terça-feira, 7 de janeiro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 710, 711, 712 - continua - Da Agência e Distribuição - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 710, 711, 712 - continua
- Da Agência e Distribuição - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo XII – Da Agência e Distribuição –
(art. 710 a 721) vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 710. Pelo contrato de agência, uma pessoa assume, em caráter não eventual e sem vínculos de dependência, a obrigação de promover, à conta de outra, mediante retribuição, a realização de certos negócios, em zona determinada, caracterizando-se a distribuição quando o agente tiver à sua disposição a coisa a ser negociada.

Parágrafo único. O proponente pode conferir poderes ao agente para que este o represente na conclusão dos contratos.

Do Contrato Consensual, bilateral, oneroso e intuitu personae conforme leciona Claudio Luiz Bueno de Godoy, o Código Civil de 2002, no artigo presente, seguindo a tendência de trazer ao seu texto contratos de natureza mercantil por causa do tratamento unificado que reservou ao direito obrigacional, tipificou o ajuste que denominou de agência e, como uma espécie sua, a distribuição. Definiu a agência como o contrato mercê do qual uma pessoa, com habitualidade, mas sem induzir relação de dependência ou mesmo de emprego, promove, angaria ou intermedeia negócios em benefício de outrem, em uma zona circunscrita, mediante o pagamento de uma comissão, i.é, da remuneração correspectiva.

Trata-se de contrato consensual, porque aperfeiçoado sem a exigência de forma especial; bilateral, porque, uma vez firmado, induz direitos e deveres a ambas as partes, agente e, como está na lei, proponente (a rigor preponente ou agenciado); oneroso, devido à remuneração ao agente (CC 714); e intuitu personae porquanto baseado na confiança que o preponente deposita no agente, daí dizer-se personalíssimo e intransferível. Seu objeto é o desempenho, pelo agente, de atividade voltada à obtenção ou à promoção de negócio em favor do agenciado, do preponente.

Pela habilidade, estabilidade e permanência que a caracterizam, ademais da delimitação da área de atuação do agente, a agência difere da corretagem, também uma mediação tendente a promover negócios à conta e interesse de outrem, mas sem aqueles mesmos elementos. Difere também da comissão porquanto o agente, ao contrário do comissário, não é partícipe, não contrata em seu nome o negócio fim, aquele a cuja consumação, sempre no interesse de outrem, tendem ambos os ajustes.

O grande problema, porém, que o Código Civil de 2002 acaba fomentando, sobretudo quando, no CC 721, sem maior explicitação, ressalva a aplicação, no que couber, da legislação especial, malgrado já candente a dúvida mesmo antes de sua edição, é se o contrato de agência guarda alguma relevante distinção da representação comercial, regrada na Lei n. 4.886/65, com alterações introduzidas pela Lei n. 8.420/92. Pese embora a existência de opostas opiniões a respeito, tem-se que, a rigor, apenas cuidou o Código Civil de dar nova denominação à mesma figura tipificada naquela legislação especial, seguindo a esteira de outras legislações, em especial a italiana (art. 1.742), como já se disse no comentário ao CC 693, uma fonte relevante.

Na verdade, ao que se entende, alguma diferenciação se poderia fazer se na atividade do representante comercial houvesse uma verdadeira intrínseca representação que lhe permitisse entabular os negócios que angaria ou promove em favor do representado. Mas não é o que ocorre. Ou, ao revés, tal como se prevê no parágrafo único do artigo em comento, o parágrafo único do art. 1º da Lei n. 4.886/65 prevê que a concessão de poderes de representação ao representante se dá de forma excepcional. Mais, e a reforçar a tese, a própria definição de representação comercial, no mesmo art. 1º da legislação especial, não revela nenhum traço diferencial que seja relevante em comparação ao CC 710. Em última análise, destarte, o que fundamentalmente dá conteúdo aos contratos previstos no Código Civil e na legislação especial é a mesma ideia de agenciamento de negócios, de clientes para o preponente, em troca de uma remuneração por essa atividade, que se desenvolve profissionalmente e que é, afinal, de colaboração empresarial. Aliás, a própria Lei n. 4.886/65 não deixou de aludir, logo no citado art. 1º, que o representante se incumbe de agenciar propostas ou pedidos para transmiti-los ao representado, da mesma forma que o Código Civil não se furtou a remeter à lei especial o cálculo de indenização devida em caso de dispensa do agente (CC 718).

Todavia, malgrado cuidando-se de um só contrato, a ausência de maior explicitude do Código Civil de 2002 poderá trazer questões de conflito de leis. Antes, contudo, insta acentuar que é possível a admissão, quando não houver antinomia, da coexistência de ambas as legislações, caracterizando-se o direito moderno, ou pós-moderno, como já se defende, pela multiplicidade de fontes normativas, incluída aí a pluralidade de diplomas regrando um mesmo instituto, até mesmo de forma a se complementarem mutuamente , atendidos os princípios básicos que o norteiam e o papel unificador do sistema que têm os preceitos constitucionais que sejam a propósito aplicáveis. Aliás, por vezes, o próprio Código Civil ressalvou sua simultânea aplicação com a lei especial (ver CC 718, como se acaba de afirmar, sem contar o CC 721, já colacionado). Mas, havendo conflito, considera-se que deva ser aplicada a legislação posterior (critério cronológico), dado que, quando trata do contrato de agência, o Código Civil não pode ser considerado lei geral. Assim, por exemplo, e como se verá no respectivo comentário, reputa-se prevalecente, para o caso de denúncia do ajuste firmado por prazo indeterminado, o prazo de aviso prévio estabelecido no CC 720, e não o do art. 34 da lei especial. Da mesma forma a questão da exclusividade do ajuste (ver artigo seguinte). Porém, ao revés, são plenamente compatíveis ambas as normatizações quanto à exigência de registro em órgão próprio (art. 6º da Lei n. 4.886/65) para desempenho da atividade objeto do ajuste vertente, afinal de índole profissional, ou à permissão de que a exerça também pessoa jurídica (art. 1º da Lei 4.886), o que não se explicita no CC 710 nem pode ser inferido, consoante se examinará, da previsão do CC 719.

Quanto ao contrato de distribuição, termo equívoco que, em sentido amplo, pode ser também usado para designar um gênero de que a própria agência, além da concessão comercial, seria uma espécie, junto com a franquia, inclusive, conceitua-o o atual Código, é certo, como uma verdadeira agencia, mas com uma particularidade diferencial, que está na disponibilidade, pelo agente, da coisa a ser negociada em favor ou no interesse do agenciado. Mas duas ordens de questões são suscitáveis. Uma é o que se entende por disponibilidade. Outra, consequente, é se essa distribuição, prevista no Código Civil, identifica-se com o contrato atípico de concessão comercial ou com a distribuição tratada, para os veículos automotores, na Lei n. 6.729/79.

Pela concessão comercial sempre se entendeu a atividade de alguém que adquiria, ou adquire, para revenda, produtos de um fornecedor, experimentando remuneração consistente na diferença entre o preço da compra e o da venda. É certo que a caracterizam elementos como a continuidade ou a estabilidade da relação, a que se agregam deveres complementares atinentes à preservação da própria marca do produto negociado. Para muitos, dela seria exemplo a concessão de veículos automotores, que ganhou regramento específico (Lei n. 6.729/79), identificando-se como uma distribuição que envolve a mesma aquisição, pelo distribuidor, de produtos de uma marca, para revenda, e com obrigação suplementar de manter assistência técnica, estoque de reposição de peças, tudo sob a fiscalização do fornecedor, como forma de assegurar a qualidade de sua marca. Não se nega que seja feita, por vezes, uma distinção inclusive entre a concessão comercial e a distribuição, sobretudo de veículos automotores – pese embora o que está no art. 1º da Lei n. 6.729/79, que refere mesmo uma concessão entre as partes -, que estaria na autonomia que tem o distribuidor e, ao contrário, na maior interferência do concedente na concessão comercial (ver a respeito: Sílvio de Salvo Venosa. Direito civil, 3. ed. São Paulo, Atlas, 2003, v. III, p. 635). Mas, da mesma forma, em um ou outro ajuste há a aquisição pelo concessionário ou distribuidor do bem que será revendido, dando-se, ademais, sua remuneração nunca pelo pagamento de uma comissão devida pelo fornecedor, e sim pela diferença entre o montante da compra e o da venda.

Pois o que se discute e se pergunta no Código Civil de 2002 é se a distribuição por ele tratada se amolda à figura da concessão atípica ou da distribuição já tratada, para veículos, na lei especial citada, a chamada Lei Ferrari. E se para muitos a resposta é positiva – pelo que a concessão teria ganho regramento típico ou, se se entender diversa da distribuição comercial, teria igualmente esta passado a ser contrato com tipicidade geral, não só para autos, porém acerca dos quais vigoraria a lei aqui sem dúvida especial, em relação ao Código Civil – considera-se que deva ser negativa a conclusão. Ao que parece, o Código Civil regrou o que denominou de distribuição como uma espécie determinada de agência, todavia sob o influxo dos mesmos elementos que a caracterizam. Ou seja, uma atividade de intermediação, de agenciamento, enfim, paga com uma comissão devida pelo preponente, apenas que dispondo o agente não da propriedade, mas da posse da coisa a ser negociada. Tanto assim que todas as normas subsequentes do capítulo em exame cuidam de direitos e obrigações típicas de quem chamou, unificadamente, de proponente (rectius: preponente) e agente, sem nenhuma alusão específica ao distribuidor, ou a direitos e deveres que fossem compatíveis com sua condição de proprietário da coisa a ser renegociada. Tem-se em mira, na verdade, no Código Civil atual, uma distribuição de produtos de outrem, como observa Humberto Theodoro Júnior, mas por conta alheia, por mera preposição, e não uma distribuição por conta própria, como sucede no que, a seu ver, e ao que se acede, é uma verdadeira concessão comercial (“Do contrato de agência e distribuição no novo Código Civil” In: Revista dos Tribunais, v. 812, p. 22-40). (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 730-731 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 07/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na esteira de Ricardo Fiuza, com efeito, trata-se de contrato em que o agente ou representante comercial exercita, com a devida remuneração, a promoção de negócios, à conta do agenciado ou representado, em regime de habitualidade e com autonomia nas atividades que se desenvolvem em área previamente definida de atuação.

Impende distinguir o agente do distribuidor, porquanto este último caracteriza-se como tal ao dispor o bem a ser negociado e aquele desempenha a agencia sem a disponibilidade da distribuição do referido bem.

Cumpre lembrar, afinal, a Lei n. 6.729/79, versando sobre a distribuição, embora no objeto restrito da concessão comercial de veículos automotores de via terrestre e a Lei n. 8.132/90, que produziu alterações. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 378 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 07/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Bem discriminados Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, 1) Contrato de agência e distribuição ou contrato de representação comercial. O Código Civil de 2002 regulou o contrato de agência e distribuição como se ele já não tivesse regulação própria na legislação especial. O contrato de agência e distribuição, no entanto, corresponde ao contrato de representação comercial regulado pela Lei n. 4.886/65, que continua em vigor, com as derrogações operadas pelo Código Civil de 2002, como ensina Humberto Theodoro Júnior, mencionado por neste artigo por Claudio Luiz Bueno de Godoy, mas não estendido:

Todas as regras especiais, que a lei 4.886 traçou para disciplinar a profissão e os direitos e deveres do representante comercial, em princípio, continuam em vigor, porque o Código Civil traçou apenas normas gerais acerca do contrato de agência (Lei de Introdução, art. 2º, § 2º). É, aliás, o que se acha ressalvado, expressamente, no CC 721, de tal sorte, apenas quando alguma norma do Código estiver conflitando com preceito da Lei 4.886 é que terá ocorrido derrogação parcial desta” (Humberto Theodoro Júnior. Do contrato de agência e distribuição no novo Código Civil. Revista dos Tribunais, São Paulo, ano 92, v. 812, junho 2003, p. 25).

Humberto Theodoro Júnior e Sílvio de Salvo Venosa dão a entender que no artigo 710 do Código Civil encontram-se caracterizadas duas espécies contratuais: “agência” e “distribuição”. No entanto, trata-se de um único contrato: “contrato de agência e distribuição” que, no entendimento de Agostinho Alvim, era inominado (?), embora de largo uso no comércio. Ao que parece, estranhamento, o autor desta parte do Código Civil de 2002 não identificou este contrato com o contrato de representação comercial (Direito das obrigações: exposição de motivos. In Revista do Instituto dos Advogados Brasileiros, n. 24, Rio de Janeiro, 1972, p. 73), resultando deste equívoco a duplicidade de fontes existentes desde a entrada em vigor do Código Civil de 2002. O CC 710 corresponde ao artigo 1º da Lei n. 4.886/65 (com as alterações da Lei n. 8.420/92), que deve se entender derrogado.

São partes do contrato de agência: 2) agente (representante) e proponente (representado). O agente deve ser registrado no Conselho Regional dos Representantes Comerciais (art. 6º, Lei n. 4.886/65). Não podem ser agentes (art. 4º da Lei n. 4.886/65): a) os que não podem ser comerciantes (cf CC 972); b) o falido não reabilitado; c) o condenado por crime contra o patrimônio e por crimes punidos com a perda de cargo público e d) o que tenha tido o registro comercial cancelado como penalidade.

O contrato de agência tem como características a tipicidade, bilateralidade, onerosidade, consensualidade e é de execução continuada.

Mediante o contrato de agência o agente ou representante encarrega-se de angariar negócios em determinada zona territorial, em nome do proponente ou representado, segundo as instruções deste, mediante remuneração. Os negócios são angariados e realizados diretamente pelo proponente ou por intermédio do representante comercial mediante mandato, conforme o parágrafo único do CC 710.

Não é exigida forma escrita, contudo, se for escrito, deve conter obrigatoriamente as cláusulas enumeradas do art. 27 da Lei n. 4.886/65, entre as quais (a doutrina entende que a ausência de tais estipulações não anula o contrato; por todos: Sílvio de Salvo Venosa, Direito Civil, v. III. São Paulo: Atlas, 2001, p. 451/2): a) descrição das mercadorias; b) o prazo (determinado ou indeterminado); c) região onde será exercida a representação; d) existência, ou não, de exclusividade; e) indenização devida ao representante em caso de rescisão.

Descaracterizando o contrato de agência, cabe configurar o contrato de trabalho se: a) o agente não for registrado (art. 2º; RO 254/88, 1ª Turma, TRT 3ª Região, rel. Juiz Luiz Carlos da Cunha Avelar, 01.07.88); b) o proponente supervisiona diretamente o trabalho do agente, exige exclusividade, reuniões e vistas obrigatórias a clientes previamente relacionados (RO 2.574/89, 1ª Turma, TRT, 3ª Região, Rel. Juiz Aguinaldo Poliello, 18.05.90); c) a prestação de serviços for pessoal, permanente, subordinada e remunerada, não obstante a existência de contrato formal de prestação de serviço autônomo (RO 6.788/89, 3ª Turma, TRT 3ª Região, rel. Juiz Antônio Álvares da Silva, 21.09.90). (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 07.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 711. Salvo ajuste, o proponente não pode constituir, ao mesmo tempo, mais de um agente, na mesma zona, com idêntica incumbência; nem pode o agente assumir o encargo de nela tratar de negócios do mesmo gênero, à conta de outros proponentes.

Sob o prisma de Claudio Luiz Bueno de Godoy, o artigo presente consagra a regra da exclusividade, e recíproca, no contrato de agência e distribuição, ademais presumida, se não houver cláusula em contrário, o que significa inovação no sistema. É certo que a lei dos representantes comerciais já continha preceito alusivo à exclusividade – remetendo-se o leitor ao comentário ao artigo anterior para exame da controvérsia sobre se se agitava do mesmo ajuste versado aqui no Código Civil. Porém, os arts. 27, i, e 31 da Lei n. 4.886/65 referiam-se a uma exclusividade do exercício da representação em favor do representante, e tão somente se assim se tivesse ajustado. Ou seja, a exclusividade não era nem recíproca nem presumida. Agora, ao revés, dispõe-se, para os contratos de agência ou distribuição, que, se não houver cláusula em contrário, a exclusividade se presume, e não só mais do representante, todavia também em benefício do representado.

Quer dizer que, em determinada zona, e para um mesmo tipo de negócio, em regra não poderá o preponente nomear mais de um agente para agir por sua conta, como não poderá o agente aceitar o mesmo encargo para atuar em favor de mais de um preponente (v. artigo anterior sobre essa denominação). A quebra da exclusividade por qualquer uma das partes, como de resto já se previa na lei especial (art. 36, b), autoriza a resolução do ajuste por inadimplemento culposo, sujeitando o inadimplente à composição de perdas e danos, a propósito valendo remissão ao quanto se contém na disposição do CC 714, adiante comentado. Aplica-se esse preceito também para o caso de o preponente ter realizado diretamente o negócio incumbido ao agente, naquela zona, o que, se para muitos não representa afronta à exclusividade (v.g., Orlando Gomes. Contratos, 9. ed. Rio de Janeiro, Forense, 1983, p. 415), pode, na reiteração, levar à dispensa indireta, de que cuida o CC 715, parte final, do Código Civil.

A zona de atuação do agente, com exclusividade, na ausência de previsão em contrário, deve ser compreendida como uma base territorial, mas, como observa Fábio Ulhoa Coelho, também um mercado com clientela específica e perfil determinado, podendo-se excluir, por exemplo, negócios entabulados por via eletrônica ou com um mesmo grande empresário, para suprimentos diversos (Curso de direito comercial, 3. ed. São Paulo, Saraiva, 2002, v. III, p. 114).

Por fim, diga-se que se, como se sustentou no comentário ao artigo antecedente, o Código Civil tratou da mesma representação comercial que estava na Lei n. 4.886/65. Sobre ela prevalece no caso de conflito de disposições, portanto a partir do atual Código presumindo-se a recíproca exclusividade, no silêncio do contrato. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 732 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 07/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na doutrina de Ricardo Fiuza, Maria Helena Diniz, enfrentando o tema, depõe com verticalidade: “(...) o proponente não poderá constituir, salvo ajuste em contrário, ao mesmo tempo, mais de agente, na mesma zona, é com Idêntica incumbência, nem tampouco poderá o agente assumir o encargo de nela tratar de negócio do mesmo gênero por conta de outros proponentes. Logo, um representante não poderá agenciar duas ou mais empresas para um mesmo gênero de negócios, se o contrato não o permitir. No contrato de representação comercial, prevalece a seguinte norma: para toda zona e todo ramo de atividade, um só agente; e apenas um proponente para cada agente. Todavia, a exclusividade ou não-exclusividade dependerá do que constar no contrato. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 378 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 07/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na explanação de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, dispositivo correspondente: parágrafo único do artigo 31 da Lei n. 4.886/65 (Com as alterações da Lei n. 8.420/92) que se deve entender derrogado.

A representação comercial dá-se em zona territorial definida pelas partes, que pode ser uma rua, um bairro, uma cidade, uma região, um Estado, todo o País ou qualquer outra delimitação espacial.

O dispositivo determina que a exclusividade do agente e do proponente é presumida, i.é, se o contrato for omisso o representado não pode ter mais de um representante na mesma região e o representante não pode exercer sua atividade para mais de uma empresa do mesmo ramo de negócio. Salvo ajuste em contrário, o representante tem direito à comissão mesmo que não tenha participado da realização do negócio (CC 714). (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 07.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 712. O agente, no desempenho que lhe foi cometido, deve agir com toda diligência, atendo-se às instruções recebidas do proponente.

Caso típico de aplicação conjunta, de modo a se complementarem, na visão de Claudio Luiz Bueno de Godoy, o Código Civil de 2002 e a Lei n. 4.886/65, como se defendeu no comentário ao CC 710, ao qual ora se remete o leitor, é esse relativo à previsão dos deveres impostos ao agente ou distribuidor, no cumprimento do contrato entabulado. Isso porquanto o respectivo elenco não se esgota na previsão do artigo em comento.

De toda sorte, e em primeiro lugar, é evidente que ao agente se impõe a obrigação de agir com zelo e cuidado no cumprimento do encargo que lhe foi cometido. Vale aqui não olvidar que o agente age no interesse e em benefício de outrem. Por isso mesmo, e da mesma forma que ocorre no mandato e na comissão (ver comentários ao CC 667 e 696), o agente deve atuar de modo a atender à razoável expectativa que tem o preponente ao lhe cometer o desempenho da atividade de promoção de negócios à sua conta. Em diversos termos, a conduta do agente deve não só se ostentar escoimada de tudo quanto possa causar dano ao preponente, mas, também, deve se mostrar adequada a lhe proporcionar a vantagem que razoavelmente poderia esperar com a entabulação do ajuste. Tanto assim que já era hábito, e não será hoje inviável, fixarem-se metas mínimas de produção do agente.

Mais, impende ao agente obrar em conformidade com as instruções do preponente. Ou seja, embora o agente goze de relativa autonomia no desempenho de sua atividade, organizando-a como queira, inclusive valendo-se de auxiliares ou subagentes, adstringe-se àquilo que tenha ordenado o preponente, já que por este contratado para atuação no seu interesse. É o que se dá, por exemplo, quanto à fixação de preço de mercadorias cuja negociação se agencia, ou mesmo no que diz respeito às condições para tanto estabelecidas (art. 29 da Lei n. 4.886/65.

Todavia, há que reconhecer que os deveres do agente ou do distribuidor vão mais além e abrangem ainda, até como corolário da boa-fé objetiva, que em sua função supletiva cria os chamados deveres anexos ou laterais, verdadeiramente de conduta solidária e leal, a devida informação que lhe incumbe prestar sobre os negócios agenciados e sobre seu andamento, de resto, tal como expressa o art. 28 da Lei n. 4.886/65, contemplativo, em acréscimo, conforme interpretação que se lhe empresta, também da devida informação sobre as condições do mercado, a situação dos clientes, a do comércio em geral e da praça em que se desenvolve a agência (v.g.,  Fran Martins. Contratos e obrigações comerciais, 7.ed. Rio de Janeiro, Forense, 1984, p. 325).

De igual maneira deve o agente prestar contas dos negócios consumados por sua gestão e interferência, no cumprimento do contrato de agência ou distribuição, também como se contém no art. 19, e, da lei especial, por exemplo quanto a documentos ou recibos que lhe tenham sido entregues em virtude do agenciamento.

Por fim, outro dever anexo, atinente à agência e distribuição, está na reserva sobre as atividades desenvolvidas, portanto a subtração do conhecimento público de fatos ou dados que possam prejudicar o preponente, seus negócios ou a vantagem por ele razoavelmente esperada, o que decorre igualmente do princípio da boa-fé objetiva, destarte a par do que foi previsto no art. 19, d, da Lei n. 4.886/65. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 732 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 07/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Acompanhando a doutrina de Ricardo Fiuza, o dever do cuidado ativo, para corresponder com fidelidade às instruções dadas pelo proponente, é inerente ao exercício de agência na vez que o agente deve, no implemento do tal obrigação assegurar o desempenho adequado aos interesses da representação comercial embora detenha autonomia na atividade, o agente obriga-se a atuar cem total zelo e aplicação para a efetividade dos objetivos do contrato. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 378 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 07/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na toada de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, é citado como dispositivo correspondente: artigo 29 da Lei n. 4.886/65 (com as alterações da Lei n. 8.420/92).

O agente tem o dever de agir com diligência ordinária, respondendo civilmente pelos danos que causar culposamente ao proponente. Deve atuar segundo as regras do contrato e segundo as instruções que o proponente estabelecer dentro do escopo do contrato.

Conjugando-se o Código Civil e a Lei n. 4.886/65, são obrigações do agente: a) angariar negócios em favor do representado; b) seguir as instruções do representado; c) informar ao representado o andamento dos negócios; d) manter sigilo sobre as atividades da representação (art. 19, d, Lei n. 4.886/65); e) prestar contas ao representado (art. 19, e, Lei n. 4.886/65). (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 07.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

segunda-feira, 6 de janeiro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 705, 706, 707, 708, 709 - Da Comissão - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 705, 706, 707, 708, 709
- Da Comissão - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo XI – Da Comissão –
(art. 693 a 709) vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 705. Se o comissário for despedido sem justa causa, terá direito a ser remunerado pelos trabalhos prestados, bem como a ser ressarcido pelas perdas e danos resultantes de sua dispensa.

Se no CC 703, antes examinado, como lembra Claudio Luiz Bueno de Godoy, regram-se as consequências da despedida do comissário com justa causa, ou seja, por motivo de conduta culposa que lhe seja imputável, no artigo em estudo prevê-se a extinção do contrato de comissão por iniciativa do comitente, sem culpa atribuível ao comissário. É mesmo a denúncia imotivada ou a revogação da comissão que, como já se disse para o mandato, no comentário ao CC 682, a que ora se remete o leitor, decorre da essência fiduciária do ajuste, ou seja, da confiança depositada no outorgado que, assim, justifica, uma vez cessada, a retirada do encargo delegado.

Mas, também conforme se acentuou no comentário ao CC 682, uma vez remunerada a atividade do outorgado, como é intrinsecamente o que se dá na comissão, é devida indenização pelo que, aqui, o Código Civil chama de despedida sem justa causa do comissário. Até por esse dever indenizatório, muitos se recusavam a admitir que pudesse haver mesmo um direito de revogação da comissão, malgrado reconhecendo-se a possível ocorrência de uma denúncia vazia do ajuste (v.g., Pontes de Miranda. Tratado de direito privado, 3. ed. São Paulo, RT, 1984, § 4.731, n. 2, p. 326).

De toda sorte, já previa o Código Comercial, no artigo acima aludido, que poderia o comitente retirar o encargo conferido ao comissário, ainda que o indenizando. Apenas que, na legislação comercial revogada, estabelecia-se um limite ressarcitório mínimo a forfait, quando se determinava, havida a injustificada despedida, o pagamento de não menos que a metade da comissão devida, mesmo que não correspondesse exatamente aos trabalhos exercitados.

No Código civil, contudo, o ressarcimento compreenderá a comissão proporcionalizada de acordo com a extensão dos serviços úteis prestados, tal como nos CC 702 e 703, mas além disso com a composição de perdas e danos que a conduta do comitente tiver provocado ao comissário, incluindo lucros cessantes, pelo que, inclusive, muitos sempre defenderam que, no caso de despedida sem justa causa, a comissão devesse ser paga por inteiro (ver por todos: Orlando Gomes. Contratos, 9. ed. Rio de Janeiro, Forense, 1983, p. 404; Caio Mario da Silva Pereira. Instituições de direito civil, 10. ed. Rio de Janeiro, Forense, 1999, p. 248).

A diferença, no entanto, para o que está no Código Civil de 2002, é que o suplemento da comissão, em relação aos serviços prestados de forma útil, antes da despedida, não se dará de forma automática, mas a título de lucros cessantes, assim desde que atendidos os requisitos respectivos (CC 403). Sem contar os casos em que não é ajustado, previamente, o valor da comissão.

Enfim, da mesma forma que a culpa do comissário o obriga a indenizar, na despedida com justa causa (CC 703), a denúncia imotivada do comitente o sujeita a igual reparação. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 727 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 06/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Da mesma forma lembra Ricardo Fiuza quanto à disposição relacionada como CC 703, pelo princípio isonômico na relação jurídica, em face dos direitos e obrigações das partes contrastantes. Se o comitente pode exigir do comissário os prejuízos sofridos pela dispensa por este causada, também terá o direito de ser ressarcido pelas perdas e danos decorrentes de sua despedida sem justa causa.

A inovação trazida pelo CC/2002 em confronto com a disposição pertinente do Código Comercial (art. 188) é no sentido de assegurar ao comissário a justa remuneração, em atenção aos trabalhos por ele prestados, incorporando-se a esta comissão a verba indenizatória correspondente, a ser apurada em função da natureza e relevância do contrato desfeito. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 376 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 06/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Segundo entendimento de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o contrato de comissão pode ser estabelecido por prazo determinado, por prazo indeterminado ou ser condicionado à realização de certos negócios. Na primeira hipótese, o comissário tem direito ao prazo e se vier a ser destituído antes do prazo fará jus ao recebimento dos lucros cessantes. Se por prazo indeterminado, o contrato pode ser resilido a qualquer tempo por qualquer das partes, respeitando prazo razoável entre a denúncia e a efetiva extinção do contrato. Se ocorrer a extinção súbita, que venha a causar prejuízos ao comissário, fica o comitente obrigado a indenizá-lo como deflui do princípio da boa-fé objetiva. Finalmente, se contratado para a realização de determinados negócios, o comissário fará jus aos lucros cessantes uma vez que venha a ser destituído antes de realiza-los e sem justa causa. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 06.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 706. O comitente e o comissário são obrigados a pagar juros um ao outro; o primeiro pelo que o comissário houver adiantado para cumprimento de suas ordens; e o segundo pela mora na entrega dos fundos que pertencerem ao comitente.

Veja-se que, na toada de Claudio Luiz Bueno de Godoy, o artigo em questão, antes de mais nada, consagra obrigações do comitente e do comissário que no Código Comercial eram previstas de forma direta e, portanto, mais clara, nos arts. 180 e 185. De toda sorte, incumbe (a) ao comitente o dever de ressarcir as despesas que o comissário houver adiantado para o cumprimento do encargo que lhe foi conferido; e (b) ao comissário o dever de pronta entrega de fundos que pertençam ao comitente, especialmente o produto do negócio a cuja pratica se volta a comissão. A rigor nada diverso do que, acerca do mandato, previu o Código Civil nos CC 668, 675 e 676, já atrás examinados.

De um lado, exercendo-se a comissão no interesse e proveito do comitente, a este cabe arcar com as despesas necessárias e úteis ao seu cumprimento, disponibilizando-as, desde logo, se solicitado pelo comissário (ver Fran Martins. Contratos e obrigações comerciais, 7. ed. Rio de Janeiro, Forense, 1984, p. 343), tal qual no mandato (CC 675), ou reembolsando, de imediato, à vista, salvo convenção em contrário, as despesas que o comissário tiver adiantado.

De outro lado, pelo mesmo motivo, ao comissário se impõe a básica obrigação de transferir ao comitente exatamente aquele proveito auferido com o negócio que lhe foi cometido, incontinenti ou conforme o prazo ajustado, tanto quanto lhe é vedado malversar ou empregar para fim diverso fundos que lhe tenham sido entregues para cumprimento do ajuste.

Pois num ou noutro caso incidirão juros à taxa legal (CC 406), de novo tal qual se estabeleceu, em idêntica contingência, para o mandato (CC 670 e 677, a cujos comentários se remete o leitor). Vencerão em desfavor do comissário, com natureza moratória, se a desde quando tiver dado destino diverso a valores recebidos para despesas da comissão ou tiver deixado de transferir o proveito dela resultante, pertencente ao comitente, aqui se respeitando as regras gerais de constituição em mora, ex re ou ex persona, conforme haja sido ou não estabelecido prazo certo para o repasse; em desfavor do comitente, com natureza compensatória, se e desde o instante em que o comissário tiver adiantado despesas a cargo daquele, porquanto necessárias ou úteis à execução da comissão. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 727 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 06/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na doutrina apresentada, Ricardo Fiuza também se reporta ao art. 185 do Código Comercial, a seguir transcrito: “Art. 185. O comitente é obrigado 1) satisfazer à vista, salvo convenção em contrário, a importância de todas as despesas e desembolsos feitos no desempenho da comissão, com os juros pelo tempo que mediar entre o desembolso e o efetivo pagamento, as comissões que forem devidas. As contas dadas pelo comissário ao comitente devem concordar com os seus livros e assentos mercantis; e no caso de não concordarem poderá ter lugar a ação criminal de furto”.

Como é de direito o comissário ressarcir-se de todas as despesas que adiantou no seu trabalho de comissão, resta claro que o comitente, ao reembolsar todas as quantias despendidas, deverá fazê-lo com os juros relativos ao período de desembolso.

Por outro lado, a mora do comissário, no relativo ao dever de prestar contas dos negócios feitos à conta do comitente, sujeita-o ao pagamento dos juros pelo atraso. Os juros moratórios são, portanto, o pagamento.

A retenção indevida do capital pertencente ao comitente, aplicando-se a esta segunda hipóteses, quando não convencionados ou quando o forem sem taxa estipulada, o CC 406. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 377 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 06/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No entendimento de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o dispositivo estabelece o dever de pagar juros legais em caso de mora no cumprimento das obrigações de ambos, comitente e comissário. O comitente deve pagar juros de mora legais se violar a obrigação de adiantar ao comissário alguma quantia para o cumprimento de suas ordens. A obrigação de adiantamento deve estar inserida no contrato, pois não está contida no texto legal.

Já o dever do comissário de entregar ao comitente o proveito obtido no negócio a que se destina o contrato de comissão decorre da própria lei, embora esta, acertadamente, não fixe prazo para o cumprimento da obrigação. Seja explicitado no contrato o prazo, seja aferido segundo a razoabilidade, os juros legais moratórios são devidos sempre que o comissário deixar de transferir ao comitente o resultado dos negócios que lhe pertencem. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 06.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 707. O crédito do comissário, relativo a comissões e despesas feitas, goza de privilégio geral, no caso de falência ou insolvência do comitente.

Na esteira de Claudio Luiz Bueno de Godoy, manteve o Código Civil a regra contida no Código Comercial, em seu art. 189, que confere ao crédito do comissário, pela sua comissão ou reembolso de despesas efetuadas, devendo-se acrescentar os juros respectivos (ver artigo anterior), preferência legal no concurso de credores, ou seja, concede a lei privilégio geral ao crédito referido do comissário, no caso de falência ou insolvência do comitente, o que significa classificá-lo, dentre os créditos contra o comitente, antes dos quirografários, malgrado depois daqueles garantidos por direito real, ressalvados ainda os débitos trabalhistas e fiscais (art. 83 da Lei n. 11.101/2005).

A preferência, de qualquer sorte, teve em vista a verdadeira contraprestação por trabalho prestado que a comissão envolve, incluídas as despesas efetivadas e para tanto úteis ou necessárias, muito embora hoje se possa pensar na admissão de uma comissão civil, não profissional, como já expendido no comentário ao CC 693.

Por fim, diga-se que o artigo em comento não repetiu a especificação que estava no art. 189 do Código Comercial acerca de hipoteca instituída em favor do comissário, porquanto dispôs sobre direito de retenção para assegurar o recebimento do mesmo crédito ora tratado, de resto o que muitos já admitiam encerrar uma mesma providência, o que se verá no artigo seguinte. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 728 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 06/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na doutrina de Fiuza, o comissário coloca-se como credor privilegiado no caso de falência ou insolvência civil do comitente, para realizar o seu crédito, pelas comissões a que faz jus e resgate das despesas que efetuou no contrato de comissão por ele desempenhado em favor do comitente. Essa preferência legal já era prevista pelo art. 189 do Código Comercial. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 377 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 06/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o crédito do comissário é remuneração por serviços prestados. Tem, por isso, o privilégio geral, na falência ou insolvência do comitente, preferindo os créditos quirografários. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 06.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 708. Para reembolso das despesas feitas, bem como para recebimento das comissões devidas, tem o comissário direito de retenção sobre os bens e valores em seu poder em virtude da comissão.

A posição de Claudio Luiz Bueno de Godoy, é que o Código civil, no artigo presente, positivou, de forma textual, o direito de retenção em favor do comissário, que muitos já entendiam previsto no art. 189 do Código Comercial, quando aludia a uma hipoteca privilegiada a garantir o crédito daquele pela comissão e por despesas adiantadas (ver, por todos: Waldírio Bulgarelli. Contratos mercantis, 3. ed. São Paulo, Atlas, 1984, p. 474). Ou mesmo se podia inferir a retenção da interpretação conjunta dos arts. 190 e 156, também do Código Comercial.

De qualquer maneira, agora, e de novo a exemplo do que se dá no mandato (CC 664 e 681), se explicita o direito de retenção que ao comissário se concede, incidente sobre bens ou valores que estejam em seu poder, em virtude da comissão, para reembolso das despesas efetuadas e recebimento de sua remuneração. Exige-se, destarte, que os bens ou valores sobre os quais se exercitará a retenção estejam em poder do comissário e necessariamente por causa ou em razão do exercício da comissão.

Apenas se pondera que, de maneira mais abrangente, poderia o artigo em questão haver expressado a pertinência da retenção à garantia de tudo quanto devido ao comissário em virtude de comissão, tal como se procedeu no CC 664, a cujo comentário se remete o leitor, portanto incluindo até eventuais indenizações. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 728 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 06/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na toada de Fiuza, o direito de retenção é assinalado para albergar o comissário no recebimento do seu crédito perante o comitente, relativo às comissões devidas e despesas efetuadas. O exercício do jus retentionis alcança, apenas, os bens e os valores em poder do comissário em decorrência do próprio contrato de comissão. Como antes afirmado, a retenção é um instituto de defesa eficaz ao reclamo de reembolso e, ainda, no particular, por razão de crédito existente do comissário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 377 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 06/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira o comissário recebe o preço das mercadorias que vende por conta do comitente. Do valor total recebido, pode reter o valor de suas comissões, repassando a diferença ao comitente. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 06.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 709. São aplicáveis à comissão, no que couber, as regras sobre mandato.

Ainda direcionado ao Código Comercial, Claudio Luiz Bueno de Godoy mostra, afora, sobretudo, o que dispunha o art. 165, quando conceituou a comissão, a referência à aplicação subsidiária do regramento atinente ao mandato (art. 190), o que ora se repete, ainda que não só por isso, mas pelo que fazia o Código comercial quando tratava do ajuste em comento, levou grande parte da doutrina a sustentar que a comissão fosse, em verdade, uma espécie de mandato, caracterizado pela ausência de representação (mandato sem representação ou com representação imperfeita). E certo, também, que muito se combateu essa tese, procurando-se identificar uma autonomia do contrato de comissão, posto que semelhante ao mandato e com regras a este relativas, que lhe fossem aplicáveis de maneira subsidiária, a propósito inexistindo dúvida a levantar ante o que se contém, hoje, no artigo ora em comento.

Viu-se, todavia, ao longo dos comentários aos artigos do Capítulo presente, destinado ao tratamento da comissão, que constantes são as referências a idênticas previsões e mesmo a idênticos princípios, regras, direitos e obrigações concernentes ao mandato. Daí se ter sustentado, logo no CC 693, que o Código atual parece ter cuidado da comissão, malgrado em capítulo próprio, como um verdadeiro mandato sem representação, embora forçosamente oneroso, só que com finalidade específica, ou seja, para aquisição ou alienação de bens no interesse do comissário. De qualquer maneira, impende, a todo esse respeito, remeter ao que já se expendeu no comentário ao referido CC 693. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 729 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 06/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na finalização da doutrina de Ricardo Fiuza, ao dispor que aplicam-se á comissão, no que couberem, as regras sobre mandato, o CC/2002 aproxima-se da disciplina do Código Civil italiano, que a exara como uma modalidade de mandato, se, todavia, assim considerá-la. Diante da similitude dos contratos, mas cada qual com sua especificidade, a aplicação subsidiária das normas de mandato ao trato da comissão exigirá, claramente uma manifesta pertinência, ou conformidade apropriada, sob pena de confundi-los. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 377 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 06/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o mandato pode também ser instrumento de negócios de distribuição. Difere-se da comissão, porque nesta o comitente age em nome próprio, enquanto o mandatário age em nome do mandante. Em ambos os contratos, no entanto, há o dever de prestação de contas, que se aplica ao comissário por força do CC 709. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 06.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

sexta-feira, 3 de janeiro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 702, 703, 704 - continua - Da Comissão - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 702, 703, 704 - continua
- Da Comissão - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo XI – Da Comissão –
(art. 693 a 709) vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 702. No caso de morte do comissário, ou, quando, por motivo de força maior, não puder concluir o negócio, será devida pelo comitente uma remuneração proporcional aos trabalhos realizados.

Na toada de Claudio Luiz Bueno de Godoy, a ideia central do dispositivo, tal como já continha o art. 187 do Código Comercial, é remunerar o comissário pelo serviço que ele tenha prestado, de forma proveitosa, mesmo que não completamente, i.é, mesmo que não ultimado o negócio cuja prática lhe foi cometida, mas sem sua culpa, tudo a fim de evitar, a rigor, indevido enriquecimento do comitente à custa do trabalho alheio.

Segue-se, pois, que a remuneração do comissário, se ele não tiver podido concluir o negócio de que tenha sido incumbido, será devida proporcionalmente ao trabalho que chegou a desempenhar em proveito do comitente. Isso, diz a lei, ocorrerá sempre que, antes de finalizado o encargo, o comissário vier a falecer, transmitindo-se a seus herdeiros o direito à percepção proporcional da comissão, ou quando sobrevier fortuito, em sentido amplo, a impedir a continuidade do serviço a si cometido.

A proporcionalização se fará em função de quanto do contrato de comissão foi cumprido até a morte ou fortuita interrupção. Há que ver que o Código Comercial, no referido art. 187, cuidava também da comissão devida proporcionalmente em caso de despedida do comissário, hoje tratada no CC 703 e 705, conforme haja ou não justa causa para tanto. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 724 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 03/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo a doutrina apresentada por Ricardo Fiuza a remuneração proporcional do comissário, à medida do trabalho por ele desenvolvido, previa-a o Código Comercial, no caso de morte ou despedida do comissário, assegurando-se lhe o ou a seus herdeiros uma quota correspondente aos atos executados. O Código Civil atual contempla dita comissão em negócio inconcluso, acrescentando-se à hipótese o motivo de força maior, o que tem perfeito valimento, porquanto restaria, de outro modo, beneficiado indevidamente o comitente, fartando-se à custa do comissário não remunerado em face daquela causa antes não prevista. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 375 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 03/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, se os trabalhos do comissário tiverem sido iniciados, mas forem interrompidos por caso fortuito ou de força maior, entre os quais a morte do próprio comissário, têm este ou seus herdeiros direito a perceber remuneração proporcional aos trabalhos realizados, a fim de se evitar o “empobrecimento” sem causa dele ou de seus herdeiros. O dispositivo transfere ao comitente a responsabilidade do desfazimento do contrato por caso fortuito ou de força maior. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 03.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 703. Ainda que tenha dado motivo à dispensa, terá o comissário direito a ser remunerado pelos serviços úteis prestados ao comitente, ressalvado a este o direito de exigir daquele os prejuízos sofridos.

No entendimento de Claudio Luiz Bueno de Godoy, o que, no Código Comercial, se tratava num só artigo, o 187, hoje é fracionado no artigo presente e no imediatamente anterior. Ou seja, o artigo referido da legislação mercantil cuidava da comissão devida ao comissário de forma proporcional aos serviços prestados, mas por causas diversas. Uma, a do negócio inconcluso sem culpa do comissário; outra, a da sua despedida, mas já aí por sua culpa, dado que a despedida sem justa causa era tratada no Código Comercial em artigo diverso, o 188, de resto agora parcialmente reproduzido no CC 705, a seguir examinado. Melhor andou o CC/2002 ao prever, num dispositivo, a proporcionalização da comissão quando não concluído o negócio cometido ao comissário sem sua culpa (CC 702) e, noutro, o ora em comento, a mesma proporcionalização, mas quando se tenha dado a despedida do comissário, veja-se, com justa causa.

Isso, na verdade, porque, embora a proporcionalização se dê de igual maneira em função de quanto se prestou de serviço útil ao comitente, posto que não ultimado, tendo havido despedida do comissário, a ele se impõe, em contrapartida, a respectiva obrigação ressarcitória. Ou seja, havida a despedida do comissário, por ter faltado com qualquer das obrigações que, na execução da comissão, são-lhe afetas, já atrás examinadas no comentário aos artigos precedentes, deverá ele compor os prejuízos que, com sua conduta desidiosa, haja provocado ao comitente. Mas, mesmo assim, fará jus à remuneração pelos serviços que, antes da despedida, tenha prestado de forma útil ao comitente, malgrado não ultimados, pelo mesmo princípio vedatório do enriquecimento sem causa que anima o artigo precedente.

Tem-se então que, a despeito da culpa do comissário pela resolução do ajuste, não se pode aproveitar o comitente de serviços úteis que lhe tenham sido prestados, sem a respectiva remuneração. Apenas que o correspondente importe poderá vir a ser compensado, respeitados os requisitos contidos nos CC 368 e ss, com o montante de indenização que o comissário seja obrigado a pagar, ou de sua fixação abatido. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 725 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 03/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na toada de Ricardo Fiuza, o dispositivo cogita da remuneração por dispensa do comissário fundada em motivo justo, não retirando-lhe o direito de perceber a justa contraprestação, como previa, genericamente, o art. 187 do Código comercial, ao tratar de sua despedida. O CC/2002 introduz, aqui, outro elemento importante em caso da dispensa ocorrida, uma vez verificada, com ela, a causação de prejuízos, cometendo ao comitente o direito de exigir a devida compensação pelos danos ocorridos em face do negócio inacabado. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 375 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 03/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Aprendendo com Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, uma vez que o comissário tenha realizado negócios que lhe foram confiados, o descumprimento posterior do contrato e sua consequente resolução não isenta o comitente de remunerar os serviços que foram prestados e que se converteram, efetivamente, em vantagem para ele. A violação do contrato pelo comissário o obriga a indenizar os prejuízos eventualmente causados ao comitente e, portanto, ambas as obrigações devem ser compensadas. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 03.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 704. Salvo disposição em contrário, pode o comitente, a qualquer tempo, alterar as instruções dadas ao comissário, entendendo-se por elas regidos também os negócios pendentes.

Na balada de Claudio Luiz Bueno de Godoy, o dispositivo presente, que constitui inovação no sistema, consagra a prerrogativa de o comitente, a qualquer tempo, modificar as ordens e instruções dadas ao comissário, o que se aplica desde logo, mesmo aos negócios pendentes. O pressuposto subjacente ao preceito é, de um lado, a consideração de que afinal a comissão se exerce, malgrado em nome do comissário, no interesse e para o proveito do comitente, assim senhor de suas conveniências. De outra parte, não fugiu à percepção do legislador, como salienta Jones de Figueiredo Alves (Novo Código Civil comentado, coord. Ricardo Fiuza. São Paulo, Saraiva, 2002, p. 639), a constante mutação da dinâmica do mercado, que impõe, por vezes, a alteração de instruções dadas ao comissário, destarte adequando-se as circunstâncias da contratação de que foi incumbido às novas exigências da praxe negocial do lugar.

Bem de ver, porém, que, cuidando-se de direito dispositivo, podem as partes ajustar a inalterabilidade das instruções originalmente dadas ao comissário. Todavia, mesmo se não o fizerem e, assim, prevalecer a regra geral da mutabilidade das instruções, sua alteração deve ser feita sempre de modo a preservar o princípio da boa-fé objetiva que marca as relações jurídicas em geral, mercê da eticidade que ilumina toda a nova legislação. Isso significa a exigência de padrão de comportamento leal e solidário que se espera dos contratantes e que impõe ao comitente o exercício de sua potestativa prerrogativa de alterar as instruções, a qualquer tempo, de forma a evitar causar dano ao comissário (dever de cuidado com o cocontratante), ademais informando-o claramente das novas ordens (dever de informação). É, enfim, o exercício do direito de alterar as instruções sem abuso, todavia compreendido não só sob vertente subjetiva, envolvendo deliberado propósito de prejudicar, e sim em razão do standard de conduta de colaboração e cooperação que se reclama nas relações contratuais e, antes, nas relações em geral (CC 187).

 Mas, atendidos esses requisitos, não é dado ao comissário opor-se à modificação de suas instruções, se afinal age no interesse de quem as modificou. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 726 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 03/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Acompanhando a doutrina de Ricardo Fiuza, fica estabelecida, por presunção legal, autoridade ao comitente de modificar as ordens e instruções anteriormente fornecidas ao comissário. Essa mutabilidade de plano negocial na aquisição ou venda de bens é ditada pela dinâmica do mercado, a critério do comitente, cabendo ao comissário recepcionar as alterações ditadas pro ele, como nova e decisiva forma regedora dos futuros negócios e, ainda, daqueles não concluídos. Não pode, ademais, o comissário opor-se às novas diretrizes colocadas, uma vez que embora agindo em seu nome, o faz em favor e no interesse do comitente.

Jurisprudência: “Direito privado. Corretagem de valores. Mandato e comissão mercantil. Uso e costume. Autorização ratificada. É de estilo e uso do comércio a autorização verbal para a realização de negócios por intermédio de empresa corretora de valores, entendendo-se como ratificados os atos negociais, pela continuidade da prática de semelhantes, ao longo do tempo de duração do mandato”. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 376 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 03/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Lembra Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o CC 695 obriga o comissário a agir segundo as instruções do comitente. O CC 704 esclarece o caráter unilateral de tais instruções. Uma vez que elas estejam contidas no âmbito das cláusulas do contrato de comissão elas obrigam o comissário. Não o obrigam, no entanto, se exorbitarem ou contrariarem o contrato. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 03.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

quinta-feira, 2 de janeiro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 699,700,701 - continua - Da Comissão - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 699,700,701 - continua
- Da Comissão - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo XI – Da Comissão –
(art. 693 a 709) vargasdigitador.blogspot.com -

Art. 699. Presume-se o comissário autorizado a conceder dilação do prazo para pagamento, na conformidade dos usos do lugar onde se realizar o negócio, se não houver instruções diversas do comitente.

Na visão de Claudio Luiz Bueno de Godoy o preceito consagra a regra geral, complementada, é certo, pelo quanto constante do CC 700, adiante examinado, mas no sentido de caber ao comissário a prerrogativa de, a seu juízo e conforme os usos, conceder prazo para pagamento das vendas que efetuar à conta do comitente. Ou seja, se não houver específica ordem em contrário do comitente, poderá o comissário tratar da concessão de prazos, ou da respectiva dilação, conforme os costumes locais, que sejam atinentes às alienações por ele procedidas.

A previsão, a rigor, tem em vista a relativa liberdade de atuar do comissário naquilo acerca do que inexistir instrução específica, sempre de modo a propiciar maior proveito ao comitente, o que ocasionalmente se dá nas negociações a prazo, de resto muito comuns em algumas vem das de mercadorias, por exemplo as faturadas para pagamento a certo tempo e, às vezes, em mais de uma prestação. Pois se tudo isso é lícito ao comissário ajustar, não havendo proibição contratual, deve ele avisar ao comitente, como exige o CC 700, sob pena de se considerar feita à vista a alienação.

Vencidos os prazos, omitiu-se o Código Civil de 2002 na reprodução da regra estampada no art. 178 do Código Comercial, que impõe ao comissário o dever de pronta cobrança dos terceiros com quem tenha negociado, caso não efetuem o pagamento. Há que ver, no entanto, que essa obrigação, de um lado, decorre do fato em si de o comissário contratar em seu nome e, de outro, da exigência de, nesse ajuste, agir de forma a preservar os interesses do comitente (CC 696), sob pena de responder pelos prejuízos que com sua inércia ou retardo provocar. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 723 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 02/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

A doutrina de Ricardo Fiuza apresenta a realidade de mercado que pode, na consecução do próprio negócio, orientar o comissário à prática de conceder dilação do prazo para o pagamento, uma vez não existindo orientação diferente do comitente. Assim, a norma o diz autorizado, por presunção legal, diante de nenhuma manifestação prévia que a contrarie. Em todo caso, haverá o comitente de ter ciência de referida dilação, a saber que o comissário atua em favor daquele. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 374 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 02/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na comparação de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o CC 695 estabelece o dever de o comissário agir segundo as instruções do comitente e, em sua falta, segundo os usos e costumes. O CC 699 determina a aplicação da mesma regra na concessão de prazo para pagamento a ser feito pelo terceiro comprador. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 02.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 700.  Se houver instruções do comitente proibindo prorrogação de prazos para pagamento, ou se esta não for conforme os usos locais, poderá o comitente exigir que o comissário pague incontinenti ou responda pelas consequências da dilação concedida, procedendo-se de igual modo se o comissário não der ciência ao comitente dos prazos concedidos e de quem é seu beneficiário.

Seguindo com Claudio Luiz Bueno de Godoy, como se vem de examinar no comentário ao artigo anterior, se lá se consagra a regra geral de que ao comissário seja dado negociar com terceiros a prazo, conforme os costumes locais, desde que ausente instrução em contrário do comitente, aqui, no dispositivo em comento, estabelece-se a consequência para o caso de desatendimento dos dois pressupostos impostos para exercício daquela mesma discricionariedade, disposta como norma geral. Vale dizer que o artigo presente prevê considerar-se à vista a alienação feita a prazo pelo comissário, quando em desacordo com instruções contrárias do comitente ou quando dissociada da prática local ou dos usos do lugar da entabulação. Faculta-se ao comitente a imediata exigibilidade do resultado líquido da venda, ou de prejuízo maior que eventualmente demonstre haver experimentado. A rigor, cuida-se de mera especificação do que já contém o dispositivo dos CC 695 e 696, que determinam que aja o comissário de acordo com as instruções recebidas e sempre com zelo e diligência, sob pena de ser responsabilizado por perdas e danos.

O dispositivo em tela, porém, vai mais além e explicita, com igual consequência indenizatória pelo descumprimento, a obrigação que, afeta ao comissário, é verdadeiramente de prestação de contas. Impõe-se-lhe, com efeito, que informe o comitente, de imediato, sobre os prazos concedidos e seus beneficiários. Típico dever de lealdade no desenvolvimento da relação contratual, revelado pela informação precisa sobre as condições dos negócios entabulados com terceiros, cuja desatenção também carreia ao comissário responsabilidade indenizatória, nos mesmos moldes havidos para a contrariedade às instruções de venda à vista ou de sua efetivação a prazo, mas fora do que é a práxis local para aquela espécie de negócio. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 723 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 02/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo a doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, a prorrogação de prazo, acaso concedida, requer, como observado no artigo anterior, esteja confortada aos usos do local onde celebrado o negócio. Segue-se que havendo o comitente instruído o comissário em contrário ou, ainda, tendo sido dilatado o prazo sem apoio na prática do mercado, sujeita-se este último às consequências do ato de protrair a obrigação do pagamento. Inclusive ficando obrigado a pagar o preço, de imediato, desde que lhe seja exigido pelo comitente.

Que igual modo ocorrerá se a concessão de novo prazo e a identidade do beneficiário da dilação temporal ao adimplemento não forem comunicadas ao comitente, suportando o comissário, pela omissão, as mesmas consequências. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 374 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 02/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Os mestres, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apresentam como Regra Redundante. O comissário sempre responde por descumprimento culposo das instruções emanadas do comitente ou, na falta destas, do que resultar dos usos e costumes locais. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 02.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 701. Não estipulada a remuneração devida ao comissário, será ela arbitrada segundo os usos correntes no lugar.

No ritmo de Claudio Luiz Bueno de Godoy, como já se disse no comentário ao CC 693, a comissão é um contrato essencialmente oneroso, a ponto até de a sua designação servir também para identificar a remuneração a que faz jus o comissário. Com efeito, é hábito tratar-se a remuneração do comissário como comissão, via de regra um percentual do negócio cuja prática lhe foi cometida, malgrado nada impeça a fixação em valor certo.

Tal qual explicitava o Código Comercial em seu art. 186, segundo o qual era sempre lícito ao comissário exigir do comitente a remuneração pelo seu trabalho, ainda que na falta de prévia fixação do respectivo importe, repete o atual Código Civil que, ausente estipulação das partes, a comissão devida será arbitrada segundo os usos do lugar da execução do encargo. Segue-se então que, não estabelecida a remuneração por ajuste dos contratantes, ainda assim ela será devida, mediante arbitramento a ser procedido judicialmente, atentando-se, como critério, à prática negocial do local em que a comissão deve ser cumprida, ademais da consideração das condições do encargo cometido ao comissário e do esforço exigido para seu cumprimento.

Deve-se lembrar que, se contratada a cláusula del credere, a remuneração a ser arbitrada judicialmente deverá ser por isso majorada; para Pontes de Miranda, no dobro do que seria devido (Tratado de direito privado, 3. ed. São Paulo, RT, 1984, t. XLIII, § 4.730, n. 1, p. 322), o que de toda sorte, cabe também ao prudente arbítrio do julgador.

Regularmente concluído o negócio a cargo do comissário, sua remuneração será devida por inteiro, o que implica reconhecer que a comissão poderá ser proporcionalizada, caso não completado o encargo, o que, conforme a hipóteses, preveem os artigos a seguir examinados. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 724 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 02/01/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo a doutrina de Fiuza, a remuneração ou comissão a que faz jus o comissário pelo exercício do Seu trabalho é, em regra, convencionada pelas partes, em percentual sobre o valor do negócio de compra e venda ou em valor nominal. Deverá as remunerações atender a sua diligência e a importância do negócio, tom de conformidade com as tarefas que lhes são entregues pelo comitente. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 375 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 02/01/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na esteira de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o contrato de comissão, por sua natureza mercantil, presume-se oneroso. Desta presunção advém a possibilidade de arbitramento da remuneração do comissário, caso esta não tenha sido expressamente estipulada pelas partes. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 02.01.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).