Código Civil Comentado – Art. 233
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Parte Especial Livro I Do Direito Das Obrigações
Título I Das Modalidades Das Obrigações
Capítulo I Das Obrigações de Dar
Seção I - Das Obrigações de Dar Coisa Certa
(arts.
233 até 242)
Art. 233. A
obrigação de dar coisa certa abrange os acessórios dela embora não mencionados,
salvo se o contrário resultar do título ou das circunstâncias do caso.
O
conceito doutrinário passado pelo relator, Ricardo Fiuza, é tal: Obrigação
de dar: Na clássica definição de Clóvis Beviláqua “é aquela cuja prestação
consiste na entrega de uma coisa móvel ou imóvel, seja para constituir um
direito real, seja somente para facultar o uso, ou ainda, a simples detenção,
seja finalmente, para restitui-la ao seu dono. A definição compreende duas espécies
de obrigações: a de dar, propriamente dita, e a de restituir (Direito das
obrigações, 8. ed., Rio de Janeiro, Paulo de Azevedo, 1954, p. 54). O
conceito pode ser resumido em uma única frase: é a obrigação de efetuar a
tradição.
Obrigação
de dar coisa certa: Se o objeto da prestação já estiver
certo e determinado, ter-se-á que a obrigação é de dar coisa certa, em que o
devedor não se desobrigará oferecendo outra coisa, ainda que mais valiosa,
conforme já dispunha o art. 863 do Código Civil de 1916 (Princípio da
Identidade da Coisa Certa).
O
preceito contido no art. 233 não inova o direito anterior. Trata-se de
aplicação da regra geral do direito romano “acessorium sequitur principale”
expressa no art. 59 do Código Civil de 1916, segundo o qual o acessório tem o
mesmo destino do principal. Havendo uma obrigação de dar coisa certa, enfatiza
Carvalho Santos, “lógico e racional é que o obrigado faça a entrega dessa coisa
ao credor em toda a sua integridade, tal como se apresenta para servir à sua
destinação. A coisa, portanto, deve ser entregue com todas as suas partes
integrantes. Vale dizer: tudo aquilo que, conforme o uso local, constitui um
elemento essencial da coisa e que desta não pode ser separado sem a destruir,
deteriorar, ou alterar (Cód. Civil Suíço, art. 642)” (J. M. de Carvalho
Santos, Código Civil brasileiro interpretado, 10. ed., Rio de Janeiro,
Freitas Bastos, 1976, v. 11, p. 28).
O
próprio artigo, no entanto, excetua a regra de acordo com a natureza do
contrato ou as circunstâncias do caso, elementos aferíveis pelos usos e
costumes locais ou ainda pelo comportamento anterior dos contraentes. Além do
mais, os acessórios que forem acrescidos à coisa durante o período em que ela
estiver com o devedor pertencerão a ele, que poderá inclusive exigir aumento do
preço para entregar a coisa (v. Art. 237), salvo se houver previsão em
contrário no contrato. (Direito Civil -
doutrina, Ricardo Fiuza – Art. 233, p. 138-139, apud Maria Helena Diniz
Código Civil Comentado já impresso
pdf. Vários Autores 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 15/03/2022, corrigido e
aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).
A
introdução e conceito do novo assunto em pauta, é passada de forma clara e
concisa pelo autor Hamid Charaf Bdine Jr, nos comentários ao CC art.
233, p. 183-186 do Código Civil Comentado, Doutrina e Jurisprudência,
da seguinte forma:
Introdução.
Conceito. A obrigação é a relação jurídica por intermédio da qual o sujeito
passivo (devedor) se obriga a dar, fazer ou não fazer alguma coisa (prestação)
em benefício do sujeito ativo (credor). Seus elementos são as partes, a
prestação e o vínculo jurídico. A prestação é sempre uma conduta do devedor.
Terá natureza patrimonial e consistirá em um dar, fazer ou não fazer. Renan
Lotufo, invocando lição de Clóvis Beviláqua, afirma que “o fundamento das
obrigações é a boa-fé”, sob pena de “funestas consequências pela falta de
confiança mútua entre as pessoas” (Código Civil comentado. São Paulo,
Saraiva, 2003, v. II, p. 1). Em razão desse fundamento é que as obrigações não
podem ser vistas apenas sob o aspecto do interesse do credor à satisfação de seu
crédito, nem como um vínculo que leva à submissão absoluta do devedor. Sua
concepção contemporânea leva em consideração os interesses do devedor na
satisfação de sua dívida, conduzindo a uma visão dinâmica, e não estática, da
relação jurídica. A obrigação deve ser vista como uma relação complexa, que
compreende interesses recíprocos em evolução, de modo que se desenvolvam na
direção da satisfação da prestação (cf. a obra de Clóvis do Couto e Silva. A
obrigação como processo. São Paulo, José Bushatsky Editor, 1976). Ainda segundo
Renan Lotufo, “o contrato, tal qual a obrigação, relação jurídica complexa, é
um processo que, como ensina o eminente professor Clóvis do Couto e Silva, tem
dinamismo e somente chegará ao seu bom êxito se contar com a colaboração leal
dos dois participantes. Não há mais, segundo o novo Código, o velho
protagonista ‘contratante’, mas os contratantes, em constante interação, com
respeito à posição e aos interesses de cada um” (op. cit., p. 10). No campo das
obrigações, o credor poderá exigir a prestação do devedor e, se este último não
adimpli-la espontaneamente, poderá também exigir judicialmente seu efetivo
cumprimento ou indenização por perdas e danos que será suportada por seu
patrimônio (arts. 389 e 391 do CC). Essa distinção entre a conduta devida e a
responsabilidade oriunda do inadimplemento é consagrada pela teoria dualista,
que se contrapõe à unitária e pode ser identificada nos casos de obrigações com
garantia fidejussória prestada por terceiro - em que se pode verificar que o
patrimônio do devedor da obrigação (o locatário, por exemplo) não é o único
sobre o qual podem recair as consequências do inadimplemento (pois também
poderá ser alcançado o patrimônio do fiador) (cf. a propósito das mencionadas
teorias Varela, João de Matos Antunes. Obrigações em geral. Coimbra, Almedina,
2000, v. I, p. 143-57). No direito das obrigações, o vínculo se estabelece
entre as pessoas, embora seu conteúdo seja patrimonial, diversamente do que
ocorre com os direito reais, em que a relação jurídica se estabelece, em
primeiro lugar, entre o titular do direito e o bem e, posteriormente, atinge as
pessoas obrigadas a respeitá-la. Fontes das obrigações são os atos ou fatos de
onde elas se originam, ou, na lição de Orlando Gomes, “o fato jurídico ao qual
a lei atribui o efeito de suscitá-la”, pois, prossegue, “entre a lei, esquema
geral e abstrato, e a obrigação, relação jurídica singular entre pessoas,
medeia sempre um fato, ou se configura uma situação, considerando idôneo pelo
ordenamento jurídico para determinar o dever de prestar” (Obrigações.
Rio de Janeiro, Forense, 1986, p. 31). As leis são sempre a fonte imediata das
obrigações, enquanto fontes mediatas são fatos ou situações capazes de
produzi-las. O Código Civil em vigor não disciplinou as fontes das obrigações.
Contudo, a partir da definição adotada, podemos identificar os contratos, os
atos unilaterais e os atos ilícitos entre as fontes disciplinadas por ele, sem
prejuízo, porém, da existência de outras que possam subsumir no conceito estabelecido
(Monteiro, Washington de Barros. Curso de direito civil, 1ª parte, 32.
ed., atualizada por Carlos Alberto Dabus Maluf. São Paulo, Saraiva, 2003, v.
IV, p. 42-4). Após a disciplina das modalidades, o Livro “Do Direito das
Obrigações” disciplinou a transmissão, o adimplemento e o inadimplemento das
obrigações e suas consequências. No Título I, do Livro I, estão disciplinadas
as modalidades das obrigações, que correspondem a um critério de classificação,
e verificam-se as consequências estabelecidas a partir dessa classificação.
Classificação. Importa registrar, de início, que o interesse cia classificação
das obrigações resulta da possibilidade de, a partir dela, reduzi-las a alguns
poucos grupos com características semelhantes, de modo a tornar possível
invocar os princípios aplicáveis a cada um deles e simplificar as soluções para
as questões que suscitam (Pereira, Caio Mário da Silva. Instituições de
direito civil, 20. ed., atualizada por Luiz Roldão de Freitas Gomes. Rio de
Janeiro, Forense, 2003, v. II, p. 45). Adotando-se o critério utilizado por
Maria Helena Diniz (Curso de direito civil, 16. ed. São Paulo, Saraiva, 2002,
v. II, p. 49), as obrigações podem ser classificadas segundo os critérios
seguintes:
Consideradas
em si mesmas: a) quanto ao vínculo: civil, moral ou natural; b) quanto à
execução: simples, cumulativa, alternativa ou facultativa; c) quanto ao tempo
do adimplemento: instantânea, continuada ou diferida; d) quanto ao fim: de
meio, de resultado ou de garantia; e) quanto aos elementos acidentais:
condicional, modal ou a termo; f) quanto à pluralidade de sujeitos: divisível,
indivisível ou solidária; e g) quanto à liquidez do objeto: líquida e ilíquida.
Consideradas
umas em relação às outras, isto é, de modo recíproco, as obrigações serão
acessórias ou principais.
A
obrigação de dar, objeto do artigo cm exame, tem natureza positiva, exigindo
que o devedor pratique uma conduta, e não que se omita. Quando seu objeto for
coisa certa (móvel ou imóvel), como é o caso deste dispositivo, o devedor só
satisfaz a prestação se entrega ao credor o bem especificamente individuado
pelas partes. Como ensina Renan Lotufo, a coisa é certa quando em sua
identificação houver indicação da quantidade, do gênero e de sua individuação,
que a torne única (op. cit., p. 17). Desse modo, não há possibilidade de a
escolha do bem se verificar em momento posterior ao surgimento da obrigação. A
entrega do bem pode se destinar a transferir o domínio, assegurar o uso
(entregar) ou restituir ao proprietário (Gonçalves, Carlos Roberto. Direito
civil brasileiro. São Paulo, Saraiva, 2004, v. II, p. 53). No nosso
sistema, a transmissão do domínio não se aperfeiçoa com a criação da obrigação,
sendo indispensável que se verifique o registro, para os imóveis (arts. 1.227 e
1.245), e a tradição, para os móveis (arts. 1.226 e 1.267), o que revela a
importância do dispositivo em exame. Na lição de Carlos Roberto Gonçalves, “a
obrigação de dar coisa certa confere ao credor simples direito pessoal (jus
ad rem) e não real (jus in re). O contrato de compra e venda, por
exemplo, tem natureza obrigacional” (op. cit., p. 43).
Do
mesmo teor: Bierambaum, Gustavo “Classificação: obrigações de dar, fazer e não
fazer”. Obrigações: estudos na perspectiva civil-constitucional, coord.
Gustavo Tepedino. Rio de Janeiro, Renovar, 2005, p. 123, que acrescenta que a
obrigação, por si só, não cria direito erga omnes. Assim, o credor da obrigação
de dar coisa certa que não tenha tido anterior posse do bem ou que não for seu
proprietário não se pode valer de demandas possessórias ou dominiais para
recuperá-lo. No entanto, poderá se valer de ação destinada a obrigar o devedor
a entregar-lhe o bem (arts. 461-A e 621 a 628 do CPC (vide abaixo distinções do
CPC/2015 – Nota VD), como decorrência da obrigação assumida. No caso do
art. 461-A CPC/1973, que corresponde ao 498 parágrafo único no CPC/2015, o
pedido é de condenação na entrega de coisa certa formulado por quem não dispõe
de título executivo. Na hipótese do art. 621 do Código de Processo Civil/1973,
correspondendo no CPC/2015, aos art. 806 a 810, Nota VD), o credor
dispõe do título extrajudicial. Tais dispositivos viabilizaram ao credor de
obrigação de dar coisa certa a possibilidade de obtê-la diretamente, fazendo
valer a força obrigatória que do contrato resulta. A obrigação só se converterá
em perdas e danos se o credor a requerer ou se a tutela específica ou a
obtenção do resultado prático correspondente for impossível (arts. 461, § 1º, e
461-A, § 3º, do CPC/1973, correspondendo no CPC/2015, aos arts. 498 parágrafo
único e 538, § 3º). Neste sentido lecionam Carlos Roberto Gonçalves (op. cit.,
p. 43-5) e Everaldo Augusto Chambler (Comentários ao Código Civil brasileiro.
Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. III, p. 60-4). Acrescente-se que tal espécie
de providência já havia sido prevista no art. 83 do Código de Defesa do
Consumidor. Se o bem cuja entrega foi prometida ao credor vier a ser
novamente alienado a terceiro, que efetivamente adquire o domínio pela tradição
ou pelo registro, o primeiro adquirente não poderá exigi-lo, porque seu direito
pessoal não poderá se opor ao direito real do segundo adquirente (Gonçalves,
Carlos Roberto. Op. cit., p. 45). No entanto, caso haja má-fé do terceiro,
poder-se-á sustentar a proteção do direito do primeiro, levando-se em conta a
função social dos contratos e a boa-fé objetiva, consagradas nos arts. 421 e
422 do Código Civil. É o que se pode extrair da lição de Antonio Junqueira de
Azevedo em parecer publicado na Revista dos Tribunais, n. 750, p. 113:
“A responsabilidade do terceiro é, pois, aquiliana. ‘Efetivamente, se um
contrato deve ser considerado como fato social, como temos insistido, então a
sua real existência há de impor-se por si mesma, para poder ser invocada contra
terceiros, e, às vezes, até para ser oposta por terceiros às próprias partes.
Assim é que não só a violação de contato por terceiro pode gerar
responsabilidade civil deste (como quando terceiro destrói a coisa que devia
ser prestada, ou na figura da indução ao inadimplemento do negócio jurídico alheio),
como também terceiros podem opor-se ao contrato, quando sejam por ele
prejudicados (o instituto da fraude contra terceiros é exemplo típico disso)’
(Fernando Noronha. O direito dos contratos e seus princípios fundamentais. São
Paulo, Saraiva, 1994, p. 119)”. E ainda: “Não é possível que, ao final do
século XX, os princípios de direito contratual se limitem àqueles da survival
of the fittest (sobrevivência do mais forte – Nota VD), ao gosto de
Spencer, no ápice do liberalismo sem peias; seria fazer tabula rasa de tudo que
ocorreu nos últimos cem anos. A atual diminuição do Estado não pode significar
a perda da noção, conquistada com tanto sofrimento, de tantos povos e de tantas
revoluções, de harmonia social. O alvo, hoje, é o equilíbrio entre sociedade,
Estado e indivíduo. O contrato não pode ser considerado como um ato que somente
diz respeito às partes; do contrário voltaríamos a um capitalismo selvagem, em
que a vitória é dada justamente ao menos escrupuloso” (trecho extraído da p.
119). Nas hipóteses em que o credor faz jus à entrega para poder usar o bem de
propriedade do devedor (locação) ou para recuperá-lo em razão de sua condição
de proprietário ou de qualquer direito de que sobre a coisa disponha
(depositário) - e não para adquirir a propriedade -, será possível que ele se
valha da mesma espécie de proteção processual conferida ao adquirente (arts.
461-A e 621 a 628 todos do CPC/1973, correspondendo no CPC/2015, aos arts. 498
e 806 a 810, Nota VD), embora, em alguns desses casos, seja possível admitir
a adequação de demandas de natureza possessória ou petitória. Se a hipótese é
de credor proprietário ou possuidor, serão adequadas as ações petitórias ou
possessórias. Se o credor não é proprietário nem possuidor, utiliza-se do
procedimento previsto nos artigos mencionados - será o caso do locatário, a
quem o locador não entrega o imóvel locado. O art. 233 assegura que os
acessórios do bem objeto da prestação estarão abrangidos pela obrigação
assumida. Assim, ao devedor cumprirá entregar ao credor os acessórios do bem
que é objeto da obrigação. Imagine-se que alguém aliena ao comprador um terreno
sobre o qual há uma edificação, sem que da matrícula ou da escritura conste a
construção. Admitindo-se que a acessão seja acessório do solo (arts. 79 e 92 do
CC), ela deverá seguir o destino deste, transferindo-se ao adquirente, que se
tornará proprietário do todo (solo e construção). A regra resulta do princípio
de que o acessório segue o principal - não repetido no CC/2002, diversamente do
que ocorria com o art. 59 do CC/1916, mas consagrado pela doutrina como
princípio e extraído do disposto no art. 92 do Código Civil. O dispositivo de
que ora se trata ressalva, porém, a possibilidade de o acessório não seguir o
principal: a) em razão de as partes assim haverem convencionado - o que se
insere nos limites de sua autonomia privada; e b) em virtude das circunstâncias
do caso. Nesta última situação estaria incluída a hipótese em que os acessórios
tivessem sido, temporariamente, separados do bem principal. Caso isso se tenha
verificado, as circunstâncias deverão ser examinadas para que seja possível
concluir se os acessórios devem ou não seguir o principal. O art. 575 do Código
Civil argentino expressamente inclui os acessórios temporariamente afastados do
bem principal entre os que acompanham o principal (Cambler, Everaldo Augusto.
Op. cit., p. 61). O Código Civil brasileiro, porém, no art. 233, permite que as
circunstâncias de cada caso sejam avaliadas para que se conclua se o acessório
destacado segue ou não o bem principal a ser entregue. O tema em exame remete
ao tratamento dado às pertenças pelo art. 94 do Código Civil - pertenças são
bens que não constituem parte integrante do principal, mas se destinam de modo
duradouro a seu uso, serviço ou aformoseamento. Nesse dispositivo, há ressalva
expressa no sentido de que as pertenças (acessórios que são) não seguem o bem
principal, se o negócio jurídico só diz respeito a este. Dessa forma, as
pertenças são exceção à regra do art. 233, pois, no que se refere a elas, somente
disposição expressa fará com que estejam abrangidas pelo negócio que tenha por
objeto o bem principal. Interessante exemplo a respeito pode ser constatado no
caso de alienação de imóvel rural em que o vendedor se compromete a entregar
não apenas o imóvel, mas também os animais e as máquinas que nele se encontram
(as pertenças) - negócio que na prática comercial é denominado “venda de
porteira fechada”. Nessa espécie de transação, não havendo menção expressa às
pertenças, somente o imóvel terá sido alienado, sem que ao negócio se aplique a
disposição prevista nesse artigo. Os acessórios a que se refere o artigo cm
exame, segundo Renan Lotufo, que invoca Mário Júlio de Almeida Costa, não se
resumem aos que se vinculam à coisa, mas também aos relacionados ao
comportamento do devedor (op. cit., p. 18). Segundo o ilustre comentarista,
entre os acessórios da obrigação estariam os deveres anexos oriundos da boa-fé
objetiva (ver comentário ao art. 422). Dessa forma, seriam deveres acessórios
do devedor: guardar a coisa vendida, embalá-la, transportá-la, fornecer
informações necessárias etc. (obra e local citados). (Hamid Charaf Bdine Jr, nos
comentários ao CC art. 233, p. 183-186 do Código Civil Comentado,
Doutrina e Jurisprudência, Lei n. 10.406 de 10.01.2002, Coord. Ministro Cezar
Peluzo Código Civil Comentado Cópia pdf, vários Autores: contém o Código Civil
de 1916 - 4ª ed. Verificada e atual. - Barueri, SP, ed. Manole, 2010. Acessado
em 15/03/2022, corrigido e aplicadas as devidas atualizações. Nota VD).
Segundo
orientação dos autores Sebastião de Assis
Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito
Civil, para melhor compreensão do direito obrigações, é necessário que se
tenha noção da sua abrangência no campo do direito em geral – e não só do
direito civil.
A importância do estudo das obrigações é evidente: os
fatos jurídicos ocorrem e, deles, como é cediço, criam-se, transferem-se,
modificam-se, extinguem-se direitos; em se criando direito subjetivo para
alguém, a ele, comumente, costuma corresponder a necessidade do cumprimento de
um dever por outrem.
A esse dever (schuld) corresponde um dos principais
elementos da obrigação que, em resumo, reflete a extensão do direito do credor
sobre a pessoa do devedor.
O contrato gera obrigações; o casamento igualmente; da
mesma forma, o ato ilícito, bem como o fato gerador da obrigação tributária,
por exemplo. Para se compreender, portanto, como se criam, desenvolvem e
extinguem essas obrigações, é necessário que se tenha um regramento geral da
matéria.
Por isso, a teoria geral das obrigações, consagrada
no Livro I da Parte Especial do Código Civil de 2002, se destina a conceituar e
classificar as obrigações, além de estabelecer normas relativas aos seus
elementos essenciais e acidentais, bem como as consequências de seu cumprimento
ou descumprimento.
Em essência, o direito das obrigações pode ser subdividido
nas seguintes partes: (a) Parte geral das obrigações (arts. 233 a 420); (b)
Teoria geral dos contratos (arts. 421 a 480); (c) Contratos em espécie (arts.
481 a 853; (d) Obrigações por atos unilaterais (arts. 854 a 886; (e)
Responsabilidade civil (arts. 927 a 954); (f) Preferências e privilégios
creditórios (arts. 955 a 965).
Conceito e breve evolução histórica – Gramaticalmente, o termo obrigação advém do ato de
obrigar-se, ou seja, considera-se obrigado aquele que assume o
compromisso de cumprir uma determinada prestação a favor de outra pessoa.
Para Audry et Rau a obrigação é uma “necessidade
jurídica, por força da qual uma pessoa fica subordinada em relação à outra a
dar, a fazer ou não fazer alguma coisa” (apud Tepedino, 2000, p. 187).
Observa-se, desta concepção clássica, que o conteúdo jurídico primordial da
obrigação é a criação da prestação, a qual se subdivide, de há muito,
nos clássicos atos de dar alguma coisa, fazer algo ou deixar de
realizar alguma atividade.
Mas obrigação, em tempos primitivos, não continha os
caracteres individuais e determinados com que a conhecemos hoje. Em verdade, as
comunidades formadas nas eras mais remotas eram distribuídas por grupos de
pessoas, em regra orientadas por um líder e seu caráter era predominantemente
religioso. Por isso, não havia negociações individuais ou particulares entre os
membros dessas comunidades, pois a propriedade, em geral, era comum a todos os
seus integrantes ou se considerava pertencente ao Deus ou ao líder espiritual
(Pereira, 1978, p. 12-18).
As obrigações eram contraídas, em regra, de um grupo para
outro e o seu descumprimento, nessa era primitiva, acarretava a batalha entre
as tribos, como forma de solucionar o litígio.
No Direito romano, a herança de legislações mais antigas importou
em que, até meados do século IV a.C., a execução de uma dívida poderia se dar
sobre a disponibilidade física do corpo do devedor. É que ainda se faziam
indissociáveis as noções de delito e de descumprimento de obrigação, de tal
forma que aquele que faltava a palavra dada cometia ato delituoso e, como tal,
deveria ser punido.
Assim, o devedor que descumpria a prestação pactuada
pagava com a escravidão ou a servidão pessoa. São célebres as referências aos
casos em que, tendo vários credores, o devedor era esquartejado, sendo seu
corpo dividido em partes para cada um deles, como resultava da Tábula III da
vetusta Lei das XII Tábuas: “Tertiis mundinis partis secanto; si plus
minusve secuerunt se fraude esto”. A obrigação, portanto, naqueles tempos,
criava vínculo que submetia a pessoa do devedor ao talante do credor. (Sebastião
de Assis Neto, Marcelo de Jesus e Maria Izabel Melo, em Manual de Direito Civil, falam no
item 4.5. Perícia, Volume Único. Cap. VIII – Da Invalidade do Negócio
Jurídico, verificada, atual. e ampliada, item 1. – Noções Introdutórias
– Obrigações em geral - pp 581-582. Comentários ao CC. 233. Ed. JuspodiVm,
6ª ed., consultado em 15/03/2022, corrigido e aplicadas as
devidas atualizações VD).
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