Comentários ao Código Penal – Art. 18
Crime doloso e crime
culposo – VARGAS, Paulo S. R.
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Parte Geral –Título II - Do Crime
Crime doloso e crime culposo
–
(Redação dada pela Lei na 7.209, de 11/7/1984.)
Art. 18. Diz-se
o crime: (Redação dada pela Lei na
7.209, de 11/711984.)
Crime
doloso - (Incluído pela Lei ns 7.209, de 11/7/1984.)
I - Doloso, quando o agente
quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo; (Incluído pela Lei na 7.209,
de 11/7/1984.)
Crime
culposo - (Incluído pela Lei na 7.209, de 11/7/1984.)
II - Culposo, quando o agente
deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia. (Incluído pela
Lei na 7.209, de 11/7/1984).
Parágrafo único. Salvo
os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como
crime, senão quando o pratica dolosamente. (Incluído pela Lei na 7.209, de
11/7/1984).
Há regras, segundo leciona em suas
apreciações Greco, Rogério. Código Penal: Comentado. 5ª ed. – Niterói, RJ:
Comentários ao Crime doloso e crime culposo – Art. 18 do CP, p. 56-61, veja:
Conceito de dolo - Dolo é a vontade e a
consciência dirigidas a realizar a conduta prevista no tipo penal incriminador.
(Dissertando
sobre as origens do dolo, Patrícia Laurenzo Copello esclarece que “o dolo, como
pressuposto do delito, aparece peia primeira vez no Direito romano, onde foi
concebido com perfis muito nítidos e definidos, identificando-o com a intenção
ou, melhor ainda, com a ‘má intenção’ ou malícia na realização do fato ilícito.
Deste modo ficava superada a primitiva concepção do ilícito penal como mera
causação objetiva de resultados, exigindo-se a ‘intenção imoral’ dirigida a um ‘fim
antijurídico’ — o ‘dolus matus' -
como fundamento para a aplicação da pena pública" (Dolo y conocimiento, p. 27).
Conforme preleciona Welzel, “toda ação
consciente é conduzida pela decisão da ação, quer dizer, peia consciência do
que se quer - o momento intelectual - e pela decisão a respeito de querer
realizá-lo – o momento volitivo. Ambos - os momentos, conjuntamente, como
fatores configuradores de uma ação típica real, formam o dolo (= dolo do tipo)”
(WELZEL, Hans. Derecho penal alemán, p. 77); ou, ainda, na lição de Zaffaroni, “dolo
é uma vontade determinada que, como qualquer vontade, pressupõe um conhecimento
determinado”. (ZAFFARONI, Eugênio Raúl. Manual
de derecho penal - Parte general, p. 405). Assim, podemos perceber que o
dolo é formado por um elemento intelectual e um elemento volitivo.
Habeas corpus - O habeas corpus, sendo
instrumento de cognição sumária e célere, não se presta à análise aprofundada
do conjunto fático-probatório, sobretudo quando se objetiva a reclassificação
ou desclassificação da conduta por ausência de dolo (STF, H C 90017/AP, Rel.
Min. Ricardo Lewandowski, 1ª T., DJ 14/9/2007, p. 44).
É sabidamente descabida, em sede de habeas
corpus, a discussão acerca do elemento subjetivo (dolo) das condutas delituosas
(STJ, HC 16738/SP, Relª Minª. Laurita Vaz, 5ª T., DJ 3/10/2005, p. 285).
Tipo doloso como regra - Dispõe o
parágrafo único do art. 18 do
Código Penal: Salvo os casos expressos
em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o
pratica dolosamente. A regra contida nesse parágrafo é a de que todo crime é
doloso, somente havendo a possibilidade de punição pela prática de conduta
culposa se a lei assim o previr expressamente. Em síntese, o dolo é a regra; a
culpa, a exceção.
Teorias do dolo * - Podemos destacar
quatro teorias a respeito do dolo: a)
teoria da vontade; b) teoria do
assentimento; c) teoria da
representação; d) teoria da
probabilidade.
* “O verbo querer, empregado para
exprimir a vontade humana, é um verbo auxiliar que necessita, sempre, de um
verbo principal para explicitar seu conteúdo; neste caso, o verbo querer deve
ser completado com o verbo realizar, porque o direito penal proíbe realizar
crimes e, portanto, o componente volitivo do dolo define-se como querer
realizar o tipo objetivo de um crime” (SANTOS, Juarez Cirino dos. A moderna teoria do fato punível, p.
63).
Segundo a teoria da vontade, dolo seria tão
somente a vontade livre e consciente de querer praticar a infração penal, isto
é, de querer levar a efeito a conduta prevista no tipo penal incriminador. (TAVARES,
Juarez. Teoria do injusto penal, p. 278-279).
Já a teoria do assentimento diz que atua
com dolo aquele que, antevendo como possível o resultado lesivo com a prática
de sua conduta, mesmo não o querendo de forma direta, não se importa com sua ocorrência;
assumindo o risco de vir a produzi-lo. Aqui o agente não quer o resultado
diretamente, mas o entende como possível e o aceita. Segundo a precisa lição de
Juarez Tavares, “a teoria do consentimento ou da assunção é a teoria dominante
e tem por base uma vinculação emocional do agente para com o resultado. Vale
dizer, exige não apenas o conhecimento ou a previsão de que a conduta e o
resultado típicos podem realizar-se, como também que o agente se ponha de
acordo com isso ou na forma de conformar-se ou de aceitar ou de assumir o risco
de sua produção”. (CEREZO MIR, José. Curso
de derecho penal español - Parte general, v. II, p. 149.75).
Para a teoria da representação, podemos
falar em dolo toda vez que o agente tiver tão somente a previsão do resultado
como possível e, ainda assim, decidir pela continuidade de sua conduta. Para os
adeptos dessa teoria, não se deve perquirir se o agente havia assumido o risco
de produzir o resultado, ou se, mesmo o prevendo como possível, acreditava
sinceramente na sua não ocorrência. Para a teoria da representação, não há
distinção entre dolo eventual e culpa consciente, uma vez que a antevisão do
resultado leva à responsabilização do agente a título de dolo.
Segundo a teoria da probabilidade, conforme
as lições de José Cerezo Mir, “se o sujeito considerava provável a produção do resultado
estaríamos diante do dolo eventual. Se considerava que a produção do resultado era
meramente possível, se daria a imprudência consciente ou com representação”. (CEREZO
MIR, José. Curso de derecho penal español
- Parte general, v. II, p. 149). Na verdade, a teoria da probabilidade trabalha
com dados estatísticos, ou seja, se, de acordo com determinado comportamento
praticado peio agente, estatisticamente, houvesse grande probabilidade de
ocorrência do resultado, estaríamos diante do dolo eventual.
Espécies de dolo - Costuma-se distinguir
o dolo em: direto e indireto. O dolo direto se biparte em: dolo direto de
primeiro grau e dolo direto de segundo grau. O dolo indireto, a seu turno, pode
ser concebido como: dolo alternativo e dolo eventual. A alternatividade do dolo
pode ser: subjetiva (quando se referir à pessoa) e objetiva (quando disser
respeito ao resultado).
Dolo geral (hipótese de erro sucessivo)
- Fala-se em dolo geral (dolus generalis),
segundo Welzel, “quando o autor acredita haver consumado o delito quando na realidade
o resultado somente se produz por uma ação posterior, com a qual buscava encobrir
o fato”, (WELZEL, Hans. Derecho penal alamán, p. 89); ou, ainda, na definição
de Hungria, “quando o agente, julgando ter obtido o resultado intencionado,
pratica segunda ação com diverso propósito e só então é que efetivamente o dito
resultado se produz” (HUNGRIA, Nélson. Comentários
ao Código Penal, v. I, t. II, p. 182). Exemplificando, os insignes juristas
trazem à colação caso do agente que após desferir golpes de faca na vítima, supondo-a
morta, joga o corpo dela em um rio, vindo esta, na realidade, a morrer por afogamento.
A discussão travada na
Alemanha cingia-se ao fato de que, com a
primeira conduta, o agente não havia alcançado o resultado morte, razão pela
qual deveria responder por um crime tentado; em virtude de seu segundo
comportamento, i.é, o fato de jogar o
corpo da vítima num rio, seria responsabilizado por homicídio culposo.
Dolo genérico e dolo específico - Fazia-se,
quando prevalecia a teoria natural da ação, a distinção entre dolo genérico e
dolo específico. Dizia-se que dolo genérico era aquele em que no tipo penal não
havia indicativo algum do elemento subjetivo do agente ou, melhor dizendo, não havia
indicação alguma da finalidade da conduta do agente. Dolo específico, a seu turno,
era aquele em que no tipo penal podia ser identificado o que denominamos de especial
fim de agir. No tipo do art. 121 do Código Penal, por exemplo, não há, segundo os
adeptos dessa distinção, indicação alguma da finalidade do agente, razão pela
qual vislumbravam, ali, o dolo genérico. Ao contrário, rio caso de tipos penais
como o do art. 159 do Código Penal, em que na sua redação encontramos
expressões que indicam a finalidade da conduta do agente (com o fim de etc.),
existiria um dolo específico.
Dolo normativo (dolus malus) - Na precisa lição de Assis Toledo, (TOLEDO, Francisco
de Assis. Princípios básicos de direito
penal, p. 282-283), “a teoria extremada do dolo - a mais antiga - situa o dolo
na culpabilidade e a consciência da ilicitude no próprio dolo. O dolo é, pois,
um dolo normativo, o dolus malus dos
romanos, ou seja: vontade, previsão e mais o conhecimento de que se realiza uma
conduta proibida (consciência atual da ilicitude). A teoria limitada do dolo
quer ser um aperfeiçoamento da anterior, pois desta não diverge a não ser em
alguns pontos: substitui o conhecimento atual da ilicitude pelo conhecimento
potencial; além disso, exige a consciência da ilicitude material, não puramente
formal”. (TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios básicos de direito penal, p.
282-283).
Dolo subsequente (dolus subsequens ou
dolo consecutivo) - Para efeito de raciocínio, estaríamos diante de uma hipótese,
por exemplo, em que o agente tivesse produzido um resultado sem que, para tanto,
houvesse qualquer conduta penalmente relevante, em face da inexistência de dolo
ou culpa ou, mesmo, diante de um fato inicialmente culposo, sendo que, após verificar
a ocorrência desse resultado, o agente teria se alegrado ou mesmo aceitado sua produção.
Conforme bem observado por Günter Stratenwerth, como não se pode querer realizar
o que já aconteceu, a “mera aprovação retroativa de um resultado já produzido
nunca constitui dolo". (STRATENWERTH, Günter. Derecho penal - Parte general I, p. 171).
Dolo subsequente (dolus subsequens ou
dolo consecutivo) - Para efeito de raciocínio, estaríamos diante de uma hipótese,
por exemplo, em que o agente tivesse produzido um resultado sem que, para tanto,
houvesse qualquer conduta penalmente relevante, em face da inexistência de dolo
ou culpa ou, mesmo, diante de um fato inicialmente culposo, sendo que, após verificar
a ocorrência desse resultado, o agente teria se alegrado ou mesmo aceitado sua produção.
Conforme bem observado por Günter Stratenwerth, como não se pode querer realizar
o que já aconteceu, a “mera aprovação retroativa de um resultado já produzido
nunca constitui dolo". (STRATENWERTH, Günter. Derecho penal - Parte general I, p. 171).
Ausência de dolo em virtude de erro de
tipo - O erro, numa concepção ampla, é a falsa percepção da realidade. Aquele
que incorre em erro imagina uma situação diversa daquela realmente existente. O
erro de tipo, em precisa lição de Zaffaroni, “é o fenômeno que determina a
ausência de dolo quando, havendo uma tipicidade objetiva, falta ou é falso o
conhecimento dos elementos requeridos pelo tipo objetivo". (ZAFFARONI,
Eugênio Raúl, Manual de derecho penal - Parte general, p. 411). No exemplo do
caçador que atira em seu companheiro supondo-o um animai, não podemos, mesmo
sendo inescusável o erro, vislumbrar o dolo em sua conduta. Isso porque, pelo exemplo
fornecido, a vontade do agente não era de matar alguém e, sim, um animal que ele
supunha estar naquele locai. Tampouco tinha consciência de que matava um ser
humano. Dessa forma, a consequência natural do erro de tipo é a de, sempre,
afastar o dolo do agente, permitindo, contudo, sua punição pela prática de um
crime culposo, se houver previsão legal, conforme determina o caput do art. 20
do Código Penal, assim redigido: O erro
sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a
punição por crime culposo, se previsto em lei.
Conceito e elementos do crime culposo -
Na lição de Mirabete tem-se conceituado o crime culposo como “a conduta humana voluntária
(ação ou omissão) que produz resultado antijurídico não querido, mas previsível,
e excepcionalmente previsto, que podia, com a devida atenção, ser evitado”. (MIRABETE,
Júlio Fabbrini. Manual de direito penal - Parte gerai, p. 138).
Nota-se, portanto, que para a caracterização
do delito culposo é preciso a conjugação de vários elementos, a saber: a) conduta humana voluntária, comissiva ou
omissiva; b) inobservância de um
dever objetivo de cuidado (negligência, imprudência ou imperícia); c) o resultado lesivo não querido, tampouco
assumido, pelo agente; d) nexo de
causalidade entre a conduta do agente que deixa de observar o seu dever de
cuidado e o resultado lesivo dela advindo; e)
previsibilidade (objetiva e subjetiva); f)
tipicidade.
Imprudência, negligência e imperícia - Mais
do que uma conceituação de crime culposo, o inciso II do art. 18 do Código Penal
nos fornece as modalidades de condutas que fazem com que o agente deixe de
observar o seu exigível dever de cuidado. Esta falta de observância ao dever de
cuidado pode ocorrer em virtude de imprudência, negligência ou imperícia do
agente.
No caso, o paciente dirigindo em alta velocidade,
sob condições de visibilidade adversas, não efetuou manobra necessária para evitar
o atropelamento das vítimas. Quem dirige nessas condições age, induvidosamente,
com imprudência, imperícia e negligência. Daí a Improcedência da alegação de
que, tendo a denúncia relatado a ocorrência de imprudência e imperícia, o
acórdão do TJ/RS não poderia considerar a negligencia (STF, RHC 97669/RS, Rei.
Min. Eros Grau, 2a T., Dje 11/2/2010, p. 515-517).
Imprudente seria a conduta positiva praticada
pelo agente que, por não observar seu dever de cuidado, causasse o resultado lesivo
que lhe era previsível. Na definição de Aníbal Bruno, “consiste a imprudência na
prática de um ato perigoso sem os cuidados que o caso requer’’. (BRUNO, Anibal.
Direito penal, p. 88). Por exemplo, imprudente
é o motorista que imprime velocidade excessiva ao seu veículo ou o que desrespeita
um sinal vermelho em um cruzamento etc. A imprudência é, portanto, um fazer
alguma coisa.
O condutor de automóvel que realiza ultrapassagem
em trecho de rodovia com faixa contínua, invadindo a contramão e causando
colisão com motocicleta que trafegava em sentido contrário, causando a morte de
motociclista, pratica conduta ilícita, caracterizada pela imprudência (TJMG, AC
1.0024.02.801342-3/001, Rel. Des. Eduardo Maniré da Cunha, DJ 30/1 1/2006).
A negligência, ao contrário, é um deixar
de fazer aquilo que a diligência normal impunha. É o caso, por exemplo, do
motorista que não conserta os freios já gastos de seu automóvel ou o do pai que
deixa arma de fogo ao alcance de seus filhos menores.
Não há falar em negligência na conduta de
quem deixa de fiscalizar serviço alheio, desde que executado por profissional qualificado
e especificamente contratado para tal fim, tendo em vista que, nessa hipótese, aplica-se
o princípio da confiança (TjMG, AC 1.0701.04.070527-2/001, Rel. Des. Hélcio
Valentim, DJ 1V8/2007).
Fala-se em imperícia quando ocorre uma inaptidão,
momentânea ou não, do agente para o exercício de arte, profissão ou ofício. Diz-se
que a imperícia está ligada, basicamente, à atividade profissional do agente. Um
cirurgião plástico, v.g., durante um
ato cirúrgico, pode praticar atos que, naquela situação específica, conduzam à
imperícia.
O homicídio culposo se caracteriza com a
imprudência, negligência ou imperícia do agente, modalidades da culpa que não
se confundem com a inobservância de regra técnica da profissão, que é causa
especial de aumento de pena que se situa no campo da culpabilidade, por conta
do grau de reprovabilidade da conduta concretamente praticada. Precedentes
(STJ. HC 94973/RJ, Rel3. Mm1. Laurita Vaz, 5ª T. Dje 30/6/200S).
Crime culposo e tipo aberto - Os crimes
culposos são considerados tipos abertos. Isso porque não existe uma definição
típica completa e precisa para que se possa, como acontece em quase todos os delitos
dolosos, adequar a conduta do agente ao modelo abstrato previsto na lei. A
redação do tipo culposo é diferente daquela destinada ao delito doloso. Em
virtude disso, Welzel diz: “Nos delitos culposos a ação do tipo não está
determinada legalmente. Seus tipos são, por isso, ‘abertos’ ou ‘com necessidade
de complementação’, já que o juiz tem que ‘completá-los’ para o caso
concreto”. (WELZEL, Hans. Derecho penal alemán, p. 157).
Embora os tipos culposos possam ser considerados
como abertos, existem algumas exceções a essa regra, a exemplo do que ocorre
com a receptação culposa, prevista no § 3º, do art. 180 do Código Penal, onde há
a narração completa do comportamento típico, e também o art. 38 da Lei na
11.343, de 23 de agosto de 2006.
Culpa consciente e culpa inconsciente -
A culpa inconsciente distingue-se da culpa consciente no que diz respeito à previsão
do resultado; naquela, o resultado, embora previsível, não foi previsto pelo agente;
nesta, o resultado é previsto, mas o agente, confiando em si mesmo, nas suas habilidades
pessoais, acredita sinceramente que este não venha a ocorrer. A culpa inconsciente
é a culpa sem previsão e a culpa consciente é a culpa com previsão.
Diferença entre culpa consciente e dolo
eventual - Na culpa consciente, o agente, embora prevendo o resultado, acredita
sinceramente na sua não ocorrência; o resultado previsto não é querido ou mesmo
assumido pelo agente. Já no dolo eventual, o agente, embora não queira
diretamente o resultado, assume o risco de vir a produzi-lo. Na culpa consciente,
o agente, sinceramente, acredita que pode evitar o resultado; no dolo eventual,
o agente não quer diretamente produzir o resultado, mais, se este vier a acontecer,
pouco importa.
Culpa imprópria - Fala-se em culpa
imprópria nas hipóteses das chamadas descriminantes putativas em que o agente,
em virtude de erro evitável pelas circunstâncias, dá causa dolosamente a um
resultado, mas responde como se tivesse praticado um delito culposo.
Compensação e concorrência de culpas - Embora
não se admita a compensação de culpas em Direito Penal, a concorrência é plenamente
possível.
Excepcionalidade do crime culposo - De
acordo com o disposto no parágrafo único do art. 18 do Código Penal, o dolo é a
regra; a culpa, a exceção. Aquele que. de forma imprudente, causar dano a um
terceiro não pratica infração alguma de natureza penal, haja vista que o art.
163 do Código Penal não fez a previsão dessa modalidade de conduta. Deverá o
agente, portanto, na esfera civil, reparar o dano por ele causado à vítima.
Tentativa nos delitos culposos - Parte
da doutrina aceita a possibilidade de tentativa nos crimes culposos, quando da
ocorrência da chamada culpa imprópria (culpa por extensão, por assimilação, por
equiparação), i.é, quando o agente,
nos casos de erro evitável nas descriminantes putativas, atua com dolo, mas
responde pelo resultado causado com as penas correspondentes ao delito culposo.
(Greco, Rogério. Código Penal: Comentado. 5ª ed. – Niterói, RJ: Comentários ao
Crime doloso e crime culposo – Art. 18 do CP, p. 56-61. Editora Impetus.com.br,
acessado em 29/10/2022 corrigido e aplicadas as
devidas atualizações VD).
No lecionar de Victor Augusto em artigo
intitulado “Crime doloso e culposo, comentários ao art. 18 do CP, culpa e
dolo são elementos subjetivos que integram a tipicidade da conduta. São os
estados psicológicos e anímicos que delineiam a intenção do agente e permitem a
configuração do fato tipificado na lei.
Ao se tratar de dolo e culpa, algumas expressões
são comuns, como: a) estado anímico (“estado
da alma”); b) estado psíquico ou psicológico; c) elemento subjetivo; d)
culpabilidade em sentido amplo; e) volição etc. São em geral expressões que
denotam o processo interno do agente e mostram a refutação de responsabilidade
penal objetiva (aquela que prescinde de culpa ou dolo do agente).
Enfim: O dolo é a união da representação
do resultado (consciência, estado cognitivo) de uma conduta e da vontade
(volição) de querer praticar essa conduta. No Código Penal, o dolo é natural ou
neutro, portanto, não possui elementos normativos em seu teor, como fazem
algumas teorias.
Apenas
como acréscimo, saiba-se que a teoria normativa do dolo afirma que o dolo
depende, além da representação do resultado e da vontade em atingi-lo, de uma consciência
da antijuridicidade (ilicitude) da conduta. Esse elemento, modernamente, foi
excluído do tipo doloso e passou à culpabilidade. A visão predominante na
doutrina hoje é a do dolo natural ou neutro.
Como regra, as condutas tipificadas no
Código Penal correspondem aos crimes dolosos. A punição por conduta culposa
deve ser explicitamente prevista para ser aplicada.
O
artigo confirma a adoção tanto da teoria da vontade como da teoria do
consentimento para confirmar a existência do dolo. Pela primeira, o dolo se
verifica na conjunção de representação do resultado e da vontade de alcança-lo
(dolo direito). Na segunda, o dolo deriva da representação do resultado mais o
consentimento de atingi-lo, mesmo que este não seja o interesse direito do
agente (dolo eventual).
A
consequência jurídica é a mesma: a punição. Para Hungria (1978, p. 115): “Ora,
consentir no resultado não é senão um modo de querê-lo”.
Na doutrina, são múltiplas as facetas atribuídas
à conduta dolosa, algumas classificações podem ser ressaltadas, devendo ser
mencionado, entretanto, que, em geral, essas classificações decorrem de
ponderações doutrinárias sem maiores repercussões na aplicação prática do
Direito Penal.
Dolo de dano: aquele típico do crime
material, dirigido à produção da lesão ao bem jurídico protegido;
Dolo de perigo: aquele típico do crime
de perigo, que se consuma com a causação de perigo. Quer o agente pôr o bem jurídico
em perigo;
Dolo genérico: aquele que prescinde de
qualquer fim particular.
Dolo específico: aquele que almeja um
fim especial ou determinado previsto na lei incriminadora (Ex.: receptação de
animal em comparação com a receptação comum).
As
noções de dolo genérico e específico hoje são refutadas por parte da doutrina,
prevalecendo simplesmente a ideia de que as finalidades específicas previstas
no tipo são elementos subjetivos específicos (ESTEFAM, 2018).
Dolo de propósito: é o dolo acompanhado
por uma premeditação, uma deliberação do agente.
Dolo de ímpeto: é o dolo passional, que
acompanha uma emoção ou reação súbita do agente.
Dolo direto de primeiro grau (imediato):
é aquele típico, dirigido exclusivamente ao resultado imediato buscado.
Dolo direito de segundo grau ou de consequências:
é aquele dolo voltado às consequências necessárias na conduta criminosa, tendo
em vista os meios escolhidos.
Em
relação ao dolo de segundo grau, a doutrina aponta como caso típico o do
terrorista que, visando assassinar um estadista, explode o avião em que este se
encontra. Pelo meio escolhido, ele está diretamente ciente e interessado no
óbito de todos os outros passageiros, visto que esta é uma consequência natural
do meio escolhido.
É
importante ressaltar a diferença desta figura em relação ao dolo eventual, pois
neste o resultado não é consequência necessária da ação, mas sim uma
possibilidade com que o agente aceita.
Dolo alternativo: é o dolo do agente
que, com sua ação, busca produzir um resultado ou outro, existindo dentro da
volição autoral a realização dos resultados possíveis.
Dolo geral: é o dolo que abrange o
resultado final causado por uma conduta subsequente à conduta inicial do
agente. Este pensa erroneamente ter atingido o objetivo com a conduta prévia,
mas é a conduta subsequente que realmente alcança o objetivo.
O
exemplo clássico do dolo geral (dolus generalis) envolve o crime de homicídio:
o agente dispara contra o desafeto, atingindo-o e supondo tê-lo matado, mas o
mesmo permanece vivo. Em seguida, o criminoso, buscando destruir a evidência da
materialidade, joga o corpo num rio, vindo a vítima a morrer afogada. Como o
resultado foi obtido, mesmo que por forma distinta da pretendida pelo autor, o
seu dolo abrange de forma geral seus atos, sendo possível a punição pela
consumação.
O crime culposo é aquele que deriva de
uma conduta imprudente, negligente ou imperita, explicando a doutrina que essas
figuras são interpenetráveis, muitas vezes se aproximando.
Imprudência: é o agir afoito, sem
pensar, sem ponderamento prévio.
Negligência: é o desleixo com as
precauções anteriores, é a omissão de se tomar certos cuidados prévios exigidos
pela praxe.
Imperícia: é uma espécie de imprudência profissional.
É o censurável agir desamparado das qualificações e do conhecimento técnico
exigido para um ato.
A doutrina discute, ainda, graus de
culpa: levíssima, leve ou grave. Essa divisão diz mais respeito à intensidade
da reprimenda (dosimetria da pena) que poderá ser aplicada.
A
ordem jurídica não pode renunciar à punibilidade do delinquente culposo; [e
este um desajustado à disciplina social. Falta-lhe constância na preocupação
que, no convívio social, deve ter todo homem responsável, no sentido do neminem
laedere ou de evitar a lesão ou periclitação do interesse de seus concidadãos.
(Hungria, Fragoso, 1978, p. 201).
O elemento básico da reprovação do crime
culposo é a previsibilidade do resultado, o que o tornaria evitável se os
cuidados e diligencias exigidas pela lei fossem tomados. Se o resultado era imprevisível,
não há que se falar em crime, entrando aquele nas raias do caso fortuito e da
força maior.
A
previsibilidade é uma característica genérica e diz respeito à simples possibilidade
de se prever um resultado. Em outras palavras, previsibilidade existe quando o
agente pode, segundo a experiência geral, representar (prever) um resultado ((Hungria,
Fragoso, 1978).
A
previsão, por outro lado, é uma questão concreta e diz respeito à efetiva
previsão ou falta de previsão desse resultado no caso concreto.
Com base na previsibilidade, duas
espécies de culpa podem ser verificadas: a culpa inconsciente (mais comum) e a
consciente. No primeiro caso, há previsibilidade, mas o agente concretamente
não previu o resultado, gerando-o. no segundo, o agente prevê o resultado, mas
acredita que este não se realizará.
Diante da previsão do resultado, a
doutrina menciona a aproximação entre a culpa consciente e o dolo eventual, mas
distancia-os na abordagem desse resultado previsto:
Sensível
é a diferença entre essas duas atitudes psíquicas. Há, entre elas, é certo, um
traço comum: a previsão do resultado antijurídico; mas, enquanto no dolo
eventual o agente presta anuência ao advento desse resultado, preferindo
arriscar-se a produzi-lo, ao invés de renunciar à ação, sua culpa consciente,
ao contrário, o agente repele, embora inconsideradamente, a hipótese de superveniência
do resultado, e empreende a ação na esperança ou persuasão de que este não
ocorrerá. (Hungria, Fragoso, 1978, p. 116-117).
Em certas situações, a lei prevê tipos
penais que correspondem a uma conduta complexa, iniciada de forma dolosa, mas
atingindo um resultado culposo. É o que se denomina praeterdolo:
No
crime praterdolo há um concurso de dolo e culpa: dolo no antecedente (minus
delictum) e culpa no subsequente (majus delictum). Trata-se de um crime complexo
in partibus doloso e in partibus culposo. A diferença que existe entre o crime
praterdolo e o crime culposo está apenas em que neste o evento antijurídico não
querido resulta de um fato penalmente indiferente ou, quando muito, contravencional,
enquanto naquele o resultado involuntário deriva de um crime doloso. (Hungria,
Fragoso, 1978, p. 140). (Victor Augusto em artigo intitulado “Crime doloso e culposo, comentários ao art. 18 do CP, no site Index Jurídico,
em 17 de janeiro de 2019, acessado em 29/10/2022 corrigido
e aplicadas as devidas atualizações VD).
No lecionar de Flávio Olímpio de Azevedo,
Comentários ao art. 18 do Código Penal, publicado no site Direito.com, resumidamente: “O princípio da culpabilidade (nullum crimen nulla poena sine culpa) é corolário
do Estado Democrático de Direito e reflexo de um ordenamento jurídico fundado
na dignidade da pessoa humana” (Código Penal interpretado Adjair de A. Cintra,
p. 33).
O elo da culpabilidade entre fato e o
agente apresenta-se sob a forma de dolo e culpa.
Crime doloso: doloso, quando a gente
quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo; o dolo é composto por consciência
(saber) e vontade (querer) pela pessoa humana de realizar com conduta o
comportamento típico.
O dolo direto é o determinado à forma
intensa da expressão da vontade livre e consciente de fazer. E quando o agente
tem consciência do ato praticado da realidade buscada com propósito da prática
da conduta típica e o resultado com sua conduta. Disfere um tiro de revólver na
vítima com intenção de matar, de cometer um homicídio.
Dolo indireto (eventual alternativo) – O
dolo indireto é quando a vontade do agente não visa a um resultado preciso e
determinado. Compreende duas formas: a) dolo
eventual: quando o agente conscientemente, admite e aceita o risco de produzir
o resultado; b) dolo alternativo
quando a vontade do agente visa a um ou outro resultado. (Exemplo: matar ou
ferir) (Celso Delmanto et al, Código
Penal comentado, p. 33).
Crime culposo – É a prática de uma
conduta em que o agente não tem intenção de conduzir ao resultado de conduta
típica por imprudência, negligência ou imperícia. A culpa não se presume, tem
que estar comprovada.
Imprudência: Falta de cuidado; de
precaução; exemplo: motorista dirigindo em velocidade acima da permitida.
Negligência: é modalidade de culpa
negativa “in-ommitendo” é inércia do
agente e modalidade omissiva, displicente. O agente, por exemplo, não faz
manutenção do veículo que, por um defeito nos freios, causa um acidente.
Imperícia. É atitude positiva e a culpa técnica
é incapacidade do agente para prática do exercício da profissão ou ofício, por
falta de aptidão. Ad esempio: o
médico sem conhecimentos técnicos da cirurgia plástica, realiza a mesma,
ocasionando a morte do paciente por complicações pós-operatória. (Flávio
Olímpio de Azevedo, Formado em Direito pela FMU em 1973. Comentários ao art. 18
do Código Penal, publicado no site Direito.com,
acessado em 29/10/2022 corrigido e aplicadas as
devidas atualizações VD).
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