simples fato de terem sido adquiridos na constância
do casamento, não importando que hajam resultado ou não do esforço
comum”. (TJSP; APL-Rev 176.318.4/6; Ac. 3362670; São Paulo; Décima
Câmara de Direito Privado; Rel. Des. Octavio Helena; Julg. 04/11/2008; DJESP
12/01/2009);
Parece-nos que a Súmula 377 do
STF num ponto age com justiça e, noutro, com grande injustiça: a) no
primeiro, faz justiça ao determinar a comunhão dos bens adquiridos no curso da
união familiar, determinando sua partilha, evitando-se, assim, o enriquecimento
indevido e; b) no segundo, comete injustiça ao considerar
(implicitamente) que pessoa maior de 70 anos (considerado absolutamente capaz
para a prática de diversos atos da vida civil) é incapaz de escolher livremente
um dos regimes patrimoniais que julgue melhor atender suas expectativas. (Thiago Felipe Vargas
Simões, Advogado
no ES; Mestre e Doutorando em Direito Civil pela PUC/SP; Membro e Diretor do
Conselho Científico do IBDFAM/ES – Instituto Brasileiro de Direito de Família; Acessado
no site ambitojurídico.com.br/edições em 22/04/2021, corrigido e aplicadas as
devidas atualizações VD).
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