Direito Civil Comentado - Art.
696,697,698 - Continua
- Da Comissão - VARGAS, Paulo S.
R.
Parte
Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI
– Das Várias Espécies de Contrato
(art. 481 a 853) Capítulo XI – Da Comissão –
(art. 693
a 709) vargasdigitador.blogspot.com -
Art.
696. No
desempenho das suas incumbências o comissário é obrigado a agir com cuidado e
diligencia, não só para evitar qualquer prejuízo ao comitente, mas ainda para
lhe proporcionar o lucro que razoavelmente se podia esperar do negócio.
Parágrafo
único. Responderá o comissário, salvo motivo de força maior, por qualquer
prejuízo que, por ação ou omissão, ocasionar ao comitente.
Na dissertação de Claudio Luiz Bueno de Godoy, o artigo consagra
obrigação básica do comissário, a exemplo do que, para o mandatário, se
explicita no CC 667, que é a de agir com zelo e diligência no cumprimento do
encargo que lhe tiver sido cometido. Aqui se deve ressalvar, primeiro, que o
cuidado e a diligência exigíveis do comissário não são tão somente os que
permeiam sua forma habitual de se portar, senão aqueles suficientes e idôneos a
evitar qualquer prejuízo ao comitente e, antes, a lhe garantir o proveito
esperado da operação.
De outra parte, e coo já se disse no comentário ao artigo
anterior, a aferição sobre esse nível de exigência não pode olvidar a
circunstância eventual de o comissário ser profissional – o que pressupõe
admitir-se, portanto, que a comissão pode envolver atividade não profissional
(ver comentário ao CC 693). Com efeito, deve-se diferenciar o que razoavelmente
se espera da forma diligente de agir de quem seja e de quem não seja um
profissional. Isso sem prejuízo de obrar o comissário de acordo com as ordens
recebidas, o que está no preceito antecedente, mas ao qual o vertente se agrega
para explicitar que, mesmo de conformidade com as instruções do comitente, a
atuação do comissário deverá ser diligente.
Nessa obrigação genérica de cuidado, impende considerar que
estejam abrangidos deveres específicos que vinham dispostos no Código Comercial
e que sejam compatíveis com a limitação do Código Civil acerca do objeto do
encargo cometido ao comissário (CC 693). Assim, por exemplo, a obrigação de
guarda e conservação da coisa adquirida e que deva ser entregue ao comitente ou
dele ser recebida para venda (CC 170), dando aviso de danos porventura havidos
na res (CC 171). Da mesma forma, enquadra-se a obrigação de procurar
negócio a ser efetivado em condições não mais onerosas do que as correntes, no
tempo e lugar da entabulação (CC 183).
O CC/2002, na mesma esteira do Código Comercial, silenciou sobre a
possibilidade de o comissário, sem infringência ao dever de zeloso cumprimento
da comissão, adquirir para si a coisa do comitente que lhe tenha sido entregue
para venda (contrato consigo mesmo ou autocontrato). Defende-se, todavia, essa
possibilidade, desde que sem abuso do comissário e com proveito ao comitente
(cf. Sílvio de Salvo Venosa, Direito civil, 3. ed. São Paulo, Atlas,
2003, v. III, p. 559), de resto como segue hoje explicitado no mandato acerca
da procuração em causa própria (CC 685).
Para Orlando Gomes, que sustenta a existência de autorização
implícita de contratar consigo mesmo, possibilidade então somente afastada se
houver cláusula explícita proibindo o autocontrato, condiciona-se a verificação
do proveito ao comitente a que a negociação se faça sobre coisa com preços
cotáveis de forma corrente, a fim de se efetivar a comparação com o preço pago
pelo comissário (Contratos, 9. ed. Rio de Janeiro, Forense, 1983, p.
406). É certo, porém, que, mesmo sem essa limitação, o proveito ao comitente
deve ser demonstrado, já que existe um intrínseco conflito de interesses com o
comissário.
Por fim, estabelece o
preceito em tela, no parágrafo único, a consequência pelo descumprimento da
obrigação de zelo e diligência afeta ao comissário, impondo-lhe dever reparatório,
exceto, segundo a dicção legal, se havida força maior. Na verdade, erigiu-se
responsabilidade contratual do comissário por conduta culposa, de novo tal qual
no mandato (CC 667), sempre ressalvada na comissão profissional, exercida por
pessoa jurídica, a ocasional incidência, configurada a relação de consumo, da
legislação respectiva (Lei n. 8.078/90) e da responsabilidade sem culpa lá
instituída. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n.
10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e
atual., p. 721 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 31/12/2019. Revista e
atualizada nesta data por VD).
Para a Doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, não será apenas
indispensável que o comissário opere em conformidade com o texto programado das
ordens e instruções do comitente (CC 695). É, por igual, imperativo desempenhar
a tarefa com cuidado e diligência. O desvelo e a cautela, o cuidado ativo e a
presteza conjugam-se na persecução de dois propósitos bem definidos: impedir
prejuízo, ainda que mínimo, ao comitente e assegurá-lo com os lucros que
conforme à própria regularidade do negócio lhe seriam proporcionados. A imposição
da norma é um preceito de garantia ao êxito da comissão.
O parágrafo
único estabelece responsabilidade do comissário pelos prejuízos advindos de sua
ação ou omissão e causados ao comitente, ressalvado motivo de força maior.
Dessa forma não responderá apenas o comitente pelo excesso na comissão (falta
de exação), mas, ainda, quando faltar ao desempenho de suas incumbências o
mencionado cuidado ativo, importando tal inobservância em prejuízos ao
comitente. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 373 apud
Maria Helena Diniz Código Civil
Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf,
Microsoft Word. Acesso em 31/12/2019,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Para Luís Paulo Cotrim
Guimarães e Samuel Mezzalira, o contrato de comissão impõe o dever de cuidado
por parte do comissário em relação aos interesses do comitente, respondendo por
perdas e danos se provocar danos por conduta culposa. (Luís Paulo Cotrim
Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso
em 31.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art. 697. O comissário não responde pela
insolvência das pessoas com quem tratar, exceto em caso de culpa e no do artigo
seguinte.
No entendimento de Claudio Luiz Bueno de Godoy, o dispositivo
estabelece a regra geral de que o risco pela solvência daquele com quem o
comissário trata é do comitente. Ou, em diversos termos, o princípio é que o
comissário não responde pelo cumprimento da obrigação que contratar no
interesse do comitente. Não responde, enfim, pela execução ou pelo pagamento do
negócio entabulado à conta do comitente.
É certo, porém, que a referida responsabilidade, que como norma
geral ele não tem, poderá ser carreada ao comissário se agir com culpa na
escolha daquele com quem contrata. É o que, na dicção do art. 175 do Código
Comercial, se revelava pela contratação com pessoa inidônea ao tempo da
entabulação. Ou seja, pessoa que se sabia ou deveria saber insolvente, não no
sentido estrito, jurídico, mas sim alguém que já se prenunciava que poderia
faltar ao cumprimento do ajuste, ou, da mesma forma, alguém insolvável, sem
garantia suficiente a compor a responsabilidade pela obrigação contraída.
Ter-se-á em hipóteses tais, verdadeiramente, a desatenção à obrigação que tem o
comissário de agir com diligência e zelo. Importa, todavia, a aferição das
condições subjetivas desta pessoa com que o comissário trata ao instante em que
a contratação se consuma.
Por fim, remete o preceito
ao artigo seguinte como contemplativa de outras hipóteses em que se quebra a
regra da irresponsabilidade do comissário pelo adequado cumprimento do negócio
tratado à conta do comitente. É o caso da comissão del credere, a seguir
examinada. (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n.
10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e
atual., p. 721 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 31/12/2019. Revista e
atualizada nesta data por VD).
Segundo o histórico apresentado na postagem de Ricardo Fiuza, a
redação atual é a mesma do projeto. Não há artigo correspondente de CC de 1916.
No entanto, o Código Comercial de 1850 traz artigo acerca do tema, de n. 175, in
verbis: “Art. 175. O comissário não responde pela insolvência das pessoas
com quem contratar em execução da comissão, se ao tempo do contrato eram
reputadas idôneas; salvo nos casos do art. 179, ou obrando com culpa ou dolo”.
O mencionado art. 179, por sua vez, refere-se à hipótese de comissão dei
credere.
Na doutrina, a cláusula
legal de isenção de responsabilidade na comissão mercantil é a de não responder
o comissário pela insolvibilidade de terceiros com quem contrata, correndo os
riscos por conta do comitente. Entretanto, achar-se-á em culpa, p. ex., se
contratar com pessoas inidôneas, como decorre, a contrario sensu do que
estabelece o art. 175 do Código Comercial, ou, ainda, exclui-se a isenção, no
caso da comissão dei credere, tratada pelo CC 698. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 373 apud
Maria Helena Diniz Código Civil
Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf,
Microsoft Word. Acesso em 31/12/2019,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Na toada de Luís Paulo Cotrim
Guimarães e Samuel Mezzalira, se o comprador da mercadoria não pagar o preço ao
comissário, este não estará obrigado a ressarcir o comitente pelo prejuízo
decorrente do inadimplemento nem mesmo se o comprador for insolvente, salvo se
tiver agido com culpa. A norma é supletiva. As partes podem estipular a
cláusula del credere, que estabelece a solidariedade do comissário e do
comprador em relação ao comitente como disposto no CC 698. (Luís Paulo Cotrim
Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso
em 31.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Art.
698. Se do
contrato de comissão constar a cláusula del credere, responderá o comissário solidariamente com
as pessoas com que houver tratado em nome do comitente, caso em que, salvo
estipulação em contrário, o comissário tem direito a remuneração mais elevada,
para compensar o ônus assumido.
No ritmo de Claudio Luiz Bueno de Godoy, a cláusula del credere
encerra pacto adjeto ao contrato de comissão e pode ser convencionada
verbalmente, dado que é informal o próprio ajuste a que se refere, conforme
acentua Sílvio Venosa (Direito civil, 3. ed. São Paulo, Atlas, 2003, v.
III, p. 558) e já o assegurava o art. 179 do Código comercial, cujo conteúdo é,
quebrando a regra geral contida no artigo antecedente, fazer do comissário um
garante solidário pela solvabilidade e pontualidade daquele com quem contrata à
conta – e não em nome – do comissário, como inadequadamente é aludido no artigo
em comento, visto ser característica da entabulação a atuação do outorgado em
nome próprio, malgrado sempre no interesse do outorgante.
Ou seja, pela cláusula del credere o comissário passa,
excepcionalmente, a responder por tudo quanto se disse no artigo anterior
ser-lhe estranho, em termos de responsabilidade. Passa a responder, enfim, pela
boa execução do ajuste contratado no interesse do comitente, pelo seu
cumprimento, pela sua completa e tempestiva satisfação. Mais, expressa a lei
que essa responsabilidade é solidária, para muitos em virtude da natureza de
verdadeira fiança que tem o o del credere, de resto lembrando que a
fiança comercial era sempre solidária (art. 258 do Código Comercial), todavia o
que não se repete no Código Civil. Já para outros ter-se-ia, no caso, uma
espécie de seguro, em que o pagamento de remuneração maior ao comissário
significaria mesmo um prêmio pela responsabilidade por ele assumida, uma
contrapartida a cargo do comitente pelo ônus imposto ao comissário. De toda
sorte, cuida-se de uma garantia que o comissário pode prestar, se assim se
pactuar, e com caráter de solidariedade previsto em lei.
A remuneração maior em virtude dessa garantia não é obrigatória,
conforme ressalva o próprio texto legal. Mas, para tanto, se rá necessária
expressa menção do ajuste, sobretudo nos casos em que a remuneração tiver de ser
arbitrada judicialmente, portanto quando já não vier estipulada em valor
previamente convencionado (CC 701).
Muito se discutiu, ainda sob
a égide do Código Comercial, sobre a possibilidade da comissão del credere
se o negócio pactuado pelo comissário com terceiro fosse de pagamento á vista,
ao argumento de que então não seria justificável uma garantia que, afinal, é
remunerada. Ou, por outra, não faria sentido possibilitar uma maior remuneração
ao comissário por garantia vazia, já que, pagando o terceiro à vista, seria
irrelevante a questão de sua solvabilidade. Bem de ver, porém, que a
contratação da cláusula del credere se faz aprioristicamente, antes da
contratação do comissário com o terceiro e antes de saber quem será esse
terceiro, portanto de toda sorte cabendo a garantia remunerada de que trata o
artigo (ver a respeito: Fran Martins. Contratos e obrigações comerciais, 7. ed.
Rio de Janeiro, Forense, 1984, p. 345). (Claudio Luiz Bueno de Godoy, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n.
10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e
atual., p. 721-722 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 31/12/2019. Revista e
atualizada nesta data por VD).
A doutrina
de Ricardo Fiuza diz que a Lei estipula uma remuneração compensatória, superior
à convencional, tendo em conta a responsabilidade assumida pelo comissário,
qual seja a de garantir a capacidade de pagamento por aqueles com quem
contratar. Essa remuneração inerente à cláusula deixará de ser atribuída ao
comissário, havendo disposição contratual em contrário, ao tempo em que
admitida, no contrato de comissão, a referida cláusula del credere. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 373 apud
Maria Helena Diniz Código Civil
Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf,
Microsoft Word. Acesso em 31/12/2019,
corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).
Na esteira de Luís Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira, a cláusula
del credere é a que responsabiliza o distribuidor a responder
solidariamente junto ao comitente pelas obrigações assumidas pelo comprador.
De
modo inusitado, o dispositivo determina que, havendo a referida solidariedade,
“o comissário tem direito a remuneração mais elevada, para compensar o ônus
assumido”. Qual o parâmetro será tomado em conta par a elevação a remuneração
do comissário? A regra não é impossível de ser aplicada, mas dependerá da
existência de contratos nos quais o comitente haja estabelecido remuneração a
algum comissário seu sem a cláusula del credere. Quanto a mais deverá
ser pago ao comissário solidariamente responsável com as pessoas que contratar?
O cálculo deverá levar em conta o volume e o valor total dos negócios, bem como
proporção entre estes e a inadimplência os devedores. A alteração da
remuneração pode, então, apesar da difícil contabilidade, ser estabelecida. (Luís Paulo Cotrim
Guimarães e Samuel Mezzalira apud Direito.com acesso
em 31.12.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).