terça-feira, 17 de setembro de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 513, 514, 515 - continua - Da Preempção ou Preferência – VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 513, 514, 515 - continua
- Da Preempção ou Preferência
VARGAS, Paulo S. R.

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo I – Da Compra e Venda
Seção II – Das Cláusulas Especiais à Compra e Venda –
Subseção III – Da Preempção ou Preferência
 - vargasdigitador.blogspot.com

Art. 513. A preempção, ou preferência, impõe ao comprador a obrigação de oferecer ao vendedor a coisa que aquele vai vender, ou dar em pagamento, para que este use de seu direito de prelação na compra, tanto por tanto.

Parágrafo único. O prazo para exercer o direito de preferência não poderá exceder a centro e oitenta dias, se a coisa for móvel, ou a dois anos, se imóvel.

Em importante ensinamento Nelson Rosenvald a preempção ou preferência como uma espécie de pacto à compra e venda, que assegura ao vendedor o direito de prelação, em igualdade de condições com terceiros, caso o comprador do bem móvel ou imóvel queira futuramente vendê-lo ou dá-lo em pagamento.

Aproxima-se da retrovenda, mas sem extremado rigor, pois não submete o comprador ao poder de recompra do vendedor, mas somente obriga aquele a lhe conceder preferência caso tenha o desejo de vender a coisa a terceiros. Ademais, na retrovenda a opção pela compra gera a resolução da propriedade, enquanto no direito de preferência surge uma nova aquisição.

Aliás, cremos que não existe condição suspensiva ou resolutiva nesse instituto. O negócio é perfeito e acabado, mas o comprador realiza uma promessa unilateral de contratar (CC 466), em que surgem dois requisitos determinantes o desejo do comprador de vender (condição resolutiva) e a vontade do vendedor de recomprar (condição suspensiva). Faltando uma delas, não se concretiza a cláusula.

O artigo em comento impõe ao comprador a obrigação de franquear a coisa ao vendedor para que ofereça, se quiser, igual preço e idênticas condições àquelas dispensadas por terceiro. a notificação consubstanciará somente o valor e as vantagens oferecidas pelo terceiro (CC 518).

O parágrafo único concebeu um prazo decadencial de 180 dias para bens móveis (contados da tradição) e de dois anos para imóveis (a contar do registro) para o exercício do direito de preferência. Superado esse prazo, o comprador ficará livre para vender a quem bem entender, sucumbindo a prelação. Nada impede que as partes ajustem prazo decadencial convencional inferior ao descrito na norma.

A outro giro, infere-se da leitura do artigo que a preempção não poderá ser utilizada em outro negócio jurídico a não ser a compra e venda e como modo indireto de adimplemento na dação em pagamento. Apesar de usualmente cogitarmos de bem imóvel, não há restrições à prelação de bens móveis e também incorpóreos. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 575 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 17/09/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Correspondendo ao caput do art. 1.149 do CC de 1916, segundo Ricardo Fiuza, a preempção ou preferência é cláusula especial à compra e venda garantidora ao vendedor do direito de recomprar a coisa vendida, se o adquirente resolver vende-la ou oferece-la à dação em pagamento. Diferencia-se da retrovenda, porque nesta última o vendedor da coisa imóvel pode reservar-se o direito de recobra-la, independente da vontade do comprador, e por versar também sobre coisa móvel, consoante explicita o parágrafo introduzido.

Desatendida a preferência, sujeita-se o comprador que alienou a coisa ou deu-a em pagamento a responder por perdas e danos, não resolvendo, como no direito de retrato, a venda ao terceiro adquirente (CC 597). Eis o magistério de João Alves da Silva: “A cláusula de preempção não é uma condição suspensiva, nem resolutiva: não suspende a plena aquisição do domínio pelo comprador nem faz resolver a venda, como no pacto de retrovenda ou de melhor comprador. É uma simples promessa unilateral de revender ao vendedor, em condições iguais às aceitas pelo comprador, oferecidas por terceiro. Por isso, só assegura ao vendedor um direito pessoal, que se resolve em perdas e danos, pelo inadimplemento da obrigação do comprador”. A alienação da coisa sem a prévia ciência ao vendedor, acerca do preço e das vantagens que por ela lhe oferecem, acarretará, contudo, responsabilidade solidária ao terceiro adquirente, se este tiver procedido de má-fé (CC 518).

A oferta ao vendedor primitivo, titular da preempção, para que exercite o seu direito de preferência, será feita mediante notificação judicial ou extrajudicial. Cumpre notar que ela deverá conter todas as condições do negócio (novo contrato), dispondo sobre preço, forma de pagamento, vantagens oferecidas por terceiro e outros elementos integrativos da proposta.

Os prazos decadenciais, conforme o objeto, para o exercício do direito de prelação são modificados significativamente, em confronto com o ditado pelo art. 1.153 do CC/1916 (v. art. 516). (João Luiz Alves, Código Civil da República dos Estados Unidos do Brasil anotado. Rio de Janeiro, E Briguiet, 1917) (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 274 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 17/09/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na esteira de Marco Túlio de Carvalho Rocha, deve-se atentar para o fato de, por limitar o direito de disposição que tem o proprietário sobre a coisa adquirida, a lei estabelece prazo máximo de eficácia da cláusula: 180 dias, no caso de a preferência recair sobre bem móvel; 2 anos, caso tenha por objeto bem imóvel. Vencidos tais prazos o comprador não mais estará obrigado a dar a preferência ao antigo proprietário. Tais limites são de ordem pública, não podem ser aumentados por disposição contratual. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 17.09.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 514. O vendedor pode também exercer o seu direito de prelação intimando o comprador, quando lhe constar que este vai vender a coisa.

Orientações relevantes de Nelson Rosenvald, obriga-nos a redobrada atenção ao contrato, pois, assim como o comprador fica obrigado a oferecer a coisa ao vendedor quando desejar negociá-la, caberá ao vendedor que desconfie da intenção do comprador em vender e exercer o direito de prelação, intimando o comprador para lhe conceder o direito de preferência.

Se realmente existia o intuito de vender – que pode ser aferido por diversas maneiras, o comprador, quando intimado -, não mais poderá desistir de oferecer a coisa ao vendedor, sob pena de ser condenado a indenizar pelo abuso do direito na modalidade do venire contra factum proprium, eis que a conduta ativa de oferecer a coisa a terceiros, que atraiu a legítima confiança do vendedor na possibilidade de recompra, foi traída pela segunda conduta, na qual o comprador retirou a proposta injustificadamente. Trata-se de evidente afronta ao princípio da boa-fé objetiva, tutelada como ato ilícito pelo CC 187. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 575 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 17/09/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na Doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, o dispositivo cuida da iniciativa da prelação pelo antigo vendedor, uma vez bastante ciente que o atual proprietário pretenda vender a coisa (ou dá-la em pagamento). Utiliza-se de faculdade ao exercício do seu direito de preferência sobre a coisa em venda ou ilação, antecipando-se à oferta obrigatória que haveria de ser feita pelo vendedor potencial a ele preferente. A intimação serve para evidenciar o seu interesse de recomprar a coisa, tanto por tanto (CC 515). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 274 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 17/09/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão de Marco Túlio de Carvalho Rocha, uma vez que tome conhecimento do intuito do comprador de alienar a coisa adquirida, não necessita o titular do direito de preferência aguardar ser notificado pelo comprador, mas pode tomar a iniciativa de intimá-lo com a mesma finalidade. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 17.09.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 515. Aquele que exerce a preferência está, sob pena de a perder, obrigado a pagar, em condições iguais, o preço encontrado, ou o ajustado.

Sob o prisma de Nelson Rosenvald, o artigo especifica que, além da vontade do comprador de vender e do vendedor de comprar, essencial é que se mantenha uma paridade entre as posições do terceiro e do vendedor, de modo que este só tenha êxito na recompra em caso de oferecer idênticas condições de pagamento, tanto no valores como nos prazos e demais vantagens que são oferecidas ao comprador.

Uma primeira leitura da parte final do dispositivo poderia gerar contradições. As expressões “preço encontrado” e “preço ajustado” podem não significar a mesma coisa. A primeira expressão dá a ideia de equivalência entre o que oferecem o vendedor e o terceiro. porém, “preço ajustado” poderia exprimir aquilo que comprador e vendedor fixaram como preço de recompra, independentemente de qualquer oferta de terceiros.

Contudo, tal interpretação literal não resiste à finalidade do instituto, que pretende resguardar a preferência, termo que sempre traz uma ideia de comparação com outro, jamais de exclusão. Outrossim, a ideia do “tanto por tanto” que encerra o CC 513 demonstra que sempre será observada a paridade entre o terceiro e o vendedor.

Por fim, a referência direta ao pagamento de um preço afasta a possibilidade de admissão do direito de preferência nos contratos de troca e permuta, que se aproxima do direito na venda, mas dispensa o pressuposto do preço. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 576 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 17/09/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Para a Doutrina de Nelson Rosenvald, o exercício do direito de prelação na compra pelo antigo proprietário da coisa (preemptor) obriga-o a concorrer com terceiros em igualdade de condições sujeitando-se a pagar, tanto por tanto, o preço exibido ou ajustado, para fazer valer a preferência. De conseguinte, havendo o comprador (atual proprietário) oferecido, em precedência, ao vendedor (ex proprietário) a coisa que aquele vai vender (CC 513), cumpre-lhe manifestar o interesse de exercer ou não o seu direito. Caso o exercite, o preferente aceitante obriga-se a pagar o preço nas mesmas condições ajustadas pelo vendedor com eventual terceiro interessado, constituindo essa obrigação a substância do instituto da preempção.

O exercício da preferência, no prazo ajustado ou no prazo legal (ausente a estipulação de prazo convencional) apresenta-se como um ato complexo. Não é suficiente a pretensão manifesta evidenciando o interesse real de o vendedor readquirir a coisa vendida, preço por preço, ou em iguais condições. Assim, é necessário que, no termo fixado, seja pago o preço da coisa sob pena da perda da preferência. Pondera João Luiz Alves, comentando o CC de 1916: “Declarando que quer exercer a preferência, i. é, que aceita a coisa – tanto por tanto – (Art. 1.149), assume o vendedor a obrigação de comprar, i. é, de pagar o preço na forma ajustada. O inadimplemento dessa obrigação determina contra o vendedor não só a perda do direito de preferência, para o futuro, na hipóteses de não se realizar a compra pelo terceiro, com quem fora ajustada, mas ainda a responsabilidade por perdas e danos que, no caso ocorram, como as que resultam do fato de não poder o comprador realizar o negócio com o terceiro, afastado pela declaração do vendedor, de que entendia exercer a preempção e aceitar o contrato nas condições ajustadas etc? Augusto Zenun é afirmativo: “A preferência tem de ser exercida por meio de depósito fixado, começando tão logo seja afrontado, vale dizer, estiver um frente ao outro; prazo que não se estica, pois é de caducidades não de prescrição”. O entendimento está conforme a jurisprudência ‘Na venda de imóvel vinculado ao instituto jurídico da preempção, o preço a ser depositado pelo comprador, ‘quando afrontado’, corresponderá ao valor do bem conforme a oferta. (...)” (grifo nosso) (STJ – Resp 2.223-RS).

A oferta ao preferente, compreendendo todos os elementos da proposta (preço, prazo, condições) ou das vantagens oferecidas ao proponente pela coisa, exige seriedade e correção, não podendo ser alterada perante terceiros, sob penas de o antigo comprador, obrigado à oferta preferencial, responder por perdas e danos.

A lei n. 8.245, de 18-10-1991, dispondo sobre as locações de imóveis urbanos, cuidou do direito de preferência do inquilino, ditando-o como preferência legal (art. 27). Nesse passo, a jurisprudência assinala: “(...) Direito de preempção ou perdas e danos. Não levado a registro o contrato de locação não é exercitável o direito de preferência pelo locatário. Cabendo, contudo, se preterido esse direito, perdas e danos. Art. 313. Lei n. 8.245/91” (STJ, 9T., REsp 130.008-SP, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, DJ de 15-9-1997).

A jurisprudência tem orientado: “Preempção. Exercício do direito. Distinção entre preço para depósito e preço para pagamento. Na venda de imóvel vinculado ao instituto jurídico da preempção, o preço a ser depositado pelo comprador, quando afrontado, corresponderá ao valor do bem conforme a oferta. Para efeito de conceituação, distingue-se depósito do preço, como manifestação da preferência na pré-compra, e pagamento do preço na compra e venda definitiva, nesta incluindo-se os acessórios ao preço e a correção monetária do valor do depósito’ (STJ, 31 T., REsp 2.223-RS, Rel. Min. Gueiros Leite, DJ de 1-10-1990) (João Luiz Alves, Código civil da República dos Estados Unidos do Brasil anotado, Rio de Janeiro, F. Briguiet. 1917 (p. 787),; Augusto Zenun, Da compra e venda e da troca, Rio de Janeiro, forense, 2001 (p. 75). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 275 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 17/09/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Resumindo seu comentário a respeito do que dispõe o art. 513, Marco Túlio de Carvalho Rocha, afirma que o direito de preferencia é o de adquirir a coisa nas mesmas condições em que ela é ofertada a terceiros, “tanto por tanto”. As condições dizem respeito ao valor total, ao prazo de pagamento, ao número de parcelas e tudo o mais que condicione o pagamento do preço. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 17.09.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

segunda-feira, 16 de setembro de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 509, 510, 511, 512 - Da Venda a Contento e da Sujeita a Prova – VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 509, 510, 511, 512
- Da Venda a Contento e da Sujeita a Prova
VARGAS, Paulo S. R.

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo I – Da Compra e Venda
Seção II – Das Cláusulas Especiais à Compra e Venda –
Subseção II – Da Venda a Contento e da Sujeita a Prova
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Art. 509. A venda feita a contento do comprador entende-se realizada sob condição suspensiva, ainda que a coisa lhe tenha sido entregue; e não se reputará perfeita, enquanto o adquirente não manifestar seu agrado.

Seguindo orientação de Nelson Rosenvald, a Subseção II – relativa às cláusulas especiais de compra e venda – traz inovação ao inserir na disciplina da venda a contento o pacto de venda sujeito a prova.

O artigo ora enfocado dispõe sobre a tradicional venda a contento (pactum diplicentiae), caracterizada pela subordinação a uma condição suspensiva, qual seja aquela em que o comprador aprecia as qualidades da coisa que lhe foi entregue. Temos então uma situação em que o vendedor se sujeitará a um evento futuro e incerto, que se relaciona ao puro arbítrio do comprador, excepcionando-se aqui a proibição às condições puramente potestativas (CC 122). Com efeito, a devolução do em não se prende em nenhum momento a uma apreciação objetiva acerca das características materiais da coisa, mas simplesmente ao desejo do comprador. Nesse ponto discordamos daqueles que acreditam se tratar de cláusula simplesmente potestativa e não meramente potestativa, pois o arbítrio não seria ilimitado. Muito pelo contrário, temos que a opção do comprador poderá se basear em um simples capricho sem que se possa questionar tal aspecto subjetivo.

O comprador não e proprietário, porém mero titular de um direito eventual, portanto dele não se exigirá nenhuma espécie de pagamento até que se decida adquirir o bem. Todavia, poderá reclamar a entrega da coisa, pois sem a posse direta do objeto não terá condições de avaliar se o negócio jurídico se lhe mostra satisfatório.

Não se olvide de que a cláusula será expressa no contrato, caso contrário não se poderá presumir que o comprador apenas adquiriu para experimentar. Já nas relações de consumo, em que a compra ocorre fora do domicilio do fornecedor, o consumidor exercerá o direito de arrependimento no prazo de reflexão de sete dias (CDC 49). Ao contrário do exposto no Código Civil, a devolução não decorre da autonomia privada, mas da tutela ao vulnerável que adquire bens por meio de pressão psicológica, sem a necessária ponderação acerca da real utilidade da compra. Outrossim, no Código de Defesa do Consumidor a aquisição não se faz por condição suspensiva; ela é perfeita e acabada, mas subordina-se ao direito potestativo de resilição unilateral (CC 473).

Diversamente do Código Civil de 1916, a norma em apreciação silencia no que concerne à possibilidade de a venda a contento ser realizada mediante cláusula resolutiva para o comprador. Entendemos que nada impede a fixação da resolução, com base na autonomia privada das partes, eis que não há proibição expressa da norma ou ofensa à ordem púbica. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 573 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 16/09/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Vemos na doutrina apresentada por Fiuza, que a condição suspensiva da venda feita a contento está clausulada pela subordinação do negócio à circunstância da satisfação do adquirente. Enquanto o comprador não aceitar a coisa (no sentido de aprova-la), ainda não colhido o manifesto do aprazimento por quem ela foi entregue, não se terá a venda como perfeita e obrigatória. Da declaração da ‘vontade do comprador depende a eficácia do negócio’. A venda a contento (pactum displicentiae) é, conforme ensina Clóvis Beviláqua, “a que se conclui sob a condição de ficar desfeita, se o comprador não se agradar da coisa vendida”. Por conseguinte, a tradição da coisa não corresponde à transferência do domínio, resumindo-se a transferir a posse direta, visto que efetuada a venda sob condição suspensiva. A presunção de a venda feita pelo comprador ser sempre realizada sob condição suspensiva afasta a hipótese de poder o contrato dá-lhe o caráter de condição resolutiva, antes referida pelo art. 1.444, parte final, do CC/1916. – A propósito não há mais de se falar de condição resolutiva e, sim de cláusula resolutiva.

Carlos Alberto Dabus Maluf reconhece a venda feita a contento como um contrato sujeito a condição potestativa, que o Código Civil admite e disciplina minuciosamente. Enfatize, porém, entender a doutrina que tal condição não é meramente potestativa, não infringindo o princípio do art. 115 do CC de 1916 (vide CC/2002 art. 122). O arbítrio do comprador não é, por isso, ilimitado. Ele fica constrito a um fato ou circunstância, a do agrado, não incidindo um mero capricho. Desse modo, constitui exceção à regra do mencionado artigo. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 272 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 16/09/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Segundo entendimento de Marco Túlio de Carvalho Rocha, a venda a contento é a cláusula que permite ao comprador não se vincular à compra e venda se a coisa vendida não o satisfizer. Tal cláusula consiste numa condição suspensiva: o contrato somente produzirá seus efeitos após a confirmação do comprador quanto à sua satisfação quanto à coisa. A satisfação do comprador implica o direito potestativo deste confirmar o não o contrato.

Embora não haja qualquer restrição legal, a doutrina ensina que “comporta gêneros que se costumam provar, medir, pesar e experimentar antes de aceitar” (Caio Mário da Silva Pereira), Instituições de Direito Civil, v III, Rio de Janeiro: Forense).

No Código de 1916 entendia-se ser direito personalíssimo do comprador, pelo uso do termo “pessoal”, no art. 1.148, segundo Beviláqua). A restrição não tem correspondente no CC/2002.

O artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor, concede ao consumidor o direito de “desistir” do contrato em 7 dias, quando a contratação ocorrer fora do estabelecimento comercial o que conforma espécie de venda a contento por força de lei. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 16.09.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 510. Também a venda sujeita a prova presume-se feita sob a condição suspensiva de que a coisa tenha as qualidades asseguradas pelo vendedor e seja idônea para o fim a que se destina.

Na visão de Nelson Rosenvald, a inovação do legislador nesse ponto foi a criação da cláusula de “venda sujeita a prova”. Aqui, a eficácia do negócio jurídico compra e venda se subordinará à objetiva constatação das qualidades que foram asseguradas pelo vendedor. Difere, portanto, da venda a contento, em que a satisfação do comprador e avaliada em nível subjetivo, da estima pela coisa.

Mas a distinção não para por aí. Na medida em que o desagrado do comprador se prende à própria desconformidade externa entre o que se prometeu e o que se pretende adquirir realmente, pergunta-se se o comprador deverá provar a existência do alegado déficit qualitativo. Parece-nos que a resposta é positiva, caso contrário cairíamos nas mesmas consequências da venda a contento, ou seja, do arbítrio do comprador. E outras palavras, a condição suspensiva da compra e sujeita à demonstração da veracidade das alegações do comprador, sob pena de ser lavada à apreciação do magistrado para os fins do antigo art. 335 do CPC/1973, correspondendo hoje ao art. 375 no CPC/2015, com praticamente redação idêntica. Caso o desnível qualitativo seja oculto, deverá o comprador se socorrer das normas relativas aos vícios redibitórios (CC 441 a 446). (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 573 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 16/09/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Relembrando Ricardo Fiuza, que o parágrafo único do art. 1.144 do CC de 1916 dispunha: “Nesta espécie de venda, se classifica a dos gêneros, que se costumam provar, medir, pesar, ou experimentar antes de aceitos”. Revela, no exemplo, o característico determinando de pacto adjeto a tal espécie de compra e venda.

O legislador do CC/2002 deu novo tratamento à venda sujeita a prova ou experimentação, também realizada sob condição suspensiva, disciplinando-a em dispositivo próprio. A coisa vendida submete-se ao exame do adquirente, na apuração das qualidades que lhes são inerentes e assegurados pelo vendedor, como condição ao aperfeiçoamento do contrato. Quer dizer que, tendo a coisa as qualidades afirmadas como certas, abonadas pelo vendedor, e reconhecida adequada para o fim a que se destina, não poderá o comprador, feita a experimentação, recusá-las por puro arbítrio, sem a devida motivação, o que importaria em potestatividade pura, defesa por lei. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 273 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 16/09/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Temos na visão de Marco Túlio de Carvalho Rocha que, a venda sujeita a prova é cláusula de sentido próximo ao da venda a contento, desta se diferenciando, no entanto, porque a recusa do comprador somente pode ser manifestada caso a coisa vendida não possua as qualidades asseguradas pelo vendedor ou não sirva ao fim a que ela se destina.

E, tal como a venda a contento, uma condição suspensiva: o contrato somente produzirá efeitos se a coisa vendida possuir as qualidades prometidas e servir à finalidade a que destinada. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 16.09.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 511. Em ambos os casos, as obrigações do comprador, que recebeu, sob condição suspensiva, a coisa comprada, são as de mero comodatário, enquanto não manifeste aceitá-la.

Seguindo na esteira de Nelson Rosenvald, o dispositivo é de índole meramente explicativa. Evidentemente, se na venda a contento e na sujeita à prova o comprador é mero titular de direito eventual em razão da condição suspensiva (CC 125), a eficácia aquisitiva se sujeita ao evento futuro e incerto do contentamento com o bem ou da constatação de suas virtudes materiais.

Enquanto a condição não se verifica, o comprador é mero comodatário, pois surge apenas um desdobramento da posse: a posse indireta se mantém com o vendedor – ainda remanescente na posição de proprietário – e a posse direta é transferida ao comprador, em virtude de uma relação de direito obrigacional.

Caso o comprador não queira adquirir a coisa, sua obrigação consistirá na devolução imediata, sob pena de conversão da posse em injusta – pela precariedade, se, interpelado pelo vendedor, recusar-se a restituir no prazo assinalado. Diante do esbulho, a saída será o ajuizamento da ação de reintegração de posse.

Todavia, a parte final do dispositivo se refere á manifestação do comprador em aceitar a coisa. Qual a natureza de tal manifestação? A nosso viso, normalmente será expressa, mas admite a forma tácita, como pelo pagamento do preço ou a prática de qualquer comportamento concludente ou socialmente típico que demonstre a sua satisfação com a aquisição. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 574 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 16/09/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na esteira da doutrina de Fiuza, enquanto não manifestada a declaração de vontade do comprador (pacto ad gustum) ou aceita a coisa comprada pela confirmação de suas qualidades e aptidão para o fim a que se destina, o possuidor direito e pretenso adquirente equipara-se ao comodatário, onde inato o dever de restitui-la, com as obrigações de conservá-la como se ela lhe fora dada em empréstimo. Pela condição suspensiva, a coisa comprada tem sua tradição provisória, implicando uma relação jurídica assemelhada ao comodato. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 273 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 16/09/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Tendo em conta o comentário de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o contrato de compra e venda tem seus efeitos suspensos enquanto não se verificar as respectivas condições suspensivas previstas para venda a contento e para a venda sujeita a prova. Em razão disso, pode-se indagar a que título a posse da cosa seria transferida ao comprador ou quais os direitos e deveres dele e do vendedor enquanto não operada a condição. O dispositivo esclarece que o comprador exerce a posse na qualidade de mero comodatário. Disto decorre, por exemplo que a transferência da posse direta sobre a coisa não transfere a propriedade ao comprador e que, se sobrevier a perda da coisa por caso fortuito ou por força maior, a regra res perit domino implica a perda da propriedade para o vendedor. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 16.09.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 Art. 512. Não havendo prazo estipulado para a declaração do comprador, o vendedor terá direito de intimá-lo, judicial ou extrajudicialmente, para que o faça em prazo improrrogável.

Vendo sob o prisma de Nelson Rosenvald, tanto na venda a contento como na venda sujeita a prova, o Código Civil abdicou da possibilidade de fixar os prazos decadenciais ao exercício do direito potestativo de restituição da coisa.

Duas soluções se impõem. Primeiro, as partes ajustam prazo convencional de decadência. Superado o lapso temporal, a compra e venda se aperfeiçoa em caráter definitivo. Segundo, não havendo fixação de prazo pelas partes, o vendedor deverá interpelar o comprador – judicial ou extrajudicialmente – para o exercício da opção, assinalando prazo para manifestação, sob pena de, no silêncio, concretizar-se a compra e venda. Cuida-se de uma forma de aceitação presumida da compra e venda.

Nada obstante ser conhecida a regra que disciplina a satisfação imediata do credor nos contratos sem prazo (CC 331), há casos em que se demanda um prazo tácito (CC 134), quando suas próprias particularidades evidenciarem a necessidade de um período para o cumprimento da obrigação. Aqui estamos diante de tais situações, pois seria abusiva a conduta do vendedor em exigir imediatamente o adimplemento, sem que ao comprador seja concedido tempo razoável – mediante interpelação – para constatar as qualidades da coisa possuída. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 574 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 16/09/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

A doutrina apresentada por Fiuza, aponta a declaração do comprador acerca da coisa, supostamente necessária para reputar-se perfeita a venda feita a contento (CC 509 parte final) ou ainda a sujeita a prova, visto que, sem embargo, como vendas condicionais, a eficácia do ato fica na dependência daquela manifestação. Não avençado o prazo para a declaração, é natural cumprir ao vendedor intimá-lo para que exprima seu agrado ou aquiescência, e, no caso, o prazo será fixado de modo unilateral. Nesse sentido: “Na venda a contento, se no próprio contrato não ficou estabelecido prazo para aceitação do negócio pelo comprador, é necessária a sua interpelação para os fins constantes do CC 1.147” (RT 445/I 80). O novo texto inclui a intimação extrajudicial, adotando a prática comum dos avisos de conhecimento por meio do Registro de títulos e Documentos. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 273 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 16/09/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Diferentemente do que faz em relação a outros institutos, a lei não demarca um prazo para que o comprador manifeste o interesse na confirmação ou não do negócio na venda sujeita a prova e na venda a contento, salvo nas vendas a consumidor fora do estabelecimento comercial, em que vigora o prazo de 7 dias (Marco Túlio de Carvalho Rocha. Desse modo, o prazo para o comprador manifestar a aceitação da coisa deve ser estabelecido contratualmente e, caso não seja, o limite temporal será estabelecido por meio de interpelação do vendedor ao comprador (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 16.09.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).


sexta-feira, 13 de setembro de 2019

Direito Civil Comentado - Art. 505, 506, 507, 508 - Das Cláusulas Especiais à Compra e Venda – VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 505, 506, 507, 508
- Das Cláusulas Especiais à Compra e Venda
VARGAS, Paulo S. R.

Parte Especial - Livro I – Do Direito das Obrigações
Título VI – Das Várias Espécies de Contrato
 (art. 481 a 853) Capítulo I – Da Compra e Venda
Seção II – Das Cláusulas Especiais à Compra e Venda –
Subseção I – Da Retrovenda - vargasdigitador.blogspot.com

Art. 505. O vendedor de coisa imóvel pode reservar-se o direito de recobrá-la no prazo máximo de decadência de três anos, restituindo o preço recebido e reembolsando as despesas do comprador, inclusive as que, durante o período de resgate, se efetuaram com a sua autorização escrita, ou para a realização de benfeitorias necessárias.

Viajando com Nelson Rosenvald, tem-se que o negócio jurídico da compra e venda possui vastíssimo campo de aplicação, não apenas pelo fato de ser o modo mais democrático de realização do tráfego jurídico em qualquer estrato social, mas também por possibilitar a conjugação de cláusulas especiais que flexibilizam o contrato sem sacrificar a sua natureza bilateral e onerosa.

Dentre as cláusulas especiais, uma das mais ricas é a de retrovenda. Cuida-se de pacto adjeto à compra e venda, pelo qual vendedor e comprador estipulam que aquele possuirá o direito potestativo de recobrar a propriedade em certo prazo, sujeitando o adquirente a tanto, desde que deposite o preço acrescido de despesas realizadas pelo comprador.

Destarte, o núcleo da retrovenda é exatamente o direito potestativo, o poder do comprador de submeter o vendedor ao exercício unilateral da desconstituição do negócio jurídico, sem que possa a isso se por. Basta que o direito seja exercitado no prazo decadencial e fatal de três anos, a contar no registro do título aquisitivo da propriedade imóvel. Ademais, não havendo um novo contrato de compra e venda, mas apenas um desfazimento do anterior, não se pode questionar de hipótese de incidência de imposto de transmissão de bens imóveis (ITBI).

Note-se que o prazo decadencial descrito na norma é o máximo, nada impedindo que as partes convencionem um período inferior, observando-se o disposto no CC. 211. Aliás, seria ofensivo ao direito de propriedade permitir a convenção de prazo maior, diante da insegurança que a cláusula provocaria nas relações patrimoniais do proprietário e de terceiros que com ele negociem. Caso as partes silenciem quanto ao prazo, a qualquer momento poderá ser exercitada a retratação mediante interpelação do comprador, mas com a devida atenção à observação do parágrafo único do CC. 473, a fim de evitar o abusivo exercício do direito potestativo que seja lesivo à economia do contrato e à sua função social.

A retrovenda é, a priori, uma nítida manifestação do princípio da autonomia privada, pois só nos negócios jurídicos as partes podem inserir elementos acidentais (termo, condição e encargo) a ponto de inovar dentro dos limites impostos pelo sistema.

Todavia, atualmente a autonomia privada é ponderada com princípios como o da função social do contrato e da boa-fé objetiva. Na espécie, isso implica a impossibilidade de o ordenamento ser complacente com a cláusula de retrovenda que seja utilizada como modo de garantia de um mutuante contra o mutuário diante do eventual inadimplemento da obrigação.

Em outas palavras, o Código Civil veda a cláusula comissória (CC. 1,365 e 1.428), que permitiria ao credor ficar com o bem dado em garantia em caso de inexecução da obrigação ao tempo do vencimento. A norma possui evidente aspecto ético, pois impede a usura. A título ilustrativo, caso a dívida fosse de trinta mil reais, a cláusula comissória permitirá ao credor adjudicar um imóvel de cem mil reais diante do inadimplemento.

Portanto, a retrovenda serviria como acordo simulatório, no qual o negócio jurídico compra e venda seria uma fachada para encobrir a real causa da contratação: a garantia ilícita de um empréstimo. A sanção para a simulação será a nulidade do negócio, nos termos do CC. 167. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 569-570 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 13/09/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo o histórico apresentado pelo Deputado Ricardo Fiuza, o dispositivo foi alterado pela Câmara dos Deputados no período inicial de tramitação do projeto apenas para inclusão do advérbio “máximo” após o substantivo prazo. Inovando em parte o sistema ora vigente, o art. 505, talvez por defeito de redação, aparenta que o prazo de recompra seja sempre, em todo e qualquer caso, fixado em três anos. Ora, não deve ser esta, sem dúvida a mens legis, porque vai contra a tradição do instituto e os ditames do art. 1.141 do CC de 1916. Embora se saiba que o instituto se prestou e ainda se presta ao abuso de poder econômico e a acobertar a prática da agiotagem, o prazo de três anos deve ser entendido como máximo, não único. Mais precisamente:  não estipulado prazo menor, prevalecerá o máximo, para o direito de retrato ou de resgate, tal como dispõe a parte final do art. 1.141 do CC de 1916: “(...) presumindo-se estipulado o máximo do tempo, quando as partes não o determinarem”.

A Doutrina mostra que a retrovenda (pactum de retrovendendo) é pacto adjunto à compra e venda, cláusula especial e resolutiva pela qual o vendedor reserva-se o direito de adquirir de novo o imóvel vendido, mediante a devolução do preço recebido com reembolso das despesas do comprador, inclusive das despendidas durante o período de resgate, por sua autorização ou decorrentes da realização de benfeitorias necessárias. Findo o prazo de resgate, sem que dele o vendedor o exercite, ter-se-á por irretratável o negócio da compra e venda, deixando a propriedade de ser resolúvel. A propriedade resolúvel também se extinguirá em exercendo o alienante o seu direito de resgate sobre o imóvel alienado. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 270 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 12/09/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na esteira do Maestro Marco Túlio de Carvalho Rocha, retrovenda ou pactum de retrovendendo é a cláusula especial do contrato de compra e venda que permite ao vendedor readquirir o bem imóvel mediante o reembolso do preço, das despesas e indenização das benfeitorias necessárias.

O prazo máximo de eficácia de cláusula é de 3 anos. É prazo máximo inderrogável pelas partes, uma vez que o limite é de ordem pública, pois visa a segurança jurídica de terceiros, uma vez que a cláusula torna a propriedade resolúvel para o comprador (sobre propriedade resolúvel: CC 1.359 e 1.360)

Somente em contratos de compra e venda de bens imóveis a cláusula pode ser inserida, pois a resolutividade do domínio que ela cria subordina terceiros e, portanto, depende da publicidade assegurada pelo registro de imóveis.

O critério para o exercício do direito de recompra do imóvel, ao contrário, é de ordem privada e, portanto, pode ser alterado pelas partes contratantes. Nada obsta, portanto, que prevejam a correção monetária do preço e a incidência de juros, respeitados os limites legais. O caso fortuito e a força maior extinguem o direito para o vendedor e a coisa para o comprador. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 13.09.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 506. Se o comprador se recusar a receber as quantias a que faz jus, o vendedor, para exercer o direito de resgate, as depositará judicialmente.

Parágrafo único. Verificada a insuficiência do depósito judicial, não será o vendedor restituído no domínio da coisa, até e enquanto não for integralmente pago o comprador.

Como alerta Nelson Rosenvald, a recusa do vendedor em se submeter à desconstituição da compra e venda permite que o comprador proponha ação de consignação em pagamento, a fim de exercer o direito potestativo de resgate.

No particular, entendemos que houve um lapso do legislador ao não permitir o depósito em estabelecimento bancário da quantia devida, como permite o CC 334 e o CPC/1973, 890, § 1º, com correspondência no CPC/2015, art. 539, § 1º.

Já o parágrafo único disserta sobre o óbvio. Se a recusa do comprador em receber é justificada, pelo fato de a quantia oferecida não exaurir suas despesas – inserindo-se aquelas elencadas na parte final do art. 505 -, o vendedor somente poderá adjudicar a coisa quando complementar o preço, seguindo os trâmites do CPC/1973, 899, com correspondência no CPC/2015, art. 545. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 570 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 13/09/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na doutrina apresentada por Ricardo Fiuza, o depósito judicial, com efeito de pagamento, das quantias da devolução do preço pago, acrescido das despesas, é o procedimento do vendedor para reaver o imóvel vendido, se o comprador se recusar receber as quantias a que faz jus, para o efeito de ser exercido o direito de resgate da coisa.

A disposição do parágrafo único merece revisão, para ajustá-la aos termos da hipótese do depósito carecedor de integralidade suficiente. Ao empregar a expressão “até e enquanto não for integralmente pago para o comprador”, no sentido de obstar a restituição do imóvel ao vendedor resgatador, o texto culmina por não considerar prazo assinado e peremptório para a faculdade da complementação do depósito, quando arguida a insuficiência, e mais ainda, o fato juridicamente relevante de, não completado o depósito, a não-integralidade conduzir à improcedência do pedido originado no direito de retrato. Ora, em casos que tais, haverá um limite temporal para a oblação real, com a conclusão inarredável de implicar o deposito incompleto e não integralizado, no prazo, a falta de êxito da pretensão, devendo aplicar-se supletivamente a regra do caput do art. 899 do CPC/1973, com correspondência no CPC/2015, art. 545.

Assim, se o resgatante não aproveita o benefício processual da complementação do depósito, deixando de fazê-lo e certo que depositou quantia inferior ao quantum, a insuficiência dou a não-complementação retira-lhe o pressuposto necessário ao exercício do resgate, qual seja, o depósito correspondente à devolução do preço recebido com reembolso das despesas do comprador (CC 505). De sorte que caducará o direito de reaver o bem. Nesse sentido, pontifica a jurisprudência: “Direito civil. Preferência. Condomínio. Direitos hereditários. Cessão. Depósito não corrigido. Oferta insuficiente. Exigência do CC 139, desatendida. Recurso desprovido. Inacolhe-se a adjudicação, fundada em direito de preferência, quando a oferta não se faz atualizada pela correção monetária, restando desatendida a norma do CC 1.139, sequer se valendo o condômino da complementação a que alude o art. 899 do CPC/1973 vide correspondência no CPC/2015, art. 545.” (STJ, 4’ I., REsp 5.430-MO, rel. Miii. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 4-11-1991).

Parágrafo único. Verificada a insuficiência do depósito judicial, a não integralização do valor, no prazo de dez dias, acarreta a improcedência do pedido importando ao vendedor a perda do seu direito de resgate. (Aderbal da Cunha Gonçalves. Da propriedade resolúvel, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1979) (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 270 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 13/09/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na revisão de Marco Túlio de Carvalho Rocha, a cláusula de retrovenda equivale a uma promessa de compra e venda feita pelo adquirente ao antigo proprietário do imóvel. Tal como o promissário comprador, o titular do direito de retrovenda faz jus à adjudicação compulsória do imóvel uma vez que tenha pago ao comprador o preço acertado. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 13.09.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 507. O direito de retrato, que é cessível e transmissível a herdeiros e legatários, poderá ser exercido contra o terceiro adquirente.

Na visão de Nelson Rosenvald, o dispositivo em comento possui grande abrangência, pois relata a eficácia real da retrovenda, tanto em nível de sucessão inter vivos como em causa mortis, seja pelo ângulo do vendedor, seja pelo do comprador.

Quanto à titularidade para o exercício do direito potestativo, observa-se não se tratar de direito personalíssimo, sendo objeto de cessão a terceiros por negócio jurídico gratuito ou oneroso, além de transmissível aos herdeiros e legatários em razão de sucessão legítima ou testamentária.

Aliás, tratando-se o sucessor de absolutamente incapaz, suspende-se a contagem do prazo decadencial, como expressamente veicula o CC 208 – ao fazer remissão ao CC 198, I.

Mais importante. Pelo fato de a compra e venda ser registrada no ofício imobiliário, qualquer adquirente do imóvel se sujeitará à eventual e futura adjudicação do bem por parte do vendedor ou sucessores, no prazo decadencial legal ou convencional.

O registro provoca o direito de sequela contra quem quer que esteja na posição de proprietário. Certamente o proprietário não poderá alegar a boa-fé subjetiva, pois o registro acarreta a indispensável publicidade do ato. Daí, quando ocorrer a resolução da propriedade, a retrovenda operará efeitos ex tunc, desconstituindo-se todos os direitos reais concedidos no período (CC 1.359).

Apesar da existência de dissidio doutrinário, não consideramos a retrovenda como direito real. Trata-se de mero direito obrigacional, que gera uma obrigação ao proprietário de restituir, caso provocado o direito potestativo de retratação. Os direitos reais no Código Civil de 2002 são aqueles taxativamente elencados no art. 1.225. Em verdade, o pacto adjeto de retrovenda produz um direito obrigacional com eficácia real, assim como o direito de preferência em favor do locatário que averba o contrato de locação no registro imobiliário, tornando a prelação oponível em face de eventuais adquirentes (art. 33 da Lei n. 8.245/91). (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 571 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 13/09/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na doutrina apresentada, a ulterior alienação da coisa retrovendida por parte do comprador não inibe o primitivo vendedor, em cujo favor se opera o direito de retrato, de exercitá-lo, dentro do prazo decadencial, promovendo a ação cabível contra o terceiro adquirente. Isso decorre da existência da propriedade resolúvel, cujo conceito nos é oferecido por Aderbal da Cunha Gonçalves, fixada pela “possibilidade de uma predeterminação de revogabilidade, independente da vontade de seu atual titular”, ou ainda, “quando adquirida em virtude de um título sujeito à resolução”. A alienação feita a terceiros adquirentes será resolvida pelo exercício do direito de resgate, ainda que eles não conheçam a cláusula de retrato. Esse direito do vendedor, clausulado no negócio jurídico, torna-se transmissível, podendo ser cedido ou transmitido a herdeiros e legatários. Aderbal da Cunha Gonçalves, Da propriedade resolúvel, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1979 (p.67-8) Maria Helena Diniz, Curso de direito civil brasileiro, 16. cd. São Paulo, Saraiva, 2001, v. 3 (p. 176-8).
Sob o prisma de Marco Túlio de Carvalho Rocha, o dispositivo assegura aos sucessores a título universal do antigo proprietário o direito que a cláusula de retrovenda assegura a este. Por exclusão, o direito à reaquisição do imóvel não pode ser cedido a terceiros a título singular.

De outro lado, a cláusula de retrovenda possui eficácia erga omnes e, por isso, vincula terceiros que venha a adquirir o imóvel. Frise-se: a cláusula de retrovenda não impede a alienação do imóvel pelo adquirente, mas, por instituir propriedade resolúvel, direito real, tem eficácia perante terceiros. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 13.09.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 Art. 508. Se a duas ou mais pessoas couber o direito de retrato sobre o mesmo imóvel, e só uma o exercer, poderá o comprador intimar as outras para nele acordarem, prevalecendo o pacto em favor de quem haja efetuado o depósito, contanto que seja integral.

Na esteira de Nelson Rosenvald, o Código Civil adotou aqui posição oposta à da legislação revogada. Entendia-se anteriormente que, se a compra e venda com cláusula de retrovenda fosse pactuada por vendedores condôminos e apenas um deles tivesse interesse em readquirir a coisa posteriormente, caducaria o direito de todos (art. 1.143, § 1º, do CC/1916).

A solução era equivocada, pois não se pode conceber um direito potestativo pela “metade”, ou seja, que dependa da atuação de um terceiro para a sua efetivação, uma vez que deixaria de ter essa característica e se tornaria um direito subjetivo como outro qualquer, em que se pede uma conduta de outrem.

Assim, foi feliz técnico o legislador ao preconizar que, por medida de cautela, poderá o comprador convocar os demais condôminos quando apenas um deles exercer o direito de retrato. A retrovenda prevalecerá em favor daquele condômino que efetue o deposito integral, i. é, pague o preço acrescido das despesas do comprador. Contudo, não sendo realizado o pagamento integral por nenhum dos condôminos, caducará o direito comum ao resgate.

O condomínio poderá também surgir quando o vendedor for apenas um proprietário, que venha a falecer ao curso do prazo de recompra ou que tenha cedido o direito de retratação a duas ou mais pessoas, como permite o CC 507. Caso todos os vendedores concordem na divisão do preço, a retrovenda acarretará o nascimento de um condomínio, seja o bem divisível, seja indivisível. (ROSENVALD Nelson, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 571-572 - Barueri, SP: Manole, 2010. Acesso 13/09/2019. Revista e atualizada nesta data por VD).

Há um histórico. “Se duas ou mais pessoas tiverem direito ao retrato sobre o mesmo imóvel, e só uma o exercer, poderá o comprador intimar as outras para nele acordarem, prevalecendo o pacto em favor de quem haja efetuado o depósito, contanto que seja integral”. Esta era a redação original do dispositivo no anteprojeto. Com as alterações empreendidas pelo iminente Senador Josaphat Marinho temos a composição atual. Melhorar a linguagem do texto, tal foi a justificativa apresentado pelo Senado, tratando-se aqui, mais uma vez, de mero aperfeiçoamento redacional, dispensando-se maiores considerações. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 272 apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 13/09/2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Segundo Marco Túlio de Carvalho Rocha o dispositivo cuida de cláusula de retrovenda instituída em favor de alienantes condôminos. Neste caso, o direito de retrato pode ser exercido por apenas um ou por alguns dos condôminos, desde que paguem o valor integral avençado. (Marco Túlio de Carvalho Rocha apud Direito.com acesso em 13.09.2019, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).