quarta-feira, 18 de novembro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 1.343, 1.344, 1.345, 1.346 Do Condomínio Edilício - Disposições Gerais– VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado - Art. 1.343, 1.344, 1.345, 1.346

Do Condomínio Edilício – VARGAS, Paulo S. R. - Parte Especial –

 Livro IIITítulo III – Da Propriedade (Art. 1.331 a 1.358) Capítulo VII

– Do Condomínio Edilício – Seção I – Disposições Gerais–

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Art. 1.343. A construção de outro pavimento, ou, no solo comum, de outro edifício, destinado a conter novas unidades imobiliárias, depende da aprovação da unanimidade dos condôminos.

Acompanhando a visão de Francisco Eduardo Loureiro, o artigo em exame não tinha correspondente no Código Civil de 1916 nem na Lei n. 4.591/64. Disciplina o artigo modalidade específica de acessão, qual seja, a criação de nova unidade imobiliária, quer por construção de mais um pavimento, quer por edificação de novo edifício no solo. A magnitude do investimento, a alteração das frações ideais das unidades já existentes no solo e nas coisas comuns e a desfiguração do projeto original, com o acréscimo de novos condôminos, tem profunda repercussão na vida condominial, justificando-se, por isso, a aprovação por unanimidade.

Levando em conta a gravidade da alteração, a unanimidade abrange não somente os condôminos aptos a deliberar, como também os inadimplentes. Haveria manifesta desproporção entre a sanção lateral prevista para o inadimplemento - o alijamento das deliberações - e a magnitude da mudança para todos os condôminos, que implica a construção de novas unidades. O que se discute é a possibilidade do suprimento do consentimento injustamente negado por um dos condôminos, quando manifesto for o benefício da acessão para a vida condominial. A propriedade está conformada por sua função social, que não é limite, mas integra seu próprio conteúdo (ver comentário ao CC 1.228). O exercício de um direito que exceda manifestamente sua função social e econômica ou a boa-fé constitui ato ilícito, nos exatos termos do CC 187. Assim sendo, no caso de marcada resistência abusiva de um condômino, pode seu consentimento ser suprido judicialmente.  (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.375. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 18/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Em sua doutrina, Ricardo Fiuza fala como determina o artigo, da necessidade da aprovação de todos os condôminos para a realização de obras em área comum que importem em modificação das frações ideais de terreno. E mais não disse. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 689, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 18/11/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

De proêmio, Marina Vanessa Gomes Caieiro e Luís Fernando Ribas Ceccon, em publicação do artigo “Realização de obras no condomínio edilício”, publicado no site conteudojurico.com.br, em 28 de julho de 2010, trazem o tema em análise consagrando o diploma legal que, trata com especificidade da realização de obras no condomínio, qual seja o CC 1.341, dele constatando-se que: a) as obras destinadas à realização de benfeitorias voluptuárias, consideras as que possuem por escopo somente dar deleite àquele que as fez, não tendo qualquer utilidade por serem obras tão somente para embelezar a coisa e portanto, dependem de voto de aprovação de dois terços (2/3) dos condôminos, no mínimo; b)

A realização de obras denominadas úteis, ou seja, as que visam aumentar ou facilitar o uso do bem, apesar de não serem necessárias, dependem de voto de aprovação da maioria dos condôminos.

Exponencialmente relevante constar quando esse tipo de obra abranger área comum do condomínio, o CC 1.342 faz exigir duas condições: a) aprovação de dois terços (2/3) dos votos dos condôminos, e b) que as obras não sejam passiveis de causar obstáculos à livre utilização, por qualquer dos condôminos, das partes de propriedade exclusiva, ou das que pertencerem à comunhão; c) no que tange à realização de obras que se constituam em necessárias, i.é, aquelas que se destinam a conservar o bem ou evitar sua deterioração o CC 96, parágrafo 3º, explicita o dispositivo legal, em seu parágrafo 1º, que reza “o síndico poderá determinar a sua execução, independentemente de autorização dos condôminos”. Em omitindo-se este, ou em caso de verificar-se impedido, por qualquer motivo, a realização desse tipo de obra poderá ser determinada por qualquer dos condôminos, a observar ainda que: a)se a realização desse tipo de obra for urgente e importar em elevadas montas, aquele que houver determinado a sua execução (síndico ou condômino), deverá levar esse fato ao conhecimento dos demais condôminos, convocando-os imediatamente à reunir-se em assembleia especial; b) se a realização desse tipo de obra não for urgente, mas importar em elevados níveis monetários, somente poderá ser determinada a sua execução após a aprovação dos condôminos, em assembleia, a ser convocada por aquele que tiver interesse.

Pedra angular que norteia em relação ao anotado pelo legislador, as expressões “urgente” e “despesas excessivas”, conforme citações feitas a cargo dos parágrafos 2º e 3º do CC 1.341, a fim de se evitar futuras lides entre os condôminos, alicerçados o que um repute por urgente, outro não; entre o que um considere determinada quantia como despesa excessiva, outro não, também esse aspecto deve ser objeto de apreciação na convenção do condomínio, consistente na delimitação, v.g., de certas condições a serem respeitadas para que seja tomada por urgente a execução de uma obra. E também que se delimite, como suso, um importe monetário tal que, ultrapassado, se comporte como despesas excessivas. Outrossim dispõe, enfim, o parágrafo 4º, do citado dispositivo legal de cunho civilista , “aquele que às suas próprias expensas tiver suportado as despesas com a execução das obras ou reparos necessários no condomínio, tem o direito de exigir o ressarcimento do respectivo numerário, na proporção ajustada na convenção”. Destarte. Essas obras não se reputarem, propriamente como necessárias, a restituição não será devida, mesmo que realizada em benefício de todo o condomínio. Neste diapasão outro dispositivo legal que se refere a obras no condomínio, e que envolve complexa repercussão, encontra-se pautado no CC 1.343, embora tenha se limitado o legislador em prescrever que, em caso de construção de outro pavimento ou no solo comum de outro edifício, objetivando a criação de novas unidades imobiliárias, a aprovação unanime dos condomínios é condição sine qua non para a sua execução.

Nessa seara de pensamento, suponha-se que determinado condômino, desejando erigir mais um pavimento no edifício, destinado a compreender novas unidades imobiliárias, obtenha a aprovação unanime dos demais condôminos para essa finalidade. Assim, indaga-se da forma procedimental à regularização desse ato. Infere-se da questão como ponto de cunho exordial, a premente necessidade de alteração das frações ideais que se encontram distribuídas entre todas as unidades do condomínio, e já consolidadas diante do registro do ato constitutivo do condomínio de per si, com a finalidade de que o novo pavimento adquira a sua respectiva base no solo.

Na mesma esfera de pensamento, dita-se que as frações ideais das unidades já constituídas, restarão diminuídas, e a respectiva proporção que couber às futuras unidades, deverá ser inicialmente adquirida por esse condômino, através de escritura pública de compra e venda, ou por instrumento particular, ressalvado o fato do valor não ser superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente.

O ajuste, suso, deverá ter possuído como seu ingresso diante do Registro Imobiliário, mediante a sequência dos seguintes atos para maior elucidação do tema em fulcro: a) averbação, na matrícula-mãe, onde se encontra lançado o registro do ato constitutivo do condomínio, da ata de aprovação da construção desse outro pavimento, por votação unanime dos condôminos; b) averbação, na matrícula-mãe e nas matrículas de todas as unidades do condomínio, da escritura pública de alteração do ato de instituição do condomínio e de individuação das unidades imobiliárias, onde far-se-á a redistribuição das frações ideais e partes comuns do condomínio, em razão do empreendimento futuro que originará as novas unidades, com cláusula resolutiva; c) averbação da área correspondente ao novo pavimento da matrícula-mãe; d) abertura das matrículas das novas unidades; e) averbação no registro competente, do instrumento de alteração da convenção do condomínio, fazendo a inserção das novas unidades imobiliárias; e f) registro, na matrícula-mãe, da escritura ou instrumento particular de compra das frações ideais que corresponderão às novas unidades imobiliárias.

Por derradeiro, restam explicitadas as normas jurídicas concernentes a disciplina legal do tema ora exposto; delimitando-se, de forma coesa e objetiva os parâmetros legais erigidos para balizarem a realização de obras no contexto fático do condomínio edilício, objeto de estudo corriqueiro e diuturnamente enfrentado pela jurisprudência pátria. (Marina Vanessa Gomes Caieiro e Luís Fernando Ribas Ceccon em publicação do artigo “Realização de obras no condomínio edilício”, publicado no site conteúdojuridico.com.br, em 28 de julho de 2010, acessado em 18.11.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.344. Ao proprietário do terraço de cobertura incumbem as despesas da conservação, de modo que não haja danos às unidades imobiliárias inferiores.

Em sua doutrina, Ricardo Fiuza só alude a ordem literal do legislador, que expõe o óbvio, “este dispositivo estabelece que é dever do proprietário que utiliza a cobertura ou terraço cuidar da sua conservação, arcando com as despesas. Incumbe-lhe, mesmo, reparar possíveis infiltrações de água nos pavimentos inferiores, sempre a suas expensas, nunca onerando o condomínio”, (o que mais não é obrigação de todos os demais condôminos em relação a cada quota-parte, em não permitir o desconforto dos vizinhos em posicionamentos inferiores, Grifo VD). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 689, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 18/11/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão de Francisco Eduardo Loureiro, o terraço de cobertura pode ser área comum ou privativa de uma unidade autônoma. Caso seja área comum, pode ser de uso privativo ou não da unidade do último piso, consoante disposto na instituição de condomínio ou deliberação unânime da assembleia. A regra, portanto, deve ser lida do seguinte modo: a manutenção e a conservação do terraço de cobertura incumbem ao condômino quando integrar a propriedade exclusiva da unidade autônoma ou, ainda que de propriedade comum, for de uso exclusivo de um condômino, que dele se serve. Por exclusão, terraços, lajes e telhados de propriedade e uso comum devem ser mantidos e conservados pelo condomínio. Diz a lei que a conservação deve ser feita de molde a não causar danos aos demais condôminos. A responsabilidade, como ocorre no direito de vizinhança, é objetiva e alcança tanto vazamentos como quedas e calhas, reboco ou outros objetos. Cabe aos condôminos prejudicados, ou sob risco, tanto ação de dano infecto como indenizatórias, ou de execução de fazer ou não fazer, com tutela específica, além de pedido cominatório. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.375. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 18/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Em resumo, o edifício é uma unidade, como leciona Caio Mario da Silva Pereira: “O edifício representa uma unidade. Unidade sob todos os aspectos. Unidade arquitetônica. Unidade técnico-material de sua construção. Unidade orgânica de convivência. Unidade econômica na expressão de sua harmonia externa. Unidade ética, na sua dupla configuração, moral e jurídica” (A propriedade horizontal, novo regime de condomínio. In: Sousa, Sylvio Capanema de (org.). Revista Forense Comemorativa – 100 anos, t. III. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 520). Dessa forma, não se aplica ao condomínio edilício o direito potestativo de pleitear a extinção da comunhão, reconhecido no condomínio comum a qualquer dos coproprietários (CC 1.320 e 1.322). Sob outro aspecto, também se mostra impossível a alienação apenas da propriedade sobre a unidade autônoma ou isoladamente da correspondente fração sobre o terreno e áreas comuns (CC 1.339, § 1º).

A Revista de Direito Privado 2016 – RDPRIV66 – Direitos Reais, p. 261, tópico 3. Hipóteses de uso privativo do terraço. 3.1 – Inclusão do terraço entre as áreas privativas do condomínio, cita: Inicialmente, há que se definir, para os fins da presente investigação, o que se entende por terraço de cobertura. Tanto o Dec. 5.481/1928 como a Lei 4.591/1.964 não mencionam em seus dispositivos o termo “terraço”, o que poderia levar à sua equiparação com o teto ou telhado do edifício. Tal equiparação resultava no entendimento de que no terraço da cobertura se aplicava a mesma disciplina jurídica do teto do edifício, considerado como parte comum do condomínio ao tempo do Dec. 5.481/1928 e expressamente incluído em tal categoria pelo art. 3º da Lei 4.591/1964, de forma a afastar a possibilidade de que sobre ele qualquer dos condôminos, incluindo o proprietário da unidade do último andar, tivesse algum direito em particular. Com o devido respeito, diverge o autor do texto dessa orientação, alinhando-se com aqueles que no regime anterior já distinguiam o teto do terraço de cobertura: “(...) Se não há de compreender como teto do edifício a construção efetuada como terraço, para utilização de um, algum ou de todos os condôminos. Assim, é o comum no Rio de Janeiro e, certamente em muitas outras cidades, a existência dos chamados apartamentos de cobertura, nos quais uma parte destes é constituída exatamente de um terraço a sua frente ou circundando-o, ou então apartamentos que têm acesso ao terraço de cobertura, o qual é privativo daqueles e, inclusive, com acesso único pelos referidos apartamentos” – grifou-se. Dependendo da configuração ou estrutura do edifício, pode-se cogitar de três situações, o teto ou telhado em sentido estrito, que não serve para passear ou andar; terraço de cobertura, sem a existência de unidade autônoma, ligado ao resto do edifício por escadas, corredores ou elevadores comuns, terraço de cobertura, lindeiro a unidade autônoma, com acesso por meio desta. É desta última situação que aqui se trata.

Realmente, a existência de um apartamento de propriedade de apenas um dos condôminos na cobertura do prédio altera a sua destinação e, por conseguinte, a percepção do que pode ou não ser considerado área comum. Ausente tal unidade, não se pode afirmar que qualquer condômino tenha maior interesse no uso do teto ou cobertura do que os demais e tampouco que o seu uso por um deles acarrete peculiar transtorno ou inconveniente a qualquer dos demais. Diversamente, existindo tal unidade, naturalmente o seu proprietário tem maior interesse no uso do terraço que os demais, em razão da proximidade da área, e sofreria ele maiores incômodos pelo uso comum do que os condôminos que habitam os pisos inferiores do edifício.

A respeito deste último aspecto, deve-se desde logo ressaltar que o livre acesso aos demais condôminos (e eventuais convidados) poderia colocar em risco a segurança e o sossego do morador da cobertura, quando não ao menos seria ameaçada a sua intimidade (inexistente no caso dos demais condôminos), razão pela qual o “Poder Judiciário já autorizou o fechamento do terraço ainda quando integrante de área comum, para resguardos os interesses do proprietário de apartamento localizado na cobertura.

Feita tal observação, suso, deve ser ressaltado que, sem embargo do que foi dito, de fato o terraço localizado na cobertura deve em princípio ser considerado como parte da área comum do edifício, não sendo por si só juridicamente relevante a proximidade ou não da unidade autônoma, vez que não localizado no interior desta, que é delimitado por suas paredes, piso e teto. (Mas, Grifo VD, que deixa de ser em caso de venda como quota-parte, no edifício edilício – vide arts. 1.320 e ss). (Revista de Direito Privado 2016 – RDPRIV66 – Direitos Reais, p. 261, tópico 3. Hipóteses de uso privativo do terraço. 3.1 – Inclusão do terraço entre as áreas privativas do condomínio, Acessado 18/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Art. 1.345. O adquirente de unidade responde pelos débitos do alienante, em relação ao condomínio, inclusive multas e juros moratórios.

Como analisa Francisco Eduardo Loureiro, o Código Civil de 1916 não tinha dispositivo correspondente ao artigo em exame. A Lei n. 4.591/64 dispõe apenas, no art. 4º, parágrafo único, com redação dada pela Lei n. 7.182/84, que alienação ou transferência da unidade autônoma e correspondente fração ideal depende de prova de quitação das obrigações do alienante para com o respectivo condomínio. Merece o preceito exame atento.

Não resta dúvida de que as obrigações do titular da unidade autônoma em condomínio edilício têm natureza propter rem, ou seja, existem quando um titular de um direito real é obrigado, devido a essa condição, a satisfazer determinada prestação. Em termos diversos, a pessoa do devedor se individualiza pela titularidade do direito real. Assim, quem adquire unidade autônoma passa a arcar com as respectivas despesas, pois a obrigação é imposta a quem for seu titular (II TACSP, Ap. n. 775.364-00/9, rel. Melo Bueno, JTA-Lex 203/486).

O artigo, porém, vai além. Dispõe que o adquirente arca com todos os débitos do alienante, inclusive multa e juros moratórios. Logo, arca com dívidas vencidas no período anterior ao da aquisição, ultrapassando a natureza propter rem da obrigação. Na lição clássica de Antunes Varela, o artigo em exame descreve verdadeiro ônus real. Segundo o autor, “a diferença prática entre ônus e as obrigações reais, tal como a história do direito as modelou, está em que, quanto a estas, o titular só fica vinculado às obrigações constituídas na vigência do seu direito, enquanto nos ônus reais o titular da coisa fica obrigado mesmo em relação às prestações anteriores, por suceder na titularidade de uma coisa a que está visceralmente unida a obrigação” (Das obrigações em geral, 8. ed. Coimbra, Almedina, 1994, v. 1, p. 202; no mesmo sentido, o profundo estudo de MESQUITA, Manuel Henrique. Obrigações reais e ônus reais. Coimbra, Almedina, 1990).

Disso decorrem relevantes efeitos. Primeiro, o titular da coisa no momento em que se constitui a obrigação responde com todos seus bens. Já o adquirente posterior responde apenas até o valor da coisa onerada, que garante o cumprimento da obrigação (Varela, Antunes. Op. cit., p. 202). Segundo, está revogada a regra do art. 4º, parágrafo único, da Lei n. 4.591/64. Se a própria lei explicita que o adquirente responde pelos débitos anteriores, perde o sentido a prova da quitação de débito existente no momento da alienação. A jurisprudência administrativa do Estado de São Paulo, porém, ainda subordina o registro e a lavratura de escritura de alienação de unidade autônoma à prévia prova da quitação do débito condominial. Silencia a lei quanto a eventuais créditos do alienante. Pense-se na hipótese de uma repetição de indébito ajuizada pelo condomínio, ou uma ação de reparação de danos por vício de construção contra a construtora, por fato anterior, cujo pagamento, porem, seja feito em data posterior à alienação. A interpretação deve ser simétrica, transferindo o alienante ao adquirente todos os direitos incidentes sobre a coisa, salvo convenção em sentido contrário. Equipara-se ao adquirente o compromissário comprador imitido na posse da unidade autônoma, quer seu contrato tenha ou não registro imobiliário. O entendimento dos tribunais, ainda na vigência do antigo Código Civil, teve respaldo no CC 1.334, § 2º, do atual Código, já comentado, e equipara ao condômino, para efeito da cobrança de despesas, o usufrutuário, o nu-proprietário, o cessionário de direitos de compromisso de compra e venda e o arrematante (II TACSP, Ap. n. 839.428-00/0, rel. Antonio Rigolin; Ap. n. 663.356-00/3, rel. Celso Pimentel).

O entendimento firme do Superior Tribunal de Justiça, seguido pelas Cortes Estaduais, é no sentido de que “a ação de cobrança de cotas condominiais pode ser proposta tanto contra o proprietário como contra o promissário comprador, pois o interesse prevalente é o da coletividade de receber os recursos para o pagamento das despesas indispensáveis e inadiáveis, podendo o credor escolher - entre aqueles que tenham uma relação jurídica vinculada ao imóvel (proprietário, possuidor, promissário comprador etc.) - o que mais prontamente poderá cumprir com a obrigação, ressalvado direito regressivo contra quem entenda responsável” (REsp n. 223.282/SC, rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar). A natureza das despesas condominiais permite, mais, que a ação de cobrança seja ajuizada diretamente contra o locatário ou o comodatário, se assim for de interesse do condomínio. O artigo usa a expressão genérica adquirente, não restringindo às aquisições por negócio jurídico, de modo que também alcança as vendas judiciais, atingindo o arrematante e o adjudicatário. Como adquirentes da unidade, assumem o polo passivo de eventual ação de cobrança em aberto, ainda que já tenha sido esta julgada (II TACSP, AI n. 713.594-00-7, rel. Soares Levada). Exceção óbvia a essa regra está na arrematação levada a efeito na execução das próprias despesas condominiais, caso em que há uma sub-rogação real, e o condomínio satisfará seu crédito com o produto da arrematação, ainda que o valor do crédito seja superior ao valor da unidade autônoma. O executado, exproprietário, responderá com o seu patrimônio por eventual saldo remanescente.

No caso de imóvel gravado com direito real de usufruto, divide-se a jurisprudência. Ora aplica o disposto nos CC 733 e 734, repartindo a responsabilidade de acordo com a natureza das despesas (ordinárias carreadas no usufrutuário e extraordinárias ao nu-proprietário), ora determina que somente o usufrutuário responda pelas despesas, ora somente o nu-proprietário, ou, finalmente, ambos em litisconsórcio. Entendo que a última posição é a melhor, até porque o direito real de usufruto não é alienável e, portanto, impenhorável. Assim, perante o condomínio ambos são responsáveis pela despesa e as regras dos CC 733 e 734 somente têm relevância em sede de direito de regresso, nas relações internas entre nu-proprietário e usufrutuário. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.376-77. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 18/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Das Hipóteses de uso privativo do terraço. 3.1 – Inclusão do terraço entre as áreas privativas do condomínio. (in: Revista de Direito Privado 2016 – RDPRIV66 – Direitos Reais, p. 264 e ss: “Aliás, mesmo no regime do Dec. 5.481, em que se entendia ser imperativo o preceito (art. 2º) que elencava as áreas comuns, começando pelo “terreno em que montam o edifício e suas instalações”, defendia a doutrina que este deveria ser interpretado inteligentemente, afirmando Wilson de Campos Batalha que “o terreno que é de propriedade comum e inalienável é o terreno necessário ao edifício e não o terreno supérfluo; este último pode ser alienado, separadamente das fações autônomas”. Se a correção desse entendimento poderia ser colocada em dúvida ao tempo da vigência dos diplomas legais revogados, o mesmo não pode ser dito a propósito do regime legal vigente, vez que o § 5º do CC 1.331, expressamente admite que por disposição contida na escritura de constituição do condomínio o terraço de cobertura seja considerado área de propriedade exclusiva.

Em sendo esse o caso, o terraço será parte integrante da unidade autônoma localizada na cobertura e, portanto, de propriedade exclusiva do condomínio ao qual ela pertencer. Propriedade privativa e não propriedade comum de uso exclusivo. Corroborando esta possibilidade, o CC 1.344 dá um passo além e estabelece qual a consequência de se atribuir ao titular da unidade localizada na cobertura a propriedade sobre o respectivo terraço: a assunção pelo proprietário das despesas com a sua conservação, evitando que haja dano aos demais condôminos. Outrossim, pode-se cogitar de que após a instituição do condomínio os condôminos reunidos em assembleia deliberem converter o terraço em área particular ou aliená-lo ao proprietário da unidade da cobertura, solução mencionada pela doutrina, que, contudo, nem sempre poderá ser levada a efeito, vez que demanda do consentimento unânime de todos (CC 1.351) por resultar em alteração das frações ideais de todas as unidades autônomas. (Revista de Direito Privado 2016 – RDPRIV66 – Direitos Reais, p. 264, tópico 3. Hipóteses de uso privativo do terraço. 3.1 – Inclusão do terraço entre as áreas privativas do condomínio, Acessado 18/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Art. 1.346. É obrigatório o seguro de toda a edificação contra o risco de incêndio ou destruição, total ou parcial.

Dividindo conhecimento Francisco Eduardo Loureiro explica que o art. 13 da Lei n. 4.591/64 disciplinava o tema deste artigo com mais minúcia, inclusive estabelecendo prazo para a sua realização e cominando pena de multa para sua falta. A norma é cogente e o seguro obrigatório, tendo por objeto toda a edificação e como riscos mínimos incêndio ou destruição. É incumbência do síndico contratar o seguro, não valendo deliberação em contrário da assembleia. As despesas com o pagamento do prêmio são ordinárias. A indenização abrange a edificação, mas, salvo disposição contratual mais extensiva, não as benfeitorias e objetos que se encontrem no interior das unidades autônomas. Nada impede que os condôminos façam individual ou mesmo coletivamente seguro facultativo complementar, com o propósito de cobrir os riscos e interesses excluídos pela apólice compulsória. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.379. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 18/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Matéria de 15 de abril de 2016 no site seucondominio.com.br, encontrada com título “Seguro de condomínio é obrigatória”, contém o seguinte teor: Até a década de 1970, as casas eram o sonho de consumo habitacional de boa parte dos brasileiros. Contudo, a partir de meados da referida década novos modelos habitacionais começara a disseminar pelo espaço arquitetônico nacional, mais especificamente, os condomínios verticais. Tal situação foi desencadeada pelo mercado imobiliário como maneira de majorar seus lucros, numa época que grandes espaços urbanos já começavam a se tornar escassos e caros. Sabe-se que toda decisão resulta em uma consequência. Neste caso, denotou-se que a reunião de grande contingente de pessoas em unidades autônomas em um lote antes ocupado por uma ou duas famílias gerou o aumento exponencial da complexidade social existente, visto a necessidade de conciliar os mais diversos anseios pessoais.

Nesta linha de raciocínio, as consequências desta complexidade social (brigas entre vizinhos, problemas com garagem, normatização de visitas, garantia do sossego, entre outros), via de regra, restou para o síndico gerenciar. Salienta-se que o síndico foi devidamente escolhido pelos proprietários em assembleia geral para este fim (CC 1.347),  gerenciamento do condomínio. Se já não bastasse essa enorme ocupação de conciliar as várias necessidades dos condôminos, a legislação de regência encampada principalmente pelo Código Civil de 2002 e a Lei n. 4.591/64, atribuiu ao síndico eleito uma série de competências arroladas ao CC 1.348. Apesar do CC 1.348, do Código Civil vigente atribuir uma grande quantidade de responsabilidades do síndico, tratar-se-á neste ensaio sobre especificidade inserida no inciso IX do referido artigo – (CC 1.348, IX – realizar seguro da edificação). Assim sendo, o objetivo central deste artigo é demonstrar a importância jurídica e fática de manter-se atualizado o contrato de seguro garantidor da higidez condominial, regulado tanto pelo CC 1.346, quanto pelo art. 13 da Lei n. 4.591/64.

Pois bem, percebe-se que tanto o CC 1.346, quanto a Lei n. 4.591/64 (art. 13), determinaram pela obrigatoriedade da existência de seguro capaz de assegurar toda a edificação contra o risco de incêndio ou destruição, total ou parcial. Neste ponto, não há que pugnar pela possibilidade do afastamento da contratação de seguro que venha cobrir o mínimo estabelecido pela legislação (risco de incêndio ou destruição, total ou parcial. Em outras palavras, nem a Assembleia Geral que é o órgão interno máximo dos condomínios tem o poder de deliberar sobre a não contratação de seguro mínimo determinado pela lei nacional. Ora, a intenção do legislador foi obviamente a garantia mínima de sobrevivência do condomínio em casos mais graves. Ademais, preocupou o legislador em prezar pela segurança de vizinhos do condomínio, visto a possibilidade nunca descartada da realização de prejuízos materiais ao patrimônio de terceiros, em decorrência de incêndios e/ou destruição.

É importante ressaltar que coberturas adicionais (danos elétricos; responsabilidade civil do síndico; acidentes pessoais, entre outros) podem ser deliberados em Assembleia Geral. A lei não foi clara ao dispor sobre o quorum para este tipo de deliberação. Assim, caso não exista prescrição expressa na Convenção de Condomínio, entende-se que a maioria simples tem o poder de decidir o assunto. Indo adiante, entende-se que o gasto com o seguro obrigatório é uma despesa ordinária. Dessa maneira, cabe a todo proprietário arcar com sua cota parte da despesa por meio de rateio, levando em conta a sua fração ideal, i.é, em condomínios que existem diversas frações ideais, o proprietário pagará proporcionalmente pelo tamanho da sua respectiva. Por ser uma despesa ordinária, contratualmente pode ser imposto seu pagamento ao locatário. (Matéria de 15 de abril de 2016 no site seucondominio.com.br, encontrada com título “Seguro de condomínio é obrigatória”, Acessado 18/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Arrematando, a Doutrina de Ricardo Fiuza, este artigo obriga a contratação de seguro, e está embasado no art. 13 da Lei n. 4.591, de 16-12- 1964, que regulamenta o condomínio em plano horizontal. Além de trazer inovações de redação, é de melhor técnica legislativa, modernizando as expressões. No mais, deve ser dado a essa matéria o mesmo tratamento doutrinário dispensado ao dispositivo apontado da Lei n. 4.591/64. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 689, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 19/11/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

terça-feira, 17 de novembro de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 1.340, 1.341, 1.342 Do Condomínio Edilício – VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado - Art. 1.340, 1.341, 1.342

Do Condomínio Edilício – VARGAS, Paulo S. R. - Parte Especial –

 Livro IIITítulo III – Da Propriedade (Art. 1.331 a 1.358) Capítulo VII

– Do Condomínio Edilício – Seção I – Disposições Gerais–

digitadorvargas@outlook.com  - vargasdigitador.blogpot.com

 

Art. 1.340. As despesas relativas a partes comuns de uso exclusivo de um condômino, ou de alguns deles, incumbem a quem delas se serve.

Na visão de Francisco Eduardo Loureiro, são as despesas do condomínio provenientes da manutenção ou melhoramentos das partes comuns do edifício, uma vez que cada condômino arca com as despesas oriundas da própria unidade autônoma. Ocorre, porém, que certas partes, embora de natureza comum, servem ao uso exclusivo de um ou alguns condôminos. Em tal caso, as despesas dessas partes, em última análise, revertem somente em proveito de um ou de uma classe de condôminos, não sendo razoável que o rateio seja feito entre todos. Tomem-se como exemplos os casos de edifícios mistos, com lojas no pavimento térreo e apartamentos ou escritórios nos andares superiores. O condômino titular da loja, que, via de regra, face a sua área privativa, tem grande participação na fração ideal de terreno, não deve participar do rateio de despesas relativas à manutenção ou reforma de elevadores ou de manutenção das escadas internas do prédio. Isso porque, embora áreas comuns, sua utilização ou serviços não têm qualquer potencial utilidade para os lojistas. Já decidiu o STJ que “do rateio das despesas de condomínio não pode resultar deva arcar o condômino com aquelas que se refiram a serviços ou utilidades que, em virtude da própria configuração do prédio, não têm, para ele, qualquer préstimo” (REsp n. 164.672/PR, rel. Min. Eduardo Ribeiro). O que visa o preceito é evitar o enriquecimento sem causa, hoje positivado como cláusula geral no CC 884 do Código Civil, do condômino ou grupo de condômino em proveito dos quais reverte o proveito exclusivo de certas despesas, pagas, porém, pela totalidade dos comunheiros. A regra do CC 1.340 é cogente, de modo que prevalece sobre disposição convencional, ou decisão de assembleia. Constitui exceção à regra geral do rateio de despesas prevista no CC 1.336,1, anteriormente examinado.

Note-se que, para eximir-se do rateio, não basta que o condômino não use, ou opte por não usar certos serviços ou áreas comuns. É necessário que não possa usá-los, quer por não ter acesso livre a certas áreas, quer porque os serviços nem potencialmente possam trazer-lhe qualquer vantagem. Se o serviço se encontra à disposição do condômino e este, por problemas ou circunstâncias pessoais, não o utiliza, embora possa utilizá-lo, deve participar do rateio de seu custo. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.370-71. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 17/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Não sobra muito para dizer, no comentário de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira. Inspirado no princípio da vedação ao enriquecimento sem causa, o Código dispõe que as despesas relativas a partes comuns, mas de uso exclusivo de um condômino, ou de alguns, incumbem a quem delas se serve.  (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com acesso em 17.11.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Por sua vez, Ricardo Arruda em sua doutrina aponta prever este dispositivo que o pagamento das despesas que concernem ao uso exclusivo das áreas comuns, como por exemplo, a cobertura do edifício, o hall de elevador privativo etc., compete ao condômino que as utiliza. Tal dispositivo consagra, mais uma vez, o princípio que veda o enriquecimento sem justa causa. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 687, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 17/11/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.341. A realização de obras no condomínio depende:

I – se voluptuárias, de voto de dois terços dos condôminos;

II – se úteis, de voto da maioria dos condôminos.

§ 1º. As obras ou reparações necessárias podem ser realizadas independentemente de autorização, pelo síndico, ou, em caso de omissão ou impedimento deste, por qualquer condômino.

§ 2º. Se as obras ou reparos necessários forem urgentes e importarem em despesas excessivas, determinada sua realização, o síndico ou o condômino que tomou a iniciativa delas dará ciência à assembleia, que deverá ser convocada imediatamente.

§ 3º. Não sendo urgentes, as obras ou reparos necessários, que importarem em despesas excessivas, somente poderão ser efetuadas após autorização da assembleia, especialmente convocada pelo síndico, ou, em caso de omissão ou impedimento deste, por qualquer dos condôminos.

§ 4º. O condômino que realizar obras ou reparos necessários será reembolsado das despesas que efetuar, não tendo direito à restituição das que fizer com obras ou reparos de outra natureza, embora de interesse comum.

Historicamente, observe-se o texto original do projeto: “A realização de obras voluptuárias depende de aprovação da unanimidade dos condôminos; a das obras úteis depende da de dois terços de seus votos; as obras ou reparações necessárias podem ser realizadas pelo síndico independentemente de autorização. Parágrafo único. Se as obras, ou reparações necessárias importam despesas excessivas, deve o síndico dar prévio conhecimento delas à assembleia, salvo quando sejam absolutamente indispensáveis e urgentes. No impedimento ou omissão do síndico, podem estas ser efetuadas por iniciativa de qualquer dos condôminos. Mas não terá o condômino direito a reembolsar das despesas que fizer com obras, ou reparações, de outra natureza, embora no interesse comum.” Do exposto fácil é verificar que a Emenda de n. 139, de autoria do eminente Senador Itamar Franco, buscou flexibilizar o procedimento. servindo ao conjunto dos interessados. A justificativa da emenda apresentada perante o Senado Federal, e com a qual anuiu o relator Fiuza, foi a seguinte: “A emenda confere nova redação ao CC 1.341, desdobrando o parágrafo único em três parágrafos. o desdobramento empresta maior clareza ao texto. Também procede a redução do quorum de unanimidade para dois terços, no caso de autorização para obras e reparações voluptuárias, e de dois terços para maioria absoluta, no caso de obras e reparações úteis. A experiência mostra a dificuldade de reunião da assembleia de condôminos para deliberações convenientes.

Com o conhecimento que leciona Ricardo Fiuza em sua doutrina, este dispositivo legal fixa quorum qualificado para a aprovação de realização de obras no condomínio. Faz a distinção entre benfeitorias necessárias, úteis e voluptuárias, permitindo que, quando se trata de obra necessária e urgente, o síndico, ou qualquer condômino, se o síndico for omisso, poderá fazê-la, independentemente de autorização da assembleia, devendo aprová-la posteriormente. Prevê também o reembolso ao condômino que fez obras necessárias no condomínio, se comprovadas. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 688, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 17/11/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Não se estendem os autores Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  que no seu parecer: Benfeitorias voluptuárias se fazem com a aprovação de dois terços dos condôminos; as úteis com o voto da maioria simples; as necessárias podem ser realizadas pelo síndico, independentemente de autorização e, na omissão, por qualquer condômino. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com acesso em 17.11.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).


Mais focado no tamanho do problema, ao que parece, Francisco Eduardo Loureiro, traz um resumo mais completo a começar pela ausência de dispositivo  correspondente no Código Civil de 1916, tampouco na Lei n. 4.591/64. Inova o legislador, ao exigir a aprovação por critérios determinados e distintos para cada modalidade de obra a ser realizada se a aprovação de obras se daria por maioria simples ou qualificada. No silêncio, incidia a regra geral da aprovação por maioria simples.

O princípio da norma é o da exigência de aprovação por maioria inversamente proporcional à indispensabilidade da obra. Quanto menos necessária a obra, mais elevado o quorum para sua aprovação. A norma é cogente, de modo que prevalece sobre disposição convencional em sentido contrário, que dispense maioria absoluta ou qualificada. Nada impede, todavia, que a convenção exija quóruns mais rigorosos do que a lei.

Como visto anteriormente, a discussão acerca da incidência da norma sobre convenções registradas anteriormente à vigência do atual Código Civil gera polêmica. Vale o que foi dito para a questão da multa moratória devida pelo condômino em atraso. Os que entendem que a convenção tem natureza contratual, de modo coerente defendem que a nova lei não pode retroagir para alcançar o ato jurídico perfeito. Os que entendem que a convenção tem natureza de ato-regra, gerando direito estatutário, admitem a imediata incidência da nova norma de ordem pública, corrente que parece preferível, evitando a incerteza da persistência de duplo regime jurídico do condomínio edilício, os constituídos anteriormente ou posteriormente ao Código Civil.

O caput do artigo fala em “obras” no condomínio, termo que merece detida investigação. A expressão exclui acessões, tratadas nos artigos subsequentes, mas deve ser interpretada em sentido amplo, englobando não somente construções, como também todo e qualquer melhoramento, aí incluída a aquisição de pertenças e investimentos em geral, como decoração do hall de entrada, aquisição de objetos, paisagismo ou mesmo a contratação de certos profissionais, como professores de línguas ou instrutores de ginástica para ministrar aulas no edifício. Embora não diga a lei, devem ser tais investimentos de certa magnitude ou de custo excessivo. Não teria sentido, como é óbvio, exigir a aprovação da assembleia para adquirir objetos e serviços de valor reduzido, ainda que de natureza voluptuária, ou de mero deleite dos condôminos. A expressão abrange as benfeitorias, ou seja, os investimentos que se fazem numa coisa para conservá-la, melhorá-la ou embelezá-la, mas não as acessões, que criam coisas novas e são reguladas no artigo subsequente. Utiliza a lei a mesma classificação das benfeitorias da Parte Geral do Código Civil, dividindo-as em necessárias, úteis e voluptuárias. As categorias, porém, não são estanques, podendo uma obra ser voluptuária em determinadas circunstâncias, mas útil em outras.

Em relação às obras voluptuárias, exige a lei aprovação pela maioria qualificada de “dois terços dos condôminos”. Comporta a regra algumas observações. A maioria qualificada a que alude a lei é para aprovação da obra e não o quorum para instalação da assembleia. Os dois terços se contam sobre o universo daqueles aptos a votar, não somente dos presentes, excluídos, portanto, os inadimplentes. Caso contrário, causaria o impedimento efeito contrário ao que almeja a lei, prejudicando duplamente os demais condôminos pontuais. Embora se refira a condôminos, na verdade a contagem dos votos se faz na forma prevista no parágrafo único do CC 1.352, adiante comentado, ou seja, com a força das frações ideais no solo e nas outras partes comuns pertencentes a cada condômino, salvo disposição diversa na convenção. A matéria a ser deliberada deverá constar obrigatoriamente da convocação da assembleia. Em relação às obras úteis, exige a lei aprovação por maioria absoluta, estendendo-se, no mais, o que já se disse sobre as obras voluptuárias.

A deliberação da maioria qualificada ou absoluta - dependendo da natureza da obra - vincula a minoria, ainda que discordante. Embora existam julgados divergentes, não pode a minoria - daí a exigência de quorum elevado - eximir-se do pagamento, a pretexto de que a despesa é incompatível com a categoria do edifício, ou muito dispendiosa. A única eximente aceitável é a amparada no CC 1240, já comentado, qual seja, de que a melhoria reverterá apenas em proveito de um ou determinado grupo de condôminos, sobre os quais deverá recair o rateio.

Em relação às obras - englobando melhoramentos, pertenças e serviços - necessárias, a disciplina é diversa. São indispensáveis à conservação da coisa comum, que, sem elas, corre o risco de se deteriorar ou perecer ou, ainda, sofrer sanções do Poder Público. A lei cria duas categorias de obras necessárias e lhes dá tratamento distinto: a) urgentes e não urgentes; b) de custo excessivo e de custo moderado.

As obras necessárias de custo moderado - urgentes ou não - podem ser feitas pelo síndico, ou, em sua omissão ou impedimento, por qualquer condômino, independentemente de prévia deliberação da assembleia geral. A expressão “custo não excessivo”, ou moderado, é indeterminada e deve ser preenchida pelo juiz no caso concreto, levando em conta sua proporção em relação à arrecadação do condomínio e o reflexo que causará na contribuição dos condôminos. Obra de preço moderado em condomínio de alto padrão certamente será de custo excessivo em condomínio popular.

As obras de custo excessivo podem ser urgentes ou não. Caso sejam urgentes, podem e devem ser feitas pelo síndico ou, em sua omissão ou impossibilidade, por qualquer condômino, submetidas ao posterior placet da assembleia, por maioria simples, que deve ser convocada imediatamente. Pode a assembleia deixar de chancelar a obra já realizada, quer entendendo não ser ela necessária, quer não urgente, quer rejeitando o custo de sua realização. Como consequência, deve determinar ao síndico a devolução da quantia gasta, ou negar o reembolso das despesas já feitas, levando em conta, sempre, o efetivo benefício auferido pelo condomínio, para evitar o enriquecimento sem causa.

Caso as obras necessárias sejam de custo excessivo e não urgentes, se impõe a aprovação prévia em assembleia, por maioria simples, valendo o que foi dito, quanto à convocação e à contagem de votos, para as obras voluptuárias.

Com o objetivo de impedir que um condômino realize isoladamente por conta própria as obras que entender cabíveis e após pretenda ratear seu custo com os demais condôminos, restringe a lei, no § 4º do artigo em exame, o reembolso das obras necessárias. As obras úteis e voluptuárias, embora revertam em benefício do condomínio, não são indenizáveis ao condômino que as fez sponte própria, em posição simétrica à do possuidor de má-fé. Cabe apenas indenização pelas benfeitorias necessárias, sem, contudo, direito de retenção, incompatível com a persistência e os fins do condomínio edilício, uma vez que são as obras realizadas em áreas comuns. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.372-74. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 17/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Art. 1.342. A realização de obras, em partes comuns, em acréscimo às já existentes, a fim de lhes facilitar ou aumentar a utilização, depende de aprovação de dois terços dos votos dos condôminos, não sendo permitidas construções, nas partes comuns, suscetíveis de prejudicar a utilização, por qualquer dos condôminos, das partes próprias, ou comuns.

Da mesma forma que o artigo anterior, o artigo em exame não tinha, na concepção de Francisco Eduardo Loureiro, correspondente no Código Civil de 1916 nem na Lei n. 4.591/64. Trata o artigo das acessões, desde que não constituam novas unidades autônomas, ou, na dicção da lei, feitas em acréscimo às já existentes. Essa é a diferença em relação ao artigo antecedente, que tratava apenas de benfeitorias ou melhoramentos em coisas já existentes, mas sem acréscimo, sem a criação de coisas novas.

Levando em conta a maior magnitude da obra, impõe a lei, por norma cogente, que se sobrepõe à convenção, quorum qualificado de dois terços dos condôminos para sua aprovação. O que foi dito no artigo anterior sobre a composição do quorum e cômputo da maioria aqui se aplica.

Coloca a lei claros limites à aplicação da norma. As obras serão sempre em partes comuns e se somarão ou complementarão outras obras já existentes. São os casos, por exemplo, de construção de uma piscina na área de recreio, de ampliação de vestiários para implantação de uma sauna ou da construção de uma churrasqueira, em complementação aos equipamentos de lazer. Visam a facilitar ou aumentar a utilização das áreas comuns, em proveito de todos os condôminos. Não podem as novas construções, todavia, converter área comum em área de proveito de apenas um ou alguns condôminos, como construção de garagens para certas unidades autônomas. Também não podem as obras vir em detrimento de qualquer das unidades autônomas, prejudicando sua insolação, ventilação, sossego ou privacidade dos ocupantes ou condôminos. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.374. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 17/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Repete o histórico, o conceito de Francisco Eduardo Loureiro acima, o artigo em exame não ter correspondente no Código Civil de 1916 nem na Lei n. 4.591/64, seja da parte do Senado Federal, seja da parte da Câmara dos Deputados, no período final de tramitação do projeto. A redação atual é a mesma do projeto.

Também muito sucinta a atuação do relator em sua doutrina, prevendo este artigo a necessidade de quorum qualificado também para a aprovação de realização de obras de acréscimo em área comum, sendo que essas obras serão vedadas se causarem prejuízo, dificultando a utilização da área comum. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 689, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 17/11/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

O comentário de Luiz Antonio Scavone Junior, a estrutura dos condomínios edilícios mudou radicalmente nos últimos anos. Com efeito, cada vez mais os projetos contemplam, no mesmo condomínio, diversos edifícios e áreas comuns que não se limitam mais aos tradicionais equipamentos de outrora, como as piscinas, quadras poliesportivas, churrasqueiras, saunas e salões de festas. Os projetos atuais contam com equipamentos e serviços cada vez mais sofisticados. Em consonância com o acatado, vemos clínicas de estética, brinquedotecas, academias de ginástica, restaurantes e, muitas vezes, centros comerciais agregados. As grandes áreas comuns, igualmente são compostas por trilhas, bosques, lagos, pistas para corrida, quadras de tênis e espaços de uso variado. Evidentemente que as necessidades de manutenção, obras e adequações desses condomínios diferem daquelas necessidades de um condomínio formado por torre única que, afinal, inspirou a legislação condominial vigente no Código Civil ainda sob a inspiração da vetusta Lei n. 4.591/1964.

Em sendo assim, torna-se necessário estender os comentários à realização de obras úteis e voluptuárias – aparente antinomia do texto legal. Quando ao quórum para aprovação de obras úteis e voluptuárias nos condomínios edilícios, a disciplina da matéria resulta, inicialmente, da conjugação dos CC 1.341 e 1.342.

Posta assim a questão, esta obra dependeria da aprovação da maioria dos condôminos, estipulada pelo CC 1.341, II, ou do quórum qualificado de dois terços exigido pelo CC 1.342. Aliás, a princípio, difícil é imaginar qualquer obra em condomínio edilício que não se configure como “obra de acréscimo às já existentes”. Com efeito, existe um sistema jurídico que deve, pelas mãos do intérprete, surgir da unificação das normas e dos princípios com o firme propósito de formular conceitos lógicos extraídos dos textos de direito positivo que sejam despidos das contradições decorrentes da linguagem equivoca da lei, formando um conjunto harmônico e passível de aplicação.

Nesta medida, anote-se a lição que inça da doutrina de Norberto Bobbio como premissa daquilo que será adotado para a solução do problema sistemático proposto: “A coerência não é condição de validade, mas sempre condição para a justiça do ordenamento. É evidente que quando duas normas contraditórias são ambas válidas, e pode haver indiferentemente a aplicação de uma ou de outra, conforme o livre-arbítrio daqueles que são chamados a aplicá-las, são violadas suas exigências fundamentais em que se inspiram ou tendem a inspirar-se os ordenamentos jurídicos: a exigência da certeza (que corresponde ao valor da paz ou da ordem), e a exigência da justiça (que corresponde ao valor da igualdade). Onde existem duas normas antinômicas, ambas válidas, e, portanto, ambas aplicáveis, o ordenamento jurídico não consegue garantir nem a certeza, entendida como possibilidade, por parte do cidadão, de prever com exatidão as consequências jurídicas da própria conduta, nem a justiça, entendida como o igual tratamento das pessoas que pertencem à mesma categoria".

A solução desta primeira aparente antinomia passa, necessariamente, pelo conceito de benfeitoria. A doutrina civilista, há muito, identificou a classificação das benfeitorias como úteis, necessárias e voluptuárias, o que fez de maneira muito próxima daquilo que hoje está previsto no CC 96 do atual Código Civil, segundo o qual “As benfeitorias podem ser voluptuárias, úteis ou necessárias. São voluptuárias as de mero deleite ou recreio, que não aumentam o uso habitual do bem, ainda que o tornem mais agradável ou sejam de elevado valor.

São úteis as que aumentam ou facilitam o uso do bem. São necessárias as que têm por fim conservar o bem ou evitar que se deteriore. Dispositivos semelhantes já estavam presentes no art. 905, do Esboço de Teixeira de Freitas e, igualmente, no art. 92 do Projeto de Coelho Rodrigues.

O Esboço de Teixeira de Freitas propunha: “São benfeitorias necessárias aquelas sem as quais a coisa não poderia ser conservada. São benfeitorias úteis as que, não sendo indispensáveis para a conservação da coisa, seriam, todavia, de manifesto proveito para qualquer possuidor dela. São benfeitorias voluptuárias as de mero luxo ou recreio, ou de exclusiva utilidade para quem as fez”.

De uma maneira geral, as benfeitorias qualificam-se como espécies dos bens acessórios que implicam em melhoramentos efetuados na coisa principal e, no que interessa a este estudo, à edificação condominial, a fim de incrementar o seu uso habitual ou ampliar a sua utilização.

Para o Prof. Glauber Moreno Talavera, “Consideram-se voluptuárias, portanto, as benfeitorias que tenham por objetivo o embelezamento do bem ou, ainda as que tenham por finalidade permitir ou potencializar as atividades de deleite ou recreio, como, v.g., a construção de piscinas e a feitura de trabalhos paisagísticos, melhoramentos que não são necessários ao uso habitual da coisa. Consideram-se úteis as benfeitorias que aumentam ou facilitam o uso do bem principal, melhorando-o ou valorizando-o, como, p. ex., a construção de uma suíte anexa ao quarto do casal. As benfeitorias úteis, portanto, embora não sejam indispensáveis para a conservação do bem, são de inafastável utilidade. Consideram-se necessárias as benfeitorias que têm por finalidade conservar o bem, evitando que este se arruíne ou deteriore, como, e.g., o conserto do teto que cedeu, ou mesmo de um assoalho que se rompeu.”

Todavia, ao tratar das intervenções nos condomínios edilícios, os CC 1.341 e 1.342 as qualificou como “obras” sem a distinção entre benfeitorias e acessões (construções novas – Código Civil, CC 1.248, V e 1.253 e ss), levando em consideração que estas últimas não são simples melhoramentos da coisa principal, mas a implantação de coisa nova.

No julgado abaixo, o Tribunal de Justiça de São Paulo definiu o conceito das obras úteis e voluptuárias dos mencionados dispositivos (CC 1.341 e 1.342), o que fez nos seguintes termos:

Tribunal de Justiça de São PauloAgravo de Instrumento. 0254275-95.2012.8.26.0000 - Relator: Carlos Henrique Miguel Trevisan - Comarca: São Paulo - Órgão julgador: 4ª Câmara de Direito Privado - Data do julgamento: 17/01/2013 - Data de registro: 18/01/2013 - Outros números: 2542759520128260000 - Condomínio. Ação de anulação de assembleia. Vícios de forma e conteúdo. Deliberações em afronta à convenção e ao ordenamento jurídico Questionamentos em relação ao quórum mínimo de votação. Decisão de primeiro grau que indefere pedido de tutela antecipada voltado a anular a assembleia. Agravo interposto pelo autor. Despesas a envolver, na maior parte, obras úteis, de caráter voluptuário e em áreas comuns. Quórum mínimo de votação desrespeitado. Inteligência do artigo 1.341, incisos I e II, e do artigo 1.342, ambos do Código Civil. Parcial presença dos requisitos legais da relevância das razões do recurso e do perigo de dano de difícil reparação. Situação de fato que enseja a concessão parcial da tutela antecipada. Agravo provido em parte.

Consta do aresto o relato segundo o qual o condômino que se sentiu prejudicado alegou que "o condomínio é composto de 368 apartamentos, que compareceram 67 condôminos e que, por maioria, foram votados e aprovados (i) a instalação da academia de ginástica, mediante a locação de equipamentos, (ii) o envidraçamento das sacadas, (iii) a reforma de um dos salões de festas, com custo inicial de R$ 50.000,00, e (iv) a extinção do exame médico para uso das piscinas.”

Alegou-se, ainda, que as deliberações que em assembleia aprovaram a execução dos itens (i), (ii) e (iii) se deram por maioria simples, quando a convenção do condomínio e o Código Civil, em seu artigo 1.341, inciso I, preveem quórum qualificado de dois terços dos condôminos.

No voto condutor, asseverou o relator: "A controvérsia posta à apreciação reside na definição de obras úteis ou voluptuárias, e se em área comum ou não, o que distingue o quórum necessário à sua aprovação pelos condôminos, conforme estabelece a convenção do condomínio e preveem os artigos 1.341, incisos I e II, e 1.342, ambos do Código Civil.”

"São úteis as benfeitorias quando aumentam ou facilitam o uso da coisa, melhorando-a ou valorizando-a, as quais, embora não sendo indispensáveis para a conservação da coisa, se mostram de visível utilidade. Voluptuárias, as destinadas ao mero deleite ou recreio de quem as fez, não se mostrando necessárias ao uso habitual da coisa, nem de maior valia para seu dono, mesmo que por elas se tenha tornado mais agradável.”

"Em análise ao documento de fls. 47/49, do qual consta a ata da assembleia, com a relação das obras e despesas do condomínio cuja aprovação foi posta à votação na assembleia que se pretende anular, verifica-se que a instalação da academia de ginástica trata-se de obra voluptuária, não se mostrando necessária ao uso habitual, de modo que o quórum de aprovação pela assembleia não poderia ser o de maioria simples, mas sim o quórum especial de 2/3, nos termos do artigo 1.341, inciso I, do Código Civil ('A realização de obras no condomínio depende: I se voluptuárias, de voto de dois terços dos condôminos´).”

"Com relação ao envidraçamento das varandas (sacadas), aprovado também por maioria simples, verifica-se que, embora a instalação seja opcional a cada condômino, a fachada à qual pertence faz parte da área comum do condomínio e, portanto, a deliberação acerca da matéria exige o quórum especial de 2/3, nos termos do artigo 1.342 do Código Civil ('A realização de obras, em partes comuns, em acréscimo às já existentes, a fim de lhes facilitar ou aumentar a utilização, depende da aprovação de dois terços dos votos dos condôminos, não sendo permitidas construções, nas partes comuns, suscetíveis de prejudicar a utilização, por qualquer dos condôminos, das partes próprias, ou comuns')”

"Quanto à reforma de um dos salões de festas, aprovada por maioria simples, verifica-se que se trata de área comum e, portanto, também se exige a aprovação por quórum especial de 2/3, nos termos do artigo 1.342."

Concluiu o voto pela antecipação de tutela com a "suspensão do deliberado na assembleia que se quer anular, e que, sopesando os interesses em conflito, não há dúvida de que é o agravante quem se encontra na iminência de sofrer dano de difícil reparação, na eventualidade de se manter integralmente a decisão hostilizada."

O conceito de “obra” para os fins dos arts. 1.341 e 1.342 – A exata significação de obra constante tanto do art. 1.341, quanto do art. 1.342, ambos do Código Civil, é aqui necessária, sendo curial concluir que se trata, de maneira geral, nos termos da definição do dicionário Michaelis "de coisa feita ou produzida por um agente, ou seja, o resultado de uma ação ou trabalho e, ainda, de construção ou reparação em um edifício".

Curial concluir que a expressão "obra", empregada pela lei, interpreta-se em sentido amplo, englobando construções, benfeitorias e qualquer melhoramento, como aquisição de pertenças (art. 93 do Código Civil) além dos investimentos em geral.

Portanto, a qualificação das benfeitorias, no que se refere às obras nos condomínios edilícios, deve ser utilizada igualmente para qualificar as obras com a extensão aqui proposta.

A interpretação dos CC 1.341 e 1.342 do Código Civil - Com as premissas consideradas, tendo em vista que não há uniformidade jurisprudencial na interpretação dos dispositivos insculpidos nos CC 1.341 e 1.342, propõe-se a seguinte interpretação sistemática:

a) Tratando-se a obra – tal qual identificou-se -, de qualquer intervenção no Condomínio que implique em equipamento novo, não existente no plano inicial da edificação e no memorial de incorporação, tratar-se-á do “acréscimo” do art. 1.342 e, independentemente de tratar-se de obra útil ou voluptuária, dependerá do quórum qualificado de dois terços para a aprovação; e,

b) Tratando-se de obra tal qual aqui qualificada, ou seja, qualquer intervenção no condomínio, além da aquisição de pertenças, mas sempre em partes já existentes, sem implicar em acréscimo, dependerá do voto de dois terços se for qualificada como obra voluptuária e do voto da maioria dos condôminos quando se tratar de obra útil, utilizando-se, para tanto, por analogia, a qualificação legal e doutrinária desde sempre empregada quanto às benfeitorias e agora estendida às obras no âmbito do condomínio edilício.

A “mens legis” que envolve a solução alvitrada pelo texto legal, tal qual agora propus, me parece clara e visa impedir que a conformação do condomínio nos termos da especificação e dos projetos originais seja alterada sem o quórum qualificado.

Assim sendo, se não existe piscina ou churrasqueira no condomínio, mas se pretende acrescer esses equipamentos, estar-se-á diante de acréscimos às obras já existentes a reclamar a aprovação de dois terços dos condôminos, sem qualquer importância quanto à distinção entre obra útil ou voluptuária.

Por outro lado, se o caso for, por exemplo, de ampliar academia de ginástica já existente no condomínio ou reformar o restaurante que já opera desde a instituição, a distinção entre obra útil e voluptuária é importante de tal sorte que, considerada desta última natureza reclamará o quórum de dois terços e, considerada útil, da maioria.

Registre-se, ainda, em que pese o Condomínio tenha eventualmente sido instituído antes da vigência do atual Código Civil, não é possível cogitar a ofensa ao ato jurídico perfeito, pois a Convenção não conta com natureza jurídica contratual, mas institucional normativa, de tal sorte que a lei nova e suas regras de ordem pública incidem automaticamente sobre os condomínios instituídos anteriormente ao início da vigência da Lei 10.406/2002, o que evita incertezas pela manutenção de duplo regime jurídico, um para condomínios edilícios anteriores e outro para condomínios edilícios constituídos depois do atual Código Civil. 

A correta interpretação do quórum para aprovação das obras - A mais branda das interpretações dos arts. 1.341 e 1.342 do Código Civil, decorrente da doutrina de Pedro Elias Avaad, sustenta que não há necessidade de aprovação por dois terços ou pela maioria de todos os condôminos, mas apenas que o assunto seja deliberado por dois terços ou pela maioria para as referidas obras.

Em outras palavras, esta corrente defende que basta a presença do quórum legal na assembleia para que a obra possa ser aprovada pela maioria simples dos presentes. Seja como for, não me parece que a interpretação segundo a qual a lei exige apenas a deliberação e não a efetiva aprovação da maioria ou de dois terços, conforme o caso (CC 1.341 e 1.342), seja consentânea com a “mens legis” na exata medida em que, à toda evidência, o quórum é legalmente exigido para aprovação e não para presença em assembleia, pois exigido quórum especial nos termos dos CC 1.352 e 1.353:


CC 1.352. Salvo quando exigido quórum especial, as deliberações da assembleia serão tomadas, em primeira convocação, por maioria de votos dos condôminos presentes que representem pelo menos metade das frações ideais.

CC 1.353. Em segunda convocação, a assembleia poderá deliberar por maioria dos votos dos presentes, salvo quando exigido quórum especial.

Assim, com fundamento em abalizada jurisprudência, não basta apenas a deliberação por dois terços ou pela maioria (50% + 1) dos condôminos, mas, efetivamente, o voto de aprovação de dois terços no caso de obras de acréscimo de qualquer natureza e no caso de obras voluptuárias, ou da maioria (50% + 1) de todos os condôminos, considerada a obra apenas útil e não voluptuária.

Nesta medida o seguinte julgado: Tribunal de Justiça de São Paulo - Apelação n. 0146185-03.2006.8.26.0000 - Cível/anulação de assembleia em condomínio. Relator: Des. Francisco Loureiro. Comarca: São Paulo. Órgão julgador: 4ª Câmara de Direito Privado.  Data do julgamento: 05/03/2009. Data de registro: 24/03/2009. Outros números: 4863044800, 994.06.146185-0. Ação declaratória de nulidade - Condomínio - Assembleia de condôminos em que foi aprovada a realização de obras voluptuárias em área comum - Compra e instalação de parque infantil – CC 1.342 - Realização de obras em áreas comuns carecem da aprovação por 2/3 dos condôminos aptos a votar - No caso concreto apenas 213 dos condôminos estiveram presentes e ao menos o autor não anuiu com a realização de tais obras de forma que não observado o preceito legal - Nulidade em assembleia não pode ser convalidada por abaixo-assinado - Reunião dos condôminos é o momento adequado para a exposição dos motivos da dissidência e discussão das questões de maior relevo - Sentença improcedente - Recurso provido.

No seu voto, o Desembargador relator asseverou: “O Código Civil, em seu CC 1.342 dispõe que "a realização de obras, em partes comuns, em acréscimo às já existentes, a fim de lhes facilitar ou aumentar a utilização, depende da aprovação de dois terços dos votos dos condôminos (...)".

“Ainda que se considere que a instalação de playground em área antes destinada a jardins não se enquadra no conceito de obras em áreas comuns, se aplica o CC 1.341, que dispõe depender a realização de obras voluptuárias no condomínio da aprovação por voto de dois terços dos condôminos.”

Estabeleceu, portanto, o legislador, norma cogente e de aplicação imediata, que se sobrepõe a eventuais disposições em contrário contidas na convenção de condomínio, garantindo aos condôminos a necessidade de maioria qualificada de votos para o acréscimo de benfeitorias nas áreas comuns, ou para a realização de obras voluptuárias.”

“No caso dos autos, deliberou a assembleia ordinária de condôminos do dia 9 de março de 2004 sobre "a compra e colocação de playground no fundo do edifício". Evidente que a instalação de playground enquadra-se na previsão legal dos artigos supracitados. De modo análogo ao que ocorre quando da instalação de piscina, sauna, churrasqueira ou vestiário, a criação de um playground é feita necessariamente em prejuízo da conformação atual de área comum, o que somente se admite com a aprovação de 2/3 dos condôminos.”

Frise-se que a própria redação do artigo afasta a cogitação a respeito da potencial utilidade ou pertinência da obra. O legislador expressamente dispôs que a exigência se aplica às obras realizadas nas áreas comuns "a fim de facilitar ou aumentar a utilização". Irrelevantes, portanto, os argumentos do réu no sentido de que a benfeitoria é realizada em proveito das crianças que habitam o prédio. A conformação atual das áreas comuns não pode ser alterada sem o cumprimento do requisito legal.”

Ressalte-se, aliás, que os CC 1.341 e 1.342 falam em "aprovação de dois terços dos votos dos condôminos". Não se trata, portanto, de exigência de quórum mínimo de participantes para a instauração da assembleia, a qual poderá, então, decidir por maioria simples. Exige-se na verdade, maioria qualificada de dois terços dos habilitados a votar em assembleia, e não apenas dos condôminos presentes...”

Por fim, ainda no que diz respeito ao quórum, caso a convenção preveja outro mais qualificado – posto que não pode reduzir, mas apenas ampliar aquele mínimo decorrente dos arts. 1.341 e 1.342 – este quórum deve ser respeitado.

Caio Mário da Silva Pereira ensina que "na assembleia, as decisões se tomam, via de regra, por simples maioria. Tendo em vista, todavia, a importância da matéria, a sua repercussão na órbita jurídico-econômica dos condôminos, poderá a convenção dispor diferentemente, e fixar quórum especial para as decisões. A validade destas, a sua oponibilidade aos ausentes, a sua repercussão, a sua obrigatoriedade e normatividade dependem da apuração do quórum, pois é óbvio que a inobservância deste implica a ineficácia da deliberação (Bendersky, "Nulidad de Asambleas")"

Limites específicos impostos às obras que exigem a unanimidade - 
Independentemente da espécie de obra, ou seja, acréscimo, obra útil ou, ainda, voluptuária, se implicar em alteração substancial da destinação ou do uso das partes comuns, demandará a unanimidade.

Posta assim a questão, por exemplo, nenhuma obra pode transformar uma área antes especificada como salão de festas em sala de ginástica e, ainda, a quadra poliesportiva em estacionamento para visitantes.

Esta é a lição do acatado Prof. João batista Lopes para quem, “definida, na convenção, a destinação das unidades autônomas e o uso das partes comuns, somente a unanimidade dos condôminos poderá alterá-la, pena de ofensa a direitos adquiridos.”

Portanto, a alteração do plano inicial da edificação existente na época da instituição do condomínio, além da destinação das áreas comuns reclamam anuência unânime dos condôminos e seus consortes (incluídos os compromissários compradores, com título registrado), porquanto o princípio majoritário não pode suprimir, no todo ou em parte, ou alterar o direito dominial (real) dos comunheiros.

A unanimidade dos interessados vem preceituada na Lei n. 4.591/1964 (art. 43, IV), que regula as incorporações, impondo a impossibilidade de alteração das áreas comuns projetadas desde a construção do imóvel submetido a este regime.

De qualquer forma, esta é uma regra geral. Não pode haver qualquer alteração da destinação ou uso sem a aprovação unânime dos condôminos.

A alteração de projeto registrado de incorporação de edifício em condomínio exige, portanto, consenso unânime dos interessados, tal como resulta de imperativo legal e de remansosa jurisprudência, inclusive do Supremo Tribunal Federal (Recurso Extraordinário n. 71.285-PR, Segunda Turma, 18.10.74. Min. Antonio Neder - in “Revista Trimestral de Jurisprudência”, vol. 71, págs. 425-430; Recurso Extraordinário, n. 89.869-9-RJ, Segunda Turma, 8.6.79, Min. Cordeiro Guerra - in “Revista de Direito Imobiliário”, vol. 5, págs. 65-67; Recurso Extraordinário, n. 94.861-PR, Primeira Turma, 24.11.81, Min. Rafael Mayer - in “Revista de Direito Imobiliário”, vol. 9, págs. 55-57).

Ressalte-se, no mesmo sentido, o parecer do Dr. José Celso do Mello Filho, Curador de Registros Públicos da Capital, nos autos da dúvida n. 659/84, da 1ª Vara de Registos Públicos de São Paulo, no qual são citados muitos outros julgados dos Tribunais paulistas.

A doutrina não se afasta desse entendimento, nos termos das lições de Pontes de Miranda, além da obra de João Nascimento Franco e Nisske Gondo.

No aspecto registral, o entrave ao registro de alteração da especificação do condomínio emerge por uma exigência da segurança estática: o titular de um direito posicional no registro não pode ser afetado nessa posição tabular, sem concorrência de sua vontade, salvo em hipóteses taxativamente determinadas em lei (v.g.: sujeição, prescrições extintiva e aquisitiva, perempção - todas, entretanto, reclamando meios regulares).

E a especificação de Condomínio é a individualização de cada unidade, sua identificação, destinação e discriminação.

Assinale-se, a título exemplificativo, que no Estado de São Paulo as “Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça”, disciplinando mais amplamente a modificação de especificações condominiais, dispõem: “A alteração da especificação exige a anuência da totalidade dos condôminos” (item 74, cap. XX).

A obra ou acréscimo, igualmente, não pode representar alteração de fachada posto que, neste caso, também exigirá a unanimidade.

Todo condômino está impedido de alterar a cor e a forma da fachada, salvo decisão unânime.

Na dicção da lei (Código Civil, art. 1.336, III), percebe-se que a fachada não pertence ao condômino.

Trata-se de parte comum que, por essa razão, não é passível de destinação exclusiva.

Tem-se entendido, embora o assunto seja polêmico, que a obra de modificação que depende da unanimidade é aquela promovida por um dos condôminos, como, por exemplo, a troca das esquadrias externas da sua unidade, diferentes do padrão da edificação, o que não inclui a decisão para pintura do prédio de cor diversa de forma uniforme ou a troca de todas as esquadrias externas, ainda que isso represente alteração de fachada.

Obras necessárias - Ao tratar das incumbências do síndico, o atual Código Civil acrescentou, no CC 1.348, V, o dever de conservação, antes não presente na derrogada Lei 4.591/1964, que disciplinava a matéria.

Portanto, como não há na lei comandos inúteis, o síndico tem o dever de conservar o edifício, o que gera importantes consequências.

Com efeito, sob a égide da Lei 4.591/1964, se a assembleia não autorizasse, o síndico nada podia fazer para impedir a deterioração das partes comuns.

De fato, basta verificar o estado de conservação – talvez fosse melhor dizer “estado de deterioração” – de alguns edifícios, para descobrir, sem muita dificuldade, que em nome da falsa economia colocam em risco a vida e a saúde dos que o habitam e até de terceiros.

Deixando de lado os extremos, podemos exemplificar: são comuns os edifícios cujo revestimento externo demanda pintura. Essa pintura, além de embelezar a construção, impermeabiliza a fachada. Também é sabido que os fabricantes das tintas recomendam que a pintura seja refeita, com o fechamento de pequenas fissuras, a cada período de três ou cinco anos.

Ocorre que, em nome da economia ou desautorizados pela assembleia especialmente convocada para votar a pintura do edifício, essas construções passam anos além do prazo sem que a indispensável providência seja tomada. Quando, enfim, se decide pela pintura, os gastos são muito maiores em razão do avançado estado de deterioração da fachada, desmascarando a falsa economia. Outros exemplos podem ser dados: postergação da troca de colunas de água, caixilhos, fiação, impermeabilização de lajes etc.

As consequências são desastrosas. Há relato que um edifício comercial teve toda sua parte elétrica incendiada, colocando em risco a vida dos condôminos e demais ocupantes, em razão da negligência na manutenção. De qualquer forma, ainda que não haja esse risco que, afinal, não consta do CC 1.348, V, o síndico deve diligenciar e conservar as partes comuns.

Não há mais escolha: fazer ou deixar de fazer. A conservação é um dever do síndico que, se não for respeitado, pode lhe impor responsabilidade civil em razão da omissão bem como motivar a sua destituição nos termos do CC 1.349, que defere à maioria absoluta dos membros da assembleia a faculdade de destituir o síndico que não cumprir seus deveres.

De fato, um quarto dos condôminos pode convocar a assembleia e deliberar acerca da destituição do síndico que não conservar as partes comuns de acordo com o que lhe impõe a lei. Com ou sem a destituição, o síndico omisso, ou seja, aquele que deixar de conservar as partes comuns, será responsabilizado civilmente pelos prejuízos que causar.

Voltando ao exemplo, se o síndico não providenciou a pintura ou a recuperação da fachada no momento oportuno e, ao depois, essa pintura ou recuperação demandar maiores gastos em comparação com os gastos decorrentes do mesmo serviço no tempo certo, a diferença pode ser imposta judicialmente ao síndico omisso.

O suporte para tal inferência se encontra no próprio Código Civil, que, assim como no direito anterior, impõe o dever de reparar e ressarcir os danos a todo aquele que os causar por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência (CC 186 c/c o CC 927). Mas poder-se-ia redarguir, alegando que, nesses casos, a aprovação das despesas pela assembleia sempre deve existir. Não pensa assim o autor.

O § 1º do CC 1.341 é claro e determina, em consonância com o inciso V do art. 1.348, que “as obras ou reparações necessárias podem ser realizadas, independentemente de autorização, pelo síndico, ou, em caso de omissão ou impedimento deste, por qualquer condômino”. Ao depois, determina que essas obras, desde que urgentes, podem ser feitas sem autorização da assembleia e apenas devem ser comunicadas a ela posteriormente. Mas poder-se-ia redarguir novamente, alegando que, na ausência de urgência, como é o caso da pintura, a aprovação da assembleia para as despesas sempre deve existir. De fato, determina o § 3º do CC 1.341, que, “não sendo urgentes, as obras ou reparos necessários, que importarem em despesas excessivas, somente poderão ser efetuadas após autorização da assembleia (...).”

Contradição ou antinomia no Código Civil - Como a conservação pode ser um dever do síndico se essa mesma conservação deve ser submetida à aprovação da assembleia. As respostas, são mais simples do que parecem e resumem tudo o que foi dito:

a)  O síndico deve conservar o edifício sob pena de omissão, responsabilidade civil e destituição (CC 1.348, V, e 1.349).

b)  Se a despesa com a conservação for de pequena monta, não há, sequer, a necessidade de assembleia (CC. 1.341, § 1º).

c)  Se a despesa com a conservação for excessiva e a obra urgente, o síndico realiza de qualquer forma e, ao depois, dá ciência à assembleia, não havendo necessidade de prévia aprovação, como pode ocorrer, por exemplo, com o rompimento da coluna de água (CC 1.341, § 2º).

d)  Se a despesa com a conservação for excessiva e a obra não for urgente (CC 1.341, § 3º), o síndico providencia orçamentos e os submete à assembleia que apenas decidirá de que forma será feita a conservação e qual dos orçamentos será aprovado, jamais se a obra – que é um dever seu – será ou não realizada. O exemplo é a pintura ou a recuperação da fachada. Portanto, em razão do dever de conservação imposto ao síndico, mesmo que a obra não seja urgente, a assembleia não pode decidir pela não realização da despesa que for destinada a conservar o edifício. Poderá, apenas, decidir como será feita a conservação.

Ninguém discute se os funcionários do edifício devem ser ou não pagos e muito menos se o rateio para esse pagamento deve ou não deve ser feito. É dever do síndico diligenciar para cumprir essa obrigação como também é um dever seu a conservação do edifício. Por fim, a lei não disse o que é uma despesa excessiva.

Sendo assim, repetindo o que já dito alhures, transcreve-se a crítica do insigne Desembargador Gildo dos Santos[2] à alínea “g” do art. 23 § 1º da Lei 8.245/1991, que impõe ao locatário o pagamento de “pequenos reparos nas dependências (...)” e pode ser aproveitada por analogia: “sabe-se que é condenável a existência de adjetivos nos textos legais, exatamente porque, sendo pequeno um qualificativo de significação abstrata, não se pode saber, com exatidão, o que é um reparo ou conserto pequeno. É de se prever, portanto, infindáveis elucubrações sobre a caracterização do que sejam pequenos reparos nas dependências e instalações elétricas e hidráulicas de uso comum.”

Tentando solucionar a respeitável crítica, ousa o autor definir um critério levando em consideração o valor do reparo. Desse modo, já que a lei não definiu o critério de despesa excessiva, naquela oportunidade dá-se sugestão e aproveita-se aqui o mesmo critério: se, após o rateio, a despesa não ultrapassar metade do valor da despesa ordinária de condomínio do mês em que ocorrer, não será excessiva. Em suma, se a despesa de conservação superar a metade do valor da despesa ordinária do mês em que ocorrer, será qualificada como despesa excessiva, caso contrário, não o será. É conveniente, contudo, que essa circunstância conste da convenção. Observe-se que, no caso de cobrança parcelada, o valor total da despesa rateada deve ser levado em conta, não a parcela mensal.

Necessidade de transparência e inserção na “ordem do dia” constante da convocação - Insta esclarecer que, nos termos de remansosa doutrina e jurisprudência, não pode ser aprovada qualquer matéria que não conste de forma clara na ordem do dia. Assim, qualquer que seja a obra, sua clara menção deve ser feita no instrumento de convocação para dar publicidade a todos os condôminos daquilo que se pretende aprovar.

No acórdão já mencionado, do Tribunal de Justiça de São Paulo, deixou claro o Desembargador relator: "Não bastasse, padece a assembleia de um segundo e sério vício formal, por ausência de inclusão da matéria na ordem do dia. Como é sabido, devem, obrigatoriamente, constar da convocação, sob pena de nulidade, a ordem do dia, o local e a hora da primeira assembleia, e, na hipótese de sua frustração, deve constar o mesmo em relação à segunda assembleia.” "A ordem do dia deve ser clara, objetiva, de modo a propiciar ao condômino aferir a conveniência de seu comparecimento e a oportunidade de se preparar para deliberação e votação." "É comum a utilização de expressões genéricas de fechamento nas convocações, como interesse geral dos condôminos, que, todavia, prestam-se somente a decidir assuntos de somenos e comunicações.” "Todas as questões relevantes, em especial as geradoras de obrigações para os condôminos, alteração da convenção e do regimento interno e mudanças na utilização das áreas comuns, devem constar de modo expresso da ordem do dia, sob pena de nulidade da votação." (Luiz Antonio Scavone Junior, Advogado, Administrador pela Universidade Mackenzie, Mestre e Doutor pela PUC-SP, Professor e Coordenador do curso de pós-graduação em Direito Imobiliário da EPD, Professor de Direito Civil e Mediação e Direito Arbitral nos cursos de graduação da Universidade Presbiteriana Mackenzie e da FAAP, autor de diversas obras, entre elas: Direito Imobiliário – teoria e prática (Ed. Forense) artigo publicado no site www.scavone.adv.br, Acessado 17/11/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).