quinta-feira, 12 de novembro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 1.331, 1.332, 1.333 Do Condomínio Edilício – VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado - Art. 1.331, 1.332, 1.333

Do Condomínio Edilício – VARGAS, Paulo S. R. - Parte Especial –

 Livro IIITítulo III – Da Propriedade (Art. 1.331 a 1.358) Capítulo VII

– Do Condomínio Edilício – Seção I – Disposições Gerais–

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Art. 1.331. Pode haver, em edificações, partes que são propriedade exclusiva, e partes que são propriedade comum dos condôminos.

§ 1º.  As partes suscetíveis de utilização independente, tais como apartamentos, escritórios, salas, lojas, sobrelojas ou abrigos para veículos, com as respectivas frações ideais no solo e nas outras partes comuns, sujeitam-se a propriedade exclusiva, podendo ser alienadas e gravadas livremente por seus proprietários.

§ 2º.  O solo, a estrutura do prédio, o telhado, a rede geral de distribuição de água, esgoto, gás e eletricidade, a calefação e refrigeração centrais, e as demais partes comuns, inclusive o acesso ao logradouro público, são utilizados em comum pelos condôminos, não podendo ser alienados separadamente, ou divididos.

§ 3º. A cada unidade imobiliária caberá, como parte inseparável, uma fração ideal no solo e nas outras partes comuns, que será identificada em forma decimal ou ordinária no instrumento de instituição do condomínio. Parágrafo com redação dada pela Lei n. 10.931, de 02.08.2004.

§ 4º. Nenhuma unidade imobiliária pode ser privada do acesso ao logradouro público.

§ 5º. O terraço de cobertura é parte comum, salvo disposição contrária da escritura de constituição do condomínio.

(*) Historicamente, durante o período inicial de tramitação do projeto, foi apresentada uma emenda visando à substituição da expressão “Do condomínio edilício” por “Do condomínio em edifícios”. Segundo o Deputado Henrique Alves, autor da emenda, “a significação jurídica do termo ‘edilício’ não é a que lhe emprestou o projeto. Edilícias são as ações referentes aos vícios redibitórios. Nem há necessidade da inovação. Como oportunamente ponderou o ilustre jurista potiguar, Dr. Mário Moacyr Porto”. A emenda veio, no entanto, a ser rejeitada pelo relator geral à época, que entendeu não haver razão “para condenar-se a expressão ‘condomínio edilício’ um dos poucos neologismos introduzidos pelos autores do Projeto de Código Civil. Neologismo, além do mais, de direta recepção da língua mater, tendo o Prof. Miguel Reale e o Relator Parcial demonstrado não só a adequada origem latina do termo, mas o seu uso corrente no Direito Italiano, sendo o idioma italiano, no dizer de Rui Barbosa. o que mais se avizinha ao nosso. O termo ‘condomínio edilício’, em substituição a ‘condomínio especial’, que nada significa, e ‘condomínio em edifício’ tal como se propõe, não resulta, aliás, do desejo de introduzir palavras novas, só por desejo de novidade. Trata-se de expressão que, pensamos nós, atende rigorosamente à natureza das coisas, ou seja, do ‘condomínio que resulta da edificação’. O termo ‘condomínio em edifícios’ não corresponde ao que expressa, pois, no edifício, há partes comuns e partes privativas, o que se procurou atender indo à fonte latina”.

Emenda do Senador Josaphat Marinho procurou modificar o capta do artigo em análise (“As partes constitutivas das edificações podem ser propriedade exclusiva ou propriedade comum dos condôminos”) com o intuito de imprimir-lhe maior clareza. O relator parcial da matéria na Câmara, na etapa final de tramitação do projeto, propôs a rejeição da emenda, com os seguintes argumentos: “O texto é uma tentativa canhestra de definição do condomínio edilício, de todo despicienda. O art. 1o da Lei 4.59 1/64 já diz: ‘As edificações ou conjuntos de edificações, de um ou mais pavimentos, construídos sob a forma de unidades isoladas entre si, destinadas a fins residenciais ou não residenciais, poderão ser alienados. no todo ou em parte, objetivamente considerados, e constituirá, cada unidade, propriedade autônoma, sujeita às limitações desta lei. § 1º. Cada unidade será assinalada por designação especial, numérica ou alfabética, para efeitos de identificação e discriminação. § 2º A cada unidade caberá, como parte inseparável, uma fração ideal do terreno e coisas comuns, expressa sob forma decimal ou ordinária’. Embora seja mais elegante a redação da emenda, opinamos pela sua rejeição, visto ser mais clara e de mais fácil entendimento a redação ’ do projeto”. O Deputado Fiuza entendeu que assistia razão ao relator parcial no que diz respeito à maior clareza da redação original do projeto, e a emenda foi rejeitada.

O que traz os comentários à doutrina apresentada pelo relator Ricardo Fiuza, este dispositivo e seus parágrafos estão embasados nos arts. 1º e seus parágrafos, 2º e seus parágrafos e 3º da Lei n. 4.591, de 16-12-1964. que regulamenta o condomínio em plano horizontal. Trouxe o artigo para o bojo do novo Código Civil a regulamentação do tema, já que o Código de 1916 era omisso, pois que no inicio do século XX não havia prédios de apartamentos, de escritórios ou de garagens. Deve ser entendida como propriedade exclusiva aquela cujo uso, gozo e disposição não dependem de nenhum outro condômino, por exemplo, as unidades autônomas, como lojas, garagens, salas comerciais, apartamentos etc.; já a propriedade comum tem seu uso vinculado à vontade dos condôminos, e não pode ser alienada, como, por exemplo, a área comum (estrutura do prédio, telhado etc.). Inova o § 3º deste artigo ao estabelecer como parâmetro para fixação da fração ideal, no solo e nas partes comuns, o valor da unidade imobiliária em relação ao conjunto da edificação. Quanto à viabilidade de tal inovação, isso dependerá da experiência que resultar da sua aplicação prática e, principalmente, das decisões jurisprudenciais. O § 4º prevê a instituição de uma servidão de passagem, sendo direito do coproprietário o livre acesso à via publica. E, finalmente, no § 5º , fica estabelecido que o terraço de cobertura é parte comum, a não ser que a escritura de constituição de condomínio estipule de modo contrário.  Este artigo inova, ainda, na redação e é de melhor técnica legislativa, modernizando as expressões. Deve, contudo, ser-lhe dado o mesmo tratamento doutrinário dispensado aos dispositivos legais apontados da Lei n. 4.591/64. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 681-82, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 12/11/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Enquanto no saber de Francisco Eduardo Loureiro, o artigo em estudo inaugura o Capítulo “ Do Condomínio Edilício”, que não era tratado no Código Civil de 1916, e corresponde aos arts. 1º ao 21 da Lei n. 4.591/64. Destaque-se que o § 3° transcrito segue a redação que lhe foi dada pela Lei n. 10.931/2004, que alterou vários dispositivos do Código Civil de 2002. A primeira questão a ser examinada é o atual regime jurídico do condomínio edilício, em especial a revogação, ou não, ou em que medida, da Lei n. 4.591/64 pelo Código Civil de 2002, que é lei geral, ao passo que a lei de condomínio e incorporações é especial. Não prevalece, porém, o princípio da especialidade, porque a lei geral trata da mesma matéria, voltada aos mesmos destinatários. A situação jurídica é a mesma, sem qualquer discrímen que justifique a aplicação de regra especial à categoria distinta. Por isso, o Código Civil de 2002 derrogou a Lei n. 4.591/64 em tudo aquilo que com ela conflitasse. Os arts. 28 e seguintes da lei especial, voltados à disciplina da incorporação imobiliária, estão em plena vigência, uma vez que tal negócio jurídico não foi objeto de regramento distinto no Código Civil de 2002. Resta apenas saber, no tocante aos arts. 2º a 27, se houve derrogação ou ab-rogação da lei especial pelo atual Código. Embora haja entendimento divergente a respeito, a melhor posição é no sentido de que houve simples derrogação, podendo as regras da lei especial ser aplicadas de modo supletivo nas lacunas do Código Civil de 2002, desde que não conflitem com os princípios ou as regras posteriores. Prova disso é que o próprio CC 1.332, adiante comentado, dispõe que em relação à instituição do condomínio edilício se aplicam não somente as regras do próprio Código Civil como também o disposto em lei especial.

Ainda no tocante à questão do regime jurídico, o entendimento tranquilo dos nossos tribunais é no sentido de que não incidem as regras de proteção do Código de Defesa do Consumidor, uma vez que não há relação de consumo, porque o condomínio não é fornecedor de bens ou de serviços. Quanto à extensão das regras do condomínio edilício, na Jornada de Direito Civil da CEJ do Conselho da Justiça Federal aprovou-se o seguinte enunciado: “O disposto nos CC 1.331 a 1.358 aplica-se, no que couber, aos condomínios assemelhados, tais como loteamentos fechados, multipropriedade imobiliária e clubes de campo”. O enunciado deve ser lido com cautela. Claro que as vias internas dos loteamentos fechados são bens públicos e sua aprovação, registro e alienação obedecem regime jurídico próprio (Lei n. 6.766/79, se urbanos, e Decreto-lei n. 58/37, se rurais). As alienações de lotes como se fossem unidades autônomas constituem fraude à lei e são nulas de pleno direito, além de tipificarem infração penal. As regras relativas ao condomínio edilício, que podem ser estendidas aos loteamentos fechados, são as das contribuições condominiais, para que todos os proprietários de lotes paguem de modo proporcional o custo da manutenção de benefícios comuns a todos os adquirentes, como segurança e paisagismo, evitando o enriquecimento sem causa de uns em desfavor dos demais, consoante entendimento majoritário de nossos tribunais. É irrelevante que o loteamento seja ou não fechado por lei, ou, ainda, que o adquirente de lote seja ou não associado à associação de moradores. O que importa é a efetiva prestação de serviços que revertam em proveito geral e provoquem a valorização do imóvel. A fonte da obrigação não é o consentimento manifestado à associação, até porque ninguém é obrigado a permanecer associado, mas sim a cláusula geral que veda o enriquecimento sem causa. Diversos julgados tratam da matéria aludindo a “condomínios de fato”, que, embora não regularmente constituídos, geram manutenção de certos equipamentos que beneficiam todos os moradores ou adquirentes de lotes. A possibilidade de cobrança do custeio de serviços em tais empreendimentos é hoje objeto de acesa polêmica. Inicialmente, o STJ admitiu a prática, desde que provada a existência de serviços que beneficiem todos os adquirentes de lotes. Em um segundo momento, prevaleceu o entendimento de que o rateio somente pode ser cobrado de morador associado, ou que anuiu à cobrança. Aparentemente, impressionou-se o STJ com a possibilidade de criação da obrigação com origem diversa do contrato, da declaração unilateral de vontade, ou de ato ilícito. Esqueceu-se, porém, que no regime do atual Código Civil o enriquecimento sem causa constitui fonte autônoma de obrigação. A melhor orientação é a de que se deve analisar cada caso concreto e exigir a prova, a cargo da associação autora, de real e proveitosa prestação de serviços, a todos os moradores ou adquirentes de lotes. Eventual cláusula penal moratória, prevista em estatuto, é que pode ser cobrada apenas dos associados, em razão de sua natureza convencional. A cláusula penal, embora não seja pacífica a matéria, está limitada a 2%, em razão de aplicação analógica do CC 1.336, § 1º, comentado a seguir. Não faria sentido que em condomínios regularmente instituídos a cláusula penal fosse limitada, mas livre nos condomínios de fato. No que se refere ao prazo prescricional da pretensão, o entendimento, também majoritário, é no sentido de que é trienal, pois o fundamento da cobrança é, como já dito, o enriquecimento sem causa. Quanto à natureza jurídica do condomínio edilício, Caio Mário da Silva Pereira, após expor as diversas teorias a respeito, conclui a inadequação das tentativas de enquadrá-lo em institutos diversos, como a servidão ou a sociedade. Trata-se de instituto novo, com a fusão dos conceitos de domínio exclusivo e de domínio comum para a criação de um conceito próprio. As propriedades exclusiva e comum se aglutinam, formando um todo indissolúvel e unitário. Há uma simbiose orgânica entre ambos, para formação de um complexo, e não uma simples justaposição de institutos (Condomínio e incorporações, 10. ed. Rio de Janeiro, Forense, 2002, p. 92-3). Problema não resolvido pelo Código Civil de 2002 é o da personalidade jurídica do condomínio edilício. A doutrina tradicional, capitaneada por Caio Mário da Silva Pereira (op. cit., p. 89), não reconhece ao condomínio personalidade jurídica distinta da personalidade dos condôminos, até para evitar que o condômino se torne proprietário de uma cota imaterial da pessoa jurídica, em vez de cota ideal material das partes comuns e do solo. Além disso, embora haja comunhão orgânica dos condôminos, cada um tem interesses próprios, distinguindo-se aí da sociedade. É ponto incontroverso, porém, a personalidade processual ou judiciária do condomínio para, em seu próprio nome e representado pelo síndico, agir ativa ou passivamente em juízo, na defesa dos interesses materiais da comunidade dos condôminos (art. 12, IX, do CPC/1973, correspondendo ao atual art. 75, XI, no CPC/2015 Grifo VD). Em suma, o entendimento predominante é no sentido da existência de personalidade judiciária, mas não de personalidade de direito material do condomínio. Esse posicionamento passou a ser questionado em razão de diversas situações jurídicas que, para receber solução confortável, implicariam o reconhecimento da personalidade jurídica total do condomínio. São os casos de contratos de prestação de serviços diversos, firmados pelo condomínio e não pelos condôminos, a aquisição de imóvel vizinho para ampliação da área de garagens ou de recreio comum e a adjudicação ou arrematação da unidade do condômino inadimplente em hasta pública. Seria inviável, em todas elas, exigir o consentimento de todos os condôminos, especialmente considerando a possibilidade de alguns serem incapazes. De outro lado, o reconhecimento incondicional de personalidade poderia levar a situações inadmissíveis, como, por deliberação da maioria, se adquirir imóvel de campo ou ingressar em empreendimento de risco estranho à finalidade do condomínio, colocando em risco o patrimônio pessoal de todos os condôminos minoritários.

Assim, na I Jornada de Direito Civil da CEJ do Conselho da Justiça Federal aprovou-se o seguinte enunciado, de n. 90: “Admite-se a personalidade jurídica ao condomínio, desde que em atividade de seu peculiar interesse”. A posição equilibrada evita a exposição de riscos excessivos. Em reunião mais recente, a mesma Jornada aprovou enunciado mais amplo (Enunciado n. 246): “ Fica alterado o Enunciado n. 90, com supressão da parte final: ‘nas relações jurídicas inerentes às atividades de seu peculiar interesse’. Prevalece o texto: ‘Deve ser reconhecida personalidade jurídica ao condomínio edilício’”. O Conselho Superior da Magistratura de São Paulo, em recente mudança de posição, passou a admitir que o condomínio adjudique para si a unidade autônoma de condômino inadimplente, seguindo o que já fora decidido em relação ao espólio. Apenas ressalva o julgado que tanto a adjudicação como a posterior alienação da unidade autônoma a terceiros devem ser previamente aprovadas por assembleia geral, por unanimidade de votos, excluindo-se apenas o do condômino inadimplente (Ap. cível n. 273-6/7, rel. Des. José Cardinale). Aplicou-se, por analogia, o disposto no art. 63, § 3º, da Lei n. 4.591/64, em plena vigência, que admite expressamente a aquisição da unidade autônoma de condômino inadimplente, em construção a preço de custo, por parte do condomínio de construção do edifício. O CC 1.331 trata dos requisitos do condomínio edilício. O caput do artigo menciona que “ pode haver” partes de propriedade exclusiva e partes comuns. Na verdade, deve haver partes de propriedade exclusiva, vinculadas de modo indissociável à fração ideal de terreno e das coisas comuns do edifício. O § 1º do artigo em estudo inicia tratando do primeiro requisito do condomínio edilício: a existência de edificação, sob a forma de unidades autônomas. Menciona, em caráter exemplificativo, apartamentos, escritórios, salas, lojas e sobrelojas ou abrigos para veículos. Outras edificações, como casas (art. 8° da Lei n. 4.591/64), edifícios/garagem, jazigos ou mesmo cocheiras podem submeter-se ao regime jurídico do condomínio edilício, constituindo unidades autônomas. O que não se admite é o que se denomina “condomínio de solo”, com aquisição de terrenos sem edificação ou vinculação a edificação futura. A construção futura deve estar devidamente discriminada, com descrição da unidade autônoma, da fração ideal de terreno e prazo para construção. Deve-se responder o quê, quando, quem e como se constrói. Admitir o contrário seria chancelar burla às normas cogentes da Lei n. 6.766/79, convertendo loteamento em condomínio edilício em fraude à lei.

O § 1º cita que as unidades autônomas são objeto de propriedade exclusiva dos condôminos, podendo ser livremente alienadas ou oneradas, sem observância da regra de preferência do CC 504. Claro que a livre alienação da unidade autônoma é acompanhada de sua fração ideal no terreno e nas coisas comuns, indissociáveis entre si. O segundo requisito do condomínio edilício é a vinculação, de modo indissolúvel, das unidades autônomas à fração ideal do terreno onde se assenta o edifício e nas coisas comuns. O § 2º do CC 1.331, que corresponde ao art. 3º da Lei n. 4.591/64, enumera, de modo exemplificativo, quais são as partes comuns do condomínio edilício. Menciona o solo, a estrutura do prédio, o telhado, a rede geral de água, esgoto, gás e eletricidade, a calefação e a refrigeração centrais e o acesso aos logradouros públicos. Alude, ainda, às “demais partes comuns”, que se podem resumir, como fazia a redação superior da lei revogada, “a tudo o que mais sirva a qualquer dependência de uso comum dos proprietários”. O período final do § 2º do CC 1.331 reza que as partes comuns são utilizadas em comum pelos condôminos, não podendo ser alienadas separadamente ou divididas. Como acentua Marco Aurélio S. Viana, a nova redação do preceito não mais veda de modo incisivo, como fazia o art. 3º da Lei n. 4.591/64, a utilização exclusiva de parte comum por um dos condôminos, desde que a unanimidade, em assembleia, delibere nesse sentido. Tome-se como exemplo a laje de cobertura, cuja utilidade atende ao interesse exclusivo do condômino do último andar. A propriedade permanece comum, mas o uso pode ser cedido por unanimidade ao condômino interessado (Comentários ao Código Civil Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. XV I, p. 389). O Enunciado n. 247 da III Jornada de Direito Civil 2004 editou conclusão ainda mais liberal: “Art. 1.331: No condomínio edilício é possível a utilização exclusiva de área ‘comum’ que, pelas próprias características da edificação, não se preste ao ‘uso comum’ dos demais condôminos”. O § 5º do CC 1.331 diz respeito ao terraço de cobertura, dispondo que integra as partes comuns, salvo disposição em contrário na “escritura de constituição” do condomínio. A regra, pois, é dispositiva, porque somente se aplica no silêncio de cláusula negocial em sentido contrário. Há certa imprecisão na utilização do termo “escritura”, vez que a instituição do condomínio edilício pode ter como título instrumento particular. A nova regra consolida entendimento da doutrina e dos tribunais de que nem sempre a laje de cobertura constitui área comum, como dava impressão o art. 3º da Lei n. 4.591/64. O § 3º do CC 1.331, alterado pela Lei n. 10.931/2004, diz que a fração ideal deve ser indicada de modo decimal no momento da instituição do condomínio. A fração ideal, como diz Caio Mário da Silva Pereira, “é a cifra representativa do interesse econômico de cada uma das pessoas participantes do condomínio” (op. cit., p. 98). A lei abandonou o critério, adotado originalmente pelo Código Civil, de calcular a fração de modo proporcional ao valor de cada unidade autônoma. Logo, a fração ideal, agora, tem critério livre, podendo ser calculada tanto tomando como base tanto o valor como o tamanho da unidade autônoma, ou, ainda, em porções iguais a todas as unidades. Prevalece a autonomia privada dos condôminos no momento da instituição do condomínio, respeitados, é claro, os princípios cogentes da boa-fé objetiva, equilíbrio negocial e função social do contrato e da propriedade. Deixa expresso a lei apenas o momento em que a fração ideal deve estar fixada, qual seja, o da instituição do condomínio edilício, ou, caso haja incorporação imobiliária, ao momento de seu registro. Atuais as palavras de Caio Mário da Silva Pereira, para quem “ uma vez estabelecida, é definitiva a quota ideal de cada um”, podendo ser retificada se houver erro material de cálculo. A ocorrência de fatos posteriores, que alterem o valor das unidades, a princípio não muda as frações ideais, salvo deliberação da assembleia geral, “ mas a votação há de ser unânime, pois que o efeito da deliberação repercute na esfera jurídica de todos e de cada um, reduzindo os encargos de alguém em prejuízo de outrem e afetando a distribuição do valor de quotas individuais de cada comunheiro no valor global do edifício” (op. cit., p. 101).

O terceiro requisito do condomínio edilício está positivado no § 4º do CC 1.331: toda a unidade autônoma deve ter acesso à via pública. Pode o acesso ser direto, como de lojas com frente para a via pública, ou indireto, por meio das áreas comuns do edifício, como no caso de apartamentos ou conjuntos comerciais. O que importa é que as unidades autônomas não podem estar encravadas, subordinado o acesso à travessia de outra unidade. O quarto e último requisito do condomínio edilício está previsto no CC 1.332, adiante comentado. Deve haver a vontade dos condôminos voltada à adoção do regime jurídico, mediante instituição do condomínio, levada ao registro imobiliário. Falha grave do Código Civil de 2002 é a omissão quanto ao regime jurídico das garagens. Cabe, de início, ressaltar que as vagas em edifícios-garagem são sempre unidades autônomas. Nos demais casos, há apenas breve alusão ao abrigo de veículos, como parte de utilização exclusiva dos condôminos. Colmata-se a lacuna do Código Civil aplicando-se o que contém o art. 2º, § 1º, da Lei n. 4.591/64. A doutrina e a jurisprudência admitem tripla modalidade das vagas, a saber: a) como coisa comum, absorvida na fração ideal de terreno da unidade autônoma, conferindo o direito de estacionar veículo no espaço comum que se encontrar desocupado, sem demarcação. Admite-se que a convenção de condomínio discipline o uso, ou faça o sorteio de utilização temporária das vagas; b) como acessório de unidade autônoma, reservada a um condômino ou a determinado grupo, sem fração ideal de terreno a ela atrelada, mas demarcada para uso privativo do titular da unidade a que se vincula; distingue-se da modalidade anterior, porque a unidade com vaga acessória tem fração ideal maior no terreno do edifício; c) como unidade autônoma, com fração ideal de terreno a ela atrelada, com designação específica e extremada das demais vagas de garagem. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.341/45. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 12/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo os estudos e entendimentos de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o artigo em comento trata-se do condomínio especial dos edifícios coletivos, ou condomínio horizontal, que teve como base a Lei n. 4.591/1964, tratada hoje pelo CC 1.331 a 1.358, sob o título de “Condomínio Edilício”. E tal, é o referente a condomínios de edifícios coletivos, e consiste na conjugação do direito do uso exclusivo do titular, sobre sua unidade independente, com o direito relativo às partes comuns do condomínio. Esta modalidade de condomínio representa a união da propriedade das partes exclusivas, de cada titular, com a propriedade das partes comuns, ou copropriedade, sendo que estas não podem ser alienadas separadamente, nem divididas. Trata-se, pois, de uma conjunção perpétua e inseparável da propriedade exclusiva com a propriedade em comum, ou copropriedade (Mário, 2004, p. 186). Podem ser livremente alienadas as partes exclusivas, de utilização independente, como as unidades de apartamentos, escritórios, salas, lojas, sobrelojas, com as respectivas frações ideais do solo, como garagens. Admite-se a transformação de uma área em comum em um unidade autônoma, desde que a decisão seja por unanimidade, uma vez que representa uma diminuição da fração ideal de cada coproprietário.

Súmula 478 do Supremo Tribunal Federal: “Na execução de crédito relativo a cotas condominiais, este tem preferencia sobre o hipotecário”.

Enunciados do Conselho da Justiça Federal: 90 “Deve ser reconhecida personalidade jurídica ao condomínio edilício nas relações jurídicas inerentes às atividades de seu peculiar interesse” (alterado pelo enunciado 246); 91 “A convenção de condomínio ou assembleia geral podem vedar a locação de área de garagem ou abrigo para veículos a estranhos do condomínio”; 246 “Fica alterado o Enunciado n. 90, com supressão da parte final: “Deve ser reconhecida personalidade jurídica ao condomínio edilício”; 247 “No condomínio edilício é possível a utilização exclusiva de área ‘comum’ que, pelas próprias características da edificação, não se preste ao ‘uso comum’ do demais condôminos”; 320 “O direito de preferencia de que trata o CC 1.338 deve ser assegurado não apenas nos casos de locação, mas também na hipótese de venda de garagem”. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud  Direito.com acesso em 12.11.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.332. Institui-se o condomínio edilício por ato entre vivos ou testamento, registrado no Cartório de Registro de Imóveis, devendo constar daquele ato, além do disposto em lei especial:

I – a discriminação e individualização das unidades de propriedade exclusiva, estremadas uma das outras e das partes comuns;

II – a determinação da fração ideal atribuída a cada unidade, relativamente ao terreno e partes comuns;

III – o fim a que as unidades se destinam.

Na sequência dos doutores Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o condomínio edilício – ou condomínio especial de edifícios coletivos – será instituído por ato inter vivos, ou por testamento, sobre algum prédio já construído, devidamente registrado no cartório imobiliário.

Enunciados do Conselho da Justiça Federal: 323 “É indispensável a anuência dos adquirentes de unidades imobiliárias no ‘termo de afetação’ da incorporação imobiliária”; 324 “É possível a averbação do termo de afetação de incorporação imobiliária (Lei n. 4.591/64, art. 31 b) a qualquer tempo, na matrícula do terreno, mesmo antes do registro do respectivo Memorial de Incorporação no Registro de Imóveis”; 504 “A escritura declaratória de instituição e convenção firmada pelo titular único de edificação composta por unidades autônomas é título hábil para registro da propriedade horizontal no competente registro de imóveis, nos termos dos CC 1.332 a 1.334”. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud  Direito.com acesso em 12.11.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No diapasão de Francisco Eduardo Loureiro, diz a lei que o condomínio edilício se institui por negócio jurídico inter vivos ou causa mortis, sem alusão à forma pública. É negócio solene que exige a forma escrita, por instrumento particular ou público. Caio Mário da Silva Pereira enumera as seguintes possibilidades de negócios geradores do condomínio edilício: a) várias pessoas se associam para a compra de um edifício já construído por apenas uma delas ou por terceiro e, no negócio de aquisição, estabelecem o regime de propriedade exclusiva sobre as unidades autônomas e as respectivas frações ideais; b) por testamento que estabeleça o regime de condomínio edilício sobre edificação já existente; c) na mesma linha, o doador pode instituir o condomínio edilício no negócio da doação; d) podem os herdeiros, no momento da partilha de construção recebida em condomínio tradicional, instituir o condomínio edilício, atribuindo a cada um deles unidade vinculada a fração ideal; e) um imóvel sob condomínio tradicional pode ser dividido entre os condôminos mediante regime jurídico do condomínio edilício; f) a alienação que o proprietário exclusivo de um edifício faz a terceiros, desmembrando-o em unidades autônomas; g) por construção direta, quando várias pessoas coproprietárias do solo acordam edificar um edifício, atribuindo-se unidades autônomas; h) incorporação de um edifício, que adquire terreno e realiza a edificação, vendendo, durante a construção ou após seu término, unidades autônomas a adquirentes diversos; i) a construção pelo Poder Público, quando edifica e oferece ao particular unidades autônomas (Condomínio e incorporações, 10. ed. Rio de Janeiro, Forense, 2002, p. 108-11).

Os modos acima enunciados são os títulos necessários para a criação do condomínio edilício. Não basta, porém, a emissão de vontade por negócio jurídico. O registro imobiliário é constitutivo do condomínio edilício, porque não se admite que a modalidade especial de propriedade, direito real que é, nasça por mero consenso. Antes do registro, o negócio da instituição gera apenas efeitos inter partes, em especial a localização da posse sobre partes certas da construção e a obrigação de contribuir para o custeio das partes de uso comum, a que doutrina e jurisprudência denominam condomínio de fato. De outro lado, somente pode ser levada a registro a instituição de condomínio de edificação já concluída, atestada por “habite-se” emitido pela autoridade administrativa competente. O registro da incorporação de unidades a construir ou em construção não equivale e nem supre a instituição.

Os três incisos do CC 1.332 tratam dos requisitos do negócio da instituição do condomínio edilício. Alude a parte final do caput do artigo, porém, a outros requisitos previstos em lei especial. Trata-se dos requisitos previstos no art. 8º da Lei n. 4.591/64, que em suas quatro alíneas prevê regras especiais para o condomínio de casas térreas ou assobradadas, bem como detalha a descrição das unidades autônomas, com menção à parte do terreno ocupada pela edificação e a discriminação das áreas de passagem para as vias públicas. As unidades autônomas devem ser numeradas e individualizadas, de modo a tornarem-se inconfundíveis com outras. Deve constar a área privativa da unidade, sem haver necessidade, porém, de descrição dos cômodos. Também a fração ideal da unidade no terreno e nas coisas comuns deve ser fixada em fração ou percentual. A novidade do Código Civil está na exigência de constar da instituição e do registro a destinação das unidades autônomas, se residenciais, comerciais ou mistas. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.346/47. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 12/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

No saber explicitado na doutrina de Ricardo Fiuza, este dispositivo está embasado no art. 7º da Lei n. 4.591, de 16-12-1964, acrescentando apenas o inciso III, que toma requisito essencial para a instalação do condomínio a especificação do fim a que se destinam as unidades. De resto, deve ser dada à matéria o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 683, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 12/11/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.333. A convenção que constitui o condomínio edilício deve ser subscrita pelos titulares de, no mínimo, dois terços das frações ideais e torna-se, desde logo, obrigatória para os titulares de direito sobre as unidades, ou para quantos sobre elas tenham posse ou detenção. 

Parágrafo único. Para ser oponível contra terceiros, a convenção do condomínio deverá ser registrada no Cartório de Registro de Imóveis.

Historicamente, o artigo em análise foi alvo de duas alterações, ambas aprovadas pela Câmara dos Deputados. A primeira no período inicial de tramitação do projeto, por proposta do então Deputado José Bonifácio Neto. No projeto a redação era a seguinte: “Só se considera constituído o condomínio edilício com a inscrição, no Registro de Imóveis, de convenção subscrita pelos titulares de, no mínimo, dois terços das frações ideais, tomando-se ela, desde então, obrigatória para os titulares de direito sobre as unidades, ou quantos sobre ela tenham posse ou detenção”. A alteração procedida pela emenda do Deputado José Bonifácio Neto corrigiu defeito de redação do projeto, que, segundo o seu autor, contrariando “a doutrina e a jurisprudência, constituía-se em porta aberta aos maus condôminos, que não têm consciência de que, no condomínio edilício, tudo é de todos, devendo todos zelar pelo que é comum, inclusive pagando pontualmente os encargos condominiais, pelo bem do todo”. Na segunda alteração, já na fase final de tramitação do projeto, foram substituídas as expressões “inscrita” e “Registro de Imóveis” pela palavra “registrada” e por “Cartório de Registro de Imóveis”, visando adequar a redação do artigo à Lei dos Registros Públicos (Lei n. 6.015173).

Quanto à doutrina que cabe ao relator, Ricardo Fiuza, a convenção de condomínio edilício é o instrumento no qual são prefixadas as normas adotadas para o condomínio em plano horizontal, inclusive o modo como será administrado. Deve ser subscrita por, pelo menos, dois terços dos titulares, sendo também necessário seu registro no Cartório de Registro de Imóveis para ter validade erga omnes. Este dispositivo e seu parágrafo único estão embasados no art. 9º , § 1º e 2º , da Lei n. 4.591, de 16-12-1964, que regulamenta o condomínio em plano horizontal. Traz inovações de redação e é de melhor técnica legislativa, modernizando as expressões. Deve, contudo, ser dispensado a essa matéria o mesmo tratamento doutrinário dado aos dispositivos já apontados da Lei n. 4.591/64. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 683, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 12/11/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Nos saberes de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a convenção do condomínio deve ser assinada por dois terços das frações ideais dos titulares (ou dois terços dos titulares, se as frações forem iguais), tornando-se, a partir daí, de cumprimento obrigatório para os titulares, inquilinos e para quem faça uso do condomínio. Não se exige a forma pública para a elaboração da convenção, bastando que seja subscrita pelo quorum acima referido, salvo se for oposta contra terceiros, quando deverá ser registrada no cartório de imóveis. Poderá dispor sobre qualquer interesse do condomínio, de forma livre, desde que não infrinja a lei e a ordem pública. Súmula 260 do Superior Tribunal de Justiça: “A convenção de condomínio aprovada, ainda que sem registro, é eficaz para regular as relações entre os condôminos”. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud  Direito.com acesso em 12.11.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

quarta-feira, 11 de novembro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 1.327, 1.328, 1.329, 1.330 Do Condomínio Necessário – VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado - Art. 1.327, 1.328, 1.329, 1.330

Do Condomínio Necessário – VARGAS, Paulo S. R. - Parte Especial – Livro IIITítulo III – Da Propriedade (Art. 1.327 a 1.330) Capítulo VI – Do Condomínio Geral – Seção II - Do Condomínio Necessário –

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Art. 1.327. O condomínio por meação de paredes, cercas, muros e valas regula-se pelo disposto neste Código (arts. 1.297 e 1.298; 1.304 a 1.307).

Segundo apontamentos de Francisco Eduardo Loureiro, houve apenas mudança quanto à remissão aos artigos relativos ao direito de vizinhança, agora corretamente circunscritos àqueles que dizem respeito a muros e tapumes. Disciplina o condomínio necessário, ou forçado, que decorre diretamente da lei, independentemente da vontade das partes. Não se aplicam aqui as regras acima estudadas, relativas ao condomínio voluntário, uma vez que não se cogita de divisão ou extinção da coisa comum. A remissão aos CC 1.297, 1.298 e 1.304 a 1.307, já estudados, cria a presunção de que os tapumes de divisa pertencem a ambos os confinantes e também do direito potestativo do proprietário vizinho que depara com o muro já construído de se tornar condômino, indenizando metade da construção e da faixa de terreno. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.338-39. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 11/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na doutrina de Ricardo Fiuza, a esse instituto aplicam-se as regras previstas na Seção IV — Dos limites entre prédios e do direito de tapagem (CC 1.297 e 1.298), bem como as previstas na Seção VII - Do direito de construir (CC 1.304 a 1.1307).  O artigo é idêntico ao art. 642 do Código Civil de 1916, devendo a ele ser dado o mesmo tratamento doutrinário. Ressalte-se que foi criada a denominação “condomínio necessário” em substituição a “condomínio em paredes, cercas, muros, e valas”. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 679, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 11/11/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No lecionar de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, é necessário o condomínio (condomínio legal) quando não tem origem num acordo de vontades, mas sim da imposição da lei. Vem tratado neste dispositivo do Código, e reporta-se ao direito que tem o titular do imóvel vizinho de ser proprietário da metade dos muros, paredes, cercas e valas construídas pelo outro vizinho. Há de se fazer uma leitura deste enunciado legal com a seção referente ao direito de tapagem, constante do CC 1.297 e ss do Código, de onde o proprietário possui direito a cercar, levantar muros, valas ou de tapar, de alguma forma, seu prédio urbano ou rural, assim como a constranger o confinante a proceder consigo à demarcação dos prédios ou aviventar marcos apagados. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud  Direito.com acesso em 11.11.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.328. O proprietário que tiver direito a estremar um imóvel com paredes, cercas, muros, valas ou valados, tê-lo-á igualmente a adquirir meação na parede, muro, valado ou cerca do vizinho, embolsando-lhe metade do que atualmente valer a obra e o terreno por ela ocupado (CC 1.297).

Dando prosseguimento aos comentários Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o proprietário vizinho poderá adquirir a meação do muro divisório construído entre dois prédios, embolsando aquele que edificou, no valor correspondente à metade do valor atual da obra, e não nos gastos efetivados. Tal critério busca manter o equilíbrio por eventual alteração dos preços e equacionar uma esperada demora em relação à época do pagamento. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud  Direito.com acesso em 11.11.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Historicamente, o dispositivo em análise não foi atingido por nenhuma espécie de modificação, seja da parte do Senado Federal, seja da parte da Câmara dos Deputados, no período final de tramitação do projeto. A redação atual é a mesma do projeto. Em sua Doutrina como Ricardo Fiuza leciona, este artigo pressupõe, quanto às paredes divisórias, o direito de obter-lhes a meação; no mais, deve ser aplicada a regra do art. 1.297. É idêntico ao art. 643 do Código Civil de 1916, devendo a ele ser dispensado o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 680, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 11/11/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão de Francisco Eduardo Loureiro, o artigo em estudo tem estreita relação e deve ser lido em conjunto com os CC 1.297 e 1.305, já comentados. O preceito confere ao proprietário o direito potestativo - não sujeito, portanto, a prazo prescricional - de adquirir, a qualquer tempo, a meação do muro ou tapume divisório, desde que indenize ao vizinho que o construiu, ou que sucedeu o construtor, metade do valor atual da obra e do terreno por ele ocupado. O direito está circunscrito ao “proprietário que tiver direito de extremar um imóvel”, o que exclui o mero possuidor e pressupõe divisas certas, para que se saiba onde devem ser colocados os muros e tapumes. Se as divisas não forem certas, primeiro se demarca, depois se estrema com tapumes, paredes ou assemelhados. O clássico Carvalho Santos refere-se à figura em estudo como uma espécie de desapropriação. É, na verdade, uma das várias hipóteses contempladas no Código Civil de alienação compulsória de coisa a quem preencha determinados requisitos previstos na lei. Não cabe ao dono do tapume recusar a aquisição da meação pelo vizinho, nem mesmo propor a sua demolição e construção de nova obra. De outro lado, tratando-se de direito de natureza patrimonial, nada impede que o beneficiário e ele renunciem de modo expresso. É interessante notar que os direitos dos confinantes se entrecruzam. No dizer de Edson Luiz Fachin, “se, de um lado, há o direito potestativo do proprietário que construiu o muro de exigir que o confinante divida as despesas com ele, há, por parte desse confinante, direito de adquirir a meação do muro, se o outro proprietário o construiu por sua própria conta” (Comentários ao Código Civil, coord. Antônio Junqueira de Azevedo. São Paulo, Saraiva, 2003, v. XV, p. 220). A parte final do preceito fixa os parâmetros da indenização, partindo-a em duas verbas distintas. A primeira corresponde à metade do valor atual da obra, o que evita o enriquecimento sem causa de qualquer das partes. De um lado, leva em conta eventual depreciação da construção e, de outro, possível desvalorização do que foi originalmente despendido pelo construtor. Guarda tal critério estreita simetria com a regra da parte final do CC 1.222 do Código Civil, anteriormente comentado. A segunda corresponde à metade do valor do terreno onde estiver assentado o muro ou tapume divisório. Aqui há que fazer uma distinção, reproduzindo o que se disse no comentário ao CC 1.304: “em relação ao valor do chão, somente se aplica a norma se a parede estiver não sobre a linha de divisa, mas rente a ela, dentro da propriedade do vizinho que sofre a restrição”. Se a parede foi construída sobre a linha divisória, não há razão lógica para que se pague pelo que já é seu, em manifesto enriquecimento a favor daquele que construiu o muro ou parede. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.339-40. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 11/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Art. 1.329. Não convindo os dois no preço da obra, será este arbitrado por peritos, a expensas de ambos os confinantes.

Na toada de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o enunciado legal especifica que o valor da obra acima realizada deverá ser apurado devidamente por laudo de um perito profissional, uma vez que não haja acordo bilateral quanto ao preço a ser efetivado. Com base no trabalho técnico, custeado por ambos os confinantes, saberá perfeitamente a outra parte o quanto terá que desembolsar. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud  Direito.com acesso em 11.11.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Tendo pouco a ser dito, aponta Francisco Eduardo Loureiro, caso não haja consenso dos proprietários confinantes quanto ao valor da indenização, será esta fixada judicialmente mediante perícia, cujo valor será, de igual modo, rateado entre as partes. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.340. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 11/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Da mesma forma como reage Ricardo Fiuza em sua doutrina, em havendo desacordo entre os vizinhos, o valor da obra será obtido mediante arbitramento, rateando-se o preço. O texto do dispositivo é idêntico ao do art. 644 do Código Civil de 1916, devendo a ele ser dado o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 680, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 11/11/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.330. Qualquer que seja o valor da meação, enquanto aquele que pretender a divisão não o pagar o depositar, nenhum uso poderá fazer na parede, muro, vala, cerca ou qualquer outra obra divisória.

Sem muito a acrescentar, Ricardo Fiuza em sua doutrina, o vizinho que pretender a divisão, qualquer que seja o valor da meação, se não pagar ou depositar o preço, não poderá fazer uso das divisórias. O artigo é idêntico ao art. 645 do Código Civil de 1916, devendo a ele ser dado o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 680, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 11/11/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Estendendo-se um pouco Francisco Eduardo Loureiro, o artigo em estudo apresenta pequena alteração na redação em relação à norma anterior, mantendo, porém, a substância do preceito. Como acima dito, há direito do proprietário confinante à alienação compulsória do muro ou parede divisória construídos por seu vizinho. A aquisição da metade ideal do muro, porém, é derivada, embora tenha origem na lei, de modo que o título para a transmissão da propriedade é o pagamento do respectivo preço. Não se inaugura matrícula para a aquisição da área onde se assenta o muro divisório, podendo, apenas, ser averbada a acessão. Decorre daí a regra de que o proprietário confinante somente pode usar o muro divisório após efetuar o pagamento ou o depósito do valor correspondente à meação de seu custo e, em determinados casos, de metade do terreno onde se assenta. A utilização sem pagamento configura esbulho, cabendo ao vizinho ofendido usar de ações possessórias e petitórias para fazer cessar o ilícito, se necessário com pedido demolitório cumulativo, atingindo, inclusive, eventual adquirente de boa-fé, dada a natureza propter rem da obrigação. Como acima dito, cuida-se de direito patrimonial disponível, de modo que pode o vizinho construtor permitir a utilização enquanto pende saldo de pagamento. Caso haja inadimplemento, cabem a resolução da avença e o desfazimento do condomínio necessário, dado o seu caráter derivado e causal. Embora haja dúvida na doutrina tradicional, o melhor entendimento é que a instituição de condomínio sobre o tapume de divisa tem natureza constitutiva, e, portanto, efeito ex nunc, de modo que os atos lícitos praticados pelo construtor, na qualidade de então proprietário exclusivo do tapume, não são afetados pela ulterior comunhão. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.340. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 11/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

terça-feira, 10 de novembro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 1.323, 1.324, 1.325, 1.326 Da Administração do Condomínio – VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado - Art. 1.323, 1.324, 1.325, 1.326

Da Administração do Condomínio – VARGAS, Paulo S. R. - Parte Especial – Livro IIITítulo III – Da Propriedade (Art. 1.323 a 1.326) Capítulo VI – Do Condomínio Geral – Seção I - Do Condomínio Voluntário – Subseção II – Da Administração do Condomínio

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Art. 1.323. Deliberando a maioria sobre a administração da coisa comum, escolherá o administrador, que poderá ser estranho ao condomínio; resolvendo aluga-la, preferir-se-á, em condições iguais, o condômino ao que não o é.

Elucubrando os artigos acima, Francisco Eduardo Loureiro aponta que o artigo em exame condensa o disposto no art. 635, § 2º, e no art. 636, ambos do Código Civil de 1916, com pequenas alterações quanto ao conteúdo dos preceitos. Viu-se no comentário ao CC 1.320, que qualquer condômino pode exigir a divisão da coisa comum, ou seja, a manutenção da indivisão exige o consenso unânime de todos os consortes. Caso concordem com a persistência do condomínio, o passo seguinte é deliberar sobre a sua administração, ou seja, a utilização que será dada à coisa comum, de acordo com a sua natureza. O administrador é eleito pela maioria dos condôminos, observada a regra do CC 1.325, adiante comentado. Não há direito de preferência na escolha de administrador, nem preeminência de qualquer condômino. Pode a escolha recair sobre um dos condôminos ou sobre estranhos, em quem confiam os consortes. Embora um só condômino tenha a maioria absoluta de quinhões, todos os demais devem ao menos ser convocados para a deliberação, inclusive para que impugnem a escolha do administrador.

O administrador eleito pelos condôminos tem poderes e responsabilidades equivalentes aos de um mandatário com mandato geral de administração, salvo restrição ou limitação impostas pela maioria. Deve proceder com diligência e seriedade, respondendo aos demais consortes pelos danos a que der causa, ainda que a maioria o ampare. Suas atribuições são diversas: efetua despesas necessárias e úteis, procede ao seu rateio e as repassa aos comunheiros, para que efetuem o pagamento de suas quotas, distribui os frutos e presta contas. Os poderes conferidos ao administrador são de mera administração, não alterando a essência da coisa comum. Não abrangem, portanto, os atos de disposição, quer de alienação do todo ou parte, quer de oneração por direitos reais sobre coisa alheia (hipoteca, penhor, superfície, usufruto, servidão etc.). Essa limitação, todavia, não se estende aos frutos, que podem ser alienados a terceiros, repassando o administrador aos consortes as respectivas partes do proveito.

O direito de administrar ou de interferir na administração da coisa comum tem natureza potestativa e não está sujeito à prescrição ou decadência. Condômino que sempre se sujeitou à administração alheia da coisa comum pode a qualquer tempo intervir na direção do condomínio, exigindo votação para a indicação de administrador, ou a sua destituição. O que prescrevem são as pretensões indenizatórias decorrentes de maus atos praticados pelo administrador. A parte final do artigo regula a hipótese de a deliberação da maioria ser pela locação da coisa. Em tal caso, o condômino prefere a estranhos na locação, ofertando “tanto por tanto”. Tem a norma razão de ser, pois via de regra o condômino melhor zelará pela coisa comum a ele locada, além de seu quinhão ideal responder por eventual inadimplemento. Constitui, ademais, meio eficaz de evitar a fraude da maioria, locando a coisa por valor inferior ao de mercado, em detrimento de condômino minoritário. E omisso o preceito quanto ao modo de exercício da preferência, razão pela qual se aplica a regra do CC 504. Caso diversos condôminos almejem a preferencia, aplicam-se, por analogia, os critérios de prioridades entre os consortes, previstos no CC 1.322, anteriormente comentado. Não cabe à maioria negar a preferência do minoritário, porque a norma em questão é cogente. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.334-35. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 10/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

 

Segundo a, Profª Conceição, Apostila de Direito Civil IV - 6.4 – Administração do condomínio, se os condôminos resolverem que a coisa deve ser administrada, por maioria escolherão também o administrador, que poderá ser estranho ao condomínio. Esse administrador age com um mandato legal, representando todos os condôminos nos seus interesses. Deliberarão também, se o desejarem, a respeito do regime de administração, remuneração do administrador, prestação de contas etc. Resolvendo aluga-la, preferir-se-á, em condições iguais, o condômino ao que não o é (CC 1.323). (Apostila de Direito Civil IV, Profª Maria da Conceição Martins F. Castro, UNITRI, 2017 -  6.4 – Administração do condomínio, no site passeidireto.com/arquivo, Acessado 10/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD)

No lecionar de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a administração do condomínio será decidida por maioria, que escolherá o administrador, podendo ser um estranho ao condomínio. E a maioria será calculada pelo valor dos quinhões de cada um dos comunheiros. Trata-se de expediente bastante comum e até mesmo recomendável, hodiernamente, a administração do condomínio fica afeta a terceiro contratado, geralmente pessoa jurídica, estranha ao próprio condomínio, com qualificações profissionais em matéria de administração, segurança e legislação imobiliária respectivas. O dispositivo também prevê o direito de preferência do condômino em relação a terceiros, quando se deliberar alugar parte da área comum para receber proveitos. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 10.11.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 1.324. O condômino que administrar sem oposição dos outros presume-se representante comum.


No entender de Francisco Eduardo Loureiro, apenas o termo “mandatário”, usado no art. 640 do Código Civil de 1916, foi corretamente substituído pelo termo “representante”, em consonância com o instituto da representação, disciplinado agora de modo específico nos CC 115 a 120 do Código Civil de 2002. Regula o preceito a representação por um condômino decorrente de consentimento tácito dos demais, consistente em comportamento concludente de não oposição aos atos de administração. Esse é um dos casos a que a lei empresta efeitos jurídicos ao silêncio, nos termos do CC 111. Note-se que a anuência tácita de que necessita o administrador não é da unanimidade dos condôminos, mas daqueles que somem a maioria dos quinhões. O consorte que se opuser poderá pedir que os demais se reúnam em assembleia, para deliberar de modo expresso a escolha do administrador. A maioria dos quinhões é que extingue, em votação, a representação tácita.


Os poderes do condômino representante são os mesmos que teria como administrador regularmente eleito, ou seja, não pode praticar nenhum ato de disposição, oneração, ou que exija poderes expressos e especiais. Os direitos e deveres são similares aos do administrador, referidos no comentário ao artigo anterior, inclusive o de prestar contas. Provoca a representação relevantes efeitos em relação a terceiros. Reputam-se válidos e vinculam todos os condôminos os atos de mera administração praticados pelo condômino representante, como a locação, o comodato e as despesas contraídas para a manutenção e conservação da coisa comum. Prestigia a lei a confiança que a conduta concludente de um dos comunheiros, com o beneplácito dos demais, provoca a terceiros que com ele negociam. É necessária, porém, a existência de aparência da representação, aferível caso a caso, não podendo o terceiro descurar-se dos deveres de diligência e de cuidado presentes em todo negócio jurídico. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.336. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 10/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Ricardo Dip, Condomínio – administração e representação – Matrícula – unificação, no site cartório.org, 2015/01/23, leciona que, em relação ao cotejo do item 77.2, a respeito do CC 1.324 “para a unificação de diversas transcrições e matrículas, não deve ser aceito requerimento formulado por apenas 1 (um) dos vários titulares de partes ideais”, seria importante que alguém pudesse trazer futuramente alguma luz sobre esse assunto, uma vez não ter visto tema tratado no âmbito registral, embora comentado que isso tenha sido matéria levantada em uma execução de sentença de natureza ambiental. O caso concreto dizia respeito a dois condôminos de um dado imóvel. Um deles foi citado para ação ambiental e acertou com o Ministério Público que demoliria a casa e reconstruiria a vegetação local. O Ministério Público concedeu um prazo, que foi homologado pelo juiz. Decorrido o prazo sem que houvesse o cumprimento do acordo, o Ministério Público pediu a execução, com cobrança de multa etc. e, nessa altura, o segundo condômino opôs embargos de terceiro, alegando que não poderia responder pela multa, porque não havia participado do acordo e nem tinha sido citado para a ação. O juiz entendeu que os interesses ambientais prevaleciam sobre qualquer interesse e rejeitos os embargos de terceiros. Houve recurso e uma Câmara Extraordinária do Tribunal deu-lhe provimento, entendendo que alguém não citado no processo não pode ser executado quanto a mandamento que não lhe dizia respeito. A surpresa, no entanto, foi que o Ministério Público, que não havia prequestionado o dispositivo o dispositivo do CC 1.324, sustentou, em embargos aclaratórios, que o o condômino que administra sem oposição dos demais comunheiros representa-os e fala em nome deles. Rejeitaram-se esses embargos de declaração, argumentando-se que se tratava de problema de regra processual e constitucional que envolvia o direito do contraditório.

Como Dip comenta ter-se aventado em sessão anterior pela possibilidade de iniciar-se uma discussão em torno desse preceito em vista do que consta na Lei de Registros Públicos, uma vez que, quase sempre, quando a Lei 6.015/73 está copiada nas Normas de Serviço, há referência da lei em nota de rodapé, e aqui não havia, assim, a questão era a de saber se deveria ser aplicado ou não o Código Civil nessa matéria, uma vez ser ( tradição paulista, lembrou-se de uma época em que se deu um problema semelhante, referente a condomínio edilício, em que estava sendo feita alteração de especificação sem anuência de todos os condôminos, na certeza, em sua visão, de que a solução adotada pelas Normas, serem mais adequadas ao sistema do registro, embora necessário saber ser legal, aja vista as Normas da Corregedoria não poderem derrogar o Código Civil. (SJ – o referido dispositivo do Código Civil não pode abalar a ideia do direito de propriedade e todos os seus poderes próprios e inerentes. O dispositivo tinha correspondente no Código civil de 1916, art. 640, e embora não esteja se dispondo nada, como alega Dip, George Takeda contrapõe poder ser causa de um prejuízo muito sério, v.g., se houver dois imóveis, um com cinco mil metros quadrados e outro com seis mil metros quadrados, unificando-os, tem-se um imóvel com onze mil metros quadrados. No momento do desdobro, uma parte irá para a prefeitura e isso criará prejuízo ao proprietário).

Ricardo Dip afirma ser esta possibilidade um risco potencial, e que realmente, deveria ser examinado. Enfim, o tema precisa ser aprofundado. A intenção do levantamento da matéria foi a de chamar atenção para o problema, por isso é uma criação das Normas. Tem-se que ter a consciência de que há uma determinação partida de Norma correcional, de caráter meramente administrativo e possivelmente conflitante com o Código Civil. Há necessidade de encontrar elementos suficientes para justificar a razão pela qual o dispositivo do CC 1.324 do Código Civil não se aplica à unificação. A necessidade é de analisar uma possível compatibilidade entre a prática administrativa e a norma do Código Civil, de modo que se possa saber de que forma enfrentar essa questão quando o problema surgir. Ou Seja, o caso é de utilizar o raciocínio da divisão; se para dividir é necessária assinatura de todos, também o seria para unificar. (SJ – O CC 1.324 tem que ser coordenado com os artigos referentes aos poderes de representação, em especial o art. 119, que diz: “É anulável o negócio concluído pelo representante em conflito de interesses com o representado, se tal fato era ou devia ser do conhecimento de quem com aquele tratou”.

Ricardo Dip crê na necessidade de argumentos doutrinários a respeito dessa norma. Em todas as unificações, esse problema pode dar-se, independentemente de saber se é apenas um proprietário ou todos eles que requerem. O problema é saber se aquele que pede tem legitimidade para fazê-lo sozinho. Propendo a achar que trazem a solução certa, mas não se pode deixar de considerar o CC 1.324, i.é, por que não encontrar um argumento decisivo. Ainda nesse caso mencionado, a impressão é de que o STJ proverá eventual recurso, talvez por prevalência do interesse ambiental. O argumento usado é esse, de que, na espécie, já se passava da mera administração... (Ricardo Dip, Condomínio – administração e representação – Matrícula – unificação, no site cartório.org, 2015/01/23, acesso em 10.11.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Em sua doutrina, Ricardo Fiuza define pobremente o artigo 1.324 com o argumento de ser uma das poucas hipóteses de mandato tácito, que pode simplesmente ficar definido como os atos realizados pelo mandatário, em nome do mandante, sem a prévia autorização dele, mas com sua aprovação, equivalendo ao gestor de negócios (RT, 586/153 e 577/175). Equipara-se o artigo ao de n. 640 do Código Civil de 1916, devendo a ele ser dispensado o mesmo tratamento doutrinário . (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 678, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 10/11/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Definindo a redação do artigo, Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, inspirado na teoria da aparência, o dispositivo presume ser o administrador aquele que, por iniciativa própria e sem oposição dos demais condôminos, assume a gestão do condomínio. A hipótese é aquela em que os condôminos não elegeram nem contrataram administrador profissional, incumbindo-se um dos condôminos, de forma natural e voluntária, a administrar o condomínio como tivesse um mandato tacitamente outorgado. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud  Direito.com acesso em 10.11.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 1.325. A maioria será calculada pelo valor dos quinhões.

 

§ 1º. As deliberações serão obrigatórias, sendo tomadas por maioria absoluta.

 

§ 2º. Não sendo possível alcançar maioria absoluta, decidirá o juiz, a requerimento de qualquer condômino, ouvidos os outros.

 

§ 3º. Havendo dúvida quanto ao valor do quinhão, será este avaliado judicialmente.


Em artigo de Roberto Wagner Marquesi e Ana Cláudia Corrêa Zuin Mattos do Amaral, intitulado Uma Visão Panorâmica Do Condomínio Geral No Código Civil”, questão  tormentosa  repousa  nas  deliberações,  pois,  se  o  CC 1.325,  §  1º., exige maioria  absoluta,  nem  sempre  se  atinge  esse  quorum,  ou  então  ocorre  de  as votações resultarem em empate. Numa e noutra hipótese, qualquer dos condôminos poderá provocar a intervenção  jurisdicional,  mediante  procedimento  especial  de  jurisdição  voluntária,  forte  no art. 1.112, IV, do CPC/1973, (hoje correspondendo ao art. 725 no CPC/2015 Grifo VD). Ouvidos os demais condôminos, proverá o juiz a solução que entender mais  razoável,  não  sendo  obrigado,  nesse  caso,  a  adotar  parâmetro  de  legalidade  estrita  (art. 1.109 do mesmo diploma, correspondendo no atual CPC/2015, ao art. 723, Grifo VD). O  Código  atual  incluiu  a  questão  da  distribuição  dos  frutos  na  subseção  referente à administração (CC 1.326). Dos frutos já se falou em item anterior, aduzindo que sua partilha se dará na proporção dos quinhões. Acrescente-se, contudo, que tal critério é apenas supletivo da vontade, podendo os condôminos, ou ainda o doador ou testador, dispor em contrário. (Roberto Wagner Marquesi e Ana Cláudia Corrêa Zuin Mattos do Amaral, intitulado “Uma Visão Panorâmica Do Condomínio Geral No Código Civil”, Revista do Direito Privado da UEL –Volume 3 –Número 1 www.uel.br/revistas/direitoprivado. Acessado em 10/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Degustando o artigo em comento Francisco Eduardo Loureiro, a norma anterior recebeu aperfeiçoamento em sua redação, eliminando obscuridades então existentes. Foi, ainda, acrescentado o § 3º, que disciplina a mensuração do quinhão em caso de dúvida. A regra do caput do artigo diz que a maioria será calculada não per capita, mas pelo valor dos quinhões. Isso significa que se despreza o número de condôminos, levando-se em conta o volume ou o valor da quota, vale dizer, a maioria dos interesses. Disso decorre que um único condômino pode deter isoladamente a maioria absoluta dos quinhões, e, portanto, concentrar o poder de deliberação. É bom esclarecer o exato significado da expressão “valor do quinhão”: “o que importa é a fração ideal cabível a cada um e não o valor em pecúnia atribuível a essa fração” (Fachin, Edson Luiz. Comentários ao Código Civil, coord. Antônio Junqueira de Azevedo. São Paulo, Saraiva, 2003, v. XV, p. 213). O § 1º diz que o que deliberação da maioria absoluta (metade mais um dos quinhões) delibera vincula a minoria. Tais deliberações, é bom dizer, cingem-se aos atos de administração e gozo da coisa comum. Resta ao condômino minoritário vencido requerer a extinção do condomínio. Não basta a maioria, portanto, quando se trata de disposição ou oneração da coisa, ou mesmo de contrariar a sua destinação natural, ou isentar um consorte do pagamento da sua quota de despesas, ou mesmo fixar as partes cabentes a cada condômino. Exige-se aí a unanimidade. O § 2º reza que, na impossibilidade de deliberar por maioria absoluta de quinhões, qualquer condômino pode superar o impasse requerendo manifestação judicial. Ouvidos os demais consortes, o juiz deliberará no sentido do maior proveito a todos os consortes e preservação da coisa comum, atento, também, à função social da propriedade. Finalmente, o § 3º, novidade introduzida pelo Código Civil de 2002, dispõe que se houver dúvida quanto ao valor, ou o montante do quinhão, haverá avaliação judicial. Somente no caso de dúvida insuperável, não dirimida pelo título ou por outros meios de prova, é que se recorre à avaliação do quinhão. O termo “avaliação” gera perplexidade. Não se trata de avaliar a porção certa da coisa ocupada pelo condômino, no caso de condomínio pro diviso, mas sim de aferir, em caso de dúvida, qual a contribuição dada por consorte para a aquisição da coisa comum. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.337. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 10/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

No entendimento de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a maioria será calculada pelo valor dos quinhões de cada um dos comunheiros. As deliberações serão tomadas por maioria absoluta, que é a metade mais um de todos os condôminos. Assim, se o critério da maioria é o valor dos quinhões, considerando um condomínio de dez titulares, caso dois deles detenham, conjuntamente, mais de 50% do valor dos quinhões, a vontade destes prevalecerá, efetivamente, nas deliberações a serem tomadas.

Exige-se a decisão da totalidade dos condôminos, independentemente dos quinhões, sempre quando um condômino quiser dar posse ou uso de sua fração ideal a terceiros estranhos (parágrafo único do CC 1.314). o critério da maioria absoluta para as deliberações do condomínio é supletivo, ou seja, o condomínio poderá estabelecer expressamente, em convenção, quorum especial diferenciado, podendo, também, não considerar o critério do valor dos quinhões. Não havendo clausula expressa, prevalecerá a vontade legal. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud  Direito.com acesso em 10.11.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.326. Os frutos da coisa comum, não havendo em contrário estipulação ou disposição de última vontade, serão partilhados na proporção dos quinhões.

Encerrando a sessão, como esclarece Francisco Eduardo Loureiro em rápida pincelada, cuida-se de regra dispositiva, ou supletiva, de teor claro. Na falta de disposição negocial entre os condôminos, ou estipulação do doador ou testador da coisa comum, o rateio dos frutos gerados pela coisa comum, civis, naturais ou industriais, é proporcional à força dos quinhões. Vale notar que a lei fala em estipulação entre condôminos. Logo, não basta a deliberação da maioria para inverter a regra do rateio proporcional dos frutos. O alijamento ou o favorecimento do direito dos consortes aos frutos exige o consenso unânime dos condôminos, em exercício da autonomia privada. O rateio desigual dos frutos não impede que o condômino venha, a qualquer tempo, exigir a correção da distorção. O que prescreve é a pretensão à percepção dos frutos vencidos. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.338. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 10/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Lecionando Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a partilha dos frutos da coisa comum na proporção dos quinhões admite estipulação em contrário ou disposição de última vontade. Somente quando não houver tal convenção é que a regra da igualdade, com base no cálculo dos quinhões, deverá ser observada. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud  Direito.com acesso em 10.11.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).