quinta-feira, 26 de março de 2015

DIREITO ECONÔMICO: AS FORMAS DE ATUAÇÃO DO ESTADO NO PROCESSO ECONÔMICO: ATIVIDADE ECONÔMICA, PODER NORMATIVO E SERVIÇO PÚBLICO – OBRA DE EUGÊNIO ROSA DE ARAÚJO E APLICADA PELO PROFESSOR FELIPE NOGUEIRA NO CURSO DE DIREITO 8º PERÍODO FAMESC - BJI – 1º SEMESTRE / 2015 - CAPÍTULO 7 - VARGAS DIGITADOR

DIREITO ECONÔMICO: AS FORMAS DE ATUAÇÃO DO ESTADO NO PROCESSO ECONÔMICO: ATIVIDADE ECONÔMICA, PODER NORMATIVO E SERVIÇO PÚBLICO – OBRA DE EUGÊNIO ROSA DE ARAÚJO E APLICADA PELO PROFESSOR FELIPE NOGUEIRA NO CURSO DE DIREITO 8º PERÍODO FAMESC - BJI – 1º SEMESTRE / 2015 - VARGAS DIGITADOR
CAPÍTULO 7

O art. 173 da Constituição dispõe que: “a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos de segurança nacional ou relevante interesse coletivo” (grifo nosso), ao passo que o art. 174, em seguida, avisa que: “como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado” (grifo nosso) e, por fim, nos interessa de perto a letra do art. 175, segundo o qual “incumbe ao Poder Público,  na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão  ou permissão, sempre através de licitação, a proteção de serviços públicos” (grifo nosso).


Em uma primeira visão panorâmica e sistemática dos dispositivos constitucionais, podemos dizer que o art. 173 cuida da atividade econômica, o art. 174 do poder normativo sobre a atividade econômica e, por fim, vemos que o serviço público é o tema tratado no art. 175.


Para a fixação do que venha a ser atividade econômica e para fins didáticos, útil é o parâmetro estipulado pelo art. 966 do novo Código Civil, segundo o qual “considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou serviços” (isso me faz lembrar do meu amigo e nobre Professor Cesar Pimentel – grifo de Vargas Digitador), bem como o art. 3º do Código de Defesa do Código do Consumidor, remetendo-me também ao  Professor tão querido e conhecedor da matéria Rogério Mauro - grifo de Vargas Digitador), segundo o qual “Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, circulação de produtos ou prestação de serviços”, sendo que “produto é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista”.


Dito isso, é possível identificar, dentro destas linhas gerais do que vem a ser atividade econômica, a noção do serviço público, tendo em vista que está contido na noção de atividade econômica. Isto se dá porque o serviço público é um tipo de atividade econômica, posto que se volta à satisfação de necessidades, envolvendo bens, serviços e recursos escassos, cuja execução compete preferencialmente ao setor público, mas não com exclusividade, visto que o setor privado presta serviço público em regime de concessão ou permissão (art. 175).


Assim, a atividade econômica, como gênero, comporta duas espécies: o serviço público (SP) e a atividade econômica (AE), sendo que a atividade econômica em sentido amplo (AESA) é o gênero do qual a espécie é a atividade econômica em sentido estrito (AESE).


Sintetizando o que até agora foi dito, temos que o art. 173 cuida da AESE pela iniciativa privada, que poderá ser exercida pelo Estado. Desde que necessária aos imperativos de segurança nacional ou relevante interesse coletivo, ao passo que o art. 174 cuida da AESA, posto que o Estado, como agente normativo tanto da AESE como do SP, exercerá as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado e, por fim, trata o art. 175 da AESA, porque o serviço público é modalidade de atividade econômica já que apresenta caracteres econômicos.


Em síntese: art. 173 da CRFB = AESE; art. 174 da CRFB = AESA; art. 175 da CRFB = AESA/SP.


Como AESA, cuidaremos, nesse passo, de aclarar a noção de SP e, para tanto, são úteis as definições de SP oferecidas pela doutrina a saber:


Maria Sylvia Di Pietro:

          “Toda atividade material que a lei atribui ao Estado para que exerça diretamente ou por meio de seus delegados, com objetivo de satisfazer concretamente às necessidades coletivas, sob regime jurídico total ou parcialmente público”.


Celso Antônio Bandeira de Melo:

          “Toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material, fruível diretamente pelos administrados, prestado pelo Estado ou por quem lhe faça as vezes, sob um regime de Direito Público – portanto, consagrador de prerrogativas de supremacia e de restrições especiais – instituído pelo Estado em favor dos interesses que houver definido como próprios ao sistema normativo”.


Aliomar Baleeiro enfrenta o problema da prestação do serviço público sob o prisma financeiro de decisão política de realização da despesa pública para satisfação das necessidades da coletividade:


Em todos os tempos e lugares a escolha do objetivo da despesa envolve um ato político, que também se funda em critérios políticos, isto é, nas ideias, convicções, aspirações e interesses revelados no entrechoque dos grupos detentores do poder. Tanto mais lúcidos, cultos e moralizados sejam os governantes quanto mais probabilidades existem de que se realize aquele cálculo de máxima vantagem social.


Isso põe em contraste o aspecto político e o aspecto técnico de despesa pública. A despesa pública deve ser encarada sob esse duplo aspecto.


À luz do primeiro, o político, delibera-se o que deve ser objeto da despesa pública, isto é, que necessidades humanas de caráter coletivo cevem ser satisfeitas pelo processo do serviço público.


Assentada a deliberação nesse ponto preliminar, cumpre investigar o aspecto técnico, como obter o máximo de eficiência e de conveniência social com o mínimo de sacrifício pecuniário correspondente. Ou como desse sacrifício PROCONs poderá esperar o maior rendimento de proveitos para a comunidade politicamente organizada. É a tarefa de técnicos.


Determinar quais necessidades de um grupo social a serem satisfeitas por meio do serviço público e, portanto, pelo processo da despesa pública, ressalvada a hipótese de concessão, constitui missão dos órgãos políticos e questão essencialmente política.


É fácil ver que discutir SP implica em definir a função do Estado diante de determinadas circunstâncias históricas, assegurando as condições de realização de certos valores constitucionais como a promoção da dignidade da pessoa humana, a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, bem como a redução das desigualdades sociais regionais, não se podendo admitir que o Estado se recuse a perseguir o cumprimento de tais valores, nem mesmo sob o argumento da ausência de lucratividade.


Cumpre agora, para melhor compreensão do tema, distinguir os SP privativos dos SP não privativos.


Os primeiros são aqueles cuja prestação é privativa do Estado, ainda que possa o setor privado desenvolvê-lo em regime de concessão ou permissão, a teor do art. 175 da CRFB. Na Constituição, encontramos exemplos de serviços privativos nos arts. 21, incisos X, XI, XII e XXIII; 25, § 2º, e 30, inciso V.


Os SP não privativos, tem como base atividade econômica, que tanto pode ser desenvolvida pelo Estado como SP, quanto pelo setor privado como AESE, por exemplo, os arts. 199 (saúde) e 209 (ensino). Dessa forma, se as atividades de saúde e ensino forem prestadas pelo Estado, serão SP, ao passo que se desenvolvidas pela iniciativa privada, se constituirão em AESE. Note-se que, neste caso, a lei poderá disciplinar a atividade (art. 174 da CRFB) exigindo autorização como forma de garantia da qualidade do serviço prestado (parágrafo único do art. 170 da CRFB).


Logo, verificada a definição constitucional de determinada AESA como sendo SP, fica afastada qualquer dúvida quanto a sua caracterização como SP, seja privativo ou não privativo.


A distinção entre atividades econômicas que são obrigatoriamente serviços públicos (SP privativos), atividades econômicas que podem ser serviços públicos (SP não privativos) e atividades econômicas que não podem ser serviços públicos (AESE) tem grande importância, porque a AESE, embora de titularidade do setor privado, só pode ser explorada pelo Estado “quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo” (art. 173 da CRFB).


O texto constitucional prevê, nos arts. 21, XXIII, a77, caput e inciso V, hipóteses de AESE, cuidando-se de hipótese de atuação em regime de monopólio. No caso de monopólio do petróleo e do gás natural, razões ligadas aos imperativos de segurança nacional impulsionaram a previsão constitucional de atuação do Estado como agente econômico na AESE, não havendo, aqui, SP.


Justamente porque as AESE (art. 173) não podem ser discricionariamente tidas pelo legislador como SP (AESA) é que se deve ter enorme cuidado ao elevar determinadas atividades econômicas à categoria de SP, pelo fato de o texto constitucional atribuir a sua exploração à competência exclusiva do Estado.


Não fosse assim, bastaria, se consagrado o entendimento de que SP é aquela atividade em regime de SP, que o legislador atribuísse a qualquer AESE regime de serviço público, sob o argumento de que a atividade não seria AESE, estando fora do alcance do art. 173 da CRFB.


A lei, portanto, não pode transformar livremente (AESE) em SP, sob pena de chocar-se com o preceituado no art. 173 da CRFB.


Já dispomos, até agora, das noções de AESA, AESE e de SP privativos e não privativos, sendo oportuna a análise da situação das empresas públicas e sociedades de economia mista que prestam serviço público.


A exclusividade de prestação de (SP) envolve uma situação de privilégio (diferentemente do monopólio que é AESE), ainda que prestado sob regime de concessão ou permissão por mais de um concessionário ou permissionário, o que poderia sugerir (apenas sugerir) um regime de competição e concorrência entre seus agentes (por exemplo: arts. 21, XII, “a”; 21, XII, “e”; 25, §1º e 30, V, todos da CRFB). O que importa ressaltar é a não intercambialidade ou fungibilidade entre as situações nas quais, de um lado, o SP (com titulares de privilégio) e, de outro, o regime de competição e livre concorrência que caracteriza a AESE.


É o desfrute deste privilégio de exclusividade na prestação do SP que torna atrativa ao setor privado a sua exploração por intermédio de concessão ou permissão, porque aí está envolvida a exclusividade na prestação do serviço e, consequentemente, inevitável será o desfrute de sua prestação pelo público usuário.


Para as empresas públicas e sociedades de economia mista, o desenvolvimento de SP ou AESE são distintos.


Se a entidade prestar (SP) não poderá recusar o seu fornecimento ao usuário, em face do princípio da continuidade do SP; se, no entanto, a entidade explorar AESE e recusar o fornecimento da comodidade, a recusa deverá ser punida por violação aos preceitos que reprimem as infrações contra a ordem econômica, no caso, o inciso XII do art. 21 da Lei n. 8.884/94 segundo o qual constitui infração “recusar a venda de bens ou a prestação de serviços, dentro das condições de pagamento normais aos usos e costumes comerciais”.


Podemos, então, identificar três hipóteses distintas:


1)    A empresa pública (EP) ou sociedade de economia mista (SEM) explora AESE em regime de competição e não pode se recusar a contratar porque a contratação é definida pelo ordenamento jurídico como cogente, limitando o princípio da liberdade de contratar, a teor do disposto na lei antitruste;


2)    A EP ou SEM presta SP e não pode se recusar a contratar em face do princípio da continuidade do serviço, evidenciando uma limitação inerente ao instituto contratual;


3)    A EP ou SEM explora a AESE em regime de monopólio e não pode se recusar a contratar, porque a recusa implicaria em abuso do poder econômico e porque a contratação é tida pelo ordenamento como cogente.


Situação especial é a atinente à qualificação jurídica das EP e SEM prestadoras de SP, como sendo ou não concessionárias e permissionárias de SP.


Tais empresas são delegadas, e não concessionárias ou permissionárias de (SP), a teor do art. 175 da CRFB.


O concessionário está sujeito a regime contratual. As estatais não celebram nenhum contrato de concessão com o Estado, são constituídas por lei, visando à prestação do SP e o desenvolvem não em decorrência de vontade própria, mas por imposição legal, posto que foram criadas (por exemplo, o regime de prorrogação de contrato, condições de caducidade e fiscalização ou rescisão de concessão com determinada finalidade).


O concessionário é beneficiado pela estipulação constitucional e legal de política tarifária. O exercício do serviço por parte do concessionário a ele garante um direito à remuneração, em condições de equilíbrio econômico-financeiro, ao contrário das empresas estatais prestados de SP às quais não assiste um direito à percepção de remuneração pela prestação de serviço, podendo inclusive o Estado sujeitá-la a regime de atuação deficitária, fixando a remuneração por seus serviços em níveis inferiores aos que seriam necessários à reposição dos custos da atividade.


A concessão, tal qual a permissão, é exercida com a finalidade de lucro, na medida em que é assegurado o equilíbrio econômico-financeiro da relação negocial, ao passo que as empresas estatais, na prestação de SP, não visam à obtenção de lucro, mas sim à satisfação do interesse público. Tais entidades são delegadas do Estado, criadas em razão de descentralização administrativa, para uma finalidade específica. É o próprio Estado que através de uma de suas extensões, dotada de personalidade jurídica de direito privado, presta os serviços.


Assim, o modo de gestão dos SP se encontra no âmbito da discricionariedade administrativa, cabendo ao Estado optar se o faz diretamente ou por delegação a uma empresa estatal (SEM ou EP) ou por outorga de concessão, permissão ou autorização a uma empresa privada.


No entanto, empresa estatal controlada por uma das pessoas da Federação que exercite prestação de SP de titularidade de outro ente federativo o fará por meio de concessão como, por exemplo, à CESP, empresa estadual concessionária de SP federal de eletricidade.


No caso das estatais que prestam SP, não há como cogitar de licitação para concessão, posto que não se trata de atribuição de capacidade para o exercício de atividade de SP a pessoas privadas estranhas ao Estado.


Recordando o que até agora foi dito, identificamos que a atividade econômica pode ser vista em sentido amplo, na prestação dos SP (art. 175 da CRFB) e em sentido estrito AESE, (art. 173 da CRFB), podendo o Estado, diante dos pressupostos da segurança nacional e relevante interesse coletivo, intervir neste campo da atividade privada.


Viu-se que os SP privativos se constituem em atividades econômicas necessárias de SP, ao passo que SP não privativos podem ou não ser prestados como SP ou AESE e, por fim, que as AESE não podem ser tidas, de nenhuma forma, como SP.


As SEM e SP que prestam SP, são delegatárias (e não concessionárias), onde o Estado desenvolve AESA de modo não especulativo; as SEM e EP que realizam AESE (art. 173) não prestam SP e atuam mediante especulação lucrativa.


Será no confronto entre o capital (AESE) e trabalho (SP) em determinado momento histórico que se ampliarão ou reduzirão os âmbitos das AESE e os SP. O modelo ideal de SP está na captação da realidade social de elementos que informem adequadamente o estado de confronto entre capital e trabalho.


Podemos, ainda, falar de classificação referente às formas de atuação do Estado em relação ao processo econômico.


“Intervenção” é a correta atuação estatal no campo da AESE, ao passo que “atuação” estatal designa atuação do Estado no campo da AESA. “Intervenção” indica atuação na área de outrem. O domínio econômico é o campo da AESE, área alheia à esfera pública, de titularidade (dominação) do setor privado. O SP está para o setor público assim como a AESE está para o setor privado.


Temos, então, as seguintes formas de intervenção do Estado em relação ao domínio econômico (AESE):


1)    Intervenção por absorção ou participação – o Estado intervém no domínio econômico (AESE) desenvolvendo ação como agente (sujeito) econômico. Quando o faz por “absorção”, assume integralmente o controle dos meios de produção e/ou troca em determinado setor da AESE; atua por um regime de monopólio. Quando o faz por “participação”, o Estado assume o controle de parcela dos meios de produção e/ou troca em determinado setor da AESE; atua em regime de competição com empresas privadas que permanecem a exercitar suas atividades nesse mesmo setor.


2)    Intervenção por direção – aqui o Estado exerce pressão sobre a economia, estabelecendo mecanismos e normas de comportamento compulsório para os sujeitos da AESE.


3)    Intervenção por indução – Nela, o Estado manipula os instrumentos de intervenção em consonância e na conformidade das leis que regem o funcionamento dos mercados.


Nos dois últimos caos o Estado intervirá sobre o domínio econômico, i.e., sobre o campo da AESE, como “regulador” dessa atividade (art. 174 da CRFB).


O Estado se coloca em posições distintas quando intervém “no” domínio econômico e quando intervém “sobre” o domínio econômico, encontrando-se as normas de intervenção por direção “no” domínio e as normas de intervenção por indução “sobre” o domínio econômico (AESE).


No caso das normas de intervenção por direção, estamos diante de comandos imperativos, dotados de cogência, impositivos de certos comportamentos a serem necessariamente cumpridos pelos agentes que atuam no campo da AESE – inclusive pelas próprias empresas estatais que a exploram. Norma típica de intervenção por direção é a que instrumentaliza o controle de preços, para tabelá-los ou congelá-los.


As normas de intervenção por indução vinculam preceitos que, embora prescritivos, não são dotados da mesma força cogente das normas de intervenção por direção. São normas dispositivas no sentido de levar seus destinatários a uma opção econômica de interesse coletivo e social que transcende os limites do querer individual. Neles, a sanção é um convite (não um comando), uma incitação, um estímulo, incentivos oferecidos pela lei a quem participe de determinada atividade de interesse geral patrocinada ou não pelo Estado. O destinatário pode não aderir à prescrição de norma. Se aderir, ficará vinculado por consequências que correspondem aos benefícios usufruídos em decorrência dessa adesão (o chamado direito premial).


A sedução à adesão ao comportamento sugerido é vigorosa, dado que os agentes econômicos por ela são tangidos e passam a ocupar posição privilegiada nos mercados. Seus concorrentes gozam de uma situação especial (redução ou isenção de tributos, preferência na obtenção de créditos, subsídio etc), o que lhe confere melhores condições de participação naqueles mesmos mercados.


Nem sempre, porém, a indução manifesta-se em termos positivos.


Considera-se, no mesmo modo, intervenção por indução quando o Estado, por exemplo, onera por tributo elevado o exercício de determinado comportamento, ou de certos bens, mas, onera de tal modo a sua entrada, que ela se torna economicamente proibitiva (ex.: elevado imposto de importação de determinados produtos estrangeiros ou imposto de produtos industrializados sobre cigarros e bebidas alcoólicas).


Outras vezes, determinados comportamentos econômicos são estimulados por normas de intervenção por indução, mas em decorrência da execução de obras e SP de infraestrutura que tendem a otimizar o exercício da AESE em certos setores ou regiões. Essa prática permite ao Estado, de forma legal, pôr-se a serviço dos interesses privados.


O planejamento não se inclui entre as modalidades de intervenção. Ele apenas qualifica a intervenção “sobre” e “no” domínio econômico. O planejamento não configura modalidade de intervenção, mas um método que a qualifica, para torná-la mais racional.



O planejamento possibilita que a intervenção substitua a prática de atos que vinha sendo adotados aleatoriamente, por um padrão de formato racional. A forma de ação racional é caracterizada pela previsão de comportamentos econômicos e sociais futuros, pela formulação explícita de objetivos e pela definição de meios de ação coordenadamente dispostos.

quarta-feira, 25 de março de 2015

DIREITO ECONÔMICO: CAPITAIS ESTRANGEIROS – OBRA DE EUGÊNIO ROSA DE ARAÚJO E APLICADA PELO PROFESSOR FELIPE NOGUEIRA NO CURSO DE DIREITO 8º PERÍODO FAMESC- BJI – 1º SEMESTRE /2015 - VARGAS DIGITADOR

DIREITO ECONÔMICO: CAPITAIS ESTRANGEIROS – OBRA DE EUGÊNIO ROSA DE ARAÚJO E APLICADA PELO PROFESSOR FELIPE NOGUEIRA NO CURSO DE DIREITO 8º PERÍODO FAMESC- BJI – 1º SEMESTRE /2015 - VARGAS DIGITADOR

CAPÍTULO 6

CAPITAIS ESTRANGEIROS

O art. 172 da Constituição Federal dispõe que: “A lei disciplinará, com base no interesse nacional, os investimentos de capital estrangeiro, incentivará os reinvestimentos e regulará a remessa de lucros”.


O dispositivo constitucional fundamenta a Lei n. 4.131/62. Que disciplina a aplicação do capital estrangeiro e as remessas de valores para o exterior, onde o art. 1º dispõe que:


          “Art. 1º. Consideram-se capitais estrangeiros, para os efeitos desta lei, os bens, máquinas e equipamentos, entrados no Brasil sem dispêndio inicial de divisas, destinados à produção de bens ou serviços, bem como os recursos financeiros ou monetários, introduzidos no país, para aplicação em atividades econômicas desde que, em ambas as hipóteses, pertençam a pessoas físicas ou jurídicas residentes, domiciliadas ou com sede no exterior.”


Como se pode verificar a partir dessa definição legal, são requisitos para que se considere um determinado valor como capital estrangeiro nos termos da Lei n. 4.131/62: que seu titular seja pessoa física ou jurídica domiciliada no exterior, que haja ingresso de recursos na economia nacional e que haja destinação desses recursos à atividade econômica.


Não se confunde, portanto, nos termos da mencionada lei, capital estrangeiro com capital de estrangeiro, de forma que um estrangeiro domiciliado no Brasil não faz jus ao registro de seus investimentos, no Departamento de Capitais Estrangeiros do Banco Central – FIRCE, ao amparo daquela norma jurídica.


Considera-se reinvestimento os rendimentos auferidos por empresas estabelecidas no País e atribuídos a residentes e domiciliados no exterior e que forem reaplicados nas mesmas empresas de que procedem ou em outro setor da economia nacional.


Por extensão, são enquadrados nessa categoria os lucros ou dividendos distribuídos pela pessoa jurídica receptora de um investimento externo direito e aplicados em novo investimento da mesma espécie, pela via da integralização de capital subscrito ou de aquisição de participação de nacionais.


Não se confunde, pois, com o conceito de reaplicação  de recursos que vem sendo adotado na área de capitais estrangeiros.


O investimento externo direto (IED) é o investimento feito por pessoa física ou jurídica com sede no exterior no capital social de uma empresa, independentemente do percentual das ações ou quotas que tenham sido adquiridas, desde que tenha essa aquisição se dado de forma direta (por subscrição de capital, admitida pelos sócios de uma empresa ou por aquisição direta, junto a um sócio, de participação integralizada por ele detida), fora dos sistemas convencionais dos mercados organizados de bolsa de valores (mercado secundário). Excetua-se, portanto, ainda que efetuada em ambiente de bolsa de valores (e poderia até não sê-lo), a aquisição levada a efeito em leilões excepcionais, tais como os de privatização de empresas, precedidos de todo o formalismo que a legislação determina.


O Fundo Monetário Internacional (FMI) e a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento da Europa (OCDE) permitem a inclusão neste conceito dos empréstimos externos conhecidos como intercompany(ies) loans. No caso do FMI, a definição adotada engloba especialmente as noções de participação majoritária do capital votante e de poder de controle.


A reaplicação indica o conjunto de aplicações, no próprio país, de recursos correspondentes ao “principal” remissível ao exterior de uma determinada categoria ou segmento de capitais estrangeiros em outra operação da mesma categoria ou segmento estrangeiro em outra operação da mesma categoria ou segmento (constituindo, portanto, “novo principal”). Os agentes econômicos de mercado vêm empregando o termo “reaplicação” para designar também as transferências de recursos (englobando “principal” e “rendimentos”) de uma modalidade de aplicação para outra, no País, dentro do “segmento” de investimentos em Portfólio.


Convém salientar que tradicionalmente vinha o termo “reaplicação” sendo empregado de forma mais restrita, no sentido de expressar uma nova aplicação, no País, de valores passíveis de remessa ao exterior a título de retorno de capital de investimentos diretos. Nesse caso, a aplicação do ganho de capital configuraria conversão de crédito em investimento.


A expressão retorno de capital designa, tradicionalmente, em termos cambiais,a remessa ao exterior de valor decorrente da alienação de participações estrangeiras em empresas no País sob a forma de investimento direito, ou da redução de capital  para restituição a sócio, ou, ainda, da liquidação de empresa no País, até o limite do montante em moeda estrangeira constante do registro existente, observada, quando cabível, a regra da proporcionalidade, configura ganho de capital em termos cambiais.


Por outro lado, “ganho de capital” tem dupla conotação, uma de ordem cambial e outra para fins tributários, as quais não devem ser confundidas. Em termos estritamente cambiais, expressa, relativamente aos investimentos de capitais estrangeiros, a diferença positiva entre os valores em moeda estrangeira das remessas ao exterior – decorrentes da alienação de participações societárias no País, redução de capital para restituição a sócio ou liquidação de empresa – e o valor em moeda estrangeira do correspondente registro no FIRCE, observada, quando cabível, a regra da proporcionalidade.


Já a conversão de crédito externo (em outras categorias) é, em linhas gerais, o processo de transformação de um crédito detido no País por pessoa física ou jurídica domiciliada no exterior (“crédito externo”), passível de gerar remessa direta de divisas para devedor ao credor à luz do ordenamento jurídico cambial e/ou específico do capital estrangeiro, em outra modalidade de crédito externo ou em investimento direto ou de portfólio. Não se confunde com o reinvestimento  de lucros, nem com a reaplicação de recursos no País.


Pelo que se constata, a regulamentação é de controle e não de desestímulo aos investimentos de capital estrangeiro, posto que não os hostiliza.



O que não há é o dever de disciplinar o capital estrangeiro aos interesses nacionais, submetendo-o a limitações que a ordem jurídica oferece ao poder econômico.

terça-feira, 24 de março de 2015

DIREITO ECONÔMICO: HISTÓRICO – OBRA DE EUGÊNIO ROSA DE ARAÚJO E APLICADO PELO PROFESSOR FELIPE NOGUEIRA NO CURSO DE DIREITO 8º PERÍODO FAMESC- BJI – 1º SEMESTRE / 2015 - VARGAS DIGITADOR

DIREITO ECONÔMICO: HISTÓRICO – OBRA DE EUGÊNIO ROSA DE ARAÚJO E APLICADO PELO PROFESSOR FELIPE NOGUEIRA NO CURSO DE DIREITO 8º PERÍODO FAMESC- BJI – 1º SEMESTRE / 2015 - VARGAS DIGITADOR

CAPÍTULO 5

HISTÓRICO


É possível dizer que o Direito Econômico surge com maior nitidez na Primeira Guerra Mundial. O conflito demonstrou a  necessidade de concentrar todos os esforços da sociedade, não sendo lícito ao Estado desconsiderar a dinâmica das atividades econômicas (produção, distribuição, circulação e consumo) ou as decisões dos agentes econômicos (trabalhadores, consumidores, empresários e Estado), permitindo então o surgimento de minuciosa regulamentação da economia que alterou a tradicional presença episódica do estado como agente interventor no domínio econômico.


Outro fato de relevo foi a crise de 1929 com a quebra da bola de Nova Iorque, gerando níveis altíssimos de desemprego com a brusca e profunda paralisação da economia, cujo efeito recessivo afugentou os agentes econômicos do mercado, exigindo por parte deste a atitude de reimpulsionar as atividades econômicas dispondo sobre moeda, crédito, relações trabalhistas, produção agrícola, concessões administrativas, comércio exterior, criação e funcionamento de bancos e seguradoras através  da incorporação, no ordenamento jurídico, de inúmeras disposições de ordem pública.


Sucedendo a referida crise, o advento da Segunda Guerra Mundial fez com que o Estado lançasse mão de novos meios de captação da poupança popular, do empréstimo compulsório, da emissão de títulos da dívida pública, ao lado de regras impositivas de contingenciamento, estocagem, licenciamento da produção, venda ou comércio exterior, tornando a economia ainda mais disciplinada, é dizer: jurídica.


Diferentemente do estado liberal que limitava-se aos aspectos meramente conjunturais da economia, o novo Direito Econômico surgiu como um conjunto de técnicas jurídicas utilizado pelo Estado na realização de sua política econômica, disciplinando a ação estatal sobre as estruturas do sistema econômico coordenadas num quadro geral denominado plano econômico.


Operou-se, dessa forma, a mudança. O Estado ao qual no sistema capitalista estava atribuída, fundamentalmente, a função de produção do direito e segurança, não se admitindo que interviesse na “ordem natural” da economia, passou para a seguinte fase intervencionista, produzindo um conjunto de normas compreensíveis como uma ordem econômica, onde o direito passou a funcionar como instrumento de implementação de políticas públicas.

É preciso deixar claro que o direito não só harmoniza conflitos e legitima poderes, mas também implementa políticas públicas, evidenciando que o Estado sempre atuou no campo econômico, ainda que o tenha feito, por vezes, no interesse exclusivo do capital.


O surgimento dos monopólios, as crises cíclicas, a exacerbação do conflito x trabalho e a incapacidade de autorregulação dos mercados conduziram o Estado às suas novas atribuições de interventor, aplainando mas não suprimindo as imperfeições do liberalismo econômico.


Diante da flagrante inviabilidade do capitalismo liberal, o Estado passou a desempenhar importante papel de agente regulador da economia, instituindo, por exemplo, o monopólio estatal da emissão de moeda, o exercício do poder de polícia e a ampliação dos serviços públicos.


Desse breve histórico, constata-se que o nascimento do Direito Econômico derivou da superação do liberalismo econômico, onde a regra era a ausência de intervenção estatal, para a intervenção do Estado no domínio econômico, impulsionado por fatos políticos e econômicos os quais fizeram disparar a necessidade de planejamento das atividades econômicas, bem como de seus agentes.


Autonomia do Direito Econômico.


Sabemos que um ramo do direito é autônomo quando se torna possível visualizar um conjunto de normas referentes a uma determinada área institucionalizada da vida social, suscetível de constituir um subconjunto organizado em torno de princípios comuns e técnicas reguladoras.


A Constituição Federal, no art. 24, inciso I, anunciou a competência concorrente entre União, Estados e Distrito Federal para legislar sobre Direito Econômico, sendo lícito afirmar que ao Município, quando o interesse local o exigir, poderá editar normas de intervenção no domínio econômico, bem como suplementar a legislação federal e estadual com base nos arts. 18 e 30, incisos I e II, da Constituição Federal.


Inúmeros foram os autores que se lançaram na tarefa de conceituar o Direito Econômico; todos, no entanto, apontaram para o aspecto macroeconômico e macrojurídico da política econômica viabilizada pela intervenção estatal no campo da economia.


Celso Ribeiro Bastos o define como:

          “ramo do direito que se destina a normatizar as medidas adotadas pela política econômica através de uma ordenação jurídica, é dizer, a normatizar as regras econômicas, bem como a intervenção do estado na economia”.


Para Eros Roberto Grau ele vem a ser:

          “o sistema normativo voltado à ordenação do processo econômico, mediante a regulação, sob o ponto de vista macrojurídico, da atividade econômica, de sorte a definir uma disciplina destinada à efetivação da política econômica estatal”.


Cabral de Moncada anota que: “é o direito público que tem por objetivo o estudo das relações entre os entes públicos e os sujeitos privados, na perspectiva do Estado na vida econômica”.


Para Cristiane Derani ele pode ser entendido como:

          “a normatização da política econômica como meio de dirigir, implementar, organizar e coordenar práticas econômicas, tendo em vista uma finalidade ou várias e procurando compatibilizar fins conflituosos dentro de uma orientação macroeconômica. Em primeiro plano está o funcionamento do todo e não a regulamentação do comportamento individual isolado. Neste sentido é o direito um instrumento utilizado pela política econômica. Porém, não se esgota nesta direção o seu relacionamento com a economia. A plítica econômica é também orientada pelo direito econômico, o qual se revela como seu funcionamento”.


Por fim, excelente é a conceituação de Antonio Carlos Santos, Maria Eduarda Gonçalves e Maria Manuel Leitão Marques:

          “conjunto de normas, princípios e instituições que regem a organização e direção da atividade econômica nas suas diversas manifestações (produção, circulação, distribuição, consumo), impondo limites, condicionando ou incentivando os agentes econômicos ou mesmo alterando, de um ponto de vista estrutural, algumas tendências que resultam do livre funcionamento do mercado. Este conjunto de normas, princípios e instituições de origem pública visaram colmatar as insuficiências ou disfunções do direito privado clássico e constituem o núcleo originário e ainda hoje mais relevante do Direito Econômico”.


O que dever-se-á ter sempre em mente, para a adequada compreensão do Direito Econômico, é que ele tem por objeto as regras jurídicas que disciplinam a intervenção do Estado na economia, não se configurando no direito geral da atividade econômica, mas sim, no direito especial da intervenção estatal, refletindo e dialogando com os demais ramos do direito.


Objeto.

Já ficou explicitado que a missão do Direito Econômico, é a regulamentação da política econômica que, para que não caia no arbítrio ou na frustração de direitos sociais, deve ser juridicamente disciplinada, evitando-se abusos tanto do Poder Público quanto do poder econômico do capital.

Nesta perspectiva é que Eros Grau alude ao objeto do Direito Econômico como sendo:

          “a regulação do processo econômico, através da atuação do Estado nele e sobre ele, desde uma visão macroeconômica, tendo em vista a realização dos objetivos de sua política, sob a inspiração dos ideais de justiça social e desenvolvimento, em condições de mercado administrado”.


Por outro lado, Antonio Carlos Santos et allii define o seu objeto como sendo:


          “o estudo da ordenação (ou regulação) jurídica específica, a organização e direção da atividade econômica pelos poderes públicos e (ou) poderes privados, quando dotados de capacidade de editar ou contribuir para a edição de regras com caráter geral, vinculativas dos agentes econômicos”.


Método.


Esta relação ao modo de atuar do Direito Econômico, esclarece Eros Roberto Grau que ele:


          “apresenta características que o distinguem dos demais ramos do Direito. Seja porque é diferenciado o processo de elaboração das suas normas, construído desde uma visão prospectiva e não retrospectiva – por isso impondo qualificação técnica no seu elaborador; seja por que tem caráter conjuntural as suas normas e, por isso mesmo, reclama-se sejam elas flexíveis e dinâmicas; seja porque o caráter dessas normas é nitidamente instrumental, transformando-as numa ferramenta para a execução de determinados fins – com o que se afirma que o Direito Econômico não apenas concilia interesses, mas dirige e condiciona comportamentos”.


Imagine o Direito Econômico como uma barra de ferro que pode, em razão de sua dutibilidade (caráter de conduzir coisas), passar calor, frio ou mesmo corrente elétrica, dependendo do uso que se necessite dar ao metal e ao fim desejado.


Ordem Jurídica.


É preciso ter em mente que a ordem jurídica implica num complexo de regras e princípios ditados pelo Poder Público, como normas obrigatórias, para que se discipline e se proteja todas as relações e interesses dos cidadãos entre si e entre eles e o próprio Estado, no intuito de manter a própria ordem social e política.

Exprime, assim, o conjunto de regras e princípios que devem ser coativamente observados por todos quantos residam ou habitem o território do Estado. (Plácido e Silva).


Ordem Econômica.


Fixado o conceito de ordem jurídica, importa saber que a ordem econômica constitui-se de um conjunto de regras constitucionais disciplinadoras da atividade econômica. A interpretação, aplicação e execução dos preceitos que a compõem reclamam o diálogo permanente com as demais partes da Constituição, posto que a ordem econômico-financeira é indissociável dos princípios fundamentais da República Federativa e do Estado Democrático de Direito.

Inúmeras são as relações (no campo rico dos fatos da vida) entre as forças econômicas que se desenvolvem pelas regras próprias da economia, sendo certo que tais relações serão moldadas pelas normas constitucionais que vão atuar neste ambiente específico, naquilo que interessar ao Estado.

Considera-se, então, ordem econômica o conjunto de normas de intervenção protetora ou restritiva a atividades econômicas, em busca de certas finalidades e por intermédio de certos meios.


Princípios Constitucionais da Ordem Econômica.


Passaremos a analisar os princípios constitucionais da atividade econômica, os quais, como já esclarecido, não só amoldam o Capítulo da Ordem Econômica, mas servem de verdadeiro facho de luz a iluminar todo o ordenamento constitucional e infraconstitucional em vigor.


Valorização do Trabalho Humano.

O trabalho é o meio, por excelência, de subsistência do ser humano, faz parte da sua personalidade. Valorizar o trabalho implica em prestigiá-lo em detrimento do capital não com ações meramente filantrópicas, mas criando as condições necessárias à garantia do direito de influenciar nas relações e condições de trabalho, através de uma remuneração digna, da proibição do trabalho escravo, do oferecimento de um ambiente de trabalho sadio, sendo certo que a Constituição Federal absorveu este postulado em vários dispositivos, dentre os quais devem ser visitados para uma leitura mais acurada os arts. 1º, IV, 3º, 5º, XIII e XCVII, “C”, 6º, 7º, 170 caput, 173 § 1º, II, 186, IV, 187, VIII, 193, 203, III, 218, § 3º, 227 caput e § 1º, II.


Para Ricardo Antônio Lucas Camargo, deve ser considerado:


          “o descarte de interpretações de disposições constitucionais que menoscabem as formas de ganho com o trabalho, isto é, que valorizem o não trabalho, já que isto vale por desvalorizar o trabalho, dentro do princípio lógico segundo o qual a afirmação de uma proposição é a negação daquela que é oposta”.


Verifica-se que a Constituição tratou de ampliar o espaço e a importância do trabalho, considerando este como Direito Fundamental e não como mera caridade.


Livre Iniciativa.


Observadas as limitações que a própria Constituição oferece, constitui-se em fundamento de nossa ordem econômica a possibilidade concedida a todos de se lançarem no desempenho de qualquer atividade econômica.

Da leitura dos arts. 1º, IV, 5º, XIII, 170 caput, 199 e 209 da Constituição Federal, apenas para exemplificar, deduz-se a possibilidade, ampla em nosso ordenamento, do exercício de qualquer atividade econômica lícita ou que seja permitida por lei e autorizada pela autoridade competente (quando a autorização for exigida por lei).


É certo que o liberalismo defende a total liberdade do indivíduo para escolher e orientar sua ação econômica, independentemente da ação de grupos sociais ou Estado. Porem, nas condições atuais do capitalismo globalizado e neoliberal, existe a necessidade de defender o sistema das crises cíclicas, levando o Estado a impor limites à livre iniciativa, seja atuando diretamente no processo produtivo, seja agindo como elemento orientador de investimentos e controlador de desajustes sociais.


Luiz Roberto Barroso discorre sobre o tema afirmando que:


          “o princípio da livre iniciativa, do ponto de vista jurídico, pode ser decomposto em alguns elementos que lhe dão conteúdo, todos eles devidamente desdobrados no texto constitucional. Pressupõe, ele, em primeiro lutar, a existência de propriedade privada, isto é, de apropriação particular dos bens e dos meios de produção (CRFB/88, ARTS. 5º, XXII e 170, III). De parte isto, integra, igualmente, o núcleo da ideia de livre iniciativa a liberdade de empresa, conceito materializado no parágrafo único do art. 170: ‘É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização dos órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei’. Em terceiro lugar situa-se a liberdade de lucro, lastro para a faculdade de o empreendedor estabelecer os seus preços, que há de ser determinados, em princípio, pelo mercado, por meio de ‘livre concorrência’, locução abrigada no art. 170, IV. E, por fim, é da essência do regime da livre iniciativa a liberdade de contratar, decorrência lógica do princípio da legalidade, fundamento das demais liberdades, pelo qual ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei (CRFB/88, art. 5º, II)”.


Ao empreendedor, dessa forma, fica garantida a liberdade de comércio e indústria, salvo restrição estatal em virtude de lei, criando e explorando qualquer atividade econômica a título privado.


Não pode ser dispensada, a título de proteção da livre iniciativa, a necessária outorga de autorização, concessão ou permissão de entidade estatal, para a exploração por empresa particular, por exemplo, dos serviços públicos previstos no art. 21, XII, “e”, da CF/88.


Existência Digna.


Em um de seus epigramas Shiller dizia: “chega de falar no assunto: dai-lhe de comer e onde morar; quando tiverdes coberto a nudez, a dignidade aparecerá sozinha.”


A dignidade da pessoa humana já foi enunciada como fundamento da República no art. 3º, III, sendo certo que a existência digna aparece novamente na ordem econômica como direito individual protetivo em relação ao Estado e aos demais indivíduos, estabelecendo um dever dundamental de tratamento igualitário.


Alexandre de Moraes esclarece que:


          “a dignidade da pessoa humana é um poder espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se em um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que apenas excepcionalmente possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos”.


Importa reconhecer, dessa forma, que a atividade econômica, em todas as suas manifestações, deverá observar a dignidade da pessoa humana por constituir-se para além de princípio da ordem econômica, princípio fundamental da República.

É imprescindível que seja garantido um mínimo existencial para a população como saúde, educação, habitação, empregabilidade e segurança, sem o que estaremos num eterno estado de barbárie comparável à idade da pedra em que vivem, por exemplo, as sociedades subsaarianas na África.


Justiça Social.


Sabe-se que o Brasil é um dos países com pior distribuição de renda no planeta (palavras ditas por Eugênio Rosa de Araújo, com as quais eu não concordo absolutamente – grifo de Vargas Digitador), ficando atrás de países como a Suazilândia e, grosso modo, pode-se afirmar que os 10% mais pobres auferem 1% da renda nacional, ao passo que os 10% mais “ricos” (incluindo a classe média que come três vezes ao dia) auferem 50% da renda nacional.

A erradicação da pobreza em nosso país não se dará apenas a partir da transferência de renda para os mais pobres, por meio de programas de renda mínima, microcrédito ou reforma agrária. É preciso expandir ao máximo as políticas de educação, saúde, habitação e saneamento básico, já que a ausência de justiça social não representa apenas insuficiência de renda, mas, principalmente, a falta de acesso aos diversos serviços públicos. (Palavras ditas por Eugênio Rosa de Araújo, com as quais eu não concordo absolutamente – grifo de Vargas Digitador).


É urgente, portanto, superar o atual modelo de quase total exclusão social, evoluindo-se para um estado de bem-estar social e melhor distribuição de riquezas tomando-se como pauta mínima os arts. 6º e 7º da Constituição Federal. Não há pós-modernidade para o homem das cavernas que passa fome debaixo do viaduto. (Remanescentes de governos pré/1990 – grifo de Vargas Digitador).


Pode-se dizer, com Américo Luis Martins da Silva, que:


          “justiça social tem por finalidade a proteção aos mais pobres e aos desamparados, mediante a adoção de critérios que favoreçam uma repartição mais equilibrada das riquezas. Pela Justiça social ressalta a necessidade de, com medidas prontas e eficazes, vir em auxílio dos homens das classes inferiores, atendendo aqueles que estão, na maior parte, numa situação de infortúnio e de miséria imerecida. Como disse João Paulo II, é estrito dever de justiça e verdade impedir que as necessidades humanas fundamentais permaneçam insatisfeitas e que pereçam os homens por elas oprimidos. Além disso, é necessário que esses homens carentes sejam ajudados a adquirir conhecimentos, a entrar no circulo de relações, a desenvolver suas aptidões para melhor valorizar as suas capacidades e recursos”.


Soberania Nacional.


A soberania é um dos fundamentos da República Federativa e do Estado Democrático de Direito (art. 1, I), sendo que o que se trata no inciso I do art. 170 da Constituição Federal é a soberania nacional econômica, visando estabelecer, no plano externo, a independência, a coordenação e a não submissão em relação à economia e tecnologia estrangeiras.


José Afonso da Silva avisa que:


          “O constituinte de 1988 não rompeu com o sistema capitalista, mas quis que se formasse um capitalismo nacional autônomo, isto é, não dependente. Com isso, a Constituição criou as condições jurídicas fundamentais para a adoção do desenvolvimento autocentrado, nacional e popular, que, não sendo sinônimo de isolamento ou autarquização econômica, possibilita marchar para um sistema econômico desenvolvido, em que a burguesia local e seu Estado tenham o domínio da reprodução da força de trabalho, da centralização do excedente da produção, do mercado e da capacidade de competir no mercado mundial dos recursos naturais e, enfim, da tecnologia”.


Muitas vezes se tem dito que nossa soberania econômica foi posta de lado em razão das exigências de política fiscal, gastos públicos e cortes salariais exigidos pelo FMI para concessão de empréstimos para pagamento de juros da dívida externa.


Tais argumentos têm muito de viés ideológico, posto que o recurso ao FMI nunca foi obrigatório, mas facultativo e bem se sabe que a política de austeridade fiscal de gastos públicos é uma necessidade para o cumprimento do princípio da eficiência insculpido no art. 37 da Constituição Federal.

Propriedade Privada.


Imagine uma praia deserta onde alguém tivesse jogado fora uma tesoura e um par de sapatos novos.


Tais bens não são propriedade de ninguém e, no entanto, têm utilidade, podendo satisfazer uma eventual necessidade ou suprir uma carência, pois se constituem em bens econômicos: a tesoura como bem de capital, pode servir para a confecção de roupas, e o par de sapatos – bem de consumo – servirá para eventual uso de quem dele se aproprie.


A propriedade, como se vê, é um fato econômico e designa a qualidade que é inseparável de uma coisa ou que a ela pertence em caráter permanente; é possível, então, dizer, no caso da tesoura e dos sapatos, que estas propriedades não têm dono, já que não pertencem a exclusivamente ninguém, ou que, não tendo dono, não são propriedade de ninguém.


Conclui-se, por conseguinte, que propriedade e direito de propriedade não se confunde. É na qualidade de direito subjetivo que a propriedade interessa ao jurista, considerado como poder do proprietário sobre a coisa, tornando-se um dos direitos fundamentais da pessoa humana.


É o ordenamento jurídico, portanto, que determina a amplitude e o desenho básico das diversas propriedades; bens móveis, imóveis, patentes, direitos autorais, marcas, herança, servidões, garantias reais etc.


Assim, o direito de propriedade tem seus contornos esboçados na Constituição Federal e na legislação infraconstitucional e corresponde ao poder atribuído pelo Estado a alguém para usar, gozar, dispor e reivindicar das coisas. Esse poder conferido aos indivíduos pela ordem constitucional encontra-se no Texto Magno, fonte primária e imediata de todo o ordenamento jurídico.


A Constituição Federal garante, assim, no art. 5º, XXII, o direito de propriedade, referindo-se a ele ainda nos incisos XXIV, XXV, XXVI, XXVII, XXVIII “a” e “b”, XXIX, XXX, XLV, XLVI e LIV.


Assim, no dizer de Alexandre de Moraes:


          “Toda pessoa, física ou jurídica, tem direito à propriedade, podendo, o ordenamento jurídico, estabelecer suas modalidades de aquisição, perda, uso e limites. O direito de propriedade, constitucionalmente consagrado, garante que dela ninguém será privado arbitrariamente, pois somente a necessidade ou utilidade pública ou o interesse social permitirão a desapropriação. Dessa forma, a Constituição Federal adotou a moderna concepção de direito de propriedade, pois, ao mesmo tempo em que o consagrou como direito fundamental, deixou de caracterizá-lo como incondicional e absoluto”.


No campo da legislação infraconstitucional, o novo Código Civil (Lei n. 10.406/2002) tratou do tema no Livro III – Direito das Coisas – nos art. 1.196 a 1.510.


Função Social da Propriedade.


Estabelecida a proteção do direito de propriedade, consistente no direito de usar, dispor e reivindicar a coisa (art. 1.228 do CCB/2002), terá ela de atender a sua função social, conforme o mandamento dos arts. 5º, XXIII, art. 170, III, 182, § 2º e 186 da Constituição Federal, o que significa dizer que tais mandamentos constitucionais impõem ao proprietário o uso da propriedade em prol do interesse coletivo, da segurança e bem-estar dos cidadãos, dela não fazendo uso nocivo, ou que degrade o meio ambiente e, ainda, respeitando as disposições que regulam as relações de trabalho.


Para Alexandre de Moraes, a referência constitucional à função social como elemento estrutural da definição do direito à propriedade privada e da limitação legal de seu conteúdo demonstra a substituição de uma concepção abstrata de âmbito meramente subjetivo de livre domínio e disposição da propriedade por uma concepção social de propriedade privada, reforçada pela existência de um conjunto de obrigações para com os interesses da coletividade, visando também à finalidade ou utilidade social que cada categoria de bens objeto de domínio deve cumprir.


Há, portanto, uma limitação ao direito de propriedade, visando coibir abusos e evitando seu exercício em detrimento do bem-estar da sociedade.


Dessa forma, a propriedade desempenha sua função econômico-social, cujo direito deve, ao ser exercido, conjugar os interesses do proprietário, da sociedade e do Estado, afastando seu uso egoístico e o uso abusivo do domínio.


Livre Concorrência.


Trata-se de desdobramento do princípio da livre iniciativa, complementando-o com sua ponderação e, para garanti-la o legislador constituinte, no § 4º do art. 174, dispôs que a lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros.


Note   que a Constituição Federal não condena o exercício do poder econômico; apenas seu abuso suscita a intervenção estatal, coibindo os excessos tais como os cartéis e monopólios de fato que venham a turbar o livre funcionamento das estruturas do mercado.


Fazendo-se uma imagem para a concreta visualização da conjugação da livre iniciativa com a livre concorrência, podemos imaginar, por exemplo, uma corrida como a de São Silvestre, onde qualquer pessoa pode se inscrever para correr: velhos, adolescentes, paraplégicos e as grandes vedetes internacionais. A livre iniciativa é a possibilidade de todos se inscreverem para a corrida, ao passo que as regras estipuladas para as filas, a proibição de atropelo de uma faixa de atletas por outra, a prestação de serviço médico para os que caem pelo caminho, se constituem nas regras limitadoras da organização do evento para que a corrida não se transforme em um massacre.


Nesse sentido a Lei n. 8.884/94, que dispõe sobre o Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE, tratou da prevenção e repressão às infrações contra a ordem econômica, orientada pelos ditames constitucionais da liberdade de iniciativa e da livre concorrência, protegendo a própria estruturação do mercado e seu livre funcionamento, bem como os empresários vitimados por práticas lesivas, consumidores e trabalhadores.


Defesa do Consumidor.


Realmente, a Constituição Federal cuidou de envolver o consumidor em cuidadosa e eficiente proteção, determinando imperativamente ao Estado a promoção de sua defesa (art. 5º, XXXII, da CRFB/88), possibilitando a competência legislativa concorrente sobre Direito Econômico (art. 24 da CRFB/88), produção e consumo (art. 21, V, CRFB/88), a criação de juizados especiais (arts. 21, X e 98 parágrafo único da CRFB/88), incluindo a defesa do consumidor como princípio de ordem econômica (art. 170, V, da CRFB/88), oferecimento de serviço público que observe os direitos dos usuários  com a manutenção de serviço adequado (art. 175, parágrafo único, II e III, CRFB/88) e a obrigatoriedade, hoje exaurida, de elaboração do Código de Defesa do Consumidor (art. 48 do ADCT da CRFB/88).


Nesse giro, vê-se que o legislador constituinte, ao inserir a proteção do consumidor no campo dos direitos individuais, demonstrou grave preocupação com sua proteção, não só através de princípios conformadores, mas indo além, impondo a obrigação de regrar sua proteção através de um código, bem como a criação de órgãos judiciários vocacionados a esse tipo de tutela.


A Lei n. 8.078/90 – Código de Defesa do Consumidor – no art. 2º define consumidor como sendo “toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final” ao passo que a figura do fornecedor é descrita como “toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviço”. Define ainda serviço como “qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista”.


Em síntese, a proteção constitucional se volta para a pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza um bem, ou ainda, um serviço como consumidor final, é dizer, sem que tais bens ou serviços sirvam de meio ou insumo para atividades profissionais previstas no art. 2º da Lei n. 8.078/90, quando então, incidirá o Direito Civil ou Comercial, ordenações voltadas à regulamentação das relações entre iguais, ao contrário do Direito Consumerista onde a tônica é o tratamento entre desiguais.


Defesa do Meio Ambiente.


Como princípio da ordem econômica, a defesa do meio ambiente implica dizer que qualquer atividade econômica, seja ela de cunho industrial, comercial, de serviços ou mesmo as atividades informais desamparadas pelo contrato formal de trabalho, não poderá redundar em depredação e degradação do meio ambiente, servindo este princípio como dique para todas as atividades econômicas, formais e informais, posto que, como salienta José Afonso da Silva:


          “O conceito de meio ambiente há de ser, pois, globalizante, abrangente de toda a natureza original e artificial, bem como os bens culturais correlatos, compreendendo, portando, o solo, a água, o ar, a flora, as belezas naturais, o patrimônio histórico, artístico, paisagístico e arqueológico”.


Conceituou a Lei n. 6.938/81 o meio ambiente em seu art. 3º como “conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”, bem como persegue, através dos arts. 1º e 4º, a compatibilização do desenvolvimento econômico-social com a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico, redundando na promoção do chamado desenvolvimento sustentável que consiste na exploração equilibrada dos recursos naturais, nos limites da satisfação das necessidades e do bem-estar à presente geração, assim como de sua conservação no interesse das gerações futuras.


Conforme se pode perceber, atividade econômica e meio-ambiente deve seguir de mãos dadas e, como bem salientou Cristiane Derani:


          “Isto faz com que as normas do direito econômico e ambiental tenham na política econômica uma fonte fundamental. A política econômica trabalha necessariamente com a coordenação da atividade de mercado, com a concorrência, com a prestação de serviços do Estado. Ela abraça também questões de caráter ambiental, tais como: reaproveitamento de lixo, exigências de equipamento industrial para uma produção limpa, aproveitamento de recursos naturais, o quanto de reserva natural é desejável e qual seu regime social”.


O sentido limitativo da ordem econômica pela proteção ao meio ambiente conta, ainda, com a eficácia normativa do art. 225, que contém, pontuadamente, o regime jurídico constitucional do meio ambiente, dando conteúdo específico ao inciso V do art. 170 da CRFB/88, devendo naquele dispositivo procurar-se o fundamento constitucional da proteção ao meio ambiente e, neste, o fundamento constitucional de que toda atividade econômica se submete à sua preservação, num constante diálogo e interação harmônica.


O texto constitucional permite a diferenciação do tratamento jurídico de produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação, em vista do impacto que possam causar no meio-ambiente. Poderá a lei, por exemplo, diante do impacto ambiental detectado nas plantações de soja transgênica fazer exigências sanitárias e outras mais rigorosas do que em relação à mesma cultura desenvolvida sem as sementes transgênicas...


Redução das Desigualdades Regionais e Sociais.


Em um país de dimensões continentais como o Brasil, inserido em contexto socioeconômico e geográfico de país subdesenvolvido, por vezes pré-histórico, com graves distorções de distribuição de renda e diferenças climáticas e culturais significativas, importante foi a iniciativa do constituinte originário em dotar o texto constitucional de mecanismos de equalização de desigualdades regionais impedindo a manutenção de regiões em flagrante desnível em relação a outras do país, permitindo políticas públicas orientadas para um processo de desiconomia seletiva, isto é, conferindo tratamento diferenciado a determinadas regiões ou determinadas atividades econômicas como meio de promover o desenvolvimento o mais equilibrado possível.


Nosso texto constitucional, além desta passagem, possui dispositivos que visam à diminuição das desigualdades sociais através de mecanismos fiscais e financeiros, a teor dos arts. 43, 151, I, 152, 165 § 7º e 192, caput e VII, aos quais nos reportamos, recomendando a leitura atenta e sistemática, relacionando-os entre si para a compreensão do por quê muitas vezes certos benefícios fiscais são oferecidos em determinadas regiões ou para determinadas atividades econômicas.


Busca do Pleno Emprego.

Critica-se muito este dispositivo constitucional que traz como princípio da ordem econômica a busca do pleno emprego, por ser este objetivo inalcançável na ordem econômica capitalista globalizada e neoliberal.

Ocorre, no entanto, que o referido princípio tem caráter de norma programática, contendo, no mínimo, eficácia negativa no sentido de impedir a adoção, por parte do Poder Público, de políticas econômicas e salariais recessivas e geradoras de desemprego e subemprego (verdadeira praga em nossa economia) ou que desestimulem a ocorrência de quaisquer ocupações lícitas, bem como, impõe ao setor privado o respeito aos direitos sociais (art. 6º da CRFB/88) e trabalhistas (art. 7º da CRFB/88).


No campo específico da atividade econômica, a busca do pleno emprego conjuga-se com a função social da propriedade e, no campo dos direitos sociais, desestimula a despedida arbitrária ou sem justa causa (art. 7º da CRFB/88), permite a redução da jornada de trabalho mediante acordo ou convenção coletiva, como forma de manutenção dos postos de trabalho (art. 7º, XIII, da CRFB/88), proteção em face da automação (art. 7º da CRFB/88), participação dos trabalhadores nos colegiados dos órgãos públicos (art. 10 da CRFB/88), e a eleição de representantes dos trabalhadores nas empresas com mais de duzentos empregados (art. 11 da CRFB/88).


Tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte.


Outros seres desprotegidos lembrados no Capítulo da Ordem Econômica foram a pequena e a microempresa.


O art. 170, no seu inciso IX, aponta para um tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte, princípio retomado com maior ênfase no art. 179, segundo o qual a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios dispensarão às microempresas tratamento jurídico diferenciado, visando incentivá-las pela simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei.


Conjuga-se o tratamento para microempresas e empresas de pequeno porte com os princípios da valorização do trabalho e da busca pelo emprego, tendo em vista que, em inúmeros casos, as microempresas constituem-se apenas no meio pelo qual, por exemplo, costureiras, sapateiros, doceiras, perueiros e uma infinidade de cidadãos exercem pequenas atividades de manufatura ou serviços, constituindo um fator de enorme importância para a renda nacional.


Para a definição de pequena ou de microempresa, a lei poderá conjugar critérios regionais (norte, sul, sudeste, centro-oeste e nordeste), populacionais (empresas situadas em cidades de baixa, média ou alta densidade demográfica), setoriais (comércio, indústria e serviços) ou, ainda, faturamento, permitindo conciliar o favorecimento da pequena empresa com o combate às desigualdades sociais e regionais.


No campo da legislação infraconstitucional, a Lei Complementar n. 123, de 14/12/06, regulamentou o dispositivo do que se tem denominado de estatuto da Microempresa, bem assim o novo Código Civil, no seu art. 970, afirma que “A lei assegurará tratamento favorecido, diferenciado e simplificado ao empresário rural e ao pequeno empresário, quanto à inscrição e aos efeitos daí decorrentes”.


Livre Exercício de qualquer atividade, salvo autorização exigida em lei.


Em primeiro lugar é preciso distinguir a hipótese do art. 5º, XIII, da Constituição, que trata do livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer, com a presente hipótese que diz respeito à liberdade de iniciativa e início de qualquer atividade econômica, salvo se dita atividade estiver submetida, por lei, a algum tipo de outorga por parte do Poder Público em decorrência do poder de polícia.


No primeiro caso, trata-se de dispositivo que cuida de situações individuais, onde o indivíduo, caso queira exercer profissão juridicamente disciplinada (medicina, advocacia, arquitetura, contabilidade etc), deverá preencher os requisitos legais para que não exerça a profissão de forma irregular, submetendo-se, nos casos supra, à fiscalização inerente ao poder de polícia dos respectivos conselhos regionais.


No caso de atividade econômica, o empresário pode optar por lançar-se à atividade que suponha algum tipo de outorga por parte dos órgãos públicos (saúde, educação, bancária, previdência) sem que tenha, necessariamente, a qualificação para atuar especificamente na atividade explorada, ou até mesmo no caso em que isso seja desnecessário, como, por exemplo, o grande acionista de instituição financeira ou o cotista de grande colégio ou universidade.



Assim, no caso em comento, o Estado exercerá a denominada polícia administrativa, assim definida por Celso Antonio Bandeira de Mello como sendo “a atividade da Administração Pública, expressa em atos normativos ou concretos, de condicionar, com fundamento em sua supremacia geral e na forma da lei, a liberdade e propriedade dos indivíduos, mediante a ação ora fiscalizadora, ora preventiva, ora repressiva, impondo coercitivamente aos particulares em dever de abstenção (“non facere”) a fim de conformar-lhes os comportamentos aos interesses sociais no sistema normativo”.