Direito Civil Comentado - Art.
789, 790, 791
- DO
SEGURO DE PESSOA - VARGAS, Paulo S. R.
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Parte
Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI
– Das Várias Espécies de Contrato
(Art. 481 a 853) Capítulo XV – DO SEGURO DE
PESSOA
– Seção III - (art. 789 a 802)
Art. 789. Nos seguros de pessoas, o capital
segurado é livremente estipulado pelo proponente, que pode contratar mais de um
seguro sobre o mesmo interesse, com o mesmo ou diversos seguradores.
No lecionar de Claudio
Luiz Bueno de Godoy, a partir deste artigo, o Código Civil de 2002 se dedica ao
regramento do seguro de pessoa, tratado separadamente do seguro de dano, dada a
diversidade de características de um e outro. Com efeito, data de longe a
discussão sobre se ao seguro de pessoa seria aplicável o princípio indenitário,
muitos recusando se possa mesmo falar em indenização, no caso de ocorrência de
sinistro (ver, para histórico da doutrina a respeito, Pedro Alvim. O
contrato de seguro. Rio de Janeiro, forense, 1999, p. 447-53). Tudo porque,
a rigor, são inestimáveis a vida e a integridade pessoal do indivíduo, acerca
do que se contrata o seguro. Quando muito, cogitar-se-ia não da reparação de um
dano havido, na extensão desse prejuízo experimentado, mas da recomposição da
perda de uma vantagem que a cessação (ver comentário ao CC 794 sobre casos de
morte, real ou presumida) ou deterioração da vida humana representa (cf. Clóvis
Beviláqua. Código Civil comentado, 4. Ed. Rio de Janeiro, Francisco
Alves, 1939, v. V. p. 202). De qualquer forma, mesmo aceitando que, no seguro
de pessoa, a contratação se volte à garantia do indivíduo contra os riscos a
sua existência ou integridade, portanto ainda um dano, decerto que o valor a
ser pago diante da ocorrência do sinistro se fixa a forfait, ou seja,
aprioristicamente, conforme entabulado pelas partes. Não há, este o dado
relevante, a limitação ao valor do interesse segurado, porquanto inestimável,
justamente pelo que se pode contratar mais de um seguro, com o mesmo ou com
diferente segurador. Daí, para muitos, não se falar, no seguro de pessoa, em
princípio indenitário.
Certo é que, de todo modo, o importe
segurado não encontra restrição outra que não na estimação das próprias partes
contratantes. Fixa-se livremente um capital, uma soma, a que corresponde o
pagamento do prêmio e que será entregue tão logo comprovada a ocorrência do
sinistro. Ou seja, inexiste, como no seguro de dano, qualquer necessidade de
avaliação da extensão do prejuízo a ser indenizado. Paga-se o valor arbitrado
pelas partes. É, enfim, o que o Código anterior já estabelecia, malgrado
referindo, no art. 1.441, apenas o seguro de vida, mas que o artigo em pauta
estende a qualquer seguro de pessoa, de vida ou de acidentes, tão somente
ressalvando-se, no CC 802, o seguro para garantia de reembolso de despesas
médico-hospitalares (seguro-saúde regrado por lei própria, como se verá adiante
nos comentários ao dispositivo citado) e o seguro para garantia das despesas
com luto e funeral do segurado. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e
Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários
autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 817-818 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso
12/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).
Segundo o histórico, a
redação atual é a mesma do projeto. Trata-se de mera repetição do art. 1.441 do
Código de 1916, com pequena mudança redacional. O antigo texto era o seguinte:
“Art. 1.441. no caso de seguro sobre a vida, é livre às partes fixar o valor
respectivo e fazer mais de um seguro, no mesmo ou em diversos valores, sem
prejuízo dos antecedentes”. Essa seção, no Código Civil de 1916, era denominada
“Do seguro de vida” (arts. 1.471 a 1.476): agora, no entanto, passa a ser “Do
seguro de pessoa”.
Para a doutrina de
Ricardo Fiuza, o capital é livremente estipulado pelo proponente, porque difere
do seguro da coisa, em que pelo princípio indenitário a indenização há de
corresponder a um valor certo do dano sofrido pelo segurado. Em segundo de
pessoa, esse princípio não é aplicável, e sim o previdenciário, porquanto o
prejuízo é abstrato, a garante é contra os riscos de morte, de perigo à sua
integridade física, de quebra e comprometimento da saúde, e de acidentes dos
mais variados, aos quais se acha sujeito o segurado, e, afinal, o valor da vida
é inestimável, por isso, resulta possível contratar mais de um seguro sobre o
mesmo interesse, com o mesmo ou mais de um segurador. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 416 apud Maria
Helena Diniz Código Civil Comentado
já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 12/02/2020, corrigido e
aplicadas as devidas atualizações VD).
No dizer de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o
contrato de seguro de danos tem como princípio impedir o enriquecimento sem
causa do segurado e, por isso, seu valor é limitado pelo valor do bem segurado.
No
seguro de pessoa, seja o seguro de vida ou o de danos à pessoa não é possível o
estabelecimento de limite em razão do valor do bem assegurado, uma vez que nem
a personalidade nem qualquer de seus atributos são passiveis de valoração
econômica.
O seguro de pessoa visa a conceder uma compensação pelo dano causado à pessoa. A liberdade das partes para estabelecer o valor da indenização nesses casos é ampla. Por esse mesmo motivo, nada obsta que o proponente contrate mais de um seguro sobre o mesmo interesse. (Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 12.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art. 790. No seguro sobre a vida de outros, o
proponente é obrigado a declarar, sob pena de falsidade, o seu interesse pela
preservação da vida do segurado.
Parágrafo único. Até
prova em contrário, presume-se o interesse, quando o segurado é cônjuge,
ascendente ou descendente do proponente.
Para Claudio Luiz Bueno
de Godoy, já desde o Código Civil de 1916 era possível entabular contrato de
seguro sobre a vida de outrem, portanto que não a do próprio proponente. Ou
seja, já se permitia fosse o seguro contratado sobre a própria vida ou sobre a
vida de terceiro, apenas que, nessa última hipótese, sob pena de não valer o
seguro, o proponente era obrigado a declarar seu interesse pela vida que se
garantia, com a entabulação. Esse é o mesmo princípio insculpido no artigo em
pauta. Sua redação foi modificada, mas não seu conteúdo. A ideia é a de
viabilizar o seguro que compreenda a vida de terceiro, desde que demonstrado
que quem realiza o contrato tem interesse na preservação da existência da
sobrevivência daquele, cuja vida se segura. Quer dizer, é preciso ficar
demonstrado que o proponente não quer ou torce pela morte do segurado. Caso
contrário, estaria aberto caminho para contratações ilícitas, em que se
apostasse no falecimento de outrem, a fim de que sobreviesse o pagamento de
verba securitária assim especulativa.
Em diversos termos, o
contratante deve justificar seu móvel à contratação, declarando concretamente
por qual razão interessa-lhe, ao revés, a sobrevivência do terceiro. é o caso
de fazer seguro o dependente econômico sobre a vida daquele de quem dependa, do
credor a respeito da vida do devedor ou do sócio sobre a vida de outro sócio,
nos exemplos de Carvalho Santos (Código Civil brasileiro interpretado, 5.ed.
Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1951, v. XIX, p. 397). Não se exigiu, como em
outras legislações, que o terceiro consentisse na contratação, como também, ao
que se entende, não se dispensou a declaração aqui examinada, acaso havido
aquele consentimento. A finalidade da norma, afinal, é evitar seguros ilícitos,
com risco à vida do terceiro, advindo do interesse do beneficiário na
ocorrência do sinistro.
Como está no parágrafo único, presume-se
haver interesse na preservação da vida do terceiro quando este for cônjuge,
ascendente ou descendente de quem contrata o seguro, pretendendo-se a esse rol,
com ampla razão, incluir o companheiro (Projeto de Lei n. 276/2007, já de alteração
do Código Civil), o que deve prevalecer desde que, nesses casos, a relação
afetiva existente leve à admissão, a priori, de que existente interesse
na sobrevivência do terceiro cuja vida se garante. Mas, ressalva o atual
Código, essa presunção é relativa, permitindo-se, portanto, prova em contrário.
Em relação ao rol que também estava no parágrafo único do art. 1.416 do Código
de 1916, não mais nele se inclui o irmão de quem contrata o seguro, destarte
exigindo-se a mesma justificação do caput do dispositivo. (Claudio Luiz
Bueno de Godoy, apud Código Civil
Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord.
Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 819 - Barueri, SP:
Manole, 2010. Acesso 12/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).
Na doutrina de Ricardo
Fiuza, quando o seguro de pessoa não compreender a do próprio segurado, mas de
outrem, o proponente terá de justificar as razões legítimas e lícitas para a
instituição do benefício, sejam de ordem jurídica, econômica, moral ou
sentimental.
O parágrafo único do
artigo, no entanto, estabelece presunção juris tantum – ou seja,
relativa, por admitir prova em contrário – de existir tal interesse, se o
segurado for cônjuge, ascendente ou descendente do proponente, já que a relação
afetiva ou o parentesco entre eles conduz à conclusão, em geral inarredável,
pelo liame existente, sobre o interesse do proponente à preservação da vida
daquele(s). (Direito Civil - doutrina, Ricardo
Fiuza – p. 416 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012,
pdf, Microsoft Word. Acesso em
12/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Vê-se que ao pensar Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o
interesse jurídico de uma pessoa pela vida de outra diz respeito a aspectos
afetivos e econômicos. Desde que presentes tais aspectos, pode o estipulante
contratar seguro de vida de outrem, independentemente do conhecimento e da
aquiescência do segurado. A lei presume a existência de interesse por parte de
ascendentes, descendentes e do cônjuge. Por analogia, deve-se presumir,
igualmente, o interesse do companheiro. Outros podem demonstrar a existência de
interesse, como os enteados e outras pessoas que vivam sob a dependência
econômica do segurado. (Luís Paulo
Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira
apud Direito.com acesso em 12.02.2020, corrigido e aplicadas as
devidas atualizações VD).
Art. 791. Se o segurado não renunciar à
faculdade, ou se o seguro não tiver como causa declarada a garantia de alguma
obrigação, é lícita a substituição do beneficiário, por ato entre vivos ou de
última vontade.
Parágrafo único. O
segurador, que não for cientificado oportunamente da substituição,
desobrigar-se-á pagando o capital segurado ao antigo beneficiário.
Na pauta de Claudio Luiz
Bueno de Godoy, o seguro de pessoa pode ser instituído em favor de terceiro,
como ocorre, então necessariamente, com o seguro de vida. O favorecido por essa
contratação é aquele a quem se chama de beneficiário. Trata-se de alguém de
livre escolha do segurado, não se repetindo, de forma explícita, a regra do
art. 1.474 do antigo Código, que proibia a instituição em favor de quem não
pudesse dele receber por doação, como, por exemplo, o concubino do segurado
casado, mas porque a matéria está implícita na disposição do CC 793, adiante
examinado.
O beneficiário é identificado, pelo
segurado, logo no instante da contratação, ou em momento posterior. Por isso
mesmo, pode, em regra, ser livremente substituído, por ato inter vivos ou
causa mortis. É, a rigor, mera explicitação, para o seguro, do princípio
geral contido no CC 438 deste Código comentado. Veja-se, a propósito, que ao
beneficiário não há mais que uma expectativa de direito, enquanto não se dá o sinistro,
causa do pagamento do capital segurado. Assim, nada impede sua substituição.
Solucionando divergência que, sob a égide do Código Civil de 1916, a respeito
se erigia, considerou o novo Código ser passível de renúncia essa prerrogativa,
afeta ao segurado, de substituir o beneficiário. Da mesma forma,
excepcionalmente poderá ser vedada a substituição do beneficiário quando a
instituição em seu favor se tiver consumado para garantir alguma obrigação.
Pense-se, por exemplo, no devedor que contrata seguro sobre sua vida,
beneficiando seu credor, expressando ter sido esse o motivo da contratação. Não
haverá nessa hipótese liberalidade pura que possa implicar a livre substituição
do beneficiário, ao menos enquanto persistir a dívida. No entanto, com exceção
desses casos, constitui direito potestativo do segurado o de substituir o
beneficiário. Deve, porém, disso dar aviso ao segurador, sob pena de ele se
desobrigar pagando ao anterior beneficiário. Típico caso de pagamento a credor
aparente, situação de justificada putatividade que se atribui a conduta do
segurado. (Claudio Luiz Bueno de Godoy,
apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de
10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 820
- Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 12/02/2020. Revista e atualizada nesta data
por VD).
No diapasão de Ricardo
Fiuza, a lei permite a substituição do beneficiário do seguro de vida, por ato
unilateral de vontade do segurado, que a essa faculdade não renunciou ao clausular
as condições do seguro, desde que este não tenha por origem declarada a
garantia de determinada obrigação, o que se dará por ato inter vivos ou causa
mortis.
O parágrafo único desse
artigo, por sua vez, estabelece que, caso o segurador não seja cientificado, em
tempo oportuno, da substituição, resultará liberado do vínculo obrigacional
pelo ato de pagamento do capital segurado ao primitivo beneficiário, não
podendo, nessa hipótese, o novo beneficiário postular que se lhe pague aquele
capital. (Direito Civil - doutrina, Ricardo
Fiuza – p. 417 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012,
pdf, Microsoft Word. Acesso em
12/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
No dizer de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, assegura-se, em regra, o direito de o estipulante substituir o beneficiário do seguro de vida. O direito de substituir o beneficiário deixa de existir se a ele renunciar expressamente o estipulante ou se o seguro tiver como causa a garantia de alguma obrigação, como seria o caso de o seguro ter sido contratado visando a garantir a capacidade financeira do beneficiário em caso de falecimento de determinada pessoa de quem seja economicamente dependente. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 12.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).