segunda-feira, 24 de agosto de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 1.177, 1.178 Do Contabilista e Outros Auxiliares - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 1.177, 1.178
Do Contabilista e Outros Auxiliares - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro II – (Art. 966 ao 1.195) Capítulo III –
Dos Prepostos (Art. 1.177 e 1.178) Seção III – Do Contabilista
E Outros Auxiliares – digitadorvargas@outlook.com

Art. 1.177. Os assentos lançados nos livros ou fichas do preponente, por qualquer dos prepostos encarregados de sua escrituração, produzem, salvo se houver procedido de má-fé, os mesmos efeitos como se o fossem por aquele.


Parágrafo único. No exercício de suas funções, os prepostos são pessoalmente responsáveis, perante os preponentes, pelos atos culposos; e, perante terceiros, solidariamente com o preponente, pelos atos dolosos.

Segundo Marcelo Fortes Barbosa Filho, O empresário-preponente pode incumbir um ou alguns de seus prepostos da elaboração dos assentamentos contábeis obrigatórios ou não obrigatórios, com os quais a atividade econômica desenvolvida é documentada. Tais prepostos precisam possuir conhecimento técnico específico e ser qualificados profissionalmente como contabilistas (Decretos-lei n. 9.295/46 e 806/69). Dotado de tal habilitação específica, um preposto pode realizar lançamentos e zelar pela correção da escrituração de dado empresário. Ademais, quando de autoria de um preposto especificamente designado, os assentamentos se consideram elaborados pelo próprio-empresário preponente. Há uma equiparação completa, ganhando os atos dos prepostos eficácia idêntica à dos praticados pelo preponente. Excepciona-se apenas a má-fé do preposto. Presente o ânimo de prejudicar e, portanto, elaborado, intencionalmente, um lançamento incorreto ou indevido, não é alcançada a equiparação proposta. A má-fé do preposto implica sejam seus atos apartados e distinguidos, não produzindo efeitos perante o empresário-preponente. O parágrafo único encontra-se deslocado, referindo-se não apenas à atuação do contabilista, mas a todo e qualquer preposto. Como complemento ao disposto nos CC 932, III, e 933, ficou, aqui, regrada a responsabilidade civil do preposto, autor de ato ilícito e causador de dano ao próprio preponente ou a um terceiro. Num primeiro plano, causado um dano ao preponente, nascerá o dever de indenizar sempre que caracterizada a culpa em sentido amplo. Num segundo plano, diante de terceiros, quando o ato danoso deriva do exercício da vontade livre e consciente do preposto, isto é, de uma conduta dolosa, também estará presente o dever de indenizar, formando-se entre o preposto e o preponente uma solidariedade passiva com relação à reparação dos prejuízos sofridos. Os atos culposos (em sentido estrito) não conduzem à responsabilidade direta do preposto diante de um terceiro e, então, só o preponente responderá, de início, pelo resultado danoso, buscando, em seguida, se desejar, o regresso ante o autor do ilícito. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.128. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 24/08/2020. Revista e atualizada nesta data por VD

Conta o histórico que a redação deste dispositivo é a mesma do projeto original. Regras semelhantes relativas às responsabilidades do preponente e dos prepostos encontravam-se previstas nos arts. 77 e 78 do Código Comercial de 1850.

Para a Doutrina de Ricardo Fiuza o contabilista é o preposto encarregado da escrituração contábil da empresa, exercendo a profissão de contador ou técnico contábil de acordo com as normas do Decreto-Lei n. 806/69 e Decreto n. 66.408/70. Os registros lançados pelo contabilista nos livros e documentos da escrituração da empresa consideram-se realizados pelo próprio preponente, salvo se for verificado que o preposto agiu de má-fé. Como regra geral de responsabilidade na relação de preposição, o parágrafo único deste artigo estabelece que haverá responsabilidade objetiva da empresa quando o preposto venha a causar dano a terceiro em virtude de ato culposo, cabendo ao preponente indenizar os prejuízos causados, com ação regressiva contra o responsável. No caso de ato doloso, ocorrerá situação de solidariedade, devendo o preponente ser demandado juntamente com o preposto para o ressarcimento de prejuízos provocados a terceiros. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 606, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 24/08/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Fernando Maida, em seu artigo sobre Direito Tributário, intitulado A Era Digital, a nova responsabilidade civil dos profissionais de Ciências Contábeis e sua interface com o Direito Tributário, referencia a profissão de contador que desde os albores do século XVI é reverenciada como uma das mais importantes e de expressão no âmbito da administração da vida pública e privada. A era digital fez mudar seu perfil de trabalho e responsabilidade. Nos tempos de colônia, o Brasil esteve regido pelas Ordenações Manuelinas e Filipinas. Com isso, todos os atos ou negócios empreendidos em território nacional deviam obrigatoriamente estar sendo orientados por intermédio único e exclusivamente de um contador. Ademais, a responsabilidade do contador em todas as contas de origem pessoal como a advinda de ritos processuais era evidenciada em todos os textos legais. As Ordenações Filipinas expressam no Livro I Título XCI e que trata da função e responsabilidades do contador e penalidades por não empregar seus préstimos laborais, a saber: Titulo XCI - Dos Contadores dos feitos e custas, assi da Corte, como do Reino - Os Contadores das custas as contarão, assi as pessoas, como as do processo, que são o que os Scrivães e Tabeliães hão de haver da scriptura, e o salário dos Procuradores, e outros quaesquer Officiaes. As quaes não contará outra alguma pessoa na nossa Corte, nem da Relação do Porto, nem nas cidades, villas e lugares, onde Contadores de custas houver. E sendo a conta per outrem feita, seja nenhuma e de nenhum outro effeito, e torne-se a fazer per o Contador, a que pertencer. E aquelle, que a der a fazer a outrem, pague ao Contador de pena o dobro do que houvera de haver da tal conta, além do seu saldo ordenado, que lhe della montar.”
Com o avançar dos tempos, a normatização contábil se fez necessária e presente e foi materializada pelo órgão de classe, o que proporcionou um norteamento bem fundamentado das atividades que deveriam ser eticamente e profissionalmente conduzidas tanto em ambiente do direito privado como público. O Conselho Federal de Contabilidade - CFC através da Resolução n. 580 de 28 de outubro de 1983 regulou as atribuições privativas e compartilhadas do contabilista, com base no artigo 25 do decreto-lei n. 9.295 de 27 de maio de 1946. Neste momento, essa norma jurídica representava um avanço profundo, prevendo penalidades para exercício legal bem como para o seu exercício ilegal da profissão. Ainda hoje essa norma jurídica permanece em vigência regulando a vida profissional do contabilista. Com a recepção em nosso ordenamento jurídico em 2002 do Novo Código Civil, foi incorporada a responsabilidade do profissional em contabilidade. O CC 1.177, parágrafo único, mostra que na prática de suas atribuições são direta e pessoalmente responsabilizados perante os seus clientes, por atos culposos, e por atos dolosos há a responsabilidade solidária, conforme destacado a seguir: Fala-se aqui da necessidade de que os profissionais da área contábil estejam atentos para as práticas dolosas contra fiscum a serem propostas ou impostas por seus clientes ou por seus empregadores. As práticas dolosas ficarão ao encargo de quem os praticará, quer dizer, dos agentes, entretanto os profissionais da área contábil são responsabilizados solidariamente com estes por danos a terceiros. Ressaltando que esses profissionais enquadram-se com base no CC 1.169, como preposto e este instituto é definido como aquele que dirige ou pratica negócio empresarial por incumbência de outrem, que é o preponente (empresário ou sociedade), responsável por todos os atos praticados pelo preposto no estabelecimento, dentro de suas atribuições. Na verdade, esse preposto é auxiliar dependente da empresa por estar em relação de subordinação hierárquica relativamente ao preponente que lhe confere poderes, para desempenhar atividades de direção empresarial ou para substituir a empresa em suas relações com terceiros. Tem neste último caso poderes para representar a empresa perante terceiros.

Ademais, o preposto sem autorização escrita do preponente não poderá fazer-se substituir por outrem, para o desempenho dos atos especificados na preposição, sob pena de responder pessoalmente, pelos atos do substituto e pelas obrigações por ele assumidas, arcando, portanto, com o risco, que, com sua atitude, possa acarretar desvantagem ao interesse do preponente. No exercício de suas funções, o contabilista pode praticar atos jurídicos que podem violar preceitos legais de modo voluntário ou involuntário, por incumbência de outrem ou por seu arbítrio próprio. Desta forma, da prática do ato ilícito decorre a responsabilidade do agente e com base neste argumento que resolveu-se aprofundar um pouco o tratamento dessa questão focada nos profissionais das ciências contábeis. A responsabilização é meio e modo de exteriorização da própria Justiça e a responsabilidade é a tradução para o sistema jurídico do dever moral de não prejudicar a outro, ou seja, o neminem laedere. Distingue-se a prática do ato jurídico do ato ilícito. O ato jurídico pressupõe ser um ato de vontade e que irá produzir efeitos de direito. Por outro lado, o ato ilícito também é considerado um ato de vontade e como tal, produzirá efeitos jurídicos independentemente da vontade do agente. No Código Civil, artigo 81 define: “É ato lícito, ato fundado em direito, enquanto o ato ilícito constitui delito, civil ou criminal e, pois, violação à lei.” Cretella Junior preceitua “a responsabilidade jurídica nada mais é do que a própria figura da responsabilidade, in genere, transportada para o campo do direito, situação originada por ação ou omissão de sujeito de direito público ou privado que, contrariando norma objetiva, obriga o infrator a responder com sua pessoa ou bens”. Desdobrada em modalidades diversas, filiadas ao protótipo comum categorial, a responsabilidade jurídica é uma, típica, reunindo sempre, em essência, a entidade personativa, que se projetou ou se omitiu no mundo das pessoas jurídicas, quebrando-as e provocando o dano, a convulsão maior ou menor no sistema, a exigir imediata recomposição do equilíbrio atingido. Envolve a responsabilidade jurídica, desse modo a pessoa que infringe a norma, a pessoa atingida pela infração, o nexo causal entre infrator e infração, o prejuízo ocasionado, a sanção aplicável e reparação, consistente na volta ao status quo ante da produção do dano. (Fernando Maida, em seu artigo sobre Direito Tributário, publicado em 21/05/2007, intitulado A Era Digital, a nova responsabilidade civil dos profissionais de Ciências Contábeis e sua interface com o Direito Tributário, no site direitonet.com.br, Acessado em 24/08/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.178. Os preponentes são responsáveis pelos atos de quaisquer prepostos, praticados nos seus estabelecimentos e relativos à atividade da empresa, ainda que não autorizados por escrito.

Parágrafo único. Quando tais atos forem praticados fora do estabelecimento, somente obrigarão o preponente nos limites dos poderes conferidos por escrito, cujo instrumento pode ser suprido pela certidão ou cópia autêntica do seu teor.

Em seus profundos conhecimentos Marcelo Fortes Barbosa Filho aponta o presente artigo, tal qual o parágrafo único do anterior, encontrar-se deslocado, não se referindo pura e simplesmente ao contabilista ou a outro auxiliar do empresário em particular. Foram introduzidas normas de caráter geral, estatuindo-se ampla responsabilidade dos preponentes pelos atos dos prepostos, reproduzindo e pormenorizando o disposto nos CC 932, III, e 933. Num primeiro plano, o empresário-preponente responderá por todo e qualquer ato do preposto praticado em seu estabelecimento e relativo ao desempenho de sua atividade profissional. Causado um prejuízo patrimonial ou extrapatrimonial a terceiro e preenchidos os dois requisitos legais relativos ao lugar do evento e à vinculação do dano à empresa, o dever de reparação é automático, deixando-se de lado qualquer questionamento relativo à culpa do preposto. Há uma responsabilidade objetiva, ficando presumida, então, a autorização do empresário para a consumação do ato gerador do dano. Num segundo plano, praticados atos fora do estabelecimento e emergindo prejuízo patrimonial ou extrapatrimonial para um terceiro, a responsabilidade do empresário-preponente só emergirá da prática de atos correspondentes às ordens transmitidas por escrito. Desde que externos ao estabelecimento, os atos excedentes, i. é, efetivados sem o respaldo de poderes expressos, só vinculam o próprio preposto, o próprio autor, não sendo possível, nesse caso, presumir um liame envolvendo o empresário. Foi patente a preocupação do legislador em circunscrever ao máximo a aplicação dessa segunda regra, consignando-se, no parágrafo único, a necessidade da exibição do instrumento público ou particular de delegação de poderes ou, pelo menos, de certidão ou cópia autêntica, não se admitindo, para a caracterização da responsabilidade do preponente, prova sob forma ou modalidade diversas. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.129. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 24/08/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Segundo o histórico de Ricardo Fuma, a regra expressa por este artigo não foi modificada durante a tramitação do projeto. Disposição praticamente idêntica estava contida no art. 75 do Código Comercial de 1850.

Abrandando a crítica de Marcelo Fortes Barbosa Filho, acima, Ricardo Fiuza em sua Doutrina atenta para o fato que os atos praticados pelos prepostos dentro do estabelecimento comercial da empresa presume-se que foram autorizados pelo preponente, mesmo não existindo documento escrito. O preposto não é obrigado a apresentar ao cliente ou àquele que comparecer ao estabelecimento para realizar um negócio qualquer documento que comprove estar ele autorizado a praticar o ato negocial. Assim, o preponente sempre responderá pelos atos que seus prepostos pratiquem dentro do estabelecimento, havendo sempre presunção de que estão autorizados. No que se refere, todavia, aos atos praticados fora do estabelecimento, o preponente somente responderá pelas obrigações contraídas pelo preposto que expressamente constarem do documento ou instrumento de delegação de poderes para a prática de atos, o que pode ser provado por certidão ou cópia autenticada. Se os atos do preposto excederem os limites dos seus poderes, o preponente não pode ser demandado em razão de prejuízos eventualmente causados a terceiros. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 607, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 24/08/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Em defesa do legislador, Fernando Maida alega que o CC 1.178 comentado, destaca que os contabilistas são tão responsáveis quanto o empresário e, num processo judicial, são solidários à empresa e tem o seu patrimônio disponível para quitar dívidas. Esta nova realidade passa a exigir a elaboração de um contrato de prestação de serviço contábil muito bem elaborado e fundamentado à luz da melhor doutrina e jurisprudência, e que especifique claramente quais informações serão fornecidas por esse profissional, quais serão de responsabilidade do empresário e como serão fornecidas.

Na jurisprudência pátria a responsabilização dos profissionais contabilistas está espraiada por todo o território nacional. Com base na legislação em vigor, que não tipifica qualquer situação fática, envolvendo a modernização digital, de infringência à lei civil ou penal, passaremos a ilustrar o nível de responsabilização atual dos contabilistas. Entretanto, reforçamos o argumento de que este quadro tenderá em um futuro próximo a se agravar, pois haverá fiscalização mais efetiva, eficaz e com altíssima tempestividade de respostas por parte dos fiscos.
O Tribunal de Justiça de Santa Catarina na Apelação Criminal 97.012867-3 Rel. Amaral e Silva, prolatada em 16.06.1998, trata do crime de sonegação fiscal por parte dos preponentes comerciantes e que tentam incriminar o profissional contador para atenuar suas penas, conforme destacado em parte dos autos deste processo judicial, a saber:
Ementa: Penal Tributário - Crime Contra A Ordem Tributária - Autonomia Das Esferas Penal E Administrativa - Ausência De Registro Nos Livros Fiscais E De Recolhimento Do ICMS - Delito Configurado. "Não se exige, no crime de sonegação fiscal, como condição de procedibilidade, a prévia apuração do tributo sonegado na instância administrativa." (STJ) Agem com dolo comerciantes que, livre e conscientemente, deixando de registrar nos livros fiscais operações relativas a circulação de mercadorias, se eximem do pagamento dos respectivos impostos.
"A autoria, da mesma forma, restou configurada pelos interrogatórios dos recorrentes (fl. 131v. e fl. 182v.), muito embora um apelante tenha justificado que agiu daquela maneira orientado 'verbalmente' pela própria exatoria estadual, e o outro atribuiu a responsabilidade ao contador da empresa. Impossível acolher as justificativas apresentadas pelos recorrentes, pois evidente que a responsabilidade de cada empresa é pessoal, e não de quem presta serviço para ela, pelo menos no campo fiscal e criminal, tornando inviável a suposta pretensão de transferir a responsabilidade ao contador, e pior, alegar que a própria coletoria estadual orientou-os neste sentido."
No Rio Grande do Sul, o Tribunal de Justiça decidiu pela responsabilização do contador por ter sido julgada a má prestação do serviço, conforme mostrada na Apelação: Apelação cível. Alteração de contrato social de empresa. Serviço de contador. Má execução. Ressarcimento das despesas. Comprovada a execução defeituosa da alteração do contrato social de empresa, responde o contador pela falha ocorrida, ressarcindo as despesas havidas. Recurso improvido. Unânime. (Apelação Cível nº 70007681034 – 15ª Câmara Cível – Pelotas – Rel. Des. Otávio Augusto de Freitas Barcellos – Julgada em 31-03-04). A quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, a Apelação Civel 2005.001.32363, Rel. Des. Fernando Cabral, julgado em 13.12.2005, também apresenta decisão judicial de responsabilização civil do profissional contador, no que pertine a execução de serviços contratados, por danos por omissão de atos de baixa de sociedade junto ao fisco federal, na sequencia:
Responsabilidade Civil. Ausência de "baixa" da sociedade junto à Receita Federal. Danos advindos da referida omissão. Responsabilidade do contador. Falha na prestação do serviço de contabilidade. Inadimplemento contratual. Danos materiais e morais reclamados por ambas as autoras. Sanções fiscais impostas à parte por conta da omissão do réu. Obrigação de restituir o valor recebido como pagamento pelos serviços não prestados e de ressarcir as autoras dos danos que lhes foram causados. Honra objetiva da segunda autora. Ausência de mácula indenizável. Descumprimento contratual que gerou simples aborrecimentos e transtornos que não chegaram a atingir bens personalíssimos das partes. A correção monetária, que retrata mera atualização do capital, deve ser contada desde o desembolso dos valores perseguidos. Os juros de mora, tratando-se de inadimplemento contratual, contam-se da citação válida. Recursos parcialmente providos.
A 9.ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, também apresenta decisão em Apelação Cível N° 0370397-5, Rel. Eugenio Achille Grandinetti por várias ações ilícitas do contador - recolhimento a menor de tributo, prática de adulteração e obtenção ilícita de benefício fiscal.
Ementa: Ação Ordinária. Adulteração De CTPS Para Inclusão De Tempo De Serviço Com Fins De Obtenção De Benefício Junto Ao INSS. Adulteração Feita Pelo Contador Do Patrão, Que Pagou Pelo Serviço. Contribuições Ao INSS Recolhidas A Menor. Responsabilidade Inequívoca Do Empregador Por Ato De Seu Preposto. "A responsabilidade por fato de outrem também constitui responsabilidade por fato próprio, posto que as pessoas que respondem a esse título terão sempre contribuído para o fato danoso. (...) É que, havendo culpa do empregado, empenha-se o dever de reparar do seu empregador, sem qualquer indagação acerca da culpa" in eligendo" ou" in vigilando" deste, ou se houver omissão no momento em que se exigia um facere (culpa in omittendo)." (Rui Stoco, Tratado de Responsabilidade Civil, Ed. Revista dos Tribunais). RECURSOS DESPROVIDOS.
Este cenário espelha apenas a situação atual na prática de atos culposos ou dolosos de profissionais contabilistas, sem considerar ainda a introdução da modernização digital. Trataremos a seguir dessa nova tecnologia e alguns comentários relativos a esta nova mudança de perfil profissiográfico dos contabilistas.
A Modernização Fiscal e o novo papel do Contabilista - A Nota Fiscal Eletrônica já é uma realidade como forma de modernização tecnológica. As empresas passaram a emitir documento fiscal digital, emitido e armazenado eletronicamente. Outro grandioso avanço tecnológico para este ano que se inicia, é o projeto Sistema Público de Escrituração Digital (SPED) e vai beneficiar, e muito, a vida dos profissionais da contabilidade. Os chamados Leiaute Nacional Unificado de Processamento de Dados, Certificação Digital, Escrituração Contábil e Fiscal em Forma Digital com Validade Jurídica, que compõem o SPED, irão transformar a Contabilidade em papel para a Contabilidade Digital.
A Emenda Constitucional nº 42, aprovada em 19 de dezembro de 2003, introduziu o Inciso XXII ao art. 37 da Constituição Federal, que determina às administrações tributárias da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios a atuar de forma integrada, inclusive com o compartilhamento de cadastros e de informações fiscais. Com isso, surgiu o SPED. A partir da iniciativa da Receita Federal, com base no Projeto de Modernização da Administração Tributária e Aduaneira (PMATA) que consiste na implantação de novos processos apoiados por sistemas de informação integrados, tecnologia da informação e infraestrutura logística adequados. O projeto se propõe a reduzir de custos para o armazenamento de documentos e a diminuição de custo com o cumprimento das obrigações acessórias. O Sistema Público é uma solução pioneira de alta tecnologia patrocinada pelas administrações tributárias federal, estadual e municipal. Como produto vislumbra obter a oficialização das escriturações fiscal e contábil e que esta se dará por meio da transposição do que é gerado diariamente, nos sistemas empresariais para um arquivo digital pré-definido por um formato técnico específico e apropriado, para que ocorra a transmissão eletrônica dos dados das empresas para os órgãos de registro e, posteriormente, para os fiscos das diversas esferas.
O Conselho Federal de Contabilidade (CFC), mais uma vez, de forma pioneira, vem participando com destaque no desenvolvimento do SPED, em especial, com proposição de sugestões técnicas, especificamente no módulo de Escrituração Contábil Digital e, sobretudo, no que diz respeito às Normas Brasileiras de Contabilidade. Ressaltamos a publicação da Resolução CFC nº 1.020/05 que aprovou a NBCT 2.8 - Das Formalidades da Escrituração Contábil em Forma Eletrônica e a sua recente alteração na Resolução CFC nº 1.063/05. Ademais, ainda previu em agosto de 2006 a Resolução CFC nº 1.078 de 25.08.2006que estabelece o Leiaute Brasileiro de Contabilidade Digital para fins de escrituração, geração e armazenamento de informações contábeis em meio digital.
Ora, fazendo mudar com essa nova realidade contábil e fiscal, essa é atividade mais comum que todos irão pensar e fazer. A ver, nesse momento a modernização é profundamente benéfica, pois trará inúmeras facilidades e redução de custos de armazenagem de documentos, minimização de preenchimento de formulários de obrigações acessórias, minimização de quadro de pessoal menos especializado, entre outras. Contudo, após a fase de implantação e estabilização do speed é que teremos o cenário preocupante para os contabilistas.
O SPED, como uma rede neural possuirá todas as informações e dados da vida das organizações e os fiscos poderão cruzar dados, verificando inconsistências nas diversas bases de dados distintas – Nota Fiscal Eletrônica, SPED Fiscal, SPED Contábil, e futuramente de operações envolvendo Comércio Exterior, não permitindo que o contribuinte tenha tempo nem argumentação inicial e previsível para contrapor a tese de rejeição de dados, informações ou arquivos digitais. Fazendo uma analogia, o contador e seu cliente contribuinte, se sentirão como se tivessem vendo uma cidade cenográfica com linda fachada, todavia sem qualquer entendimento do que está acontecendo em seu interior e sem previsibilidade do que estaria por vir. Em como agir proativamente ao invés de reativamente após receber uma intimação de um conjunto de arquivos digitais. Esse fato já está ocorrendo e leva os contribuintes a loucura, pois num envio de arquivos em lote, com definição de problemas nestes indefinida, há a apresentação de intimação com uma base de cálculo enorme, o que poderá se tornar uma autuação expressiva e assustadora.
Por fim, diante dessa modernização digital, até o presente momento, nada se tratou a respeito da responsabilidade dos profissionais que labutam na área contábil e/ou fiscal, no entanto acredita-se que esta foi profundamente incrementada em função do acima exposto e dos montantes envolvidos nas futuras transações com envio de arquivos digitais. Com a fiscalização pontual praticada nos dias de hoje, essa realidade não ficava patente. Portanto há cada vez mais a necessidade de ter amparo em apoio de informática, pois só assim é que poderemos prever e solucionar problemas diversos envolvendo desde o envio destes arquivos digitais como inconsistências neles. A realização de simulações com base na boa técnica, fazendo então a checagem entre sistemas e consistências dos dados a serem enviados, evitarão intimações e possíveis autuações futuras indesejáveis. Ademais, com as inovações a serem implantadas e a legislação atual faz com que se pense que tudo está sob controle. Na verdade, necessita urgente de legislação que defina claramente os papeis de responsabilidade do contador de acordo com as novas obrigações que foram agregadas às anteriores. E ainda mais, não há qualquer tipificação penal para crimes que envolvam a manipulação, transmissão e guarda de dados informatizados e é isto que espera a classe que os nossos legisladores proponham como pauta para discussão no Plenário do Congresso Nacional. (Fernando Maida, em seu artigo sobre Direito Tributário, publicado em 21/05/2007, intitulado A Era Digital, a nova responsabilidade civil dos profissionais de Ciências Contábeis e sua interface com o Direito Tributário, no site direitonet.com.br, Acessado em 24/08/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

sexta-feira, 21 de agosto de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 1.175, 1.176 Do gerente - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 1.175, 1.176
Do gerente - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro II – (Art. 966 ao 1.195) Capítulo III –
Dos Prepostos (Art. 1.172 a 1.176) Seção II – Do Gerente –
digitadorvargas@outlook.com - vargasdigitador.blogspot.com

Art. 1.175. O preponente responde com o gerente pelos atos que este pratique em seu próprio nome, mas à conta daquele.

Sob a batuta de Marcelo Fortes Barbosa Filho, mesmo que o gerente-preposto atue sem poderes de representação, praticando atos em nome próprio, subsistirá a responsabilidade solidária do empresário-preponente, no interesse de quem tais atos se concretizaram. Estatuiu-se, portanto, em favor de terceiros, uma solidariedade passiva entre o preposto e o preponente, considerada a hipótese de dano emergente ou lucro cessante. Em suma, a atuação do gerente-preposto, obedecidas as instruções fornecidas pelo preponente, fará recair sempre, quando prejudicado terceiro, responsabilidade sobre este último, sendo igualadas as situações em que persiste o surgimento de representação e aquelas em que o preposto age em nome próprio e, portanto, não é um representante. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.127. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 21/08/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Do histórico, o conteúdo desta norma manteve a redação do projeto original. Não tem correspondente no Código de 1916. Regra sobre a mesma matéria, ainda que de conteúdo diverso, encontrava-se disposta no Art. 150 do Código Comercial de 1850, relativa ao mandato mercantil, aplicável por remissão expressa do seu Art. 86.

Doutrinariamente, como aponta Ricardo Fiuza, o gerente exerce os poderes de seu mandato em nome e por conta do preponente, nos limites dos poderes outorgados. Assim, em princípio, a responsabilidade perante terceiros dos atos praticados pelo gerente é do próprio preponente ou titular da empresa, que lhe delegou poderes para que realizasse os atos necessários à execução do mandato. Nos casos, todavia, em que o gerente pratique atos em seu próprio nome pessoal, mas por conta do preponente, o titular da empresa responderá perante terceiros Juntamente com o gerente, situação em que existirá solidariedade entre eles. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 605, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 21/08/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na visão de Paula Moura Francesconi de Lemos Pereira, faz-se necessário contrabalançar (e reconhecer), entre a teoria do ato ultra vires e a teoria da aparência. Na primeira, a teoria do ato ultra vires, os administradores, prepostos, gerentes têm o dever de obedecer ao contrato ou ao estatuto social, de agir nos limites do objeto social no interesse da sociedade, ou seja, intra vires. No entanto, muitas vezes os representantes da sociedade e do empresário extrapolam os limites do objeto social ou os poderes que foram estabelecidos no ato constitutivo, agindo ultra vires. Esta prática envolve tanto a responsabilidade dos administradores que os praticam como o da sociedade empresária e empresário. No tocante à responsabilidade do administrador, do preposto, a lei lhes impõe o dever de indenizar os prejuízos causados pelos atos ultra vires ou os até mesmo pelos intra vires quando agem com dolo ou culpa. Mas a responsabilidade da sociedade empresária e do empresário em relação a terceiros pelos atos praticados pelos administradores, prepostos ou gerentes que não se relacionem com o objeto social ou que exorbitem dos poderes a eles conferidos, a solução foi trazida pela teoria ultra vires que está altamente atrelada à ideia de objeto social. Mas antes de verificar sua aplicação é preciso definir os atos ultra vires, que são os atos que estiverem em discordância com o objeto social (atividade e o fim lucrativo), além dos atos que estiverem em desacordo com os poderes expressos e implícitos estabelecidos em lei e no contrato ou estatuto social, ou que estão expressamente vedados. Se o ato visa ao lucro, mas está fora da atividade empresaria é ultra vires, da mesma forma, apesar de estar dentro do ramo empresarial, não ter por objetivo o lucro.

De acordo com a teoria ultra vires, os atos praticados pelos administradores em nome da sociedade empresária além dos limites do objeto social ou que ultrapassassem seus poderes são ineficazes em relação à sociedade e, consequentemente, não geram obrigações para ela, nem direitos para terceiros. Ao terceiro, apenas caberia mover ação conta aquele que extrapolou os limites sociais. Essa teoria surgiu pra proteger interesses dos acionistas e investidores. Ela tenta evitar desvio de finalidade na administração, mas acaba por ser prejudicial aos interesses de terceiros de boa-fé que contratam com a sociedade, já que ela não vai responder pelos negócios celebrados com abuso de poderes dos administradores.

Esse dispositivo legal positivo, ainda que de forma mitigada, a teoria da ineficácia dos negócios ultra vires, que sempre foi objeto de polêmica na doutrina e jurisprudência brasileira, cuja tendência foi abrandar o rigor da teoria ultra vires e admitir a aplicação da teoria da aparência, de modo a conferir validade e eficácia aos negócios jurídicos praticados em nome da sociedade por parte de administradores sem os devidos poderes ou que fossem estranhos ao objeto social, de modo a proteger os terceiros de boa-fé. Para aplicar a teoria ultra vires e afastar a responsabilidade da sociedade empresária e do empresário é importante analisar o objeto social e os poderes conferidos aos administradores e prepostos, considerando que o Código Civil deixou um espaço de discricionariedade, já que nem todos os poderes precisam estar expressos no contrato social, haja vista a existência de poderes implícitos inerentes a atividade de gestão. Além disso, amplia-se a compreensão do objeto social em razão da existência de atos acessórios, conexos, os quais os administradores estão autorizados a praticar, afastando, assim, a caracterização de ultra vires, eis que o negócio não se torna estranho à finalidade da sociedade, pois apenas aqueles que não têm relação direta ou indireta com o objeto isentam a sociedade de responder. (Paula Moura Francesconi de Lemos Pereira, intitulada “A Responsabilidade Da Sociedade Empresária e Do Empresário Pelos Atos Dos Administradores” em sua tese de Mestre em Direito Civil pela UERJ, publicado em publicadireito.com.br, acessado em 21/08/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Art. 1.176. O gerente pode estar em juízo em nome do preponente, pelas obrigações resultantes do exercício da sua função.

Conforme defende Marcelo Fortes Barbosa Filho, o gerente-preposto pode, conforme o tamanho de suas funções, exercer a representação processual do empresário-preponente, tal qual disposto nos arts. 277, § 3º (Sem correspondência no CPC 2015), e 331 do Código de Processo Civil/1973 (com menção ao art. 334 no CPC/2015, onde fala na Seção III – Do indeferimento da Petição Inicial) (Grifo nosso) e 9o, § 4», da Lei n. 9.099/95, desde que conferidos poderes para transigir. Nesses casos, o gerente comparece em audiência, fazendo o papel do empresário, e atua diretamente em juízo. Tal representação se opera automaticamente, sem maiores formalidades, quando preenchida a condição legal estatuída expressamente e relativa ao conteúdo das questões discutidas. O litígio, portanto, não só deve dizer respeito ao âmbito de atuação do gerente, como precisa ter derivado de ato concreto do próprio preposto. Admite-se, assim, que a delegação de poderes a um gerente possa lhe atribuir, conforme a conveniência do empresário, a qualidade de seu representante judicial. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.127. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 21/08/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na doutrina comentada de Ricardo Fiuza, o mandato outorgado ao gerente geralmente contém a delegação de poderes de representação ativa e passiva da empresa, judicial ou extrajudicial. Todavia, este dispositivo prevê que, em razão das obrigações relacionadas ao exercício dos poderes em que se encontra investido, o gerente pode comparecer em juízo como representante ou preposto da empresa. Esse poder genérico de representação não abrange, todavia, a competência do gerente para a nomeação de advogados, salvo se previsto no respectivo instrumento de mandato. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 606, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 21/08/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Permanecendo na forma de defesa ou acusatória do gerente preposto, Paula Moura Francesconi de Lemos Pereira, continua com a teoria da aparência, em sentido oposto à teoria ultra vires, que afirma a subsistência dos atos praticados em nome da sociedade, ainda que a prática desses atos não esteja prevista no contrato ou estatuto social ou os contrariem. A preocupação com a aparência surgiu no contexto moderno, com o advento da Revolução Industrial, diante das mudanças das relações sociais, dos processos produtivos, da rápida circulação dos bens. Essas mudanças geraram a necessidade de proteger o terceiro, pois nem sempre em razão do envolver frenético das relações é possível distinguir a aparência da realidade, não sendo possível impor cautela a priori sobre todos os aspectos de suas relações jurídicas, até porque a complexidade das relações, a rapidez, a quantidade de negócios travados diariamente, a dependência de relações contratuais, levam o home a dar maior importância ao aspecto exterior. Por isso, reconhece como válidos alguns atos aparentemente verdadeiros e lhes confere efeitos jurídicos que a lei atribui aos atos reais. Tudo para tornar as relações justas e justificadas, a despeito das aparências. Esta, por sua vez, tem como pressuposto uma situação fática que, embora inverídica ou irreal, se apresenta como verídica ou real. Deve haver uma aparência perante terceiros que contratem com a sociedade de que as pessoas que praticaram o ato em nome da sociedade detêm poderes para tanto. Além disso, a pessoa que confiou na aparência deve estar de boa-fé, ou seja, devem confiar na imagem pública ou externa da sociedade. Desta forma, se a sociedade aparenta ter determinado objeto social, e seus administradores aparentam poderes para prática de atos relacionados com seu objeto, ela responde por essa situação irreal perante terceiros de boa-fé que com ela contratam, afinal, a teoria das aparências em como finalidade a proteção de terceiros de boa-fé, prestigiar a lealdade e a confiança depositada, conferir segurança às operações jurídicas, evitar surpresas nas transações do comércio jurídico, além de permitir a dinâmica do mercado, o qual não comporta excessivas e demoradas cautelas, especialmente quando em negócios de valor proporcionalmente baixos. Nesse aspecto, a aplicação da teoria da aparência tornou-se uma necessidade jurídico-econômica-social, resultante da multiplicação e extensão das atividades humanas, da velocidade das comunicações. O dia a dia dos negócios, a celeridade da vida comercial, não permite imputar sempre ao contratante a prova da qualidade da pessoa com quem contrata, pois não ´comum algumas situações que se exija, por exemplo, contrato de trabalho de um funcionário de determinado estabelecimento comercial antes de efetuar a compra; identificação dos representantes de credores, advogados ou mandatários, que sempre recebem pagamento, mercadorias etc. A aparência jurídica tutela situações de confiança, visa a proteger as expectativas criadas, ainda que desprovidas de um regime legal preciso e objetivo, de forma a viabilizar o funcionamento do sistema, pois valoriza a dimensão social do exercício dos direitos, em uma verdadeira solidarização do direito. Desta forma, o ato praticado por aquele que aparenta ser titular do direito ou ter os necessários poderes é reputado válido e eficaz perante terceiros de boa-fé. A função da aparência é, justamente, legitimar o terceiro a tratar com aquele que parece titular de uma situação jurídica, como se realmente fosse. Essa situação envolve três pessoas: o titular real do direito, o titular aparente e terceiro contratante, mas há um conflito de interesse entre o titular real e o terceiro. No entanto, para proteger a pessoa de boa-fé, desconsidera o vício de uma situação aparente e considera como perfeita e regular. Por isso, impõe-se a produção dos mesmos efeitos jurídicos que o negócio faria se ocorresse o assentimento do verdadeiro titular. Essa teoria tem sido aplicada em vários sistemas jurídicos. Os principais fundamentos para justificar a responsabilidade daquele a quem se atribui a declaração de vontade pela obrigação que aparentemente constituía um título legítimo são a segurança das relações jurídicas e o resguardo da boa-fé de terceiros. (Paula Moura Francesconi de Lemos Pereira, intitulada “A Responsabilidade Da Sociedade Empresária e Do Empresário Pelos Atos Dos Administradores” em sua tese de Mestre em Direito Civil pela UERJ, publicado em publicadireito.com.br, acessado em 21/08/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

quinta-feira, 20 de agosto de 2020

Direito Civil Comentado - Art. 1.172, 1.173, 1.174 - continua Do gerente - VARGAS, Paulo S. R.


Direito Civil Comentado - Art. 1.172, 1.173, 1.174 - continua
Do gerente - VARGAS, Paulo S. R.
Parte Especial - Livro II – (Art. 966 ao 1.195) Capítulo III –
Dos Prepostos (Art. 1.172 a 1.176) Seção II – Do Gerente –

Art. 1.172. Considera-se gerente o preposto permanente no exercício da empresa, na sede desta, ou em sucursal, filial ou agência.

Do preposto “gerente”, segundo Marcelo Fortes Barbosa Filho - O vocábulo “gerente”, antes utilizado para designar o administrador da sociedade personificada, ganhou, no texto do Código Civil de 2002, um significado diferente e mais técnico. O presente artigo anuncia as qualidades necessárias à caracterização cie um gerente. Trata-se de um preposto que atua, permanente e diretamente, com ou sem poderes de representação, na realização dos atos de empresa, obedecendo a diretrizes fornecidas por dado empresário individual ou coletivo para o adequado e correto desenvolvimento da produção e da circulação de bens ou serviços. Dentre os prepostos, o gerente merece especial realce. Ele ostenta posição destacada, atuando, mediante a conferência de poderes fundados em uma confiança profissional e objetiva, como os olhos e os braços de seu preponente. Mantém contato permanente com terceiros, negociando e viabilizando operações concretas, sempre no interesse do empresário, como se fosse este último o autor dos atos praticados. Nos estabelecimentos empresariais complexos, em que há descontinuidade geográfica e a formação de redes de atendimento ao público, a necessidade da participação dos gerentes na realização da atividade empresarial é marcante, ante as dificuldades de presença continuada e diuturna do empresário individual ou dos administradores da sociedade empresária. É, então, fixada uma atuação localizada, delimitada a uma parcela do estabelecimento, como é o caso de uma filial, de uma sucursal ou de uma agência, pois, ao contrário do administrador, o gerente não precisa remeter seus atos ao conjunto de toda a empresa, sendo comum uma delimitação estrita. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.125. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 20/08/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

A redação da norma, de acordo com o histórico, manteve o mesmo conteúdo do projeto original. Não tem precedente no Código de 1916. O Código Comercial de 1850 (art. 86) mandava aplicar aos feitores, como eram antigamente designados os gerentes, as disposições relativas ao mandato mercantil.

Em sua Doutrina Ricardo Fiuza segundo o Código atual denomina gerente o preposto permanente que responde pelos encargos de representação da empresa, com poderes de decisão para a prática de negócios. O sócio da empresa que exerce poderes de representação não mais é designado como gerente, passando agora a ser nominado como administrador ou diretor. Gerente é apenas o agente dependente, com vínculo empregatício, subordinado aos administradores ou ao titular da firma individual, mas com ascendência sobre os demais colaboradores da empresa no âmbito do estabelecimento-sede ou em sucursal, filial ou agência em que exercer suas funções. O gerente responde pelo exercício das atividades próprias da empresa no limite das atribuições que lhe sejam delegadas em instrumento de mandato específico. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 604, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 20/08/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Na explanação de Bérith Lourenço Marques Santana, há muito, as empresas, tanto sociedades anônimas quanto limitadas, não são mais administradas por seus acionistas ou sócios quotistas, mas sim por profissionais altamente especializados, em diversas áreas do conhecimento, remunerados de formas extraordinárias e, muitas vezes, inclusive, com expressivas participações nos resultados empresariais. Nas sociedades anônimas, os profissionais eleitos pelas respectivas assembleias de acionistas para o exercício do cargo de direção já foram reconhecidos pela doutrina e pela jurisprudência dos tribunais do trabalho como não empregados, observados os preceitos da Lei 6.404/76 (Lei das Sociedades Anônimas) e, em especial, os termos do Enunciado 269 do Tribunal Superior do Trabalho (TST).

O Código Civil de 2002, por sua vez, regulou a figura do administrador de sociedades limitadas, seja sócio ou não da sociedade, por vezes com responsabilidades similares àquelas previstas para os diretores de sociedades anônimas, por exemplo, o dever de diligência – artigo 153 da Lei 6.404/76 e CC 1.011. Desde então, é comum a nomeação de administradores não sócios em sociedades limitadas, com a celebração da relação jurídica no corpo do próprio Contrato Social da sociedade, ou por intermédio de instrumento em separado levado à respectiva averbação, nos termos do CC 1.012, sem o reconhecimento concomitante de relação jurídica de emprego entre o profissional administrador e a empresa. Nesse contexto, o que se pretende discutir é a espécie de relação jurídica decorrente do trabalho de administração prestado por profissional não sócio para sociedade limitada, em especial a caracterização da relação jurídica de emprego entre a sociedade limitada e seu administrador não sócio. Isso porque, inicialmente, se poderia afirmar que a relação jurídica entre profissional que exerce a gestão administrativa em sociedade limitada é de natureza civil, consubstanciada no contrato de mandato, regulado pelos CC 653 até 692, conforme previsto no Parágrafo 2º do seu CC 1.011, que regula o exercício da administração em sociedades, vejamos: CC 1.011 – O administrador da sociedade deverá ter, no exercício de suas funções, o cuidado e a diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração dos seus próprios negócios. (…)


Parágrafo 2º – Aplicam-se à atividade dos administradores, no que couber, as disposições concernentes ao mandato. (grifo nosso). No entanto, por se tratar de uma relação de trabalho, entende-se que poderá haver caracterização do contrato de trabalho entre as partes, não obstante sua celebração sob a forma de contrato de mandato, nos termos do disposto legal acima transcrito. Ressalte-se, por oportuno, que são reconhecidas características similares entre o contrato de mandato e o contrato de trabalho, sendo certo que (i) admite-se a possibilidade de coexistência das relações jurídicas de emprego e mandato na mesma relação de trabalho do administrador e; (ii) entende-se que a relação jurídica de mandato poderá ser afastada, com o reconhecimento da relação jurídica de emprego, caso verificada a subordinação inerente ao contrato de trabalho no dia a dia da relação de trabalho do administrador não sócio. Nesse aspecto, é importante mencionar que, em contraposição ao posicionamento doutrinário no sentido da impossibilidade de coexistência das duas espécies contratuais em uma mesma relação de trabalho – contrato de mandato e de trabalho – é importante trazer ao conhecimento o ensinamento de João de Lima Teixeira Filho, em “Instituições de Direito do Trabalho”, Volume I, 21ª Edição, Editora LTr, Página 314, vejamos: “Toda essa discussão parece hoje superada. De fato o empregado, já vinculado ao empregador por um contrato de trabalho, pode receber deste um mandato para administrar interesses. São coisas separadas e inconfundíveis. O Novo Código Civil repetiu a regra do anterior (art. 1.288), que dizia: “Opera-se o mandato, quando alguém recebe de outrem poderes, para, em seu nome, praticar atos, ou administrar interesses”. Mas acrescentou: “A procuração é o instrumento do mandato” (CC 653), o que deixa evidente que só haverá mandato se houver procuração para praticar ato ou administrar interesses, não para prestar serviços numa relação contratual subordinada”. Todo esse debate doutrinário permite afirmar que é considerável o risco de os tribunais do trabalho brasileiro admitirem a coexistência das duas espécies contratuais decorrentes da mesma prestação de trabalho do profissional na qualidade de administrador.


Nesse sentido, inicialmente, veja-se o CC 653, que define o que é o contrato de mandato: Artigo 653 – Opera-se o mandato quando alguém recebe de outrem poderes para, em seu nome, praticar atos ou administrar interesses. A procuração é o instrumento do mandato. Dessa forma, é possível concluir que aquele que recebeu poderes – mandatário – pratica, em nome daquele que outorgou poderes – mandante – atos que geram direitos e obrigações ao mandante perante terceiros, como se o mandante tivesse feito parte pessoalmente do negócio celebrado por intermédio do mandatário. Os principais deveres do mandatário são: (i) a execução do mandato de acordo com as instruções, poderes e a natureza do negócio que se deve executar; (ii) manter o mandante informado sobre os negócios objeto do contrato de mandato; (iii) indenizar o mandante por prejuízo que tenha dado causa por culpa própria ou do substabelecido sem autorização do mandante e; (iv) prestar contas de sua gerência ao mandante, transferindo-lhes as vantagens decorrentes do mandato.

O mandatário, por sua vez, está obrigado, principalmente: (i) a pagar a remuneração ajustada em razão do contrato de mandato e; (ii) adiantar ou reembolsar despesas necessárias para a execução do contrato de mandato. Ressalte-se que a procuração é o instrumento pelo qual se aperfeiçoa o contrato de mandato, entendendo-se como tal a outorga verbal – autorizada por lei em algumas hipóteses –, ou por escrito – por instrumento público ou privado, nos termos do artigo 653 do Código Civil.

Por outro lado, a caracterização do contrato de trabalho segue as definições de empregador e empregado, conforme preceituado nos artigos 2º e 3º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), veja: Artigo 2º – Considera-se empregador a empresa individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviços; Artigo 3º – Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.

A definição do artigo 2º da CLT é autoexplicativa, mas deve-se dizer que como principais obrigações do empregador estão: (i) a assunção de riscos da atividade – custos, prejuízos e o comando do trabalho, inclusive, danos causados a terceiros por consequência de condutas do trabalhador contratado e; (ii) o pagamento de salários. E, ainda que igualmente autoexplicativa a definição do artigo 3º da CLT, deve-se mencionar que as principais obrigações do empregado são: (i) prestar o trabalho contratado e; (ii) a dependência – subordinação – ao poder de direção do empregador no que tange aos aspectos do contrato de trabalho. O contrato de trabalho se aperfeiçoa de forma escrita ou verbal, tácita ou expressa, nos termos dos artigos 442 e 443 da CLT, o que significa dizer que, ao contrário da regra geral do contrato de mandato, não necessita de forma específica. Note-se, nesse contexto, que as obrigações inerentes ao mandante e ao empregador são, de certa forma, similares, pois enquanto o outorgante assume custos e riscos perante terceiros pelo negócio celebrado por intermédio do outorgado, o empregador, igualmente, assume custos e riscos perante terceiros decorrentes de atos de seus empregados. Entretanto, há um aspecto essencial a diferenciar o mandatário e o empregado, especificamente, a subordinação, requisito fundamental para a caracterização do contrato de trabalho, em detrimento do contrato de mandato ou, até mesmo, para a aceitação da coexistência de ambos em uma mesma relação de trabalho. Ressalte-se que, não há como se admitir a subordinação na relação de trabalho decorrente de contrato de mandato – de forma a se considerar nulo esse último e se declarar a relação jurídica de contrato de emprego – meramente pela obrigação do outorgado de prestar informações e contas ao outorgante sobre os atos praticados na defesa dos interesses deste último. Nesse sentido a doutrina está sedimentada, valendo trazer ao debate breve assertiva do saudoso Ministro Arnaldo Süssekind, ao diferenciar contrato de trabalho e contrato de mandato, em “Instituições de Direito do Trabalho”, Volume I, 21ª Edição, Editora LTr, Página 313, observe-se: (…) a propósito da distinção entre contrato de trabalho e mandato – que “convém recorrer, mais uma vez, ao critério do vínculo de subordinação”, advertindo, contudo, que “cumpre evitar o erro de confundir subordinação com a obrigação de prestar conta”, que incumbe ao mandatário. (Grifo nosso). 

Por outro lado, a princípio, também não há como se admitir a inexistência de subordinação na relação de trabalho, de forma a caracterizar o contrato de mandato, apenas pela alegação de que o profissional não sócio nomeado administrador, que se pretende considerar mandatário outorgado, detém amplos poderes para gestão do negócio. Isso porque, a CLT, quando trata das jornadas de trabalho, em seu capítulo II, artigo 59 e seguintes, exclui dos regimes comuns de duração do trabalho, no inciso II do seu artigo 62, os empregados que exercem cargo de gerência, preceito legal este que serviu à doutrina para a conceituação do que se denominou de cargo de confiança, vejamos: Artigo 62 – Não são abrangidos por esse regime:

(…) II – os gerentes, assim considerados os exercentes de cargos de gestão, aos quais se equiparam, para efeito do disposto neste artigo, os diretores e chefes de departamento ou filial. (Grifo nosso). Isso significa que o amplo poder de gestão pode estar presente na relação jurídica de emprego, quando o empregado exerce cargo de confiança, dirigindo a atividade econômica e confundindo sua atuação com a própria figura de empregador, mas não necessariamente afastando por completo a subordinação inerente ao contrato de trabalho. Vale trazer ao conhecimento comentário de Valentin Carrion, acerca dos requisitos para a caracterização do exercício de cargo de confiança, em “Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho”, 30ª Edição, Editora Saraiva, Página 119, veja: Gerente - O conceito legal supra, art. 62, II, é o mais próximo que se possui para cargo de confiança, não obstante possa haver outros cargos de confiança, raros (o art. 499 o menciona). A denominação utilizada na empresa não é importante; a gerência pode ser no campo administrativo somente (em grandes ou pequenas empresa) ou no administrativo e no técnico (geralmente só nas médias e grandes empresas) (…) “o que vale é o poder de autonomia nas opções importantes a serem tomadas, poder este em que o empregado se substitui ao empregador”, (Grifo nosso). 

Diante disso, cumpre então adentrar-se na verificação acerca da conceituação da subordinação inerente ao contrato de trabalho: O artigo 3º da CLT, ao definir empregado, conforme já mencionado acima, exige como requisito a dependência deste em relação ao empregador, sendo certo, entretanto, que não define as espécies do gênero “dependência”. Por isso, muitos doutrinadores entendem que, como dependência, deve ser entendida, simultaneamente, tanto a subordinação econômica quanto jurídica do empregado ao empregador, enquanto outros apenas aceitam a subordinação jurídica como existente no âmbito do contrato de trabalho. Isso porque, a subordinação – dependência – econômica pode existir sem que se tenha a relação jurídica de contrato de trabalho – por exemplo, a título ilustrativo, dependência econômica no contrato de mandato. Ou, ainda, afirmar-se que o contrato de trabalho pode existir sem que o empregado tenha dependência econômica em relação ao empregador, i. é, o empregado detentor de patrimônio suficiente para não depender do salário pago pelo empregador para sua sobrevivência. Nesse cenário, adira-se à corrente, que entende que a subordinação do contrato de trabalho é jurídica e, nesse sentido, cite-se mais uma vez o saudoso Ministro Arnaldo Süssekind, em “Instituições de Direito do Trabalho”, Volume I, 21ª Edição, Editora LTr, Página 242, veja: “Mas a subordinação do empregado é jurídica, porque resulta de um contrato: nele encontra seu fundamento e seus limites (…)” Tem razão, portanto, Sanseverino, quando frisa que a subordinação própria do contrato de trabalho não sujeita ao empregador toda a pessoa do empregado, sendo, como é, limitada ao âmbito da execução do trabalho contratado.


Por conseguinte, cumpre trazer ao conhecimento os aspectos relativos à subordinação jurídica decorrente do contrato de trabalho, especificamente relacionada com: (i) o poder de comando do empregador – determinação das condições e do trabalho a ser realizado, observados limites legais e contratuais; (ii) controle – fiscalização do cumprimento das determinações acerca das condições e do trabalho e; (iii) aplicação de sanções disciplinares pelo não cumprimento das determinações. A tradução desses aspectos mais uma vez é do Ministro Arnaldo Süssekind, em “Instituições de Direito do Trabalho”, Volume I, 21ª Edição, Editora LTr, Página 243, veja-se:Ao direito do empregador de dirigir e comandar a atuação concreta do empregado corresponde o dever de obediência por parte deste; ao direito de controle correspondem os deveres de obediência, diligência e fidelidade.Ocorre que, no mundo moderno, com a constante profissionalização das empresas em detrimento das administrações executadas diretamente pelos sócios do negócio, tornou-se difícil a identificação da subordinação no caso dos grandes executivos, sendo certo que essa peculiaridade, por si só, não afasta o reconhecimento do contrato de trabalho em casos de grandes executivos. A esse respeito, vale citar Valentin Carrion, em “Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho”, 30ª Edição, Editora Saraiva, Página 38, em foco:Entretanto, há casos em que a subordinação de fato não é visível, restando em estado potencial (trabalho em que o próprio resultado da atividade evidencia a aceitação das normas prefixadas e a quantidade de produção; altos empregados). Há autores que abandonam o critério da subordinação, preferindo caracterizá-lo simplesmente por “trabalho por conta alheia para organização ou empresa” (Alonso Olea, “Introducción al derecho del trabajo”); “o trabalho por conta alheia ou para outrem, que torna seus, direta e indiretamente, os frutos materiais e imateriais do mesmo trabalho, remunerando-os. (Idem, LTr 38/789, 1974). O Direito do Trabalho incide sobre trabalhadores cujo vínculo de subordinação é tênue; (grifo nosso). Segundo entendimento do autor, quem melhor traduziu essa dificuldade de identificação da subordinação nas relações de trabalho entre empresas e altos executivos foi Amauri Mascaro Nascimento, em “Curso de Direito do Trabalho”, 19ª Edição, Editora Saraiva, Página 597:Toda dificuldade resulta do fato de agirem como representantes do próprio empregador e com um poder de iniciativa muito grande, a ponto de serem responsáveis pela marcha do negócio.No entanto, ainda que possa ser considerada de difícil identificação, a subordinação é, sem margem de dúvidas, o requisito fundamental para a definição da relação jurídica de emprego em detrimento de qualquer outra da qual se revista a relação jurídica no seu aspecto formal. E, sendo assim, para a análise do requisito subordinação, é necessária a verificação dos poderes conferidos aos administradores não sócios de sociedades limitadas, sendo certo que a menção à investidura de “plenos poderes” ao administrador permite, a princípio, deduzir que não haveria nessa relação jurídica a subordinação inerente ao contrato de trabalho. No entanto, caso se verifique limitações aos “plenos poderes” dos administradores – para atos como alienar, transigir, hipotecar, levantar dinheiro, substabelecer, emitir nota promissória, renunciar direito, transmitir dívidas, fazer doação, fazer novação, dar fiança, emitir cheque – pode-se afirmar que estará caracterizada a espécie ordinária da administração dos interesses da empresa, que não contempla atos considerados pelo legislador como de extremo comprometimento. (Bérith Lourenço Marques Santana, editado em 23 de maio de 2013 em editorajc.com.br, Justiça & Cidadania, artigo intitulado: A relação jurídica do administrador não sócio com a sociedade limitada sob a ótica do direito do trabalho, Acessado 20/08/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).


Art. 1.173. Quando a lei não exigir poderes especiais, considera-se o gerente autorizado a praticar todos os atos necessários ao exercício dos poderes que lhe foram outorgados.

Parágrafo único. Na falta de estipulação diversa, consideram-se solidários os poderes conferidos a dois ou mais gerentes.

Sob escrutínio de Marcelo Fortes Barbosa Filho, Ao gerente, o empresário pode dar uma autorização genérica para a prática de quaisquer atos ticios como necessários ao pleno desempenho dos encargos conferidos. Tal outorga de poderes pode ser formalizada por meio de um instrumento, mas, em geral, é feita informalmente, persistindo uma simples conferência verbal de atribuições e ficando o gerente imediatamente incumbido da prática de atos de organização interna ou, ainda, de operações envolvendo terceiros. Entre os atos passíveis de serem atribuídos ao gerente, alguns dizem respeito à disposição, mediante alienação ou modificação, de direitos e merecem ressalva legal ou convencional, por sua especificidade e importância, exigindo a conferência de poderes especiais e impondo uma explícita declaração do preponente, mas se trata, evidentemente, de situações de caráter excepcional. Ademais, o parágrafo único prevê, também, a possibilidade de, subsistindo vários gerentes, serem cumulados os poderes conferidos, o que se presume, ou serem repartidas e delimitadas áreas de atuação específicas. De fato, a complexidade das situações concretas pode exigir a pluralidade de gerentes, sendo os poderes de cada qual sempre conferidos de acordo com a conveniência do empresário-preponente, que emitirá as determinações necessárias ou oportunas. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.126. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 20/08/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Na visão de Ricardo Fiuza, os poderes de representação e para a realização de negócios são outorgados ao gerente mediante procuração por instrumento público ou particular O instrumento de mandato deve especificar que poderes terá o gerente, devendo este agir somente de acordo com os poderes que lhe foram confiados. A lei, todavia, poderá exigir a outorga de poderes especiais e expressos para a prática de determinados atos, tal como ocorre nos processos de licitação pública (Lei n. 8.666/93), que exigem a delegação de poderes específicos de representação para agir em nome da empresa. Se em um mesmo instrumento de mandato forem delegados poderes para dois ou mais gerentes, não havendo previsão expressa, presume-se que existirá solidariedade entre eles, ainda que o ato ou negócio tenha sido praticado somente por um deles. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 605, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 20/08/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Seguindo com Bérith Lourenço Marques Santana, nesse contexto, no âmbito do poder da administração ordinária, quando não há outorga de poderes especiais, ou quando há limitações na outorga de poderes especiais para o administrador, em nossa opinião é possível concluir pela subordinação desse profissional nomeado administrador em relação à sociedade limitada. Mas é o próprio Código Civil, nos CC 1.172 e 1.173, que informa quem pode ser o gestor da sociedade com poderes limitados, veja: Artigo 1.172 – Considera-se gerente o preposto permanente no exercício da empresa, na sede desta, ou em sucursal, filial ou agência; Art. 1.173 – Quando a lei não exigir poderes especiais, considera-se o gerente autorizado a praticar todos os atos necessários ao exercício dos poderes que lhe foram outorgados.

Na verdade, para o Código Civil, o preposto permanente no exercício da empresa, com limitação de poderes de gestão, é considerado gerente; o qual, para o direito do trabalho, é o empregado investido em cargo de confiança. Além disso, nas hipóteses em que o administrador responde, ou tem seus atos fiscalizados e limitados pelos sócios, ou por um conselho diretivo, pode-se afirmar que, mais uma vez, apresenta-se um elemento caracterizador da subordinação. Nesse sentido, cumpre mais uma vez trazer ao conhecimento os ensinamentos de Amauri Mascaro Nascimento, em “Curso de Direito do Trabalho”, 19ª Edição, Editora Saraiva, Página 600, Leia-se: “Razões dessa ordem têm influído no posicionamento de doutrinadores trabalhistas, com reflexos sobre os juízes, ao sustentarem a tese, exemplificada na afirmação de Octávio Bueno Magano (“Manual de Direito do Trabalho”, São Paulo, LTr, 1981, v.2, p. 119), segundo a qual os diretores são subordinados ao conselho de administração e por tal motivo hão de ser, necessariamente, classificados como empregados, já que a subordinação é o traço característico do contrato de trabalho”. (Grifo nosso). Por fim, cumpre ressaltar que as previsões legais destinadas aos administradores de sociedades limitadas servem para regular as relações – direitos e obrigações – desses profissionais perante as sociedades e terceiros, assim como as suas responsabilidades no exercício da administração. Isso significa dizer que os direitos e obrigações desses profissionais em relação às sociedades, no âmbito da legislação do trabalho, não são excluídos pela legislação civil, mas coexistem dentro da órbita sistemática jurídica. Considerando os fundamentos apresentados, está claro que as sociedades limitadas que não consideram como empregados os profissionais que exercem a sua administração sem poderes especiais, ou com limitação de poderes especiais, estão sujeitas aos riscos de constituição de passivos trabalhista, previdenciário e fiscal, tanto na esfera natureza administrativa quanto judicial. (Bérith Lourenço Marques Santana, editado em 23 de maio de 2013 em editorajc.com.br, Justiça & Cidadania, artigo intitulado: A relação jurídica do administrador não sócio com a sociedade limitada sob a ótica do direito do trabalho, Acessado 20/08/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Art. 1.174. As limitações contidas na outorga de poderes, para serem opostas a terceiros, dependem do arquivamento e averbação do instrumento no Registro Público de Empresas Mercantis, salvo se provado serem conhecidas da pessoa que tratou com o gerente.

Parágrafo único. Para o mesmo efeito e com idêntica ressalva, deve a modificação ou revogação do mandato ser arquivada e averbada no Registro Publico de Empresa Mercantis.

No lecionar de Marcelo Fortes Barbosa Filho, o empresário-preponente pode atribuir ao gerente-preposto a qualidade de seu representante e, de acordo com sua conveniência concreta, como decorre do parágrafo único do artigo anterior, delimitar o âmbito de eficácia de tal representação. As balizas precisam ser expressas, ficando patente, ante a redação legal adotada, a preocupação de estabelecer regras relativas à responsabilidade decorrente dos atos praticados com abuso ou excesso de poderes, equilibrando as posições do empresário-preponente, o representado, e dos terceiros eventualmente prejudicados. Ultrapassados os limites estabelecidos para a atuação de dado gerente e, portanto, concluídos atos exorbitantes, não há como questionar a própria responsabilidade do preposto, o autor de um ilícito; mas como é, então, definida a posição do empresário, tal responsabilidade pode subsistir, ou não, conforme tenham sido tomadas providências prévias e necessárias à plena divulgação dos limites da representação e esteja presente, ou não, a boa-fé do terceiro prejudicado. Com efeito, desde que a representação tenha sido instrumentalizada por um documento escrito, levado a registro público perante a Junta Comercial onde for mantida sua inscrição, a responsabilidade do preponente será afastada. Forma-se uma presunção absoluta do conhecimento das limitações expressamente impostas, ficando o preponente imune aos resultados danosos da violação do ajuste concreto dessa mesma representação. Trata-se de uma primeira regra legal. Se não houver, no entanto, sido promovido, mediante arquivamento (art. 32, II, e, da Lei n. 8.934/94), o registro do instrumento de representação, o preponente responderá pelos excessos perpetrados pelo preposto, tendo em conta a aparência de licitude gerada, o que conforma uma segunda regra. Induz-se, assim, a solidariedade passiva, resguardando os terceiros prejudicados. Somente o conhecimento contemporâneo da natureza exorbitante do ato perpetrado pelo gerente, i. é, a má-fé do terceiro prejudicado, demonstrada a ausência de aparência a ser tutelada, exclui, também, a responsabilidade do empresário-preponente. O parágrafo único reforça essas duas regras e estende sua aplicação à modificação dos poderes do gerente-preposto, derivada da fixação de novos limites de atuação, bem como à pura e simples revogação de tais poderes. Diante da modificação ou da extinção da representação, a divulgação registrária isenta o preponente de responsabilidade pela atuação do preposto, salvaguardada, quando ausente o necessário arquivamento, a aparência. (Marcelo Fortes Barbosa Filho, apud Código Civil Comentado: Doutrina e Jurisprudência: Lei n. 10.406, de 10.02.2002. Coord. Cezar Peluso – Vários autores. 4ª ed. rev. e atual., p. 1.127. Barueri, SP: Manole, 2010. Acessado 20/08/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).

Como esclarece Ricardo Fiuza em sua doutrina, de acordo com este dispositivo, toma-se obrigatório o arquivamento e averbação do instrumento de mandato do gerente no Registro Público de Empresas Mercantis, para que os limites dos poderes conferidos possam ser opostos pelos titulares da empresa perante terceiros. A Lei n. 8.934494 não exige o arquivamento das procurações de outorga de poderes de gerência, tal como era previsto na antiga Lei do Registro do Comércio (Lei n. 4.726/ 65), exigência agora revigorada pelo Código Civil de 2002. Na hipótese de a pessoa que realizou negócio com o gerente ter ciência da limitação de seus poderes, e somente nesse caso, não se afigura Obrigatório o arquivamento do instrumento de mandato. Para a produção dos mesmos efeitos perante terceiros, qualquer alteração nos poderes delegados ou a própria revogação do mandato deverá ser arquivada e averbada à margem da inscrição da empresa no Registro Público de Empresas Mercantis. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 605, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acesso em 20/08/2020, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Em artigo publicado por Paula Moura Francesconi de Lemos Pereira, intitulada “A Responsabilidade Da Sociedade Empresária E Do Empresário Pelos Atos Dos Administradores, A sociedade empresária e o empresário agem por intermédio de seus administradores, gerentes e prepostos, os quais têm relevante papel na vida interna e externa da empresa. É por meio deles que as pessoas jurídicas celebram negócios   jurídicos necessários para atingir seus objetos sociais. Todavia, nem sempre os atos praticados em nome da sociedade empresária por meio de seus administradores, gerentes, se coadunam com seu objeto social e muitas vezes são praticados com excesso de poderes. Nessas hipóteses surge a seguinte indagação: a sociedade empresária e o empresário são responsáveis por esses atos? A resposta  a  essa  pergunta  decorre  da  aplicação  de  duas  teorias: a  teoria  do  ato ultra vires, e a teoria da aparência, que apesar da aparente colisão convivem de forma harmônica no ordenamento  jurídico  fático.  Por essa razão, cabe ao aplicador do direito, por meio de  um estudo  sistemático,  identificar  as  hipóteses  em  que  a  sociedade  responderá  pelos atos praticados por seus administradores e prepostos levando em consideração  a segurança jurídica, a boa-fé, a função social do contrato, entre outros fatores.

A administração é o órgão da sociedade por meio do qual ela assume obrigações e exerce direitos. Os administradores, são, portanto, intermediários da pessoa jurídica. É através deles que a sociedade se faz presente. Por isso, são figuras centrais da empresa, que se encontram na posição de chefe, no ápice da pirâmide hierárquica. Uma vez definido o objeto social, deve o contrato ou estatuto social definir a administração da sociedade, a forma como será realizada, os poderes conferidos aos administradores, pois só assim será possível a sociedade ter vida própria, travar suas relações. Os administradores da sociedade exteriorizam sua vontade e realizam, no limite de seu objeto social, os negócios jurídicos. Eles são responsáveis não só pela vida interna, mas externa da sociedade, fazendo com que ela funcione, atue perante terceiros, contraindo obrigações e constituindo direitos. Por isso, gozam de poderes naturais de administração e especiais. No entanto, para tal exercício, devem agir com lealdade, diligência, desempenhando sua função com cuidado, no interesse d sociedade, para alcançar os seus fins. E, uma vez realizado o negócio é a sociedade que responderá por ele. Para que a sociedade funcione, o administrador terá, por exemplo, que mobilizar os meios financeiros da sociedade, efetuar depósitos, abrir contas bancárias, contrair empréstimos, emitir títulos cambiários, endossá-los, avalizá-los, realizar compras e vendas, dentre outros negócios jurídicos. Esses poderes são muitas vezes equiparados ao dos mandatários, muito embora não sejam os administradores investidos de mandato como órgão da sociedade.

Diversas teorias surgiram para explicar sob que condições a conduta do indivíduo-administrador pode representar a conduta da pessoa jurídica. A natureza jurídica da figura do administrador para todas as espécies de sociedades comerciais é objeto de basicamente quatro teorias: (i) teoria do mandato, pela qual o gerente seria mandatário da sociedade e, por isso, não responde pelas obrigações que assume em nome da sociedade, desde que permaneça nos limites de seus poderes (crítica – possibilidade do administrador manifestar sua vontade pessoal e não ter direito de reter a coisa administrada); (ii) teoria da representação, pela qual o diretor ou gerente é mandatário da sociedade, por isso não responde pessoalmente pelas obrigações da sociedade; (iii) teoria da locação de serviços; e (iv) teoria do órgão, em que o gerente, diretor ou administrador, é um órgão da sociedade comercial, que executa a vontade da pessoa jurídica, presenta a sociedade. A designação das pessoas naturais incumbidas da administração da sociedade, seus deveres, poderes, e destituição, dependem do tipo societário, podendo ser ou não sócios da sociedade, além da nomeação poder ser feita em ato separado do contrato (CC 997, VI).

Todavia, nem todo tipo societário tem regras próprias sobre os deveres e o regime de responsabilidade dos administradores, e forma de destituição (CC 1.011, 1.019, 1.063 c/c CC 1.0171, mais arts 150 e 151 da Lei n. 6.404/76), podendo aplicar subsidiariamente, por expressa previsão legal, as regras sobre sociedade simples, que, de forma ampla, tratam de dever de diligência dos administradores no exercício de suas funções, dispõe sobre a administração conjunta ou separada, trata dos poderes dos administradores e a proteção de terceiros, estabelece a responsabilidade solidária e veda atuação em conflito de interesse (CC 1.010 a 1.021). No caso da sociedade limitada (CC 1.060 a 1.062), pode haver aplicação subsidiária da lei das sociedades anônimas, por força do disposto no CC 1.053, o que implicará na incidência dos arts. 153 a 158 da Lei n. 6.404/76. O contrato social pode ou não predefinir a competência gerencial de cada administrador. Todavia, se definir, o administrador só poderá atuar dentro dos limites de suas atribuições contratualmente delineadas e, caso não haja previsão, poderão praticar todos os atos necessários para gerir a sociedade (CC 1.015, caput e art. 144 da Lei n. 6.404/76). (...).

A responsabilidade da pessoa jurídica pode decorrer da violação de obrigações de negócios jurídicos, cujo dever de indenizar é consequência do inadimplemento, falta do cumprimento de qualquer obrigação, chamada de responsabilidade contratual, prevista no CC 389, ou da infringência de deveres legais ou sociais, consistentes estes nos princípios gerais de direitos, sem que entre o ofensor e a vítima pré exista qualquer relação jurídica que o possibilite. É a responsabilidade extracontratual ou aquiliana, CC 43, 186, 927, 923, III, todos do mesmo Código. No entanto, na atualidade, essa distinção é mais por zelo didático do que um efeito jurídico necessário, principalmente diante de novas regras de responsabilidade civil. A lei consumerista, por exemplo, superou essa divisão clássica entre responsabilidade contratual e extracontratual ao que diz respeito à responsabilidade do fornecedor de produtos e serviços, pois estende o conceito de consumidor a todos aqueles que forem vítimas do acidente de consumo, sendo indiferente haver relação direta. Isto porque o fundamento da responsabilidade é o dever de segurança. No caso em comento, a despeito da tendência unificadora do instituto da responsabilidade civil, a análise se restringirá a responsabilidade contratual da sociedade empresária perante terceiros contratantes quando os atos praticados por seus administradores em seu nome estão fora de seu objeto social, extrapolando os limites da representação, ou, até mesmo, sem poderes para tanto. (Paula Moura Francesconi de Lemos Pereira, intitulada “A Responsabilidade Da Sociedade Empresária e Do Empresário Pelos Atos Dos Administradores” em sua tese de Mestre em Direito Civil pela UERJ, publicado em publicadireito.com.br, acessado em 20/08/2020. Revista e atualizada nesta data por VD).