sábado, 29 de outubro de 2022

Comentários ao Código Penal – Art. 18 Crime doloso e crime culposo – VARGAS, Paulo S. R. vargasdigitador.blogspot.com – digitadorvargas@outlook.com Whatsapp: +55 22 98829-9130

 

Comentários ao Código Penal – Art. 18
Crime doloso e crime culposo – VARGAS, Paulo S. R.
vargasdigitador.blogspot.com – digitadorvargas@outlook.com 

Whatsapp: +55 22 98829-9130

Parte Geral –Título II - Do Crime

 

 

Crime doloso e crime culposo (Redação dada pela Lei na 7.209, de 11/7/1984.)

 

Art. 18. Diz-se o crime: (Redação dada pela Lei na 7.209, de 11/711984.)

 

Crime doloso - (Incluído pela Lei ns 7.209, de 11/7/1984.)

 

I - Doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo; (Incluído pela Lei na 7.209, de 11/7/1984.)

 

Crime culposo - (Incluído pela Lei na 7.209, de 11/7/1984.)

 

II - Culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia. (Incluído pela Lei na 7.209, de 11/7/1984).

 

Parágrafo único. Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente. (Incluído pela Lei na 7.209, de 11/7/1984).

 

Há regras, segundo leciona em suas apreciações Greco, Rogério. Código Penal: Comentado. 5ª ed. – Niterói, RJ: Comentários ao Crime doloso e crime culposo – Art. 18 do CP, p. 56-61, veja:

 

Conceito de dolo - Dolo é a vontade e a consciência dirigidas a realizar a conduta prevista no tipo penal incriminador.

(Dissertando sobre as origens do dolo, Patrícia Laurenzo Copello esclarece que “o dolo, como pressuposto do delito, aparece peia primeira vez no Direito romano, onde foi concebido com perfis muito nítidos e definidos, identificando-o com a intenção ou, melhor ainda, com a ‘má intenção’ ou malícia na realização do fato ilícito. Deste modo ficava superada a primitiva concepção do ilícito penal como mera causação objetiva de resultados, exigindo-se a ‘intenção imoral’ dirigida a um ‘fim antijurídico’ — o ‘dolus matus' - como fundamento para a aplicação da pena pública" (Dolo y conocimiento, p. 27).

Conforme preleciona Welzel, “toda ação consciente é conduzida pela decisão da ação, quer dizer, peia consciência do que se quer - o momento intelectual - e pela decisão a respeito de querer realizá-lo – o momento volitivo. Ambos - os momentos, conjuntamente, como fatores configuradores de uma ação típica real, formam o dolo (= dolo do tipo)” (WELZEL, Hans. Derecho penal alemán, p. 77); ou, ainda, na lição de Zaffaroni, “dolo é uma vontade determinada que, como qualquer vontade, pressupõe um conhecimento determinado”. (ZAFFARONI, Eugênio Raúl. Manual de derecho penal - Parte general, p. 405). Assim, podemos perceber que o dolo é formado por um elemento intelectual e um elemento volitivo.

 

Habeas corpus - O habeas corpus, sendo instrumento de cognição sumária e célere, não se presta à análise aprofundada do conjunto fático-probatório, sobretudo quando se objetiva a reclassificação ou desclassificação da conduta por ausência de dolo (STF, H C 90017/AP, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 1ª T., DJ 14/9/2007, p. 44).

 

É sabidamente descabida, em sede de habeas corpus, a discussão acerca do elemento subjetivo (dolo) das condutas delituosas (STJ, HC 16738/SP, Relª Minª. Laurita Vaz, 5ª T., DJ 3/10/2005, p. 285).

 

Tipo doloso como regra - Dispõe o parágrafo único do art. 18 do

Código Penal: Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente. A regra contida nesse parágrafo é a de que todo crime é doloso, somente havendo a possibilidade de punição pela prática de conduta culposa se a lei assim o previr expressamente. Em síntese, o dolo é a regra; a culpa, a exceção.

 

Teorias do dolo * - Podemos destacar quatro teorias a respeito do dolo: a) teoria da vontade; b) teoria do assentimento; c) teoria da representação; d) teoria da probabilidade.

 

* “O verbo querer, empregado para exprimir a vontade humana, é um verbo auxiliar que necessita, sempre, de um verbo principal para explicitar seu conteúdo; neste caso, o verbo querer deve ser completado com o verbo realizar, porque o direito penal proíbe realizar crimes e, portanto, o componente volitivo do dolo define-se como querer realizar o tipo objetivo de um crime” (SANTOS, Juarez Cirino dos. A moderna teoria do fato punível, p. 63).

 

Segundo a teoria da vontade, dolo seria tão somente a vontade livre e consciente de querer praticar a infração penal, isto é, de querer levar a efeito a conduta prevista no tipo penal incriminador. (TAVARES, Juarez. Teoria do injusto penal, p. 278-279).

 

Já a teoria do assentimento diz que atua com dolo aquele que, antevendo como possível o resultado lesivo com a prática de sua conduta, mesmo não o querendo de forma direta, não se importa com sua ocorrência; assumindo o risco de vir a produzi-lo. Aqui o agente não quer o resultado diretamente, mas o entende como possível e o aceita. Segundo a precisa lição de Juarez Tavares, “a teoria do consentimento ou da assunção é a teoria dominante e tem por base uma vinculação emocional do agente para com o resultado. Vale dizer, exige não apenas o conhecimento ou a previsão de que a conduta e o resultado típicos podem realizar-se, como também que o agente se ponha de acordo com isso ou na forma de conformar-se ou de aceitar ou de assumir o risco de sua produção”. (CEREZO MIR, José. Curso de derecho penal español - Parte general, v. II, p. 149.75).

 

Para a teoria da representação, podemos falar em dolo toda vez que o agente tiver tão somente a previsão do resultado como possível e, ainda assim, decidir pela continuidade de sua conduta. Para os adeptos dessa teoria, não se deve perquirir se o agente havia assumido o risco de produzir o resultado, ou se, mesmo o prevendo como possível, acreditava sinceramente na sua não ocorrência. Para a teoria da representação, não há distinção entre dolo eventual e culpa consciente, uma vez que a antevisão do resultado leva à responsabilização do agente a título de dolo.

 

Segundo a teoria da probabilidade, conforme as lições de José Cerezo Mir, “se o sujeito considerava provável a produção do resultado estaríamos diante do dolo eventual. Se considerava que a produção do resultado era meramente possível, se daria a imprudência consciente ou com representação”. (CEREZO MIR, José. Curso de derecho penal español - Parte general, v. II, p. 149). Na verdade, a teoria da probabilidade trabalha com dados estatísticos, ou seja, se, de acordo com determinado comportamento praticado peio agente, estatisticamente, houvesse grande probabilidade de ocorrência do resultado, estaríamos diante do dolo eventual.

 

Espécies de dolo - Costuma-se distinguir o dolo em: direto e indireto. O dolo direto se biparte em: dolo direto de primeiro grau e dolo direto de segundo grau. O dolo indireto, a seu turno, pode ser concebido como: dolo alternativo e dolo eventual. A alternatividade do dolo pode ser: subjetiva (quando se referir à pessoa) e objetiva (quando disser respeito ao resultado).

 

Dolo geral (hipótese de erro sucessivo) - Fala-se em dolo geral (dolus generalis), segundo Welzel, “quando o autor acredita haver consumado o delito quando na realidade o resultado somente se produz por uma ação posterior, com a qual buscava encobrir o fato”, (WELZEL, Hans. Derecho penal alamán, p. 89); ou, ainda, na definição de Hungria, “quando o agente, julgando ter obtido o resultado intencionado, pratica segunda ação com diverso propósito e só então é que efetivamente o dito resultado se produz” (HUNGRIA, Nélson. Comentários ao Código Penal, v. I, t. II, p. 182). Exemplificando, os insignes juristas trazem à colação caso do agente que após desferir golpes de faca na vítima, supondo-a morta, joga o corpo dela em um rio, vindo esta, na realidade, a morrer por afogamento. A discussão travada na

Alemanha cingia-se ao fato de que, com a primeira conduta, o agente não havia alcançado o resultado morte, razão pela qual deveria responder por um crime tentado; em virtude de seu segundo comportamento, i.é, o fato de jogar o corpo da vítima num rio, seria responsabilizado por homicídio culposo.

 

Dolo genérico e dolo específico - Fazia-se, quando prevalecia a teoria natural da ação, a distinção entre dolo genérico e dolo específico. Dizia-se que dolo genérico era aquele em que no tipo penal não havia indicativo algum do elemento subjetivo do agente ou, melhor dizendo, não havia indicação alguma da finalidade da conduta do agente. Dolo específico, a seu turno, era aquele em que no tipo penal podia ser identificado o que denominamos de especial fim de agir. No tipo do art. 121 do Código Penal, por exemplo, não há, segundo os adeptos dessa distinção, indicação alguma da finalidade do agente, razão pela qual vislumbravam, ali, o dolo genérico. Ao contrário, rio caso de tipos penais como o do art. 159 do Código Penal, em que na sua redação encontramos expressões que indicam a finalidade da conduta do agente (com o fim de etc.), existiria um dolo específico.

 

Dolo normativo (dolus malus) - Na precisa lição de Assis Toledo, (TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios básicos de direito penal, p. 282-283), “a teoria extremada do dolo - a mais antiga - situa o dolo na culpabilidade e a consciência da ilicitude no próprio dolo. O dolo é, pois, um dolo normativo, o dolus malus dos romanos, ou seja: vontade, previsão e mais o conhecimento de que se realiza uma conduta proibida (consciência atual da ilicitude). A teoria limitada do dolo quer ser um aperfeiçoamento da anterior, pois desta não diverge a não ser em alguns pontos: substitui o conhecimento atual da ilicitude pelo conhecimento potencial; além disso, exige a consciência da ilicitude material, não puramente formal”. (TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios básicos de direito penal, p. 282-283).

 

Dolo subsequente (dolus subsequens ou dolo consecutivo) - Para efeito de raciocínio, estaríamos diante de uma hipótese, por exemplo, em que o agente tivesse produzido um resultado sem que, para tanto, houvesse qualquer conduta penalmente relevante, em face da inexistência de dolo ou culpa ou, mesmo, diante de um fato inicialmente culposo, sendo que, após verificar a ocorrência desse resultado, o agente teria se alegrado ou mesmo aceitado sua produção. Conforme bem observado por Günter Stratenwerth, como não se pode querer realizar o que já aconteceu, a “mera aprovação retroativa de um resultado já produzido nunca constitui dolo". (STRATENWERTH, Günter. Derecho penal - Parte general I, p. 171).

 

Dolo subsequente (dolus subsequens ou dolo consecutivo) - Para efeito de raciocínio, estaríamos diante de uma hipótese, por exemplo, em que o agente tivesse produzido um resultado sem que, para tanto, houvesse qualquer conduta penalmente relevante, em face da inexistência de dolo ou culpa ou, mesmo, diante de um fato inicialmente culposo, sendo que, após verificar a ocorrência desse resultado, o agente teria se alegrado ou mesmo aceitado sua produção. Conforme bem observado por Günter Stratenwerth, como não se pode querer realizar o que já aconteceu, a “mera aprovação retroativa de um resultado já produzido nunca constitui dolo". (STRATENWERTH, Günter. Derecho penal - Parte general I, p. 171).

 

Ausência de dolo em virtude de erro de tipo - O erro, numa concepção ampla, é a falsa percepção da realidade. Aquele que incorre em erro imagina uma situação diversa daquela realmente existente. O erro de tipo, em precisa lição de Zaffaroni, “é o fenômeno que determina a ausência de dolo quando, havendo uma tipicidade objetiva, falta ou é falso o conhecimento dos elementos requeridos pelo tipo objetivo". (ZAFFARONI, Eugênio Raúl, Manual de derecho penal - Parte general, p. 411). No exemplo do caçador que atira em seu companheiro supondo-o um animai, não podemos, mesmo sendo inescusável o erro, vislumbrar o dolo em sua conduta. Isso porque, pelo exemplo fornecido, a vontade do agente não era de matar alguém e, sim, um animal que ele supunha estar naquele locai. Tampouco tinha consciência de que matava um ser humano. Dessa forma, a consequência natural do erro de tipo é a de, sempre, afastar o dolo do agente, permitindo, contudo, sua punição pela prática de um crime culposo, se houver previsão legal, conforme determina o caput do art. 20 do Código Penal, assim redigido: O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei.

 

Conceito e elementos do crime culposo - Na lição de Mirabete tem-se conceituado o crime culposo como “a conduta humana voluntária (ação ou omissão) que produz resultado antijurídico não querido, mas previsível, e excepcionalmente previsto, que podia, com a devida atenção, ser evitado”. (MIRABETE, Júlio Fabbrini. Manual de direito penal - Parte gerai, p. 138).

 

Nota-se, portanto, que para a caracterização do delito culposo é preciso a conjugação de vários elementos, a saber: a) conduta humana voluntária, comissiva ou omissiva; b) inobservância de um dever objetivo de cuidado (negligência, imprudência ou imperícia); c) o resultado lesivo não querido, tampouco assumido, pelo agente; d) nexo de causalidade entre a conduta do agente que deixa de observar o seu dever de cuidado e o resultado lesivo dela advindo; e) previsibilidade (objetiva e subjetiva); f) tipicidade.

 

Imprudência, negligência e imperícia - Mais do que uma conceituação de crime culposo, o inciso II do art. 18 do Código Penal nos fornece as modalidades de condutas que fazem com que o agente deixe de observar o seu exigível dever de cuidado. Esta falta de observância ao dever de cuidado pode ocorrer em virtude de imprudência, negligência ou imperícia do agente.

 

No caso, o paciente dirigindo em alta velocidade, sob condições de visibilidade adversas, não efetuou manobra necessária para evitar o atropelamento das vítimas. Quem dirige nessas condições age, induvidosamente, com imprudência, imperícia e negligência. Daí a Improcedência da alegação de que, tendo a denúncia relatado a ocorrência de imprudência e imperícia, o acórdão do TJ/RS não poderia considerar a negligencia (STF, RHC 97669/RS, Rei. Min. Eros Grau, 2a T., Dje 11/2/2010, p. 515-517).

 

Imprudente seria a conduta positiva praticada pelo agente que, por não observar seu dever de cuidado, causasse o resultado lesivo que lhe era previsível. Na definição de Aníbal Bruno, “consiste a imprudência na prática de um ato perigoso sem os cuidados que o caso requer’’. (BRUNO, Anibal. Direito penal, p. 88). Por exemplo, imprudente é o motorista que imprime velocidade excessiva ao seu veículo ou o que desrespeita um sinal vermelho em um cruzamento etc. A imprudência é, portanto, um fazer alguma coisa.

 

O condutor de automóvel que realiza ultrapassagem em trecho de rodovia com faixa contínua, invadindo a contramão e causando colisão com motocicleta que trafegava em sentido contrário, causando a morte de motociclista, pratica conduta ilícita, caracterizada pela imprudência (TJMG, AC 1.0024.02.801342-3/001, Rel. Des. Eduardo Maniré da Cunha, DJ 30/1 1/2006).

 

A negligência, ao contrário, é um deixar de fazer aquilo que a diligência normal impunha. É o caso, por exemplo, do motorista que não conserta os freios já gastos de seu automóvel ou o do pai que deixa arma de fogo ao alcance de seus filhos menores.

 

Não há falar em negligência na conduta de quem deixa de fiscalizar serviço alheio, desde que executado por profissional qualificado e especificamente contratado para tal fim, tendo em vista que, nessa hipótese, aplica-se o princípio da confiança (TjMG, AC 1.0701.04.070527-2/001, Rel. Des. Hélcio Valentim, DJ 1V8/2007).

 

Fala-se em imperícia quando ocorre uma inaptidão, momentânea ou não, do agente para o exercício de arte, profissão ou ofício. Diz-se que a imperícia está ligada, basicamente, à atividade profissional do agente. Um cirurgião plástico, v.g., durante um ato cirúrgico, pode praticar atos que, naquela situação específica, conduzam à imperícia.

 

O homicídio culposo se caracteriza com a imprudência, negligência ou imperícia do agente, modalidades da culpa que não se confundem com a inobservância de regra técnica da profissão, que é causa especial de aumento de pena que se situa no campo da culpabilidade, por conta do grau de reprovabilidade da conduta concretamente praticada. Precedentes (STJ. HC 94973/RJ, Rel3. Mm1. Laurita Vaz, 5ª T. Dje 30/6/200S).

 

Crime culposo e tipo aberto - Os crimes culposos são considerados tipos abertos. Isso porque não existe uma definição típica completa e precisa para que se possa, como acontece em quase todos os delitos dolosos, adequar a conduta do agente ao modelo abstrato previsto na lei. A redação do tipo culposo é diferente daquela destinada ao delito doloso. Em virtude disso, Welzel diz: “Nos delitos culposos a ação do tipo não está determinada legalmente. Seus tipos são, por isso, ‘abertos’ ou ‘com necessidade de complementação’, já que o juiz tem que ‘completá-los’ para o caso concreto”.  (WELZEL, Hans. Derecho penal alemán, p. 157).

 

Embora os tipos culposos possam ser considerados como abertos, existem algumas exceções a essa regra, a exemplo do que ocorre com a receptação culposa, prevista no § 3º, do art. 180 do Código Penal, onde há a narração completa do comportamento típico, e também o art. 38 da Lei na 11.343, de 23 de agosto de 2006.

 

Culpa consciente e culpa inconsciente - A culpa inconsciente distingue-se da culpa consciente no que diz respeito à previsão do resultado; naquela, o resultado, embora previsível, não foi previsto pelo agente; nesta, o resultado é previsto, mas o agente, confiando em si mesmo, nas suas habilidades pessoais, acredita sinceramente que este não venha a ocorrer. A culpa inconsciente é a culpa sem previsão e a culpa consciente é a culpa com previsão.

 

Diferença entre culpa consciente e dolo eventual - Na culpa consciente, o agente, embora prevendo o resultado, acredita sinceramente na sua não ocorrência; o resultado previsto não é querido ou mesmo assumido pelo agente. Já no dolo eventual, o agente, embora não queira diretamente o resultado, assume o risco de vir a produzi-lo. Na culpa consciente, o agente, sinceramente, acredita que pode evitar o resultado; no dolo eventual, o agente não quer diretamente produzir o resultado, mais, se este vier a acontecer, pouco importa.

 

Culpa imprópria - Fala-se em culpa imprópria nas hipóteses das chamadas descriminantes putativas em que o agente, em virtude de erro evitável pelas circunstâncias, dá causa dolosamente a um resultado, mas responde como se tivesse praticado um delito culposo.

 

Compensação e concorrência de culpas - Embora não se admita a compensação de culpas em Direito Penal, a concorrência é plenamente possível.

 

Excepcionalidade do crime culposo - De acordo com o disposto no parágrafo único do art. 18 do Código Penal, o dolo é a regra; a culpa, a exceção. Aquele que. de forma imprudente, causar dano a um terceiro não pratica infração alguma de natureza penal, haja vista que o art. 163 do Código Penal não fez a previsão dessa modalidade de conduta. Deverá o agente, portanto, na esfera civil, reparar o dano por ele causado à vítima.

 

Tentativa nos delitos culposos - Parte da doutrina aceita a possibilidade de tentativa nos crimes culposos, quando da ocorrência da chamada culpa imprópria (culpa por extensão, por assimilação, por equiparação), i.é, quando o agente, nos casos de erro evitável nas descriminantes putativas, atua com dolo, mas responde pelo resultado causado com as penas correspondentes ao delito culposo. (Greco, Rogério. Código Penal: Comentado. 5ª ed. – Niterói, RJ: Comentários ao Crime doloso e crime culposo – Art. 18 do CP, p. 56-61. Editora Impetus.com.br, acessado em 29/10/2022 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

No lecionar de Victor Augusto em artigo intitulado “Crime doloso e culposo, comentários ao art. 18 do CP, culpa e dolo são elementos subjetivos que integram a tipicidade da conduta. São os estados psicológicos e anímicos que delineiam a intenção do agente e permitem a configuração do fato tipificado na lei.

 

Ao se tratar de dolo e culpa, algumas expressões são comuns, como: a) estado anímico (“estado da alma”); b) estado psíquico ou psicológico; c) elemento subjetivo; d) culpabilidade em sentido amplo; e) volição etc. São em geral expressões que denotam o processo interno do agente e mostram a refutação de responsabilidade penal objetiva (aquela que prescinde de culpa ou dolo do agente).

 

Enfim: O dolo é a união da representação do resultado (consciência, estado cognitivo) de uma conduta e da vontade (volição) de querer praticar essa conduta. No Código Penal, o dolo é natural ou neutro, portanto, não possui elementos normativos em seu teor, como fazem algumas teorias.

 

Apenas como acréscimo, saiba-se que a teoria normativa do dolo afirma que o dolo depende, além da representação do resultado e da vontade em atingi-lo, de uma consciência da antijuridicidade (ilicitude) da conduta. Esse elemento, modernamente, foi excluído do tipo doloso e passou à culpabilidade. A visão predominante na doutrina hoje é a do dolo natural ou neutro.

 

Como regra, as condutas tipificadas no Código Penal correspondem aos crimes dolosos. A punição por conduta culposa deve ser explicitamente prevista para ser aplicada.

 

O artigo confirma a adoção tanto da teoria da vontade como da teoria do consentimento para confirmar a existência do dolo. Pela primeira, o dolo se verifica na conjunção de representação do resultado e da vontade de alcança-lo (dolo direito). Na segunda, o dolo deriva da representação do resultado mais o consentimento de atingi-lo, mesmo que este não seja o interesse direito do agente (dolo eventual).

 

A consequência jurídica é a mesma: a punição. Para Hungria (1978, p. 115): “Ora, consentir no resultado não é senão um modo de querê-lo”.

 

Na doutrina, são múltiplas as facetas atribuídas à conduta dolosa, algumas classificações podem ser ressaltadas, devendo ser mencionado, entretanto, que, em geral, essas classificações decorrem de ponderações doutrinárias sem maiores repercussões na aplicação prática do Direito Penal.

 

Dolo de dano: aquele típico do crime material, dirigido à produção da lesão ao bem jurídico protegido;

 

Dolo de perigo: aquele típico do crime de perigo, que se consuma com a causação de perigo. Quer o agente pôr o bem jurídico em perigo;

 

Dolo genérico: aquele que prescinde de qualquer fim particular.

 

Dolo específico: aquele que almeja um fim especial ou determinado previsto na lei incriminadora (Ex.: receptação de animal em comparação com a receptação comum).

 

As noções de dolo genérico e específico hoje são refutadas por parte da doutrina, prevalecendo simplesmente a ideia de que as finalidades específicas previstas no tipo são elementos subjetivos específicos (ESTEFAM, 2018).

 

Dolo de propósito: é o dolo acompanhado por uma premeditação, uma deliberação do agente.

 

Dolo de ímpeto: é o dolo passional, que acompanha uma emoção ou reação súbita do agente.

 

Dolo direto de primeiro grau (imediato): é aquele típico, dirigido exclusivamente ao resultado imediato buscado.

 

Dolo direito de segundo grau ou de consequências: é aquele dolo voltado às consequências necessárias na conduta criminosa, tendo em vista os meios escolhidos.

 

Em relação ao dolo de segundo grau, a doutrina aponta como caso típico o do terrorista que, visando assassinar um estadista, explode o avião em que este se encontra. Pelo meio escolhido, ele está diretamente ciente e interessado no óbito de todos os outros passageiros, visto que esta é uma consequência natural do meio escolhido.

 

É importante ressaltar a diferença desta figura em relação ao dolo eventual, pois neste o resultado não é consequência necessária da ação, mas sim uma possibilidade com que o agente aceita.

 

Dolo alternativo: é o dolo do agente que, com sua ação, busca produzir um resultado ou outro, existindo dentro da volição autoral a realização dos resultados possíveis.

 

Dolo geral: é o dolo que abrange o resultado final causado por uma conduta subsequente à conduta inicial do agente. Este pensa erroneamente ter atingido o objetivo com a conduta prévia, mas é a conduta subsequente que realmente alcança o objetivo.

 

O exemplo clássico do dolo geral (dolus generalis) envolve o crime de homicídio: o agente dispara contra o desafeto, atingindo-o e supondo tê-lo matado, mas o mesmo permanece vivo. Em seguida, o criminoso, buscando destruir a evidência da materialidade, joga o corpo num rio, vindo a vítima a morrer afogada. Como o resultado foi obtido, mesmo que por forma distinta da pretendida pelo autor, o seu dolo abrange de forma geral seus atos, sendo possível a punição pela consumação.

 

O crime culposo é aquele que deriva de uma conduta imprudente, negligente ou imperita, explicando a doutrina que essas figuras são interpenetráveis, muitas vezes se aproximando.

 

Imprudência: é o agir afoito, sem pensar, sem ponderamento prévio.

 

Negligência: é o desleixo com as precauções anteriores, é a omissão de se tomar certos cuidados prévios exigidos pela praxe.

 

Imperícia: é uma espécie de imprudência profissional. É o censurável agir desamparado das qualificações e do conhecimento técnico exigido para um ato.

 

A doutrina discute, ainda, graus de culpa: levíssima, leve ou grave. Essa divisão diz mais respeito à intensidade da reprimenda (dosimetria da pena) que poderá ser aplicada.

 

A ordem jurídica não pode renunciar à punibilidade do delinquente culposo; [e este um desajustado à disciplina social. Falta-lhe constância na preocupação que, no convívio social, deve ter todo homem responsável, no sentido do neminem laedere ou de evitar a lesão ou periclitação do interesse de seus concidadãos. (Hungria, Fragoso, 1978, p. 201).

 

O elemento básico da reprovação do crime culposo é a previsibilidade do resultado, o que o tornaria evitável se os cuidados e diligencias exigidas pela lei fossem tomados. Se o resultado era imprevisível, não há que se falar em crime, entrando aquele nas raias do caso fortuito e da força maior.

 

A previsibilidade é uma característica genérica e diz respeito à simples possibilidade de se prever um resultado. Em outras palavras, previsibilidade existe quando o agente pode, segundo a experiência geral, representar (prever) um resultado ((Hungria, Fragoso, 1978).

 

A previsão, por outro lado, é uma questão concreta e diz respeito à efetiva previsão ou falta de previsão desse resultado no caso concreto.

 

Com base na previsibilidade, duas espécies de culpa podem ser verificadas: a culpa inconsciente (mais comum) e a consciente. No primeiro caso, há previsibilidade, mas o agente concretamente não previu o resultado, gerando-o. no segundo, o agente prevê o resultado, mas acredita que este não se realizará.

 

Diante da previsão do resultado, a doutrina menciona a aproximação entre a culpa consciente e o dolo eventual, mas distancia-os na abordagem desse resultado previsto:

 

Sensível é a diferença entre essas duas atitudes psíquicas. Há, entre elas, é certo, um traço comum: a previsão do resultado antijurídico; mas, enquanto no dolo eventual o agente presta anuência ao advento desse resultado, preferindo arriscar-se a produzi-lo, ao invés de renunciar à ação, sua culpa consciente, ao contrário, o agente repele, embora inconsideradamente, a hipótese de superveniência do resultado, e empreende a ação na esperança ou persuasão de que este não ocorrerá. (Hungria, Fragoso, 1978, p. 116-117).

 

Em certas situações, a lei prevê tipos penais que correspondem a uma conduta complexa, iniciada de forma dolosa, mas atingindo um resultado culposo. É o que se denomina praeterdolo:

 

No crime praterdolo há um concurso de dolo e culpa: dolo no antecedente (minus delictum) e culpa no subsequente (majus delictum). Trata-se de um crime complexo in partibus doloso e in partibus culposo. A diferença que existe entre o crime praterdolo e o crime culposo está apenas em que neste o evento antijurídico não querido resulta de um fato penalmente indiferente ou, quando muito, contravencional, enquanto naquele o resultado involuntário deriva de um crime doloso. (Hungria, Fragoso, 1978, p. 140).  (Victor Augusto em artigo intitulado “Crime doloso e culposo, comentários ao art. 18 do CP, no site Index Jurídico, em 17 de janeiro de 2019, acessado em 29/10/2022 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

No lecionar de Flávio Olímpio de Azevedo, Comentários ao art. 18 do Código Penal, publicado no site Direito.com, resumidamente: “O princípio da culpabilidade (nullum crimen nulla poena sine culpa) é corolário do Estado Democrático de Direito e reflexo de um ordenamento jurídico fundado na dignidade da pessoa humana” (Código Penal interpretado Adjair de A. Cintra, p. 33).

 

O elo da culpabilidade entre fato e o agente apresenta-se sob a forma de dolo e culpa.

 

Crime doloso: doloso, quando a gente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo; o dolo é composto por consciência (saber) e vontade (querer) pela pessoa humana de realizar com conduta o comportamento típico.

 

O dolo direto é o determinado à forma intensa da expressão da vontade livre e consciente de fazer. E quando o agente tem consciência do ato praticado da realidade buscada com propósito da prática da conduta típica e o resultado com sua conduta. Disfere um tiro de revólver na vítima com intenção de matar, de cometer um homicídio.

 

Dolo indireto (eventual alternativo) – O dolo indireto é quando a vontade do agente não visa a um resultado preciso e determinado. Compreende duas formas: a) dolo eventual: quando o agente conscientemente, admite e aceita o risco de produzir o resultado; b) dolo alternativo quando a vontade do agente visa a um ou outro resultado. (Exemplo: matar ou ferir) (Celso Delmanto et al, Código Penal comentado, p. 33).

 

Crime culposo – É a prática de uma conduta em que o agente não tem intenção de conduzir ao resultado de conduta típica por imprudência, negligência ou imperícia. A culpa não se presume, tem que estar comprovada.

 

Imprudência: Falta de cuidado; de precaução; exemplo: motorista dirigindo em velocidade acima da permitida.

 

Negligência: é modalidade de culpa negativa “in-ommitendo” é inércia do agente e modalidade omissiva, displicente. O agente, por exemplo, não faz manutenção do veículo que, por um defeito nos freios, causa um acidente.

 

Imperícia. É atitude positiva e a culpa técnica é incapacidade do agente para prática do exercício da profissão ou ofício, por falta de aptidão. Ad esempio: o médico sem conhecimentos técnicos da cirurgia plástica, realiza a mesma, ocasionando a morte do paciente por complicações pós-operatória. (Flávio Olímpio de Azevedo, Formado em Direito pela FMU em 1973. Comentários ao art. 18 do Código Penal, publicado no site Direito.com, acessado em 29/10/2022 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

sexta-feira, 28 de outubro de 2022

Comentários ao Código Penal – Art. 17 Crime impossível – VARGAS, Paulo S. R. vargasdigitador.blogspot.com – digitadorvargas@outlook.com – Whatsapp: +55 22 98829-9130

 

Comentários ao Código Penal – Art. 17

Crime impossível – VARGAS, Paulo S. R.
vargasdigitador.blogspot.com –
digitadorvargas@outlook.com –
Whatsapp: +55 22 98829-9130
Parte Geral –Título II - Do Crime

 

 

Crime impossível - (Redação dada pela Lei na 7.209, de 11/7/1984.)

 

Art. 17. Não se pune a tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime. (Redação dada pela Lei na 7.209, de 11/7/1984.)

 

Sempre importantes as apreciações de Greco, Rogério. Código Penal: Comentado. 5ª ed. – Niterói, RJ: Comentários ao Crime Impossível – Art. 17 do CP, p. 53-55: Tentativa e crime impossível - Quando o legislador inicia a redação do artigo que prevê o crime impossível, parte da premissa de que o agente já ingressara na fase dos chamados atos de execução, e a consumação da infração penal só não ocorre por circunstâncias alheias à sua vontade.

 

Chegamos a tal ilação porque na redação inicial do artigo está expresso que não se pune a tentativa, e somente podemos falar em tentativa quando o agente, nos termos do art. 14, II, do Código Penal, já tinha dado início aos atos de execução objetivando alcançar a consumação do crime por ele pretendido.

 

Por essa razão é que o crime impossível também é conhecido como tentativa inidônea, (esclarece Miguel Angél Nuñez Paz que “na tentativa inidônea, o autor crê erroneamente na concorrência de um elemento objetivo do tipo inexistente (dispara contra uma pessoa morta, crendo-a viva; trata-se do chamado erro de tipo ao revés” - El delito Intentado, p. 119), inadequada ou quase-crime.

 

Várias teorias surgiram com o escopo de elucidar o crime impossível. Dentre elas, podemos destacar duas: teoria subjetiva e teoria objetiva.

 

A teoria objetiva biparte-se em teoria objetiva pura e teoria objetiva temperada (moderada ou matizada).

 

Para a teoria subjetiva, de von Buri, não importa se o meio ou o objeto é absoluta ou relativamente ineficaz ou impróprio, pois, para a configuração da tentativa, basta que o agente tenha agido com vontade de praticar a infração penal. Ressalte-se que o agente, para essa teoria, é punido pela sua intenção delituosa, mesmo que no caso concreto bem algum se colocasse em situação de perigo. Segundo Hungria, mesmo de acordo com a teoria subjetiva, “deve ter-se em conta somente a vontade criminosa, desde que manifesta pela conduta do agente”. (HUNGRIA, Nélson. Comentários ao código penal, v. I, t. Il, p. 101).

 

A teoria subjetiva atende a um sentimento natural do homem, que, em muitas situações, indaga a si próprio: Se o agente deu mostras suficientes de que queria cometer o crime, praticando atos de execução tendentes a consumá-lo, por que deverá ficar impune se não conseguir alcançar o resultado em virtude da ocorrência de uma circunstância alheia à sua vontade?

 

Em lado diametralmente oposto se encontra a teoria objetiva pura. Para essa teoria, não importa se o meio ou o objeto eram absoluta ou relativamente inidôneos para que se pudesse chegar ao resultado cogitado pelo agente, uma vez que em nenhuma dessas situações responderá pela tentativa. Na lição de Hungria, segundo essa teoria, "não se pode distinguir entre inidoneidade absoluta ou relativa: em ambos os casos, não há bem jurídico em perigo e, portanto, não existe fato punível”. (HUNGRIA, Nélson. Comentários ao código penal, v. I, t. II, p. 99).

 

Em situação intermediária encontra-se a teoria objetiva temperada, moderada ou matizada, que entende somente puníveis os atos praticados pelo agente quando os meios e os objetos são relativamente eficazes ou impróprios, i.é, quando há alguma possibilidade de o agente alcançar o resultado pretendido. A teoria objetiva temperada foi a adotada pelo legislador brasileiro.

 

Meio - E todo instrumento utilizado na prática da infração penal.

 

Objeto - É a pessoa ou a coisa contra a qual recai a conduta do agente.

 

Ineficácia absoluta do meio - Diz respeito ao fato de que, por mais que o agente quisesse, o resultado jamais se consumaria levando-se em consideração o meio por ele utilizado, a exemplo daquele que dispara em alguém com uma arma sem munição.

 

Absoluta impropriedade do objeto - Significa que a coisa ou a pessoa sobre a qual recai a conduta é imprópria para efeitos de reconhecimento da figura típica, como no caso do agente que atira em um cadáver acreditando que estivesse atirando em um ser humano vivo.

 

A cártula de cheque assinada, ainda que não preenchida, pode ser objeto de crime contra o patrimônio, eis que nessas condições, diferente do cheque totalmente em branco, assume feição de título ao portador, dotado assim de valor econômico intrínseco. A caracterização de crime impossível, por absoluta impropriedade do objeto, requer, nos delitos patrimoniais, que a res seja completamente destituída de valor econômico, situação, por sua vez, não verificada na hipótese (STJ, HC 110587/DF, Rel. Min. Felix Fischer, 5a T., Dje 2/2/2009).

 

Reconhece-se o crime impossível, por absoluta impropriedade do objeto, quando o agente, tencionando subtrair dinheiro da vítima, toma-lhe a bolsa que, entretanto, não possui a res perseguida, momento em que atira o objeto não desejado na rua. Tanto o meio quanto o objeto serão considerados absolutamente ineficazes ou impróprios quando não servirem, ao menos, para traduzir um risco de dano ao valor tutelado pela norma penal. Para que seja feita a necessária avaliação do perigo que a ação realizada poderia representar para o bem jurídico, com base na teoria objetiva, a análise das circunstâncias deverá ser ex post (TJMG, AC 1.0105. 02.059433-6/001, Rel. Des. Hélcio Valentim, DJ 14/7/2006).

 

Súmula na 145 do STF - Por intermédio da Súmula nº 145 do STF que diz que não há crime quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação, foi pacificado o entendimento daquela Corte no sentido de que, em determinadas situações, se a polícia preparar o flagrante de modo a tornar impossível a consumação do delito, tal situação importará em crime impossível, não havendo, por conseguinte, qualquer conduta que esteja a merecer a reprimenda do Estado.

 

Uma vez preparado o flagrante pela polícia, a total impossibilidade de se consumar a infração penal pretendida pelo agente pode ocorrer tanto no caso de absoluta ineficácia do meio por ele utilizado como no de absoluta impropriedade do objeto. Temos visto a distinção entre o chamado flagrante preparado e o flagrante esperado. Mas qual a diferença entre os dois tipos de flagrante?

 

No primeiro, i.é, no flagrante preparado, o agente é estimulado pela vítima, ou mesmo pela autoridade policial, a cometer a infração penal com o escopo de prendê-lo. A vítima e a autoridade policial, bem como terceiros que se prestem a esse papel, são conhecidos como agentes provocadores. Já no flagrante esperado não haveria essa estimulação por parte da vítima, da autoridade policial ou mesmo de terceiros, no sentido de induzir o agente à prática do delito. O agente, aqui, não é induzido a cometer delito algum. Nesses casos, tendo a autoridade policial prévio conhecimento da intenção do agente em praticar a infração penal, o aguarda, sem estimulá-lo a absolutamente nada, e cuida de todos os detalhes de modo a evitar a consumação do crime. Fala-se, nessa hipótese, em possibilidade de tentativa.

 

Não há que se confundir flagrante forjado com esperado, em que a polícia tão somente espera a prática da infração, sem que haja instigação, tampouco a preparação do ato, mas apenas o exercício de vigilância na conduta do agente criminoso (STJ, HC 20283/SP. Rel. Min. Gilson Dipp, 5* T., DJ 4/6/2007).

 

A diferença entre esses tipos de flagrantes, como se percebe, reside no fato de que, no flagrante preparado ou provocado, o agente é induzido, é estimulado a cometer a infração penal; já no flagrante esperado não existe esse estímulo, mas o agente é impedido de praticar o delito pelo fato de ter a autoridade policial tomado conhecimento prévio da ação criminosa.

Não vislumbramos, contudo, qualquer distinção que importe em atribuir a tentativa no flagrante esperado e o crime impossível no flagrante preparado.

 

Se o agente, analisando o caso concreto, estimulado ou não a praticar o crime, não tinha como alcançar sua consumação porque dele soubera com antecedência a autoridade policial e preparou tudo de modo a evitá-la, não podemos lhe atribuir o conatus.

 

Não importa se o flagrante é preparado ou esperado. Desde que o agente não tenha qualquer possibilidade, em hipótese alguma, de chegar à consumação do delito, o caso será o de crime impossível, considerando-se a absoluta ineficácia do meio por ele empregado, ou a absoluta impropriedade do objeto.

 

Se, porventura, restar consumada a infração penal, mesmo que tenham sido tomadas todas as providências para evitá-la, o agente responderá pelo crime, haja vista que, nesse caso, tendo conseguido alcançar o resultado inicialmente pretendido, é sinal de que os meios ou os objetos não eram absolutamente ineficazes ou impróprios.

 

Diferença entre crime impossível e crime putativo - Na precisa distinção feita por Maggiore, no delito putativo “o agente crê haver efetuado uma ação delituosa que existe somente em sua fantasia; em outras palavras, julga punível um fato que não merece castigo. No delito impossível o agente crê atuar de modo a ocasionar um resultado que, pelo contrário, não pode ocorrer, ou porque falta o objeto, ou porque a conduta não foi de todo idônea” (MAGGI0RE, Giuseppe. Derecho penal, v. I, p. 545-546). (Greco, Rogério. Código Penal: Comentado. 5ª ed. – Niterói, RJ: Comentários ao Crime Impossível – Art. 17 do CP, p. 53-56. Editora Impetus.com.br, acessado em 28/10/2022 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Na sequência, as apreciações de Victor Augusto em artigo intitulado “Crime Impossível ou tentativa inidônea, comentários ao art. 17 do CP: A forma como o autor se posiciona, o crime impossível representa uma situação de atipicidade decorrente da ineficácia absoluta do meio ou da absoluta impropriedade do objeto, situações que tornam impossível a consumação do delito. Nestes casos, não há lesividade perante o bem jurídico protegido, inexistindo também punição.

 

O crime impossível também é denominado como tentativa inidônea ou inadequada. Essa inadequação pode decorrer da ineficácia absoluta do meio ou da absoluta impropriedade do objeto.

 

A ineficácia absoluta do meio diz respeito do instrumento escolhido pelo agente para o fim criminoso. Este meio deve ser essencialmente ineficaz para a produção do resultado pretendido. Um exemplo: o indivíduo, querendo lesionar alguém, desfere um golpe com uma faca de brinquedo, retrátil.

 

A absoluta impropriedade do objeto diz respeito ao objeto ou alvo sobre o qual recai a conduta criminosa. Esse objeto deve ser, por natureza ou condição, incompatível com o resultado buscado (como um cadáver para o homicídio ou a mulher não grávida para o aborto).

 

Para o Código, a inidoneidade deve ser absoluta, adotando aquele a teoria objetiva temperada (ou intermédia). Assim, a inidoneidade relativa ainda permite a punição da tentativa. Explica Hungria:

 

Dá-se a inidoneidade relativa do meio quando este, embora normalmente capaz de produzir o evento intencionado, falha no caso concreto, por uma circunstância acidental na sua utilização. Exemplo: um indivíduo visa ao seu adversário com um revólver e dá ao gatilho, mas a arma nega fogo. Hungria, Fragoso. 1978, p. 100. (Hungria, Nelson: Fragoso Heleno Cláudio. Comentários ao código penal. V. I, Tomo II. Rio de Janeiro: Forense, 1978.

 

Sistema de vigilância realizado por monitoramento eletrônico ou por existência de segurança no interior de estabelecimento comercial, por si só, não torna impossível a configuração do crime de furto. (Súmula 367, 3ª Seção, STJ. Julgado em 24/2/2016).

 

Também é possível verificar inidoneidade relativa no que diz respeito ao objeto. Um caso seria, por exemplo, a entrega de um veneno ao indivíduo que, tempos antes, tomou remédio ou substância química que, coincidentemente, neutraliza os efeitos do veneno.

 

Nas situações de inidoneidade relativa, o bem jurídico existia e foi exposto a uma lesividade real, o que permite a punição. (Victor Augusto em artigo intitulado “Crime Impossível ou tentativa inidônea, comentários ao art. 17 do CP, no site Index Jurídico, em 17 de janeiro de 2019, acessado em 28/10/2022 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Segundo entendimento de Flávio Olímpio de Azevedo, Comentários ao art. 17 do Código Penal, publicado no site Direito.com: O agente pela prática do quase crime ficava isente da pena, mas possivelmente sujeito a uma medida de segurança e obrigatoriamente submetido à liberdade vigiada durante um ano ou menos. Com as modificações introduzidas pela nova legislação penal, que adotou na íntegra a teoria objetiva, o autor de crime impossível fica isento de pena e de qualquer medida de segurança”. (Curso Completo de Direito Penal, Paulo José costa, p. 77).

 

O crime impossível. Inútil por meios absolutamente ineficazes, vislumbrando pela doutrina duas hipóteses de crime impossível:

 

Por ineficácia absoluta do meio: quando o agente escolhe um meio inadequado para o resultado pretendido, v.g., pretender matar alguém com arma descarregada. Fazer macumba para alguém ficar doente.

 

Impropriedade do objeto: É segunda parte do art. 17. O objeto material do crime que se apresenta absolutamente improprio para consumação delitiva. O exemplo clássico da doutrina: fazer aborto em uma mulher que não está grávida. Disparo de um revólver em um cadáver.

 

Súmula 145 do STF: Não há crime, quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação. (Flávio Olímpio de Azevedo, Formado em Direito pela FMU em 1973. Comentários ao art. 17 do Código Penal, publicado no site Direito.com, acessado em 28/10/2022 corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).