segunda-feira, 15 de fevereiro de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.510-A, B, C, D, E Do Direito de Laje - VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.510-A, B, C, D, E

Do Direito de Laje -  VARGAS, Paulo S. R.

- Parte Especial –  Livro III – Capítulo à parte

– (Art. 1.510-A, B, C, D, E) - digitadorvargas@outlook.com  

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 Art. 1.510-A - O proprietário de uma construção-base poderá ceder a superfície superior ou inferior de sua construção a fim de que o titular da laje mantenha unidade distinta daquela originalmente construída sobre o solo. 

§ 1º O direito real de laje contempla o espaço aéreo ou o subsolo de terrenos públicos ou privados, tomados em projeção vertical, como unidade imobiliária autônoma, não contemplando as demais áreas edificadas ou não pertencentes ao proprietário da construção-base. 

§ 2º O titular do direito real de laje responderá pelos encargos e tributos que incidirem sobre a sua unidade. 

§ 3º Os titulares da laje, unidade imobiliária autônoma constituída em matrícula própria, poderão dela usar, gozar e dispor. 

§ 4º A instituição do direito real de laje não implica a atribuição de fração ideal de terreno ao titular da laje ou a participação proporcional em áreas já edificadas. 

§ 5º Os Municípios e o Distrito Federal poderão dispor sobre posturas edilícias e urbanísticas associadas ao direito real de laje.

§ 6º O Titular da laje poderá ceder a superfície de sua construção para a instituição de um sucessivo direito real de laje, desde que haja autorização expressa dos titulares da construção-base e das demais lajes, respeitadas as posturas edilícias e urbanísticas vigentes.

Art. 1.510-B. É expressamente vedado ao titular da laje prejudicar com obras novas ou com falta de reparação a segurança, a linha arquitetônica ou o arranjo estético do edifício, observadas as posturas previstas em legislação local.

Art. 1.510-C.  Sem prejuízo, no que couber, das normas aplicáveis aos condomínios edilícios, para fins do direito real de laje, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes que sirvam a todo o edifícios e ao pagamento de serviços de interesse comum serão partilhadas entre o proprietário da construção-base e o titular da laje, na proporção que venha a ser estipulada em contrato.

§ 1º São partes que servem a todo o edifício:

I – os alicerces, colunas, pilares, paredes-mestras e todas as partes restantes que constituam a estrutura do prédio;

II -  O telhado ou os terraços de cobertura, ainda que destinados ao uso exclusivo do titular da laje;

III – As instalações gerais de água, esgoto, eletricidade, aquecimento, ar condicionado, gás, comunicações e semelhantes que sirvam a todo o edifício; e

IV- em geral, as coisas que sejam afetadas ao uso de todo o edifício. 

§ 2º É assegurado, em qualquer caso, o direito de qualquer interessado em promover reparações urgentes na construção na forma do parágrafo único do CC 249 deste Código. 

Art. 1510-D. Em caso de alienação de qualquer das unidades sobrepostas, terão direito de preferência, em igualdade de condições com terceiros, os titulares da construção-base e da laje, nessa ordem, que serão cientificados por escrito para que se manifestem no prazo de trinta dias, salvo se o contrato dispuser de modo diverso. 

§ 1º O titular da construção-base ou da laje a quem não se der conhecimento da alienação poderá, mediante depósito do respectivo preço, haver para si a parte alienada a terceiros, se o requerer no prazo decadencial de centro e oitenta dias, contado da data de alienação. 

§ 2º Se houver mais de uma laje, terá preferência, sucessivamente, o titular das lajes ascendentes e o titular das lajes descendentes, assegurada a prioridade para a laje mais próxima à unidade sobreposta a ser alienada.

Art. 1.510-E. A ruína da construção-base implica extinção do direito real de laje, salvo:

I – se este tiver sido instituído sobre o subsolo;

II – se a construção-base não for reconstruída no prazo de cinco anos.

Parágrafo único.  O disposto neste artigo não afasta o direito a eventual reparação civil contra o culpado pela ruína.

Em extensão ao artigo em comento, Kamila Gabriely de Sousa Gomes e Joseval Martins Viana, publicaram no site ambitojuridico.com.br, uma complementação, intitulada “Direito real de laje e as modificações trazidas pela Lei n. 13.465/2017”, como extensão e finalização do assunto até aqui tratado e, abrindo um novo bloco, antes de entrar no próximo Livro, Direito de Família, para que se entenda a Lei 13.465/2017, portanto, posterior ao CC 2002, bem como das modificações feitas com o advento do novo CPC/2015, faz-se necessário uma análise sobre os requisitos necessários para a instituição do direito real de laje, quais sejam, isolamento funcional e acesso independente. Em seguida, passa-se a breve estudo sobre o contrato jurídico como fato gerador e a possibilidade de lajes sucessivas, bem como a realização diferenciada entre o direito real de laje e o condomínio. Foi verificado, também, os aspectos registrais e processuais, com as principais alterações trazidas pela Lei n. 13.465/2017.(Nota VD).

Estes direitos foram “acrescentados”, ao artigo 1.510, independentemente do assunto que tratava sobre penhor, hipoteca e anticrese trazidos até então, parecendo, no entender do autor do Blog VD, como uma invasão de assuntos, mas que tem tudo a ver, o que será comprovado no decorrer do estudo do Direito de Família, a seguir.

O Direito Real de Laje decorre de uma situação histórica e real na vida de muitos brasileiros. Por falta de condições financeiras de adquirir um imóvel próprio, filhos e filhas acabam construindo seus "imóveis" em laje do imóvel de seus pais, conhecido popularmente como "puxadinho". 

Para as famílias que residem ali, é certo que há “duas casas", separadas e individualizadas, dentro de um único imóvel. No entanto, por muito tempo o ordenamento jurídico brasileiro não reconhecia estes direitos. A situação social e jurídica, nestes casos, não tinha solução prática definida em lei.

Buscando regularizar esta situação, em 22/12/2016 foi publicada a Medida Provisória 759, a qual dispunha sobre a regularização fundiária rural e urbana, incluindo o direito real de laje. 

Por sua vez, a Medida Provisória 759 foi convertida na Lei nº 13.465/2017, no qual o instituto do direito real de laje foi aprimorado e introduzido no Código Civil Brasileiro. 

A Lei nº 13.465/2017 introduziu alterações significativas no Código Civil, na Lei de Registros Públicos e no Código de Processo Civil, as quais veremos no decorrer desse artigo.

O direito real de laje trata-se de direito real exercido sobre a unidade imobiliária autônoma sobrelevada, erigida sobre a construção original, de propriedade de outrem, conforme descreve o artigo 1510-A do Código Civil:

Art. 1.510-A. O proprietário de uma construção-base poderá ceder a superfície superior ou inferior de sua construção a fim de que o titular da laje mantenha unidade distinta daquela originalmente construída sobre o solo”.

Neste caso, não se trata de uma propriedade, pois o direito ali exercido não é na coisa própria. Trata-se, portanto, de direito real sobre coisa alheia, uma vez que a laje esta limitada a construção original, de propriedade de outrem.

Assim, este novo direito real somente será admitido se preencher os seguintes requisitos: O isolamento funcional, ou seja, a unidade imobiliária da laje devera estar isolada da construção original. Segundo, o acesso independente, como por exemplo uma escada exclusiva para acesso a unidade imobiliária da laje. Neste caso, a lei refere-se ao acesso independente em face do proprietário da construção original, localizado abaixo.

O contrato como fato jurídico gerador do direito: A parte final do artigo 1.510-C, do Código Civil, incluído pela Lei nº 13.465/17, caput, parte final, faz referência ao “contrato”, como fato jurídico gerador do direito da laje.

Art. 1.510-C. Sem prejuízo, no que couber, das normas aplicáveis aos condomínios edilícios, para fins do direito real de laje, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes que sirvam a todo o edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum serão partilhadas entre o proprietário da construção-base e o titular da laje, na proporção que venha a ser estipulada em contrato.

No entanto, conforme anotou Stolze (2017), o direto da laje também pode ser adquirido por meio da usucapião: Por fim, interessante serão os reflexos do novo regramento no Direito de Família, na medida em que não é incomum o titular da construção original ceder a unidade sobrelevada a um parente, que passa a exercer direito sobre a unidade autônoma.

Dependendo da circunstância, poderá, até mesmo, operar-se a aquisição do direito real de laje por usucapião, observados os requisitos legais da prescrição aquisitiva.

E mesmo que a cessão seja gratuita, a título de comodato, se o cessionário passa a se comportar como titular exclusivo da laje, alterando o seu ‘animus’ e a própria natureza da posse precária até então exercida, poderá, em nosso sentir, consolidar o seu direto sobre a construção sobrelevada (direito real de laje), mediante usucapião, contando-se o prazo de prescrição a partir do momento em que deixa de se comportar como simples comodatário, por aplicação da regra da 'interversio possessionis’.

Desta forma, sendo o contrato omisso quanto a proporção das despesas a serem arcadas pelo proprietário do imóvel e o proprietário da laje, ou então caso a laje tenha sido adquirida por usucapião, caberá ao juiz dirimir tais conflitos, quando não haver composição extrajudicial.

Quanto ao §2º do citado artigo 1510-C, o qual prevê que “É assegurado, em qualquer caso, o direito de qualquer interessado em promover reparações urgentes na construção na forma do parágrafo único do art. 249 deste Código”, escrevem Stolze e Pamplona Filho (2017): Atento a isso, o Código Civil admite a possibilidade de o fato ser executado por terceiro, havendo recusa ou mora do devedor, nos termos do seu art. 249:

“Art. 249. Se o fato puder ser executado por terceiro, será livre ao credor mandá-lo executar à custa do devedor, havendo recusa ou mora deste, sem prejuízo da indenização cabível.

Parágrafo único. Em caso de urgência, pode o credor, independentemente de autorização judicial, executar ou mandar executar o fato, sendo depois ressarcido'.”

Comentando esse dispositivo, concernente às obrigações fungíveis, SILVIO VENOSA pontifica: 'É interessante notar que, no parágrafo único, a novel lei introduz a possibilidade de procedimento de justiça de mão própria, no que andou muito bem. Imagine-se a hipótese de contratação de empresa para fazer a laje de concreto de um prédio, procedimento que requer tempo e época precisos. Caracterizada a recusa e a mora, bem como a urgência, aguardar uma decisão judicial, ainda que liminar, no caso concreto, poderá causar prejuízo de difícil reparação'.

Assim, poderá o credor, independentemente de autorização judicial, contratar terceiro para executar a tarefa, pleiteando, depois, a devida indenização, o que, se já era possível ser admitido no sistema anterior por construção doutrinária, agora se torna norma expressa.

Desta forma, não dúvidas quanto à constituição do direito real de laje por meio de contrato.

Da possibilidade de lajes sucessivas: A Lei nº 13.465/2017 colocou fim a vedação que a Medida Provisória nº 759/2016 trazia em seu texto, referente à abertura de lajes sucessivas, ou seja, que impedia “sobrelevações sucessivas”.

Em estudo sobre o tema, Stolze (2017) criticava a restrição imposta: Além disso, dada a autonomia registral que lhe foi conferida, o § 5º da MP admitiu ainda a alienação da laje: ‘as unidades autônomas constituídas em matrícula própria poderão ser alienadas e gravadas livremente por seus titulares, não podendo o adquirente instituir sobrelevações sucessivas, observadas as posturas previstas em legislação local’.

Um ponto, aqui, desperta atenção: Certa dúvida quanto ao alcance e constitucionalidade deste dispositivo, na perspectiva do princípio da função social, no que tange à vedação de extensões ou lajes sucessivas.

Uma vez que o legislador cuidou de conceder dignidade legal ao direito sobre a laje, desde que as limitações administrativas e o Plano Diretor sejam respeitados, sobrelevações sucessivas, regularmente edificadas, mereceriam, talvez, o amparo da norma.

Fica o convite à reflexão: O artigo 1510-A, em seu § 6º, do Código Civil acolhe expressamente a essa possibilidade, alinhando a legislação brasileira a realidade pratica que de fato ocorre no país.

“Art. 1510-A. […] § 6º O titular da laje poderá ceder a superfície de sua construção para a instituição de um sucessivo direito real de laje, desde que haja autorização expressa dos titulares da construção-base e das demais lajes, respeitadas as posturas edilícias e urbanísticas vigentes.”

O que o §6º consiste em abertura de novo direito real de laje, que pode ocorrer de cessão da superfície da unidade para edificação da laje quanto por cisão. Portanto, não se trata de alienação de um direito real já existente, conforme pactua o artigo 1510-D.

Do direito real de laje e condomínio: O artigo 1.510-C do Código Civil, em seu caput, determina que se apliquem as regras relativa ao condomínio edilício à edificação da laje, no que couber.

Art. 1.510-C. Sem prejuízo, no que couber, das normas aplicáveis aos condomínios edilícios, para fins do direito real de laje, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes que sirvam a todo o edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum serão partilhadas entre o proprietário da construção-base e o titular da laje, na proporção que venha a ser estipulada em contrato.

Com isso, a lei quis estabelecer um conjunto de deveres comuns à todas as edificações ali existente, utilizáveis por todos os habitantes, conforme demonstra o §1º do mesmo artigo.

“Art. 1.510-C. […]

§ Iº São partes que servem a todo o edifício

I – os alicerces, colunas, pilares, paredes-mestras e todas as partes restantes que constituam a estrutura do prédio

II – o telhado ou os terraços de cobertura, ainda que destinados ao uso exclusivo do titular da laje.

III – as instalações gerais de água, esgoto, eletricidade, aquecimento, ar condicionado, gás, comunicações e semelhantes que sirvam a todo o edifício; e

IV – em geral, as coisas que sejam afetadas ao uso de todo o edifício.”

Assim, conclui-se que a laje não se confunda com o regime de condomínio, sendo aplicadas apenas algumas normas deste na medida em que diversas pessoas compartilharão uma mesma estrutura física básica.

Do direito de preferência na alienação da laje: Para as edificações que possuem direito de laje, em caso de alienação, existe o direito de preferencia ao titulares e  demais titulares.

O direito de preferencia esta previsto no artigo 1510-D do Código Civil, o qual estabelece uma ordem preferencial, com o titular da construção-base ocupando a primeira posição.

“Art. 1510-D. Em caso de alienação de qualquer das unidades sobrepostas, terão direito de preferência, em igualdade de condições com terceiros, os titulares da construção-base e da laje, nessa ordem, que serão cientificados por escrito para que se manifestem no prazo de trinta dias, salvo se o contrato dispuser de modo diverso.

§ 1º O titular da construção-base ou da laje a quem não se der conhecimento da alienação poderá, mediante depósito do respectivo preço, haver para si a parte alienada a terceiros, se o requerer no prazo decadencial de cento e oitenta dias, contado da data de alienação.

§ 2º Se houver mais de uma laje, terá preferência, sucessivamente, o titular das lajes ascendentes e o titular das lajes descendentes, assegurada a prioridade para a laje mais próxima à unidade sobreposta a ser alienada. “

Neste caso, o legislador visa estimular que as lajes sejam apropriadas apenas por uma pessoa, por isso a previsão legal de preferência aos titulares da construção base. Já para os casos de expropriação judicial do bem, foi introduzido os incisos X e XI no artigo 799 do Código de Processo Civil, no qual se exige a intimação dos titulares das unidades sobrepostas e da construção-base no caso de penhora.

Da situação do direito de laje em face da ruína da construção-base - O artigo 1.510-E do Código Civil traz a regra quanto a situação de ruína da construção-base e do consequente perecimento do imóvel sobre o qual incide o direito de laje:

“Art. 1.510-E. A ruína da construção-base implica extinção do direito real de laje, salvo:

I – se este tiver sido instituído sobre o subsolo;

II – se a construção-base não for reconstruída no prazo de cinco anos.

Parágrafo único. O disposto neste artigo não afasta o direito a eventual reparação civil contra o culpado pela ruína. “

Portanto, ocorrendo a extinção do direito real de laje havendo a ruína da construção-base sem reedificação em 5 anos, respondendo civilmente os responsáveis pela ruína.

Dos aspectos registrais: Conforme relatado nos tópicos acima, o §3º do artigo 1510-A do Código Civil, prevê que deverá ser aberta uma matricula própria para o direito real de laje.

Neste sentido, foi que a Lei nº 13.465/2017, alterou a redação do artigo 176 da Lei de registro publico para nele incluir-se o § 9º:

“§ 9º A instituição do direito real de laje ocorrerá por meio da abertura de uma matrícula própria no registro de imóveis e por meio da averbação desse fato na matrícula da construção-base e nas matrículas de lajes anteriores, com remissão recíproca. “

A matricula própria consiste em ter uma numeração de registro original, ou seja, é o primeiro número de registro do imóvel. Assim, a cada alienação o imóvel receberá um novo numero de registro, mantendo o numero de registro original.

Gonçalves relate que: “[…] é qualquer anotação feita à margem de um registro, para indicar as alterações ocorridas no imóvel, seja quanto a sua situação física (edificação de uma casa, mudança de nome de rua) seja quanto à situação jurídica do seu proprietário (mudança de solteiro para casado, p. ex.)”

Portanto, se o Direito Real de Laje não fosse um direito real sobre coisa própria, ou seja, fosse um direito real sobre coisa alheia, ele não poderia gerar uma matrícula própria, como de fato está previsto na legislação.

Das aspectos processuais

A Lei nº 13.465/2017 também introduziu os incisos X e XI no artigo 799 do Código de Processo Civil de 2015.

“Art. 799. Incumbe ainda ao exequente:

X – requerer a intimação do titular da construção-base, bem como, se for o caso, do titular de lajes anteriores, quando a penhora recair sobre o direito real de laje;

XI – requerer a intimação do titular das lajes, quando a penhora recair sobre a construção-base.”

O artigo 799 do Código de Processo Civil esta inserido em um conjunto de normas voltadas para a proteção de terceiros, tanto que dele também fazem parte os artigo 804 e 889 do mesmo código.

Diante de todo o exposto, conclui-se o aprimoramento do Direito Real de Laje pela Lei nº 13.465/2017 trouxe uma evolução para o ordenamento jurídico brasileiro, bem como dignidade humana e legal aos milhares de brasileiros viviam num vácuo normativo habitacional. (Kamila Gabriely de Sousa Gomes e Joseval Martins Viana, publicaram no site ambitojuridico.com.br, uma complementação, intitulada “Direito real de laje e as modificações trazidas pela Lei n. 13.465/2017”, acessado em 15.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

O comentário de Maurício Mota, é baseado em seu artigo “O direito real de Laje no Código Civil”, baseado na Lei Federal n. 13.465/2017, em julho de 2017, um novo direito real, a laje (art. 1.225, XIII, do Código Civil). Na sua visão, o direito real de laje representou mudança acentuada daquele que vinha previsto na Medida Provisória n. 759/2016.

Na MP nº 759/2016 havia toda uma lógica que aproximava o direito real da noção de direito de superfície: ali se falava no direito real de laje como “consistindo na possiblidade de coexistência (sic) de unidades imobiliárias autônomas de titularidades distintas situadas em uma mesma área, de maneira a permitir que o proprietário ceda a superfície de sua construção”; ao mesmo tempo em que discorria sobre o “acesso independente qualquer que seja o seu uso” (art. 1510-A, § 3º); e “proibindo-se o adquirente de instituir sobrelevações sucessivas” (art. 1510-A, § 5º), tudo isso levando a se configurar uma “superfície de uma construção, i.é, uma modalidade de direito de superfície que é, na dicção do art. 1.524 do Código Civil português, “a faculdade de construir ou manter, perpétua ou temporariamente uma obra em terreno alheio, ou de nele fazer ou manter plantações, um direito real sobre coisa alheia, que teria sempre uma ligação peremptória com a construção “ceder a superfície de sua construção” e que não configuraria direito autônomo porque proibida de maneira expressa a instituição de sobrelevações sucessivas.

Na nova lei federal nº 13.465/2017, que alterou o CC 1.510-A, criando o novo direito real de laje,, ocorre uma mudança de orientação no Brasil quanto à forma de se conceber a regularização fundiária urbana.

O modelo tradicional de regularização fundiária, aquele derivado da lei federal n. 11.977/2009, importa na forma de garantir a moradia para os que dela precisam com todos os substratos necessários à plena consecução desta (materiais urbanísticos, creditícios, de infraestrutura etc.), pensada a solução de moradia como uma solução ampla, de plena habitabilidade em uma determinada área urbana).

A lei federal n. 13.465/2017 rompe com essa lógica. Ela tem como espirito o atendimento de que esse modelo de regularização fundiária urbana totalizante, que atende todos os anseios da moradia, é inviável, impossível de ser implementada com todas essas condições.

Então, para a lógica da nova lei no Brasil, é a compreensão de que o mais importante é titular as pessoas, dar a elas o direito de propriedade. Tornar essas pessoas proprietárias dos imóveis que habitam, ainda que não se consiga dar a elas as outras condições também necessárias para a moradia (os suportes materiais, urbanísticos, creditícios, de infraestrutura etc.). 

Preconiza-se na nova legislação que é a sociedade civil que, a partir desses meios que foram concedidos, como o reconhecimento da propriedade das lajes, i.é, é a nova legislação que passa a considerar que é melhor que se titule milhões de pessoas do que se garanta moradia integral e digna para apenas aqueles milhares de privilegiados que os recursos escassos do governo logrem atender.

Talvez essa seja do ponto de vista individual, daquele que pleiteia o acesso à moradia plena, uma lógica não satisfatória, porém, em termos sociais, isso é uma concepção inequivocamente mais abrangente. Uma política pragmática e realista para um país de recursos escassos.

Então, tem-se que pensar o direito real de laje, tal qual ele surge da lei federal n. 13.465/2017, dentro desse novo modelo. O modelo de um direito real de laje como uma verdadeira propriedade. Nós estamos falando aqui de uma propriedade sobre coisa própria. Falando de propriedade na sua acepção mais forte, na acepção mais ampla.

Uma propriedade pensada na elasticidade do direito de propriedade. Concebida como uma superação do princípio da acessão, uma superação do princípio do superfies solo cedit. Entendido isso como historicamente a propriedade se transformou, quando a ideia da compressão e da elasticidade do domínio se altera em diversas circunstâncias históricas. Ele era um na propriedade feudal; há uma série de institutos que não existem mais como o morgadio (regime em que os domínios senhoriais das famílias nobres eram inalienáveis e indivisíveis).

A questão dominial se amplia e se reduz consoante as injunções históricas de cada período. Então, temos que pensar contemporaneamente em uma propriedade afastada da ideia de projeção sobre o solo. Assim, é possível doravante ter uma propriedade mesmo que não se tenha uma fração ideal relativa ao solo onde ela está localizada. 

No final do século XIX, quando se apresentou mais candente a questão da propriedade de apartamentos, também essa questão se colocou. Naquela época era uma novidade a ideia de propriedade de apartamento: ser proprietário de uma unidade imobiliária e da fração ideal em um condomínio necessário relativo ao prédio. Também nesse momento se discutiu muito a elasticidade do domínio. 

O direito real de laje, tal como ficou configurado no CC 1.510-A, constitui um verdadeiro direito próprio de propriedade. É uma propriedade distinta daquela do solo (“unidade distinta daquela originalmente construída sobre o solo”, CC 1.510-A, caput). Tem os poderes inerentes ao direito próprio de propriedade (“Os titulares da laje, unidade imobiliária autônoma constituída em matrícula própria, poderão dela usar, gozar e dispor”, CC 1.510-A, § 3º), o aspecto interno, a senhoria do direito de propriedade, e, obviamente, o direito de reavê-la de quem injustamente a possua.

É um direito de propriedade com outra elasticidade dominial. Um feixe de poderes próprio e que se adequa ao escopo desse modelo de regularização fundiária urbana.

No CC 1.510-A, § 4º se observa a separação, a ideia da radicalidade do novo direito: a instituição do direito de laje não implica na atribuição de fração ideal do terreno (“A instituição do direito real de laje não implica a atribuição de fração ideal de terreno ao titular da laje ou a participação proporcional em áreas já edificadas”, CC 1.510-A, § 4º).

Portanto, aqui se trata de uma propriedade em condomínio necessário. Porém, se não é uma propriedade em condomínio, há de se estabelecerem as relações  jurídicas entre o proprietário da construção-base, o titular da laje e os outros titulares das lajes ascendentes ou descendentes. Aqui há uma influência grande do Código Civil português, do direito de construir sobre o edifício alheio (art. 1.526º ), sobretudo no que concerne ao nosso CC 1.510-C. 

I.é, naquilo que são despesas necessárias à conservação e fruição das partes que sirvam a todo o edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum, as partes amalgamadas entre todos, é preciso fazer um rateio de custos. A lei vai disciplinar aquilo que é comum (os alicerces, colunas, pilares, paredes-mestras e todas as partes restantes que constituam a estrutura do prédio; o telhado ou os terraços de cobertura; as instalações gerais de água, esgoto, eletricidade, aquecimento, ar condicionado, gás, comunicações e semelhantes que sirvam a todo o edifício e, em geral, as coisas que sejam afetadas ao uso de todo o edifício) e estabelece que isso será feito mediante um contrato. Ora, esse contrato terá que ser feito regulando essa forma condominial sobre tais instalações. Ao contrário do que dispunha a MP n] 759/2016, não há mais a necessidade de entrada independente para a laje, essas áreas comuns podem nem existir. É uma lei para regular a situação fática que existe para dar propriedade para todo mundo.

Se os mecanismos de compatibilização não puderem ficar perfeitamente delimitados em tal contrato, aplica-se a regra geral, estabelece-se uma servidão de passagem para a laje ou para as lajes ascendentes ou descendentes. A lei estipula o mínimo necessário: os interessados devem regular as suas relações jurídicas em contrato, mas, não chegando esses a um acordo, aplicam-se os princípios gerais da servidão. É melhor que tal contrato esteja averbado na matrícula do imóvel, para que torne certas as relações entre os proprietários e para que esta forma de associação para fins comuns seja uma associação mais segura. 

O direito real de laje no direito brasileiro, ao contrário de direito de superfície, não é temporário. Ele é um direito que tende à perpetuidade, porque ele pode inclusive, ser reconstituído, no caso da construção-base vir a ser arruinada (“A ruína da construção-base implica extinção do direito real de laje, salvo: I – se este tiver sido instituído sobre o subsolo; II – se a construção-base não for reconstruída no prazo de cinco anos”, CC 1.510-E). É possível até que o proprietário da laje reconstrua os pilares da construção-base e aí mantenha a sua laje sobreposta. 

A lei define o direito de preferência (“Em caso de alienação de qualquer das unidades sobrepostas, terão direito de preferência, em igualdade de condições com terceiros, os titulares da construção-base e da laje, nessa ordem, que serão cientificados por escrito para que se manifestem no prazo de trinta dias, salvo se o contrato dispuser de modo diverso” CC 1.510-D) o que também é uma característica do direito próprio de propriedade. Se não se tratasse de propriedade autônoma da laje, não haveria necessidade de direito de preferência. Há preferência porque a lei preconiza e incentiva a consolidação de propriedades diversas, nas mãos de um único proprietário.

Também no que se refere à matrícula do imóvel, se verificam características de que estamos, inequivocamente, diante de um direito próprio de propriedade. O que identifica o direito de propriedade é a existência da matrícula autônoma do imóvel. A partir da configuração base dessa matrícula é possível alienar sucessivamente esse direito e ter o direito de instituir sobrelevações sucessivas, na medida do que for permitido pelas posturas municipais e pelo Código de Obras do município.

Uma questão importante que não podemos deixar de levar em conta é que este é um direito que se forma por atividade negocial, i.é, eu vou constituir o direito de laje, eu tenho uma construção-base, que existe faticamente, que está averbada no registro de imóveis e, a partir daí, eu vou constituir o direito de laje, respeitando todos os regulamentos urbanísticos. Em qualquer circunstância o proprietário da construção-base vai poder juridicamente constituir a laje, ainda que, não seja possível faticamente fazer a nova construção em cima da laje, se os regulamentos urbanísticos assim não o permitirem. 

O que é uma característica de um direito real. Nenhuma legislação municipal pode atingir o meu direito de constituir juridicamente uma laje.

(...)

(Maurício Mota, seus comentários são baseados em seu artigo “O direito real de Laje no Código Civil”, publicado no site emporiododireito.com.br, em 28.02.2018, baseado na Lei Federal n. 13.465/2017, em julho de 2017, um novo direito real, a laje (art. 1.225, XIII, do Código Civil, acessado em 15.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.508, 1.509, 1.510 Da Anticrese - VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.508, 1.509, 1.510

Da Anticrese - VARGAS, Paulo S. R.

- Parte Especial –  Livro III – Capítulo IV – DA ANTICRESE

– (Art. 1.506 a 1.510) - digitadorvargas@outlook.com  

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 Art. 1.508. O credor anticrético responde pelas deteriorações que, por culpa sua, o imóvel vier a sofrer, e pelos frutos e rendimentos que, por sua negligência, deixar de perceber. 

Bom senso, é a direção que aponta o comentário de Loureiro. O credor anticrético tem o poder de administrar, usar e fruir coisa alheia. Não tem, porém, o poder de dispor, muito menos de alterar a substância da coisa dada em garantia. Cabe-lhe, por consequência, o dever de guardar e conservar o imóvel anticrético, além de zelar por ele, a fim de restituí-lo no mesmo estado que o recebeu, quando da solução da dívida e extinção da garantia real. Não responde entretanto pela depreciação decorrente do uso normal nem por aquelas às quais não der causa. Vigora a máxima res perit domini, que no caso é o devedor anticrético, se a coisa se perder ou deteriorar-se sem culpa do credor, que tem a posse direta.

Caso, porém, o imóvel se deteriore por culpa do credor, este responderá por perdas e danos. Também responderá caso entregue o imóvel em arrendamento a terceiro e este provoque o dano. Pode e deve o credor cuidar da conservação do imóvel, realizando as despesas e benfeitorias necessárias, além do pagamento de taxas e impostos. Para tanto, usará os frutos e rendimentos do próprio imóvel, empregando o saldo na amortização da dívida garantida.

Pode ocorrer de, em casos excepcionais, o imóvel nada produzir, situação que deve apenas ser comunicada ao devedor proprietário, para que este providencie, às suas expensas, as despesas necessárias à manutenção do imóvel.

Cuida-se de norma dispositiva, razão pela qual nada impede que convencionem as partes em sentido contrário. Podem ainda estipular as partes que será o imóvel entregue ao arrendamento de terceiro, escolhido em comum acordo, e que o arrendatário arcará com as despesas de manutenção e conservação do imóvel.

Dispõe ainda o artigo que responde o credor anticrético pelos frutos que se perderem por sua culpa. O preceito é lógico, pois a perda culposa de frutos e rendimentos repercutirá na amortização da dívida garantida, em detrimento do devedor. O valor dos frutos perdidos culposamente, assim, deve ser também imputado no pagamento da obrigação. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.614.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 12/02/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

No mesmo sentido, embora resumidamente, a doutrina de Ricardo Fiuza: O credor anticrético responderá pela deterioração do imóvel dado em anticrese se esse fato ocorrer por sua culpa, bem como será responsabilizado pelo não-recebimento dos frutos e rendimentos da coisa se agir com negligência. • O artigo é idêntico ao de n. 807 do Código Civil de 1916, devendo a ele ser dado o mesmo tratamento doutrinário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 760, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 12/02/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Da mesma forma, Guimarães e Mezzalira, o credor anticrético possui as seguintes obrigações: a) guardar a coisa como se fosse sua; b) responder pelas deteriorações que, por culpa sua, o bem imóvel vier a sofrer; c) responder pelos frutos e rendimentos que deixar de receber por sua negligência; d) prestar contas ao proprietário do bem. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao CC 1.508, acessado em 12.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.509. O credor anticrético pode vindicar os seus direitos contra o adquirente dos bens, os credores quirografários e os hipotecários posteriores ao registro da anticrese.

§ 1º Se executar os bens por falta de pagamento da dívida, ou permitir que outro credor o execute, sem opor o seu direito de retenção ao exequente, não terá preferência sobre o preço.

§ 2º O credor anticrético não terá preferência sobre a indenização do seguro, quando o prédio seja destruído, nem, se forem desapropriados os bens, com relação à desapropriação.

Alerta Loureiro que, como qualquer direito real, a anticrese é dotada de sequela, que lhe confere aderência sobre o imóvel e irradiação de efeitos perante terceiros. O caput do artigo em exame apenas reflete tal situação: os adquirentes do imóvel, os credores hipotecários e os quirografários ulteriores ao registro da anticrese devem respeitar os direitos anteriormente constituídos do credor anticrético.

Não perde o devedor o jus disponendi do imóvel, podendo perfeitamente aliená-lo ou dá-lo em hipoteca a terceiros, que, porém, recebem-no já gravado e são obrigados a respeitar os direitos do credor anticrético de administrar, usar, fruir e reter tal imóvel. 

O § I º do artigo se desdobra em dois preceitos. O primeiro diz que pode o credor anticrético executar o imóvel por falta de pagamento da dívida. Lembre-se, todavia, de que a garantia está circunscrita ao proveito - uso e fruição - e não à substância do imóvel. Disso decorre, como ensina Marco Aurélio S. Viana, que, “se executa, ele está tacitamente renunciando à anticrese, o que leva à extinção do ônus. Não sendo mais titular de direito real de garantia, não goza da preferência, equiparando-se aos demais credores quirografários” (Comentários ao Novo Código Civil. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. XV I, p. 880). Em suma, pode penhorar e levar o imóvel à praça, mas como credor quirografário, abdicando da garantia e, por consequência, perdendo o direito de administração, uso, fruição e retenção.

A segunda parte do preceito diz que pode outro credor penhorar o imóvel gravado, pois é ele alienável. O credor anticrético, em regra similar à do CC 1.501, acima comentado, deve ser intimado da penhora e manifestar-se na execução, ressalvando o seu direito de retenção. Se permanecer silente, apesar de intimado, a anticrese se extingue. Note-se apenas que a preferência decorrente do direito real de garantia não incide sobre o preço da arrematação, mas sim sobre os frutos e rendimentos do imóvel. O arrematante ou o adjudicante, assim, devem respeitar os direitos anteriores da anticrese, permanecendo o credor anticrético de posse do bem, recebendo os seus frutos e rendimentos, até a solução integral da dívida.

O § 2º dispõe que o credor anticrético não terá preferência sobre a indenização do seguro ou da desapropriação. A regra do CC 1.425, já comentado, aplica-se somente aos credores hipotecários e pignoratícios. A anticrese confere direito apenas aos frutos e rendimentos, e não sobre a substância do imóvel. Como porém adverte Gladston Mamede, para evitar o enriquecimento sem causa do devedor anticrético, que tinha o imóvel gravado, parle da indenização, proporcional ao valor da anticrese, deverá ser paga ao credor (Código Civil comentado. São Paulo, Atlas, 2003, v. XIV, p. 485). 

Na Doutrina do Relator Fiuza, o credor anticrético poderá opor seus direitos contra o adquirente do bem, os credores hipotecários e quirografários, desde que tenha registro anterior da anticrese, não tendo ele preferência sobre o preço se não opuser seu direito de retenção ao exequente, bem como preferência sobre a indenização paga pelo seguro, na hipótese de destruição do prédio, e sobre a indenização pela desapropriação. • O dispositivo tem redação semelhante à do art. 808 do Código Civil de 1916, devendo a ele ser dado o mesmo tratamento doutrinário. 

No comentário de Guimarães e Mezzalira, o registro da anticrese adere à coisa, autorizando o credor anticrético a reivindicar os seus direitos contra terceiro que venha a adquirir o bem, bem com como em relação a credores quirografários e hipotecários posteriores ao registro da anticrese.

No caso de excussão do bem, o credor anticrético não possui direito de preferência em relação ao resultado da alienação judicial.

Ainda que o bem esteja no seguro, o direito do credor não se sub-roga na indenização paga pelo segurador. O mesmo ocorrerá no caso de desapropriação imóvel, em que o credor anticrético não se sub-rogará na indenização obtida pelo devedor. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao CC 1.509, acessado em 12.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.510.  O adquirente dos bens dados em anticrese poderá remi-los antes do vencimento da dívida, pagando a sua totalidade à data do pedido de remição e imitir-se-á, se for o caso, na sua posse.

No lecionar de Francisco Eduardo Loureiro, entende-se com alterações à anticrese o direito de remição, estudado no CC 1.481. Viu-se que o imóvel anticrético pode ser alienado a terceiros, pois a garantia real goza de aderência. O adquirente pode fazer a remição da dívida para liberar o bem, deve fazê-lo, porém, antes do vencimento, e pagando a totalidade da dívida. 

Disso decorre que, se o valor da dívida for superior ao da aquisição, a liberação não ocorrerá somente com o depósito do valor da compra. Deve-se pagar a totalidade da dívida.

Extinta a obrigação, segue a sua sorte jurídica o direito acessório de garantia. O adquirente poderá então se imitir na posse do imóvel e se sub-rogará nos direitos do credor contra o devedor, embora como quirografário. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.615.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 12/02/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Corroborando com Loureiro, Guimarães e Mezzalira, o adquirente do bem dado em garantia por anticrese poderá, antes do vencimento da dívida, pagar a sua totalidade (remição), liberando o imóvel da oneração e imitindo-se na posse. Com a averbação da quitação no registro imobiliário, o adquirente passa aser credor quirografário do devedor e a anticrese será extinta. 

Com a remição da dívida (resgate), ficará habilitado o adquirente a demandar a averbação do cancelamento da anticrese junto ao registro imobiliário competente. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao CC 1.510, acessado em 12.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Finalizando o livro III, capítulo IV, a respeito da Anticrese, para Ricardo Fiuza em sua doutrina este artigo inova ao permitir que o adquirente do bem dado em anticrese faça sua remição antes do vencimento do débito. Para tanto, deverá pagar o total da dívida no ato da remição e imitir-se na posse do bem, se for o caso. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 761, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 12/02/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.506, 1.507 Da Anticrese - VARGAS, Paulo S. R.

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.506, 1.507

Da Anticrese - VARGAS, Paulo S. R.

- Parte Especial –  Livro III – Capítulo IV – DA ANTICRESE

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 Art. 1.506. Pode o devedor ou outrem por ele, com a entrega do imóvel ao credor, ceder-lhe o direito de perceber, em compensação da dívida, os frutos e rendimentos. 

§ 1º É permitido estipular que os frutos e rendimentos do imóvel sejam percebidos pelo credor à conta de juros, mas se o seu valor ultrapassar a taxa máxima permitida em lei para as operações financeiras, o remanescente será imputado ao capital.

§ 2º  Quando a anticrese recair sobre bem imóvel, este poderá ser hipotecado pelo devedor ao credor anticrético, ou a terceiros, assim como o imóvel hipotecado poderá ser dado em anticrese.

Historicamente esta era a redação original do presente dispositivo quando de seu envio ao Senado Federal: “Pode o devedor ou outrem por ele, entregando ao credor imóvel, ceder-lhe o direito de perceber, em compensação da dívida, os frutos e rendimentos”. Emenda da lavra do Senador Josaphat Marinho foi apresentada com a seguinte justificativa: “modifica-se a redação do dispositivo para facilitar o entendimento, evitando-se a expressão credor imóvel”. A linguagem adotada pela emenda é mais correta, evitando a cacofonia. O relator Fiuza foi pela sua aprovação. No tocante à manutenção do instituto da anticrese, condenada por muitos, o Deputado Fiuza abraça os argumentos de Ernani Satyro: A anticrese “não merece ser excluída do Código, especialmente em virtude da disciplina atualizada que recebeu no Projeto, o que permitirá o seu maior emprego. Não é demais que se disponha de um modelo jurídico que, quando menos se espera, passa a atender, com mais frequência, aos interesses da vida prática. Foi o que se deu com o antes vetusto instituto da ‘superfície’, que reaparece”.

Em seus comentários, Ricardo Fiuza, em sua Doutrina cita, na clássica definição de Clóvis Beviláqua, “anticrese é o direito real sobre imóvel alheio, cru virtude do qual o credor obtém a posse da coisa, a fim de perceber-lhes os frutos e imputá-los no pagamento da dívida, juros e capital sendo, porem permitido estipular que os frutos sejam, na sua totalidade, percebidos à conta de juros” (Código Civil dos Estados Unidos do Brasil).

Equipara-se este dispositivo ao art. 805 do Código Civil de 1916, com considerável melhora em sua redação. No mais, deve ser aplicado à matéria o mesmo tratamento doutrinário dado ao dispositivo apontado.

Muito se tem discutido sobre a utilidade desse tipo de direito real de garantia entendendo-se que a anticrese foi substituída pela hipoteca, que tem preferência, uma vez que o devedor fica com o bem. A nosso ver deve aquela ser mantida, já que amplia os direitos reais de garantia com mais uma opção a credores e devedores, e pode ser mais vantajosa que a hipoteca e o penhor , por não permitir a venda da coisa dada em garantia, sendo apenas um direito de retenção e fruição, até que se pague a totalidade da divida. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 759-60, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 11/02/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Nos comentários de Loureiro, repete o entendimento de Clóvis Beviláqua, citado acima por Ricardo Fiuza no artigo em exame que contém alterações pontuais em seus dois parágrafos, em relação ao correspondente art. 805.

Não se justifica a manutenção da anticrese em nosso ordenamento jurídico, diante de sua escassa utilidade e do raro uso nos negócios. Define-se, na lição de Clóvis Bevilaqua, como “o direito real sobre imóvel alheio, em virtude do qual o credor o possui, a fim de perceber-lhes os frutos e imputá-los no pagamento da dívida, juros e capital, ou somente dos juros” (Direito das coisas, 3. ed. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1951,1.1, p. 101).

Recai sobre bens imóveis frutíferos pertencentes ao devedor ou a terceiro prestador da garantia. O objeto da anticrese não é propriamente o imóvel, mas sim os seus frutos. O credor anticrético pode usar o imóvel e receber os seus frutos, retendo a posse até a solução da obrigação, mas não levar o prédio à excussão.

A constituição se dá mediante negócio jurídico solene, sempre por escrito e mediante escritura pública, se de valor superior a trinta salários-mínimos, com a devida especialização. O título é levado ao registro imobiliário, de natureza constitutiva do direito real. Antes do registro, há mero direito obrigacional - iura ad rem - do credor anticrético. A posse direta do imóvel é transferida ao credor, mas sem caráter constitutivo da garantia.

Podem constituir a anticrese não somente o proprietário do imóvel, mas também os titulares de poder de disposição dos rendimentos, entre os quais o enfiteuta, o usufrutuário e o superficiário.

O credor anticrético pode explorar pessoalmente o imóvel, atribuindo valor ao uso, ou entregá-lo à exploração de terceiros e receber os seus frutos e rendimentos, em ambos os casos com a finalidade de amortização da dívida. Nada impede que recaia a anticrese também sobre produtos, mediante expressa convenção entre as partes. Anota com razão Gladston Mamede que nada impede que recaia a anticrese sobre frutos naturais ou industriais e que a cessão do imóvel seja feita com acessórios e pertenças, marca e outros direitos. Haveria negócio de anticrese sobre a base física - imóvel - e penhor sobre bens móveis e pertenças (Código Civil comentado, São Paulo, Atlas, 2003, v. XIV, p. 473).

O § Iº prevê o critério de amortização da dívida garantida com os frutos e rendimentos recebidos pelo credor anticrético. A norma, de caráter dispositivo, vigente no silêncio de convenção em contrário das partes, dispõe que os rendimentos do imóvel anticrético serão imputados preferencialmente no pagamento dos juros. Os juros convencionais e legais encontram limite nos CC 591 e 406 do Código Civil, salvo no caso de instituições financeiras, às quais se permite cobrar juros livremente convencionados, à taxa de mercado. Se os frutos superarem o valor dos juros, serão imputados ao capital.

O § 2º tem relevante novidade, pois não mais adota a limitação, como fazia o Código Civil de 1916, de que a hipoteca e a anticrese de imóveis já gravados com garantia real sejam constituídas apenas em favor do mesmo credor. O devedor anticrético não perde a disponibilidade do imóvel, podendo aliená-lo a terceiros, que respeitarão as garantias reais já constituídas. É lógico, portanto, que o devedor anticrético constitua hipoteca em favor do credor ou de terceiros, ou que o devedor hipotecário possa constituir anticrese em favor do credor ou de terceiros, sem afetar a garantia real anterior. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.612-13.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 11/02/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

No dizer de Guimarães e Mezzalira, constitui-se a anticrese por uma garantia real instituída em favor do credor (credor anticrético), que retém em seu poder bem imóvel alheio, podendo explorá-lo economicamente a fim de pagar-se integralmente quanto a seu crédito.

Distingue-se da hipoteca – daí sua pífia utilização – pelo fato de o devedor, na anticrese, perder a posse direta do bem imóvel, em favor do credor, que o utiliza com o intuito de perceber os frutos extraídos e contabilizá-los no pagamento da dívida principal.

Se já se torna dificultoso alguém adquirir bem gravado com ônus hipotecário, o que dizer de um bem imóvel onerado de anticrese, onde a posse dieta permanece nas mãos do credor, até que seja pago integralmente seu crédito. Trata-se, pois, de um negócio extremamente desvantajoso para o devedor e complexo demais para o próprio credor.

Prescreve o § 2º do CC 1.506 que o bem gravado de anticrese poderá ser hipotecado pelo devedor ao credor anticrético, ou a terceiros, assim como o bem dado em hipoteca poderá ser dado em anticrese. Ou seja, o mesmo credor anticrético poderá ter a seu favor, cumulativamente, a garantia anticrética e hipotecária em relação ao imóvel. Neste caso, a dificuldade comercial do imóvel, para o devedor, aumenta significativamente.

Distingue-se da hipoteca (e do penhor) por outra razão basilar: na anticrese não há direito de preferência ao credor anticrético em caso de inadimplência da dívida principal. Em favor deste há somente direito de retenção do imóvel, até que seja pago integralmente a obrigação, conforme a primeira parte do CC 1.423.

Extingue-se a anticrese pelas mesmas razões que vierem a extinguir a dívida principal, pois é acessória desta, como mera garantia real. Perecendo o bem, de igual forma perecerá a garantia de que se cuida.

Também será extinta a anticrese pela caducidade, quando decorrido o prazo de quinze anos de sua constituição, nos moldes do CC 1.423, segunda parte, do Código Civil. Após tal prazo, ainda que a dívida persista, a garantia real deixa de existir e, via de consequência, o direito de retenção. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao CC 1.506, acessado em 11.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.507. 0 credor anticrético pode administrar os bens dados em anticrese e fruir seus frutos e utilidades, mas deverá apresentar anualmente balanço, exato e fiel, de sua administração.

§ Iº Se o devedor anticrético não concordar com o que se contém no balanço, por ser inexato, ou ruinosa a administração, poderá impugná-lo, e, se o quiser, requerer a transformação em arrendamento, fixando o juiz o valor mensal do aluguel, o qual poderá ser corrigido anualmente.

§ 2º O credor anticrético pode, salvo pacto em sentido contrário, arrendar os bens dados em anticrese a terceiro, mantendo, até ser pago, direito de retenção do imóvel, embora o aluguel desse arrendamento não seja vinculativo para o devedor.

O artigo em exame corresponde ao art. 806 do Código Civil de 1916, com significativas alterações. Como explica Loureiro, recebe o credor anticrético a posse direta do imóvel, podendo usá-lo, fruí-lo e administrá-lo, imputando os frutos e rendimentos na amortização da dívida garantida.

A exploração do imóvel poderá ser feita diretamente pelo credor, que usará as vantagens auferidas no pagamento da dívida. Nada impede que as partes ajustem desde logo um valor prefixado de remuneração decorrente do uso, desde que respeitados os princípios cogentes da boa-fé objetiva e do equilíbrio contratual. Caso não haja prévia estipulação do valor da utilização, deverá o credor apresentar anualmente balanço exato de sua administração, demonstrando os rendimentos e os custos da exploração do imóvel.

No caso de divergência fundada do devedor, quando os rendimentos apresentados forem inferiores aos reais, ou a administração do imóvel for ruinosa, inclusive no que se refere à sua conservação, a exploração direta poderá ser convertida em arrendamento. O juiz, na falta de acordo entre as partes, fixará o valor mensal do aluguel pela exploração do imóvel.

Salvo pacto em contrário, pode ainda o credor arrendar o imóvel a terceiro e receber os rendimentos e aluguéis, usando-os na amortização da dívida. Reterá o imóvel até a solução da obrigação garantida, mas o arrendamento não vincula o devedor anticrético, pois é parte estranha ao contrato. (Francisco Eduardo Loureiro, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.613-14.  Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 11/02/2021. Revista e atualizada nesta data por VD).

Constando na doutrina o comentário de Ricardo Fiuza, Credor Anticrético é o titular do direito de retenção do imóvel dado em anticrese. Assim , cabe ao credor anticrético a administração do bem dado em anticrese, devendo prestar contas anualmente ao devedor anticrético . Na hipótese de administração do credor anticrético ser ruinosa, poderá o devedor anticrético impugnar as contas apresentadas, e inclusive transformar a anticrese em arrendamento, sendo o aluguel fixado judicialmente. • O § 2º do artigo trata da faculdade de o credor anticrético arrendar o bem a terceiro, receber o aluguel do arrendamento, que não será vinculado ao devedor, isso se não houver disposição contratual em contrario. • Este dispositivo equipara-se ao art. 806 do Código Civil de 1916, com considerável melhora em sua redação. No mais, deve ser aplicado à matéria o mesmo tratamento doutrinário dado ao referido artigo. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 760, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 11/02/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Complementando Guimarães e Mezzalira, o credor anticrético deve conservar a coisa e administrá-la de acordo com a sua finalidade natural, não podendo aplicar as rendas auferidas com a retenção do bem em outros negócios, limitando-se ao pagamento da obrigação contraída (Gonçalves, 2010, p. 639).

Poderá o credor anticrético, se não quiser utilizar o bem e perceber seus frutos, arrenda-lo a terceiros, salvo se estipulado o contrário no contrato. Deve o credor apresentar balanço anual de sua administração e, se o devedor discordar, poderá impugná-lo e requerer a transformação em arrendamento, fixando o juiz o valor mensal do aluguel. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira  apud  Direito.com, comentários ao CC 1.507, acessado em 11.02.2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).