quinta-feira, 8 de agosto de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 444, 445, 446 - Dos Vícios Redibitórios – VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 444, 445, 446
- Dos Vícios Redibitórios
 – VARGAS, Paulo S. R.

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título V – DOS CONTRATOS EM GERAL
 (art. 421 a 480) Capítulo I – Disposições Gerais –
Seção V – Dos Vícios Redibitórios
- vargasdigitador.blogspot.com

Art. 444. A responsabilidade do alienante subsiste ainda que a coisa pereça em poder do alienatário, se perecer por vício oculto, já existente ao tempo da tradição.

No pensar de Rosenvald, quando estudamos as obrigações de dar no Código Civil, aprendemos que, no momento da tradição da coisa, todos os riscos são transferidos do alienante para o adquirente (CC, 492). É o brocardo res perito domino – a coisa perece para o seu dono.

Todavia, nas hipóteses de evicção e vício redibitório, remanesce a responsabilidade do alienante, justamente pelo fato de o vício ser preexistente à entrega da posse – apesar de sua constatação ocorrer em momento posterior.

Seria o caso de alguém que adquire um veículo em boas condições aparentes e, alguns dias pós, surge um grave problema hidráulico, sendo detectada a sua anterioridade em relação ao momento da alienação.

Certamente, incumbe ao adquirente o ônus probatório da anterioridade do vício, sem nenhuma necessidade de se indagar sobre eventual culpa do alienante. Porém, caso o alienante tencione acrescentar ao seu pleito as perdas e danos (CC, 443), comprovará também a má-fé do adquirente, pois, como o visto, não se cogita aqui de responsabilidade objetiva.

Lembre-se que nas relações de consumo é factível a inversão do ônus da prova (art. 6º, VIII), com facilitação da defesa do consumidor diante dos vícios do produto e do serviço, condicionada à manifestação do magistrado sobre os requisitos da verossimilhança da alegação ou da hipossuficiência do consumidor. Será o óbice técnico da demonstração do nexo causal entre o vício e a sua anterioridade, que propiciará a inversão do ônus da prova, em detrimento do fornecedor (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 513 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 07/08/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo parecer de Ricardo Fiuza, a responsabilidade do alienante subsiste quando, já em poder do adquirente, a coisa alienada perece em virtude do vício oculto, desde que este preexista à tradição da coisa.

Ao adquirente apenas cabe exercitar a ação redibitória, diante do perecimento da coisa em decorrência do vício redibitório, não tendo lugar, por óbvio, a aplicação do art. 442. O alienante deverá restituir o que recebeu (valor do preço), acrescido das despesas contratuais, respondendo, ainda, por perdas e danos, caso verificada a prévia ciência do defeito oculto (art. 443) (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 239, apud Maria Helena Diniz, Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 07/08/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No entendimento de Marco Túlio de Carvalho Rocha, a perda da coisa após a tradição extingue a pretensão do adquirente em razão de vícios redibitórios. Se, todavia, a perda da coisa ocorrer em razão do vício existente no momento da tradição, a responsabilidade do alienante por vícios redibitórios permanece, devendo-se observar, na sua quantificação, o disposto no artigo anterior.

O alienante não responde: a) se o adquirente tiver renunciado à garantia. A cláusula de exclusão da responsabilidade por dolo é nula; b) se a coisa perecer por caso fortuito, força maior ou por culpa do adquirente (Op. cit., loc., cit.) (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 07.08.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 445. O adquirente decai do direito de obter a redibição ou abatimento no preço no prazo de trinta dias se a coisa for móvel, e de um ano se for imóvel, contato da entrega efetiva; se já estava na posse, o prazo conta-0se da alienação, reduzido à metade.

§ 1º. Quando o vício, por sua natureza, só puder ser conhecido mais tarde, o prazo contar-se-á do momento em que dele tiver ciência, até o prazo máximo de centro e oitenta dias, em se tratando de bens móveis; e de um ano, para os imóveis.

§ 2º. Tratando-se de venda de animais, os prazos de garantia por vícios ocultos serão os estabelecidos em lei especial, ou, na falta desta, pelos usos locais, aplicando-se o disposto no parágrafo antecedente se não houver regras disciplinando a matéria.

No Código Civil de 1916, lembra Rosenvald, os prazos decadenciais para invocação de vício redibitório eram excessivamente econômicos. Contavam-se quinze dias para o exercício do direito potestativo de redibição ou abatimento do preço na aquisição de coisas móveis e seis meses para os imóveis, considerando-se os prazos a partir do momento da tradição.

Agora, o artigo em comento amplia os ditos prazos decadenciais para trinta dias, tratando-se de coisas móveis, e de um ano se for bem imóvel. O Código Civil corretamente afasta o termo inicial como o da tradição – somente aplicável aos bens móveis -, substituindo-se pelo momento da entrega efetiva da coisa, seja o bem móvel, seja imóvel. Vale dizer que, mesmo que o adquirente de um terreno ainda não tenha efetuado o registro e se convertido em proprietário (CC, 1.245), já estará em curso o prazo extintivo do direito desde o momento da transmissão da posse.

Em caráter inovador, o § 1º do art. 445 estabelece uma contagem de prazo decadencial distinta daquela sugerida pelo caput. O legislador adota um conceito jurídico indeterminado – “vício que por sua natureza só puder ser reconhecido mais tarde” – para estender o termo inicial para o momento em que o adquirente foi cientificado do vício, portanto em época posterior à entrega efetiva do bem.

Como qualquer conceito jurídico indeterminado, os contornos desses vícios serão delineados pelo magistrado na concretude do caso, diante das peculiaridades da situação e, é claro, da relação entre o vício e o tráfego jurídico habitual relativo àquele produto.

Destarte, no momento do conhecimento do vício se inicia a contagem do prazo para o exercício das ações edilícias, sendo de seis meses para coisas móveis e um ano para imóveis. De certa forma, provar o momento da detecção do vício é uma tarefa árdua para o adquirente. Todavia, propicia maior tutela a ele, eis que muitas vezes os vícios só se manifestam em determinadas épocas. Basta supor a situação daquele que adquire um imóvel de um particular (relação privada) no inverno e apenas observa as infiltrações no verão, quando as chuvas evidenciam os vícios ocultos.

Enfim, cremos que o Código Civil concebeu dois modelos de vícios redibitórios, que deverão coexistir dentro das peculiaridades referidas.

Há ainda uma regra especial para os vícios decorrentes de negócio jurídico de venda de animais. O § 2º determina que incumbirá ao legislador subalterno definir os prazos decadenciais para a reclamação dos vícios em tais relações. Enquanto a lei especial não for editada, o parâmetro do magistrado será o costume na região em que se efetivou o contrato. O legislador confia nos usos locais das grandes praças de venda de animais, eis que um dos paradigmas do Código Civil é a concretude, sendo necessário alcançar a pessoa em seu meio e tempo, a fim de que a decisão possa ser verdadeiramente justa. Mas, caso não se identifique um padrão de prazos na região em que houve o contrato, o Código determina a adoção da regra do § 1º, do mesmo artigo (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 515 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 07/08/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

No histórico apresentado por Ricardo Fiuza, consta que o texto original do anteprojeto previa o prazo de seis meses para a redibição ou abatimento do preço do imóvel e de quinze dias se fosse móvel. Emenda apresentada pelo Deputado Juarez Bernardes ampliou o prazo, com a seguinte justificativa: “A nós se afigura sobremaneira o prazo de seis meses estipulados para que o adquirente de bem imóvel obtenha a redibição ou o abatimento no preço da coisa adquirida eivada de vício. Certas propriedades rurais exigem dos compradores muito tempo para que sejam conhecidas. As divisas, as servidões, o regime de água, a qualidade da terra, o revestimento desta impõem averiguações imprescindíveis para cujo conhecimento o prazo de seis meses é insuficiente. Daí a necessidade de sua duplicação, que objetiva a tranquilidade do comprador, e intenta prevenir o desfazimento de aquisições de bens imóveis em desacordo com as finalidades em vista”.

Aprovada a emenda pela Câmara, foi o dispositivo remetido ao Senado com a seguinte redação: “Art. 445. O adquirente decai do direito de obter a redibição ou abatimento no preço no prazo de trinta dias se a coisa for móvel, e de um ano se for imóvel, contados da entrega efetiva. Se já estava na posse, o prazo conta-se da alienação, reduzindo ao meio. § P Quando o vício, por sua natureza, só puder ser conhecido mais tarde, o prazo contar-se-á do momento em que do mesmo se tiver ciência, até o prazo máximo de seis meses em se tratando de bens móveis, e de um ano para os imóveis.

A redação atual do dispositivo, proposta pelo Senado, resulta de duas emendas de autoria dos Senadores Milton Cabra e Marcelo Miranda acolhidas apenas parcialmente pelo Senador Josaphat Marinho, sob a forma de subemenda. Comparando-a com a redação atual, percebe-se que houve melhoramento de linguagem do texto. As justificativas do Senador Josaphat Marinho, integralmente acolhidas pelo Relator Ricardo Fiuza, foram as seguintes:

“O art. 445 regula como ‘o adquirente decai do direito de obter a redibição ou abatimento no preço no prazo de trinta dias se a coisa for móvel, e de um ano se for imóvel, contados da entrega efetiva. Se a estava na posse, o prazo conta-se da alienação, reduzido ao meio’. A emenda n. 43 altera a redação do artigo e seus §*: estabelece o prazo em ‘seis meses’ se a coisa for móvel, e na hipótese de o adquirente já estar na posse, alude a prazo ‘reduzido à metade’, em vez de ‘reduzido ao meio’, como diz o Projeto. Considera o § 1 ~ unificado no caput e redige dessa forma um ‘Parágrafo único. Em se tratando de venda de animais, os prazos de garantia por vícios ocultos serão os estabelecidos em lei especial, ou, na falta desta, pelos usos locais’. A esse parágrafo único é preferível o § 2 ~ do projeto por ser mais amplo, ao prever, ainda: ‘aplicando-se o disposto no parágrafo anterior, se não houver regra disciplinando a matéria’. Desse modo, a emenda, em conjunto, improcede. E correto, porém, no capta, dizer-se, quanto ao prazo, ‘reduzido à metade’, e não ‘reduzido ao meio’, segundo consta do Projeto. A emenda, portanto, é parcialmente aceita, para que se diga, na parte final do art. 445, capta, ‘reduzido à metade’, e não ‘reduzido ao meio’. A emenda n. 42 objeta, quanto ao § 1 ~, que ‘mesmo’ não é pronome, e o substitui por ‘dele’. A substituição atende a melhor linguagem, e a emenda merece aprovação”.

Não há artigo correspondente no Código Civil de 1916.

Então, na Doutrina apresentada por Ricardo Fiuza (Relator), tem-se que o dispositivo certifica tratar-se de prazo decadencial. Os prazos resultam dobrados em relação ao que dispõe o art. 178, § 2º, do CC de 1916 e para os fins previstos no Art. 443 do NCC.

O termo a quo para o cômputo do prazo é o da tradição da coisa, excetuando-se, todavia, quando o vício, por sua natureza, só puder ser conhecido mais tarde, apurando-se o prazo, nesse caso, a pedir da ciência do vício oculto. Nas relações de consumo, prevalece a lei especial sobre as disposições gerais do CC, de tal forma que os prazos são diferenciados nos termos do Art. 26 do CDC, permitindo-se, inclusive, causa suspensiva (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 240, apud Maria Helena Diniz, Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 07/08/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Para o entendimento de Marco Túlio de Carvalho Rocha, tem-se os prazos para o exercício do direito de ação por vício redibitório a) bens moveis: 30 dias; b) bens imóveis: Um ano; c) vendas de animais: legislação especial, usos locais ou 30 dias.

Os prazos contam-se da “entrega efetiva” da coisa (art. 445, caput, 1ª parte), salvo se: a) o adquirente já estivesse na posse da coisa: contam-se pela metade, a partir da alienação (art. 445, caput, 2ª parte); b) por sua natureza, o vício somente puder ser conhecido mais tarde (CC, 445, § 1º): 1) Móveis: 180 dias a partir da ciência do vício; 2) Imóveis: 1 ano a partir da ciência do vício; c) houver cláusula de garantia (CC, 446): o prazo será de 30 dias após o término da garantia.

No entendimento de Marco Túlio de Carvalho Rocha, ainda há os vícios da coisa nas relações de consumo, que além das opções previstas no Código Civil, o consumidor pode: a) reclamar coisa da mesma quantidade e qualidade (CDC, 18, § 1º, I); b) exigir a reexecução do serviço (CDC, 20, I).

Nas relações de consumo o CDC estabelece os seguintes prazos para o consumidor reclamar por defeitos do produto ou do serviço: a) Vícios aparentes: 90 dias a contar do recebimento da coisa (CDC, 26, II). O prazo decadencial, mas pode ser obstado pela reclamação (CDC, 26, § 2º); b) Vícios ocultos: 90 dias a contar do momento em que fica evidenciado o defeito (CDC, 26, § 3º). (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 07.08.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 446. Não correrão os prazos do artigo antecedente na constância de cláusula de garantia; mas o adquirente deve denunciar o defeito ao alienante nos trinta dias seguintes ao seu descobrimento, sob pena de decadência.

Na esteira de Nelson Rosenvald, outra substancial novidade é a possibilidade de imprimir efeito impeditivo ao início do prazo decadencial na fluência de cláusula de garantia acertada entre as partes. O dies a quo da contagem para o exercício dos prazos referidos no art. 445 será somente aquele em que cessar a garantia contratual. Portanto, se A vende uma geladeira a B e lhe concede garantia por dois anos, a partir desse instante fluirá o prazo de trinta dias para o exercício das ações edilícias.

Duas observações avultam. A primeira é que, apesar de em princípio soar inusitado o óbice legal, o próprio CC, 207 permite que uma norma estabeleça impedimento ou suspensão ao curso da decadência – aliás, assim já era o tom do art. CDC 26, § 2º. A segunda diz respeito à valorização da garantia contratual nas relações interprivadas e interempresariais, a ponde de converter os prazos do Código Civil de 2002 em regras meramente subsidiárias e complementares. Contudo, jamais poderá o adquirente renunciar ao prazo decadencial fixado em lei (CC, 209).

Mas a regra do art. 446 também revela a preocupação do legislador com a boa-fé objetiva do adquirente perante o alienante. Caso o adquirente descubra o vício redibitório dentro do prazo de garantia, terá trinta dias a contar da descoberta para denunciá-lo ao alienante, sob pena de decadência ao exercício do direito potestativo de desconstituir a relação ou abater o preço.

Pela teoria da responsabilidade, será justificável a invocação do vício pelo declarante somente quando não tiver agido de má-fé ou culposamente. Na espécie, se o adquirente sabe da existência do vício, há um dever anexo de informação imediata perante o alienante, a fim de que este possa se posicionar sobre a questão. A negligencia do referido esclarecimento, pelo indevido aguardo do término da garantia contratual, importa em violação à confiança do alienante e abuso do exercício do direito subjetivo. Daí a elogiável opção do Código pelo prazo decadencial do trintídio.

A título comparativo, no Código de Defesa do Consumidor os prazos de reclamação para vícios aparentes são de trinta dias para os produtos não duráveis e noventa dias para os duráveis, contados da entrega efetiva; tratando-se de vícios ocultos, os prazos são idênticos, mas a contagem se processa a partir da descoberta do vício (CDC, 26, § 3º). A garantia contratual será complementar à legal (art. 50). Doravante, existirão casos em que os mecanismos de garantia do Código Civil de 2002 serão mais eficazes ao consumidor do que as regras conferidas pelo microssistema que lhe serve. Poderá ele recorrer à norma mais benéfica do Código Civil pela regra de interface do art. 7º do Código de Defesa do Consumidor. Exemplificando: pelo Código Civil o adquirente de um imóvel conta com o prazo elástico de humano para reclamar dos vícios após a cessação da garantia contratual. Todavia, esse prazo cai para três meses nas relações de consumo. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 515-516 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 07/08/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Há um histórico apresentado pelo relator Ricardo Fiuza que salienta o texto original do projeto: “Art. 446. Não correrão os prazos do artigo anterior na constância de cláusula de garantia; mas o adquirente deve denunciar o defeito ao alienante dentro nos trinta dias do descobrimento, sob pena de caducidade”. Com emenda da lavra dos Senadores Milton Cabral e Marcelo Miranda ganhou a redação atual. Como justificativa apresentaram a de melhorar a linguagem do texto, substituindo o termo “caducidade” por “decadência”, no intuito de dar maior tecnicismo à linguagem jurídica utilizada pelo projeto. Ainda que as expressões possam ser consideradas sinônimas, como o projeto se refere sempre à prescrição e à decadência, a utilização do termo “caducidade” em dispositivos isolados poderia gerar dúvidas futuras na sua interpretação e aplicação. Emenda, por conseguinte, de boa técnica legislativa.

Não há artigo correspondente no CC de 1916.

A Doutrina aponta Cláusula de garantia como causa obstativa de decadência e como cláusula contratual, pela qual o alienante acoberta a idoneidade da coisa, é complementar da garantia obrigatória e legal, a que responde. Não exclui, portanto, a garantia legal.

O primeiro relatório ao projeto, de autoria do Deputado Ernani Satyro, já registrava não se haver “como confundir o fato de não correr prazo na constância da cláusula de garantia, com a obrigação que tem o adquirente de denunciar o defeito da coisa ao alienante, tão logo o verifique. Trata-se, como se vê, de consagração jurídica de um dever de probidade e boa-fé, tal como enunciado no artigo 422. Não é por estar amparado pelo prazo de garantia, que o comprador deva se prevalecer dessa situação para abster-se de dar ciência imediata do vício verificado na coisa adquirida”. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 241, apud Maria Helena Diniz, Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 07/08/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No diapasão de Marco Túlio de Carvalho Rocha, a cláusula de garantia estabelece a obrigatoriedade de o alienante responder por vícios da coisa durante determinado tempo. É reforço negocial de obrigação que já é estabelecida pela lei e pode atribuir ao adquirente condições que a lei não contempla, como a troca da coisa por outra do mesmo gênero e qualidade.

O artigo 446 tem por objetivo apontar a solução a ser dada em casos em que haja garantia negocial paralela à garantia legal. A solução é no sentido de suspensão dos prazos de garantia legal, que começam a correr, de forma unificada, por 30 dias, ao término do prazo de garantia convencional.


A solução é aparentemente, simples. Contudo o dispositivo, em sua literalidade, permitiria a redução de prazos legais superiores a 30 dias. Bastaria, para tanto, que o alienante concedesse prazo de garantia ínfimo, a partir do qual somente sobejariam os 30 dias previstos no dispositivo. A amputação de prazos legais maiores não é permitida, pois o alienante somente se exime, validamente, de sua responsabilidade por vícios redibitórios por renúncia do adquirente, quando este tem conhecimento do vício antes da contratação. Desse modo, a melhor solução é a de se respeitar o prazo legal se da aplicação da regra do art. 446 resultar redução daquele. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 07.08.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

quarta-feira, 7 de agosto de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 441, 442, 443 - Dos Vícios Redibitórios – VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 441, 442, 443
- Dos Vícios Redibitórios
 – VARGAS, Paulo S. R.

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título V – DOS CONTRATOS EM GERAL
 (art. 421 a 480) Capítulo I – Disposições Gerais –
Seção V – Dos Vícios Redibitórios
- vargasdigitador.blogspot.com

Art. 441. A coisa recebida em virtude de contrato comutativo pode ser enjeitada por vícios ou defeitos ocultos, que a tornem impropria ao uso a que é destinada, ou lhe diminuam o valor.

Parágrafo único. É aplicável a disposição deste artigo às doações onerosas.

“O vício redibitório consiste no vício oculto da coisa que a torna impropria a seu uso. Sendo inerente à essência do produto, o vício é capaz de torna-lo imprestável ao fim a que se destina ou de reduzir a capacidade do bem por ocasião de sua utilização” diz Nelson Rosenvald.

Em seus ensinamentos, Nelson Rosenvald ensina que em nosso ordenamento, a disciplina é inserida na teoria geral dos contratos, não se prendendo a nenhum contrato em espécie. Seu campo de incidência são os contratos comutativos, em que há um conhecimento prévio das prestações recíprocas. A existência do sinalagma e, portanto, da justiça contratual, requer um equilíbrio entre as trocas contratuais. Haverá uma lesão a esse equilíbrio se o bem recebido por uma das partes for incapaz materialmente de atender a suas finalidades naturais.

O vício redibitório e a evicção são dois mecanismos próximos de tutela do contratante. O primeiro acautela-nos perante vícios materiais do objeto contratado. Já a evicção possibilita proteger o adquirente diante da perda jurídica do bem.

No Código Civil, o contratante apenas obterá êxito na demonstração do vício caso seja demonstrada a efetiva incapacitação do objeto adquirido. Em contrapartida, no Código de Defesa do Consumidor, art. 18, é suficiente que os vícios gerem a inadequação do produto. A inadequação abrange todas as formas de frustração à legítima expectativa do consumidor. Muitas vezes o produto ainda poderá ser utilizado, mas com perda de eficiência.

Exemplificando: um particular que adquira de outro uma geladeira usada poderá discutir o vício decorrente do motor que não funciona. Já o consumidor que adquire eletrodoméstico novo em determinada loja poderá até mesmo discutir o excesso do tempo de congelamento, mesmo que o produto funcione normalmente.

O conceito de inadequação no CDC é amplo a ponto de abranger as disparidades entre as informações recebidas pelo consumidor e as reais qualidades do produto. Assim, ao adquirir uma máquina copiadora com base em publicidade que propaga ser o produto capaz de reproduzir duas vezes mais rápido que os concorrentes, é possível utilizar os mecanismos disponibilizados pela legislação consumerista, caso a expectativa não se verifique efetivamente.

O CDC também vai além do regime do direito civil ao prestar tutela diante dos vícios de quantidade de produtos e serviços (CDC, 19 e 20). A quantidade é considerada algo concedido a menor ao consumidor em qualquer tipo de medida adquirida. Não apenas no simples aspecto numérico como também no que diz respeito à metragem, peso e proporção de produtos e serviços, além do desencontro quantitativo entre o bem oferecido e a mensagem publicitária divulgada.

Outrossim, nas relações privadas, o vício redibitório será oculto, assim conceituado como aquele que não poderia ser detectado por uma pessoa de cautela ordinária. Sendo o vício de fácil constatação, presume-se que houve desídia do adquirente quando da contratação.

O adquirente omisso que posteriormente invoca o vício incide em abuso do direito (CC, 187), na modalidade do venire contra factum proprium, na medida em que o exercício da pretensão atual é incompatível com a sua conduta originária, sobremaneira pelas expectativas legitimamente criadas no alienante.

Todavia, o consumidor será protegido mesmo diante de vícios aparentes ou de fácil constatação (CDC, 26), pois a sua vulnerabilidade determina uma intervenção mais drástica e corretiva do ordenamento jurídico sobre as suas relações.

O art. 441 demonstra que toda a teoria dos vícios redibitórios foi edificada em torno de uma garantia para o adquirente de bens móveis e imóveis, nas obrigações de dar coisa certa. Daí a utilização do termo coisa no dispositivo em comento.

Em inegável ampliação de horizontes, a sistemática concebida pelo Código de Defesa do Consumidor contempla também as obrigações de fazer. Os vícios do serviço (CDC, 20) nada mais são do que incorreções que tornam a prestação do serviço impropria ou inadequada (v.g., espetáculo musical com má qualidade de áudio).

Portanto, no Código Civil, qualquer discussão consequente à inexecução de serviços será solucionada à luz do inadimplemento das obrigações (art. 389) (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 510-511 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 05/08/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

No que expõe a doutrina apresentada por Fiuza, vícios redibitórios são os defeitos existentes na coisa objeto de contrato oneroso, ao tempo da tradição (ver art. 444), e ocultos por imperceptíveis à diligência ordinária do adquirente (erro objetivo), tornando-a imprópria a seus fins e uso ou que lhe diminuam a utilidade ou o valor, a ensejar a ação redibitória para a rejeição da coisa e a devolução do preço pago (rescisão ou redibição) ou a ação estimatória (actio quanti mninoris) para a restituição de parte do preço, a título de abatimento. Diz-se contrato comutativo o contrato oneroso em que a prestação e a contraprestação são cedas e equivalentes.

Integra-se ao instituto a redução de utilidade do bem em face do defeito oculto, embora cuide o dispositivo apenas da impropriedade do uso (inexatidão ou inaptidão ao uso a que se destina).

Pelo art. 1.106 do CC de 1916 não responde o alienante se a coisa for alienada em hasta pública (entenda-se, venda forçada, a judicial ou a administrativa), tornando inadmissíveis a ação redibitória ou a estimatória. Tal dispositivo não tem correspondente no texto do CC de 2002, não prevalecendo mais a circunstância excepcionada como exclusão de direito.

A propósito do parágrafo único, anota Clóvis Beviláqua o seguinte: “As doações são contratos unilaterais e benéficos, aos quais não convém a classificação de comutativos. Todavia, se a doação é gravada com encargo, deve ser desclassificada de entre os contratos unilaterais, porque ao donatário é imposta igualmente a prestação, resultante do encargo”. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 238, apud Maria Helena Diniz, Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 05/08/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Marco Túlio de Carvalho Rocha conceitua vício redibitório como vício ou defeito oculto ou ausência de qualidade da coisa recebida (vício do objeto da prestação), em virtude de contrato comutativo ou de doação com encargo, que a torna impropria ao uso ou lhe diminua o valor (441).

Das distinções, pode-se apontar: a) no inadimplemento não há a entrega da coisa que era objeto da obrigação; b) vícios aparentes: nas relações comuns, a aceitação da coisa faz presumir a aceitação de vícios aparentes, exceto se houver ressalvas ou se o alienante obrigar-se a repará-los e c) a diferença de área nas vendas ad mensuram tem regulação própria (CC, 500 e 501).

Podem ser apontados cinco elementos: a) o vício deve ser oculto: os vícios ostensivos presumem-se aceitos ou são objeto de outros meios de proteção; b) desconhecimento do adquirente: se o adquirente conhecer o vício, mantém a pretensão se o receber com ressalva ou se o alienante obrigar-se a repará-lo; c) o vício deve existir no momento da tradição e perdurar até o momento da reclamação; d) prejuízo à finalidade da coisa ou ao seu valor; e) o bem deve ter sido objeto de contrato comutativo ou de doação com encargo. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 05.08.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 442. Em vez de rejeitar a coisa, redibindo o contrato (art. 441), pode o adquirente reclamar o abatimento no preço.

Em relação ao art. em comento, Nelson Rosenvald ensina que o adquirente da coisa viciada terá duas opções: redibir o negócio jurídico ou obter o abatimento no preço do bem mediante a ação estimatória. São as chamadas ações edilícias. A faculdade de escolha é absoluta, de livre conveniência do adquirente.

A ação redibitória implica a devolução da coisa com restituição dos valores pagos ao alienante. Trata-se de hipótese de direito potestativo à rescisão contratual. Com efeito, a rescisão se aplica às hipóteses em que a desconstituição da obrigação é fruto de um vício do objeto já existente ao tempo da contratação (v.g., evicção), não se podendo cogitar um inadimplemento ou inexecução – o que caracterizaria a resolução, por força do CC, 475).

Por outro ângulo, a ação estimatória, ou quanti minoris, implica a conservação do negócio jurídico à custa da redução do preço de aquisição, com devolução de parte de valores pelo alienante.

Apesar do silêncio do legislador, acreditamos que a melhor maneira de calcular a restituição é pela obtenção de uma proporcionalidade entre o que foi pago e a perda de valor da coisa em decorrência do vício, alcançando-se assim a quantia a ser restituída. Nada impede a nomeação de um perito para a execução de tal atividade.

Há que alertar que não existe necessariamente uma relação entre a extensão do vício e a opção do credor. Ele terá o direito potestativo à redibição, mesmo que o vício não seja apto a inutilizar completamente a coisa, bem com poderá exercitar a pretensão de abatimento, mesmo nos casos em que o vício torne a coisa absolutamente impropria para o seu uso.

No sistema de vícios do produto do Código de Defesa do Consumidor, a tutela ao vulnerável é mais densa. O art. 18, § 1º, I, permite a substituição do produto por outro da mesma espécie, além de conceder as alternativas da redibição e da quanti minoris. Não se olvide de que, para os vícios do serviço, sempre haverá a possibilidade de reexecução (CDC, 20, I), e, para os vícios de quantidade, a complementação do peso ou da medida (CDC, 19, II), tratando-se de vício do produto, ao consumidor só será facultada a adoção das três alternativas, se antes não obteve êxito na medida de sanação do vício no prazo de trinta dias (CDC, 18, § 1º). Excepciona-se o pré-requisito nos casos em que, em razão da extensão dos vícios, é impraticável a tentativa de remediá-los (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 512 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 06/08/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo entendimento de Fiuza, a lei confere uma segunda alternativa de proteção ao prejudicado, presente o vício redibitório. Pode o adquirente, em vez de redibir o contrato, enjeita do a coisa, postular o abatimento do preço pago, conservando o bem, mediante a ação estimatória ou actio quanti minoris (ação de menor preço). Trata-se de ação edilícia, como também é denominada a ação redibitória. Essa alternativa deixa de existir, por exceção, na hipótese do art. 444, quando ao adquirente cabe exercitar a ação redibitória, diante do perecimento da coisa em decorrência do vício redibitório.

A ação estimatória pode ser manejada, ainda, pelo comprador contra quem lhe fez a venda de móvel ou imóvel quando apurada a diminuição na qualidade ou na extensão para o efeito de abatimento proporcional no preço pago, não cabendo, v.g., se da escritura de compra e venda ficou claramente estipulado tratar-se de venda ad corpus (TJPE, I~ Câmara Cível, AC 696/85) (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 239, apud Maria Helena Diniz, Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 06/08/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Segundo a prática de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o dispositivo faculta ao adquirente requerer o abatimento do preço. No direito romano esse direito correspondia á actio quanti minoris. Se o preço ojá tiver sido pago, fica o alienante obrigado a restituir o valor equivalente à desvalorização sofrida pela coisa transferida ao adquirente.

A escolha do adquirente por uma das duas vias, desfazimento do contrato ou abatimento do preço, é irrevogável (Caio Mário, Instituições..., v. III, p. 127).

Se o objeto da contraprestação for indivisível, como no caso de troca, a pretensão de abatimento do preço pode ser impossível (Pontes de Miranda. Tratado de direito privado, t. XXXVIII, p. 283).

O exercício da pretensão não exclui o direito de reclamar por outro vício que venha a ser descoberto (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 06.08.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 443. Se o alienante conhecia o vício ou defeito da coisa, restituirá o que recebeu com perdas e danos; se o não conhecia, tão-somente restituirá o valor recebido, mas as despesas do contrato.

Seguindo os ensinamentos de Rosenvald, a norma em referência agrava a condição do alienante que tinha ciência do vício oculto da coisa ao tempo da entrega efetiva da posse. Encontrando-se o vendedor de boa-fé, a restituição se limita ao preço contratado. Todavia, constatada a má-fé daquele que encobre o vício, acrescentar-se-á o valor das perdas e danos.

Não obstante o Código faça referência apenas à ação redibitória, parece-nos que mesmo na ação estimatória será factível a incidência cumulativa do ressarcimento ao adquirente.

A responsabilidade contratual segue as regras relativas ao inadimplemento das obrigações (CC, 389). Portanto, as perdas e danos incidirão cumulativamente aos juros, atualização monetária e honorários advocatícios. É interessante que as partes estipulem a cláusula penal compensatória (CC, 408 e 410) como forma de prefixação de perdas e danos, evitando-se a árdua demonstração de danos emergente e lucros cessantes.

Outro detalhe. Enquanto os prazos de reclamação dos vícios seguem a sistemática exígua do CC, 445, a pretensão indenizatória poderá ser exercitada em três anos (a contar da transferência da posse), ex vi do CC, 206, § 3º, V.

Nas relações de consumo, a boa ou má-fé do fornecedor de produtos e serviços é irrelevante para fins de responsabilização contratual e ressarcimento. A tutela da boa-fé objetiva e do dever anexo de proteção ao consumidor resulta na desconsideração do aspecto psicológico da contraparte (CDC, 23).

Por fim, vale realçar que, no Código Civil, o adquirente apenas poderá rescindir o contrato, obter abatimento e, eventualmente, auferir perdas e danos perante a pessoa do alienante imediato, com quem celebrou o negócio jurídico. A garantia legal quanto aos vícios do objeto não alcança a cadeia anterior de circulação do produto, caso o vício já existisse mesmo quando da aquisição pelo próprio alienante.

Já nas relações consumeristas, é patente a solidariedade entre todos aqueles que participaram da inserção do produto viciado no mercado (CDC, 18). Daí caberá ao consumidor a opção entre o litisconsórcio passivo e a responsabilização isolada do fornecedor que lhe convier.

Apesar de expressamente não ter o legislador acolhido a solidariedade passiva nas relações privadas, acreditamos que pela aplicação das cláusulas gerais da boa-fé objetiva (CC, 422) e da função social do contrato (CC, 421) em um sistema móvel será viável a responsabilização direta dos alienantes mediatos. Apesar de o adquirente não ser parte nos contratos que antecederam a aquisição do bem, aqueles negócios jurídicos produzem consequências objetivas nas relações posteriores, sendo necessário preservar a tutela externa do crédito e a confiança do adquirente. Acreditamos que a solidariedade não pode mais se restringir à lei ou à vontade das partes (CC, 265), sendo justificada nas hipóteses de vulneração à própria principiologia do sistema (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 512-513 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 06/08/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo doutrina de Ricardo Fiuza, é atribuída ao alienante, por presunção legal, responsabilidade pelo vício redibitório quer o conheça ou não, ao tempo da alienação. Essa responsabilidade é aquilatada de acordo com a demonstração da conduta do alienante, ou seja, se transmitiu a coisa agindo de má-fé ou boa-fé. Portando ciência prévia do defeito oculto, restituirá o que recebeu, com o acréscimo de perdas e danos (RT, 447/216); ignorando-o, restituirá apenas o valor recebido e o das despesas contatuais.

Não é mais desonerado o alienante, por ignorância do vício, havendo cláusula expressa como dispõe o CC de 1916 (art. 1.102) (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 239, apud Maria Helena Diniz, Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 07/08/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Segundo ensinamento de Marco Túlio de Carvalho Rocha, se o alienante tinha conhecimento do vício da coisa, sua responsabilidade é ampla, deverá restituir não apenas os danos emergentes, equivalentes ao desembolso realizado pelo adquirente em virtude do contrato, que engloba o preço pago mais as despesas de transferência, quanto o lucro cessante, i.é, o que o adquirente razoavelmente deixou de ganhar em virtude do defeito da coisa.

Se o alienante não tinha conhecimento do vício da coisa, não se lhe pode imputar culpa e, por isso, o dispositivo só o obriga a devolver o valor recebido mais as despesas do contrato. Tais quantias sujeitam-se à correção monetária por serem dívida de valor (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 07.08.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

terça-feira, 6 de agosto de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 439, 440 - Da Promessa de Fato de Terceiro – VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 439, 440
- Da Promessa de Fato de Terceiro
 – VARGAS, Paulo S. R.

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título V – DOS CONTRATOS EM GERAL
 (art. 421 a 480) Capítulo I – Disposições Gerais –
Seção IV – Da Promessa de Fato de Terceiro
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Art. 439. Aquele que tiver prometido fato de terceiro responderá por perdas e danos, quando este o não executar.

Parágrafo único. Tal responsabilidade não existirá se o terceiro for o cônjuge do promitente, dependendo da sua anuência o ato a ser praticado, e desde que, pelo regime do casamento, a indenização, de algum modo, venha a recair sobre os seus bens.

Andando nos caminhos de Nelson Rosenvald, ao contrário da estipulação em favor de terceiro, a promessa de fato de terceiro não constitui exceção ao princípio da relatividade contratual entre as partes. Aqui, uma pessoa promete à outra que um terceiro realizará uma prestação em seu favor. O promitente é um garantidor do fato alheio, mas promete um fato próprio, qual seja uma obrigação de fazer consistente na obtenção da atividade do terceiro.

Exemplificando, A promete a B que o artista C realizará um show em determinada data. Caso reste infrutífera a promessa, a reparação será prestada por B, eis que o terceiro (C) não poderá ser constrangido a realizar a prestação para a qual não emprestou o seu consentimento.

Como bem explica o inovador parágrafo único, se o terceiro for o cônjuge do promitente, a recusa da outorga marital ou uxória ao ato praticado (v.g., contratos translativos de propriedade imobiliária em regime diverso da separação de bens) não pode geral indenização quando o ato recusado for daqueles que comprometam o patrimônio do casal. Com efeito, se esse raciocínio não fosse adotado, o cônjuge acabaria por responder pelo inadimplemento, mesmo que não tenha consentido com o negócio jurídico do outro cônjuge (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 509 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 04/08/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

No entendimento de Fiuza, é o denominado “contrato por terceiro” ou “contrato a cargo de terceiro”. o único vinculado à obrigação é aquele que assumiu o cumprimento da prestação, como devedor primário, prometendo fato de terceiro, no que consista em fazer, dar ou não fazer, tornando-se, portanto, garante do fato alheio. Assim, se o terceiro não atender o prometido por outrem, o promitente obriga-se a indenizar os prejuízos advindos dessa não execução, cabendo a ação do credor contra si e não contra o terceiro.

Na sua Exposição de Motivos complementar, o Prof. Agostinho Neves de Arruda Alvim analisa que a regra introduzida no dispositivo “visa a impedir que o cônjuge, geralmente a mulher, por ter usado do seu direito de veto, venha a sofrer as consequências da ação de indenização que mais tarde se mova contra o cônjuge promitente. O pressuposto é que, pelo regime do casamento, a ação indenizatória venha, de algum modo, a prejudicar o cônjuge que nada prometera”. A regra por ele preconizada tem origem nas Ordenações do Reino (Liv. IV, Tít. 48, § 1 ~) (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 237, apud Maria Helena Diniz, Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 04/08/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão de Marco Túlio de Carvalho Rocha, promessa de fato de terceiro é o contrato mediante o qual uma das partes, denominada promitente, obriga-se a obter de terceiro, prestação em favor da outra parte, denominada promissário.

A promessa de fato de terceiro obriga o promitente, que se responsabiliza a indenizar o promissário caso o terceiro se recuse a aceitar a obrigação. O terceiro não faz parte do contrato e somente estará obrigado após sua aceitação. Se o terceiro recusar-0se a realizar a prestação, nenhuma responsabilidade terá, uma vez que, pelo princípio da relatividade dos efeitos do contrato, este somente obriga as partes. Neste caso, a responsabilidade advinda da inexecução recairá sobre o promitente.

Em regra, o cônjuge responde pelas dívidas feitas pelo outro cônjuge na constância do casamento, pois presume-se que tenham sido contraídas em benefício da família, diz-se do terceiro que é cônjuge do promitente.

O CC, 1647, estabelece hipóteses em que um cônjuge somente pode agir com a anuência do outro cônjuge. A promessa de obter o consentimento do próprio cônjuge vem a ser uma das hipóteses mais comuns de promessa de fato de terceiro.

Uma vez que o cônjuge se recusasse a anuir com o ato, frustrando a expectativa do promitente que é seu consorte, a solução da regra geral do caput deste dispositivo implicaria a obrigação de o promitente indenizar ao promissário os prejuízos causados e a cobrança dessa indenização poderia recair no patrimônio do próprio cônjuge que recusou a anuir. Desse modo, diante da promessa de obtenção de anuência do cônjuge, aquele cuja anuência é requisitada ficaria na condição de anuir ou de suportar a obrigação de indenizar o promissário.

Para evitar esta situação absurda, o parágrafo único exclui a responsabilidade do promitente em caso de ser frustrada a promessa de obtenção da outorga conjugal (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 04.08.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 440. Nenhuma obrigação haverá para quem se comprometer por outrem, se este, depois de se ter obrigado, faltar à prestação.

Segundo entendimento de Nelson Rosenvald, em princípio, o terceiro é um estranho à relação obrigacional, pois a sua conduta é somente o objeto da prestação do promitente. Todavia, se o terceiro aquiescer ao cumprimento da obrigação, exonera-se o promitente de qualquer responsabilidade por eventual inadimplemento, de fato, esse e o momento em que a promessa é cumprida e o terceiro ratifica o contrato.

O único caso em que vinculação do terceiro não elide a responsabilidade do promitente será aquele em que o terceiro assumir o contrato com cláusula de solidariedade, podendo assim o credor agir tanto perante o promitente como perante o terceiro.

Enquanto na estipulação em favor de terceiro (art. 436) este recebe um benefício, na promessa de fato de terceiro ele eventualmente cumprirá uma obrigação assumida por outrem.

A figura ora apreciada guarda certa aproximação com o contrato com pessoa a declarar. Neste último há um agir em nome próprio e de outrem, pois a assunção do contrato pelo terceiro é um fato alternativo que, se não verificado, possibilita que o contratante originário prossiga na relação jurídica. Na promessa de fato de terceiro, falta ao promitente o agir em nome de outrem, pois só atua em nome próprio (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 509 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 04/08/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Dentro do ensinamento de Ricardo Fiuza, o dispositivo excepciona o art. 439, quando o terceiro se integra ao contrato, dando a sua anuência e assumido, por conseguinte, a obrigação relativa ao ato que lhe foi atribuído pelo promitente. A obrigação resulta do seu consentimento expresso quanto à promessa do ato, não ficando mais estranho à relação jurídica contratual. A anuência implica a extinção do vínculo obrigacional em relação ao promitente, devedor primário, tornando-se o terceiro devedor da prestação assegurada por aquele. Ocorre a exceção quando a obrigação é assumida solidariamente. A inserção da norma é oportuna, acompanhando o entendimento doutrinário e jurisprudencial a respeito do tema (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 237, apud Maria Helena Diniz, Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 04/08/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Segundo comentário de Marco Túlio de Carvalho Rocha, cessa a responsabilidade do promitente se o terceiro aceitar a obrigação, vinculando-se diretamente ao credor promissário (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 04.08.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).