segunda-feira, 7 de novembro de 2022

Direito Civil Comentado - Art. 787, 788 - DO SEGURO DE DANO - VARGAS, Paulo S. R. vargasdigitador.blogspot.com - digitadorvargas@outlook.com

 

Direito Civil Comentado - Art. 787, 788
- DO SEGURO DE DANO - VARGAS, Paulo S. R.
vargasdigitador.blogspot.com -
digitadorvargas@outlook.com

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações

Título VI – Das Várias Espécies de Contrato

 (Art. 481 a 853) Capítulo XV – DO SEGURO DE DANO

 – Seção II - (art. 778 a 788)

 

Art. 787. No seguro de responsabilidade civil, o segurador garante o pagamento de perdas e danos devidos pelo segurado a terceiro.

 

§ 1º. Tão logo saiba o segurado das consequências de ato seu, suscetível de lhe acarretar a responsabilidade incluída na garantia, comunicará o fato ao segurador.

 

§ 2º. É defeso ao segurado reconhecer sua responsabilidade ou confessar a ação, bem como transigir com o terceiro prejudicado, ou indenizá-lo diretamente, sem anuência expressa do segurador.

 

§ 3º. Intentada a ação contra o segurado, dará este, ciência da lide ao segurador.

 

§ 4º. Subsistirá a responsabilidade do segurado perante o terceiro, se o segurador for insolvente.

 

Sob a visão de Claudio Luiz Bueno de Godoy, no artigo presente, o CC/2002 tratou e regulamentou o que sempre se chamou de seguro de responsabilidade civil. Ou seja, o segurador assume a obrigação de garantir o pagamento de perdas e danos que o segurado acaso tenha de fazer em benefício de terceiro. portanto, contrata-se a cobertura da indenização que, eventualmente, o segurado venha a ser obrigado a compor diante de terceiro lesado.

 

O risco envolve, assim, não só o pagamento de danos emergentes, como também o de lucros cessantes, que, na forma do CC 402, compõem as perdas e danos. O prejuízo a ser coberto pode abranger, ainda, danos pessoais e extrapatrimoniais que a conduta do segurado provocou ao terceiro vitimado. Se, afinal, o seguro se faz contra a responsabilidade civil que pode recair sobre o segurado, forçoso, então, ao que se crê, recorrer à própria noção do instituto, contida no Código Civil. E, com efeito, a responsabilidade civil está afeta, primeiramente, a quem comete ato ilícito (CC 927, caput), compreendido como aquele praticado por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, que viole direito alheio e cause dano a outrem, ainda que exclusivamente moral (CC 186). Portanto, é em toda essa extensão, abrangendo o dano moral, que, como regra, responderá o segurador, inclusive conforme orientação hoje sumulada (v. item a seguir). Ademais, e seguindo a mesma esteira, responderá ele também pela indenização a que esteja obrigado o segurado, independentemente de ação culposa, como tal definida, genericamente, no CC 927, parágrafo único, do atual Código. Isso significa dizer que o segurador garante a responsabilidade civil do segurado, subjetiva e objetiva, como regra em toda a extensão da consequência danosa de sua conduta. Discute-se é se, por conta dessa garantia, o segurador pode ser compelido a honrar a cobertura em ação que diretamente lhe seja movida pelo terceiro-vítima, tal como, para o seguro obrigatório, se possibilitou, de maneira explícita, no CC 788, parágrafo único, adiante examinado, ou se, ao revés, incumbe ao terceiro se voltar contra o segurado causador do dano, que, pagando, recebe a verba do seguro, nos limites do contrato.

 

O desfavor da ação direta, costuma-se afirmar que falta legitimidade para o terceiro agir com base em contrato de que não fez parte. Ressalte-se, todavia, que, hoje, em virtude da função social do contrato, que, em uma vertente de seu conteúdo, opera verdadeira eficácia social do ajuste (ultra partes), alguém não contratante pode, conforme o caso, discutir contrato – ou com base nele – de que não foi subscritor (veja, a respeito, Cláudio Luiz Bueno de Godoy. A função social do contrato, 2.ed. São Paulo, Saraiva, 2007). Parece, porém, que, no caso, o ponto seja outro. É que, com efeito, o seguro de responsabilidade civil não é uma estipulação que se faz em favor da vítima, por isso não lhe é dado postular diretamente o benefício, como ocorre no seguro universalizado e social que é o seguro obrigatório, de que cuida o artigo seguinte. O seguro de responsabilidade é um seguro de reembolso, que pressupõe, antes, o pagamento pelo segurado ou o reconhecimento, em ação que lhe seja movida, de sua responsabilidade pelo evento danoso que vitimou terceiro, de modo a que, nessa demanda, oferte o segurado a defesa que tiver, decerto que a ele afeta e de seu conhecimento, e não do segurador. E mais, de sorte que não se submeta o terceiro à discussão de disposições contratuais que desconhece. Ou seja, os debates se estabelecem com temática própria: entre o segurado e a vítima acerca da responsabilidade pelo evento; entre o segurado e o segurador sobre a obrigação de garantia. E tanto parece ser essa a solução da lei que o Código Civil de 2002, no § 3º do artigo em discussão, de forma bastante diversa do parágrafo único do artigo seguinte, em vez de aludir a uma ação direta, menciona a ação proposta pelo terceiro contra o segurado, de que se dará ciência ao segurador.

 

No sentido do descabimento da ação direta, exatamente em função da redação dos §§ 1º a 4º do CC 787, vale conferir a lição do Min. José Delgado in Comentários, coord. Min. Sálvio de Figueiredo. Rio de Janeiro, forense, v. XI, t. I, p. 566-7. Ou, na mesma esteira, lembrando que o tipo do seguro em questão é de reembolso, está a lição de João Marcos Brito Martins (O contrato de seguro. Rio de Janeiro, Forense Universitária, p. 116).

 

Certo que, primeiramente, tese diversa, tal qual no item abaixo, de identificação da jurisprudência, se exemplifica, vem sendo sedimentada no Superior Tribunal de Justiça, admitindo a ação direta, como se de verdadeira estipulação em favor de terceiro se tratasse, à semelhança do seguro de vida, por exemplo.

 

Certo, de outra parte, e mesmo assim não fosse, que a jurisprudência já admitiu que, mesmo sem o pagamento pelo segurado, a vítima possa executar diretamente o denunciado, vencido na denunciação, como se ocorrida verdadeira sub-rogação a esta do crédito já julgado em favor daquele, por corolário da procedência da lide secundária.

 

Certo também que o CDC 101, II, permite que o fornecedor, acionado em demanda de consumo, chame ao processo seu segurador, de modo a que, afinal, possa também este, que assume a condição de litisconsorte passivo, a bem dizer tal qual se dá na denunciação da lide (CPC/1973, art. 75, I, com correspondência no CPC/2015, art. 126), ser condenado de forma solidaria, nos termos do CPC/1973, art. 80, com correspondência no CPC/2015, art. 130, a que remete o dispositivo em comento, de forma expressa.

 

Não se nega que, no preceito citado, de resto como nele expresso, a faculdade de chamamento seja deferida ao réu (ver Alvim, Arruda, et al. Código de Defesa do Consumidor comentado. São Paulo, RT, p. 217), mas, afinal, de modo a que, com a possibilidade de ampliação da polaridade passiva, se favoreça o consumidor (ver Código de Defesa do Consumidor comentado pelos autos do anteprojeto, Rio de Janeiro, Forense Universitária, p. 827).

 

De mais a mais, a parte final do mesmo inciso II do CDC 101 permite que, insolvente o fornecedor e se houver seguro, então possa o consumidor mover ação direta contra o segurador.

 

Por fim, vale a consideração de que a jurisprudência já admitiu a extensão desta disposição a casos, não de relação de consumo, propriamente, mas de acidentes de automóveis, ao menos para permitir a execução pela vítima diretamente contra o segurador do causador da colisão, vencido na denunciação.

 

Todas essas ressalvas se fazem para que, posto não se aceda à tese da genérica admissibilidade da ação direta da vítima contra o segurador, fique clara a tendência que se erige no sentido de se admitir tal iniciativa.

 

Na mesma esteira do previsto no CC 771, exige o § 1º do artigo presente que, tão logo saiba, dê o segurado aviso ao segurador do fato constitutivo de sua responsabilidade, garantida pelo ajuste securitário. Veja-se que nem sempre a ciência do segurado se verifica no exato instante da ocorrência do evento, como, por exemplo, no dano que sua construção possa ter causado a terceiro. sobre a significação da exigência de imediata comunicação e sobre as consequências derivadas de sua omissão, remete-se aos comentários ao CC 771, animado pelo mesmo espírito que subjaz ao artigo vertente.

 

No § 2º, impõe a lei a proibição de o segurado reconhecer sua responsabilidade, confessar, transigir ou ressarcir diretamente o terceiro-vítima sem expressa anuência do segurador. Tratando-se de limitação a direito do segurado, parece ser necessário interpretar restritivamente o preceito, por exemplo, excluindo-se de sua abrangência a confissão ficta ou provocada. Até pelo significado da norma, quer-se evitar que o segurador, por ato e iniciativa próprios, de alguma maneira prejudique a posição jurídica do segurador, por ato e iniciativa próprios, de alguma maneira prejudique a posição jurídica do segurador, impondo-lhe um ressarcimento acaso exagerado ou mesmo indevido. Daí exigir-se sua anuência. Mas justamente por isso é que, mais ainda, não parece razoável impor ao segurado a perda automática do direito à cobertura, como consequência da falta de obtenção de placet do segurador para a prática dos atos elencados na lei, desde eu não lhe tenha sido imposto qualquer dano. Não se crê possa ser presumido, de forma absoluta, um conluio entre segurado e terceiro para prejudicar o segurador, o que se daria com a perda automática do direito ao ressarcimento pelo simples fato da ausência de concordância. Mesmo um involuntário prejuízo não se pode admitir havido, tão só, por essa omissão, devendo-se, conforme se entende, reservar sempre a possibilidade de, apesar de não ocorrida anuência, comprovar o segurado que o ato por ele praticado em nada alterou ou afetou a cobertura que, destarte, certamente haveria de ser honrada, nos mesmos moldes. Lembre-se mesmo que ocasionalmente a transação pode até trazer benefício ao segurador, obrigado então a ressarcir valor menor do que lhe seria afeto se não houvesse o acordo.

 

O § 3º do artigo examinado dispõe que, ajuizada ação de ressarcimento contra o segurado, deverá ele dar ciência do fato ao segurador, sem que se diga, diferentemente do previsto no CC 456, que na forma das leis do processo. Aliás, bem por isso, sustenta o Ministro Eduardo Ribeiro (“Contrato de seguro – alguns tópicos”. In: O novo Código Civil, coord. Domingos Franciulli Netto, Gilmar Ferreira Mendes e Ives Gandra da Silva Martins Filho. São Paulo, LTr, p. 729-46) que a lei criou, no caso, uma ciência específica, sem previsão no Código de Processo Civil, que vincula o segurador ao que se decidir na demanda em termos de responsabilidade do segurado. Isso, no entanto, afirma o mesmo autor, sem que a falta da cientificação determine qualquer perda de direito regressivo, de resto como, hoje, também se entende para a denunciação da lide (CPC/1973, 70, III – correspondência no CPC/2015, art. 125), a despeito de que dita obrigatória, mas o que alguns vem reservando, quando muito – já que mesmo nesse caso altera-se a posição da jurisprudência -, à hipótese da evicção (vide CPC/2015, art. 125). Aliás, pela tese exposta, haveria ao segurado a alternativa de cientificar o segurador da demanda indenizatória, a fim de fazê-lo vinculado ao deslinde, ou estabelecer lide regressiva secundária, com a denunciação da lide, cujo cabimento, nas hipóteses de seguro, a reforma processual cuidou de assentar, para permiti-la nos procedimentos de rito sumário (art. 280, do CPC/1973, sem correspondência no CPC/2015, com redação dada pela Lei n. 10.444/2002). Ou seja, para o autor seriam, então duas medidas diversas, quando, ao que se crê, melhor teria andado o Código Civil determinando a cientificação como providência a ser exercitada, tal qual se dispõe no CC 456, na forma dos termos das leis do processo. Ressalve-se, apenas, a todo esse respeito, que hoje é sustentável considerar esteja o segurador vinculado ao ressarcimento se o segurado foi condenado, por conta da relação de direito material de garantia entre ambos os existentes, independentemente da cientificação. A discussão que se faria possível entre os dois estaria relacionada com as condições da garantia ajustada, mas não com o pagamento imposto ao segurado mercê da condenação judicial a que submetido. Quando muito, poder-se-ia cogitar de o segurador eventualmente pretender demonstrar que a conduta do segurado, mesmo no processo indenizatório, ostentou-se, por exemplo, por alguma omissão probatória, de modo a agravar importe ressarcitório, aí sim, o que a ciência tenderia a afastar. Mas isso, de toda sorte, sem excluir, ainda, a possibilidade de denunciação da lide, e cuja ausência, como já se decidia, não induz perda do direito regressivo.

 

Finalmente, estabelece o § 4º que a responsabilidade do segurado subsiste perante o terceiro, se o segurador for insolvente. A regra poderia levar a supor que ao terceiro fosse dado litigar diretamente contra o segurador, voltando-se contra o segurado se aquele se tornasse insolvente, o que, porém, já anteriormente se defendeu incabível. Poder-se-ia argumentar, então que, ao determinar a responsabilidade do segurado diante da insolvência do segurador, quis-se evitar o sobresseguro, que era textualmente permitido no art. 1.437 do Código de 1916, o que também não se considera seja o caso, já no mesmo dispositivo explicitando-se que a contatação de seguro contra a insolvência do segurador não implica a admitir se esteja a erigir mais de uma cobertura para o mesmo interesse (CC 782). Isso tudo se cogita dada a ociosidade do dispositivo, se interpretado, tout court, como simples reforço da responsabilidade pessoal do segurado perante quem foi por ele lesado, a despeito do seguro. Talvez reste só o elastério de que o preceito reafirma a impossibilidade de o segurado se beneficiar, diante do terceiro, da alegação de insolvência de seu garantidor, porquanto não lhe transfere a responsabilidade direta pelos danos que vier a causar (Ver José Augusto Delgado. Comentários ao novo Código Civil, coord. Sálvio de Figueiredo Teixeira. Rio de Janeiro, Forense, 2004, v. XI, t. I, p. 568). (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 11.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 814-815 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 10/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

 

Vê-se com a Doutrina de Ricardo Fiuza, que esse artigo inova, ao tratar de uma modalidade especial, que é o seguro de responsabilidade civil, já existente anteriormente, porém não disciplinado pelo CC de 1916. Por tal contrato, transferem-se aos segurados as indenizações eventualmente devidas pelo segurado a terceiros, resultantes de atos ilícitos determinantes dos prejuízos por ele causados e pelos quais seria responsabilizado. Um interessante caso particular desse contrato é o chamado seguro de fidelidade funcional, cujo objeto é a reparação de prejuízo que possa vir a ser ocasionado por funcionários ou empregados que lidem com quantias em dinheiro.

 

O § 1º desse artigo preceitua ser obrigação do segurado comunicar de pronto ao segurador, tão logo delas tome conhecimento, as consequências de ato seu, capaz de lhe acarretar a responsabilidade objeto da garantia. Esse dever jurídico é ínsito à própria relação securitária, onde, no caso, o segurador assumiu as consequências dos atos que venham de ser cometidos pelo segurado.

 

O § 2º, por sua vez, estatui ser proibido ao segurado reconhecer sua responsabilidade ou confessar a ação, bem como transigir com o terceiro prejudicado, ou indenizá-lo diretamente, sem anuência expressa do segurador.

 

A ideia da lei objetiva inibir a frustração de eventual direito do segurador, na hipótese de atuação do segurado à sua revelia, quando já se faz, em decorrência do seguro, incabível uma negociação direta entre o segurado e o terceiro sem a anuência expressa do segurador.

 

O § 3º determina que, intentada a ação contra o segurado, terá este que dar ciência da lide ao segurador. Também aqui o propósito é o de impedir seja causado injusto prejuízo ao segurador que garantiu o pagamento de perdas e danos devidos pelo segurado a terceiro.

 

Finalmente, o § 4º estatui que a responsabilidade do segurado perante o terceiro subsistirá, caso seja o segurador insolvente. É por demais evidente que não poderia a celebração do seguro de responsabilidade civil dar margem à possibilidade de vir o terceiro a ficar sem ressarcimento algum pelos danos sofridos, o que teria lugar no caso de insolvência do segurador. Assim, estabelece a lei que, uma vez constatada tal situação de insolvência, subsiste a responsabilidade do segurado perante o terceiro, quando aquele for o responsável direito pelo dano causado. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 414 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 11/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Na toada de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o seguro de responsabilidade civil, vulgarmente conhecido como “seguro de danos contra terceiros”, visa a garantir o segurado contra indenizações que lhe venham a ser cobradas por danos que vier a causar a terceiros.

 

Tendo-se em vista que essa modalidade de seguro visa a garantir o segurado contra danos que ele próprio provoca, a lei retira-lhe a possibilidade de reconhecer o direito do terceiro, de transigir ou de indenizá-lo diretamente, sem a anuência da seguradora. Uma vez que a esta incumbirá, por fim, os ônus da indenização, a ela devem ser reservadas tais faculdades.

 

O parágrafo 4º estabelece que a responsabilidade do segurado perante terceiro se for insolvente a seguradora. A rigor, no entanto, a responsabilidade do segurado junto ao terceiro remanesce sempre e só excepcionalmente tem jurisprudência admitido que o terceiro ajuíze ação diretamente conta a seguradora, em relação a quem não possui a rigor qualquer vínculo jurídico. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 11.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 788. Nos seguros de responsabilidade legalmente obrigatórios, a indenização por sinistro será paga pelo segurador diretamente ao terceiro prejudicado.

 

Parágrafo único. Demandado em ação direta pela vítima do dano, o segurador não poderá opor a exceção de contrato não cumprido pelo segurado, sem promover a citação deste para integrar o contraditório.

 

Na luz de Claudio Luiz Bueno de Godoy, de índole essencialmente social, mas de modo particular, já que todo ajuste securitário possui uma função previdenciária, a rigor de cunho social, porquanto de garantia de indenidade das pessoas, o seguro obrigatório encerra, em última análise, uma estipulação em favor de vítimas potenciais e indeterminadas, ressarcidas diante de sinistros em que se converteram riscos previstos em lei. assim é que, já no Decreto-lei n. 73/66, previram-se inúmeras hipóteses em que a contratação do seguro se faz obrigatória, para garantia de terceiros incertos expostos ao risco criado – por exemplo, por quem opera aeronaves comerciais, possui veículos automotores de vias terrestre, fluvial, lacustre e marítima, constrói imóveis em zonas urbanas, dentre outras hipóteses, todas consagradas no art. 20. De todos eles, é bastante comum e cotidiano o Seguro Obrigatório de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Vias Terrestres (DPVAT), regulamentado pelas Leis nº. 6.19474 e 8.441/92, que já estabeleciam, antes do novo Código, pagamento da indenização, em valor previamente fixado, equivalente a quarenta salários-mínimos, para o caso de morte, diretamente ao prejudicado. O que, mais recentemente, se reforçou com a Lei n. 11.482/2007, malgrado uma legislação fiscal, mas que em seu art. 8º estabeleceu valores certos para a mesma indenização. É mesmo o que se extrai da própria essência dessa forma de seguro, legalmente obrigatório. Quer-se, com ele, uma cobertura objetiva e genérica a pessoas expostas a risco de dano nos casos que a lei elenca. Por isso, o prejudicado, quando se trata de seguros obrigatórios, pode mover diretamente a ação contra o segurador, sem que a este seja dado, para eximir-se do pagamento, tal qual o expressa o atual Código, alegar falta de pagamento do prêmio pelo segurado. Nada diverso, repita-se, do que, nos acidentes de automóveis, já previa o art. 7º da Lei n. 6.194/74, com redação dada pela Lei n. 8.441/92, inclusive com a possibilidade de indenização cobrada de qualquer seguradora integrante do consórcio de empresas que operam o seguro obrigatório, por vítima de acidente em que envolvido veículo não identificado, com seguro não realizado ou vencido.

 

É nesses termos que deve ser compreendida a parte final do artigo em pauta, não se admitindo que possa a seguradora, de forma alguma, deduzir, em sua defesa, a exceção do contrato não cumprido pelo segurado, mesmo havida a citação deste (ver Súmula n. 257 do STJ). Na verdade, o que se permite é a denunciação da lide pela seguradora, a fim de reaver, em regresso, a indenização que tiver pago. Tal a redação que se tenciona explicitar com o Projeto de Lei n. 276/2007, já de alteração do Código civil. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 817 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 11/02/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

 

Seguindo a doutrina de Ricardo Fiuza, os seguros de responsabilidade civil obrigatórios são, pela natureza social de que se revestem, satisfeitos em face da simples ocorrência do dano, independentemente da apuração da culpa. Aplica-se em favor do segurado a teoria do risco, aludida no Decreto-lei n. 73/66. O caráter assistencial emprestado ao seguro obrigatório exige, por tal conduto, seja o pagamento feito pela seguradora diretamente ao interessado, terceiro prejudicado, evitando-se, destarte, que pessoas inescrupulosas dele obtenham vantagens indevidas.

 

O parágrafo único do artigo remete a hipótese ao disposto no CC 476. Entretanto, exige-se maior acuidade na interpretação do seu texto, em face da pretensa exceção arguível. É que feito o seguro em favor de outrem não identificado, terceiro prejudicado potencial, não teria, em verdade tal exceção o condão de afastar a seguradora pelo pagamento do prêmio, enquanto não implementada a obrigação pelo segurado. E o que o sistema de tais seguros objetiva estabelecer: o princípio da universalidade, a tanto que a cobertura à vítima do dano é efetuada independentemente de o veículo ou a própria seguradora serem identificados acionando o beneficiário do seguro qualquer das empresas seguradoras integrantes do consórcio securitário (art. 72 da Lei n. 6.194) e, mais ainda, terá o terceiro prejudicado direito à indenização pelo sinistro, mesmo que não efetuado o pagamento do prêmio pelo segurado. Nesse sentido o SI! tem dirimido, com segurança “A indenização decorrente do chamado seguro obrigatório de danos pessoais causados por veículos automotores de vias terrestres (DPVAT), devida a pessoa vítima por veículo identificado que esteja com a apólice de referido seguro vencida, pode ser cobrada de qualquer seguradora que opere no complexo” (STJ. 4’ T., REsp 200.838-60, rel. Mm Cesar Asfor Rocha. DJ de 2-5-2000). A jurisprudência tem sinalizado, de há muito, nessa linha: “Não pode a seguradora se recusar a pagar a indenização proveniente de seguro obrigatório alegando a falta de pagamento do prêmio pelo proprietário do veículo causador do acidente, pois a lei não faz essa exigência, e, além do mais, aquela não terá qualquer prejuízo, pois poderá ingressar cós uma ação regressiva, tudo nos termos da Lei n. 6.194, com a redação dada pela Lei n. 8.441” (RT, 743/300). Observe-se, ademais, a orientação do STJ, ao particularizar a obrigação daquele causador do dano, somente quando inexistente consórcio segurador que assuma o risco: “O dever de indenizar o prejudicado, pelo acidente causado por veículo cujo seguro estava vencido, é do proprietário deste, quando à época do evento danoso ainda não estava em vigor a norma que prevê a obrigação indenizatória do Consórcio de Seguradoras, para esses casos” (STJ, 3’, T., REsp 218.418-SP, rel. Mm Fátima Nancy Andrighi, DJ de 17-9-2001). Diante de tal sentir, afigura-se ambígua e desproposital a narração do texto do referido parágrafo, aparentando prevalecer, em tais hipóteses, a exceção do contrato ao cumprido, quando, em verdade, terá apenas a seguradora demandada o direito de regresso conta o segurado moroso. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 415 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 11/02/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

No entender de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, o beneficiário dos seguros obrigatórios é sempre o terceiro prejudicado. Em razão disso, a ele deve ser paga a indenização. Por ser obrigatório o seguro, o fato de não ter sido pago o respectivo prêmio pelo segurado não exonera a seguradora de pagar ao prejudicado a indenização devida. (Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso em 11.02.2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

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