segunda-feira, 27 de setembro de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.954, 1.955, 1.956 DAS SUBSTITUIÇÕES – Da Substituição Fideicomissária - VARGAS, Paulo S. R. vargasdigitador.blogspot.com – digitadorvargas@outlook.com

Direito Civil Comentado – Art. 1.954, 1.955, 1.956
DAS SUBSTITUIÇÕES – Da Substituição Fideicomissária
- VARGAS, Paulo S. R. vargasdigitador.blogspot.com
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Parte Especial – Livro V – Do Direito das Sucessões -
Título III – Da Sucessão Testamentária – Capítulo IX –-
DAS SUBSTITUIÇÕES –Seção II - Da Substituição
Fideicomissária (Art. 1.951 a 1.960)

 

Art. 1.954. Salvo disposição em contrário do testador, se o fiduciário renunciar a herança ou o legado, defere-se ao fideicomissário o poder de aceitar.


Não há paralelo no Código Civil de 1916. Na interpretação do relator a Doutrina - Se o fiduciário renunciar à herança ou ao legado, e se outra coisa não tiver determinado o testador, defere-se ao fideicomissário o poder de aceitar. Note-se: o fideicomissário não é herdeiro ou legatário do fiduciário; tanto quanto este, é herdeiro ou legatário do testador, embora a efetiva entrega dos bens dependa da morte do fiduciário, do termo ou da condição. Com a renúncia do fiduciário, antecipa-se a vocação hereditária do fideicomissário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 1.016, CC 1.954, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 27/09/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Em artigo de Fábio Sérgio do Amaral, publicado no site direitonet.com.br, em 19/11/2003, intitulado “Usufruto e Fideicomisso - Pontos de tangência e suas diferenças essenciais, bem como as inovações introduzidas no novo Código Civil”, em seu item 4. O Fideicomisso no Novo Código Civil, como sugere o autor: 

Com relação ao fideicomisso, as alterações essenciais em comparação ao Código Civil de 1916 encontram-se nos artigos 1952 e 1954 CC. Diz o artigo 1952: A substituição fideicomissária somente se permite em favor dos não concebidos ao tempo da morte do testador. (grifei).

Parágrafo único: Se, ao tempo da morte do testador, já houver nascido o fideicomissário, adquirirá este a propriedade dos bens fideicomitidos, convertendo-se em usufruto o direito do fiduciário.

A locução somente limita a incidência do instituto do fideicomisso, uma vez que, afora a hipótese prevista neste artigo, nenhuma outra forma de substituição fideicomissária será admitida. Esse dispositivo pode ser considerado decorrente das ideias que fundamentaram as críticas dirigidas ao instituto e que objetivavam sua eliminação do ordenamento jurídico. Orlando Gomes entende que “a substituição fideicomissária se apresenta como o recurso exclusivo para favorecer prole eventual do testador...”, (Sucessões. 6ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1986), Daí porque se justifica seu emprego somente nestes casos.

Há que se firmar ainda importante questionamento, diretamente ligado aos aspectos práticos decorrentes do novo texto legal. Se ao tempo da morte do testador já houver nascido o fideicomissário, sendo a ele transmitida a propriedade, como preconiza o parágrafo único, passando o fiduciário à condição de usufrutuário, como resolver a questão das posições jurídicas dos envolvidos?


Mesmo questionamento foi arguido por Sérgio Jacomino, em alentado artigo intitulado O Fideicomisso no Projeto do Código Civil, desde antes da efetiva entrada em vigor do novo Codex. Aqui a novidade da conversão do fideicomisso em usufruto, potencializa a confusão que amiúde se verifica na distinção entre estes institutos quando figuram em disposições de última vontade. “Além disso, suposto que a instituição do fideicomisso pode se dar por ato intervivos, como se dará a conversão do direito (propriedade resolúvel) do fiduciário em usufruto?! Como se dará a aquisição da propriedade dos bens pelos fideicomissários?! Como se opera essa mutação jurídica no registro imobiliário?! A questão, mais uma vez, deverá passar pelo crivo do Judiciário nos procedimentos especiais de jurisdição voluntária, nos termos do art. 1112 do CPC/1973, (correspondendo ao art. 725 no CPC/2015 – Nota VD) ” (O Fideicomisso no Projeto do Código Civil. Site do Quinto Cartório de Registro de Imóveis - www.quinto.com.br).

 Outra inovação, de menor repercussão que a anteriormente exposta, é a do art. 1954 do CC, que assim dispõe: “Salvo disposição em contrário do testador, se o fiduciário renunciar a herança ou o legado, defere-se ao fideicomissário o poder de aceitar.

Sob o aspecto da vocação hereditária, quando um herdeiro renuncia, tal fato lhe acarreta como consequência ser considerado como se nunca tivesse existido, daí, portanto, seus herdeiros também não são chamados à herança, por força do disposto no art. 1.811 do Código Civil, que estabelece que ninguém pode suceder, representando herdeiro renunciante, salvo se for o único de sua classe ou se todos os outros também renunciarem. Se fosse aplicado o mesmo procedimento para os casos em que o fiduciário renunciasse, não cabendo a ninguém mais a aceitação ou renúncia da herança, a própria lei estaria desprotegendo as pessoas para as quais foi criado o instituto do fideicomisso, ferindo seu espírito, que é o favorecimento e resguardo de eventual prole do testador. Portanto, a inovação introduzida com o art. 1.954 do CC visa, mais uma vez, resguardar direito futuro do fideicomissário. (Fábio Sérgio do Amaral, publicado no site direitonet.com.br, em 19/11/2003, intitulado “Usufruto e Fideicomisso - Pontos de tangência e suas diferenças essenciais, bem como as inovações introduzidas no novo Código Civil”, em seu item 4. O Fideicomisso no Novo Código Civil, acessado em 27/09/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Comentado na Equipe de Guimarães e Mezzalira, o fiduciário tem a prerrogativa de aceitar a coisa fideicomitida ou renunciá-la, tornando-se o fideicomissário proprietário absoluto da coisa transmitida. Às vezes, tendo deixado para uma prole que foi gerada dentro do prazo de dois anos, pode o testador prever que, com a renúncia do fiduciário, e o fideicomissário menor de idade, receba a coisa ao adquirir a maioridade ou semelhante, determinando que o bem seja entregue a alguém como guardião e cumpridor de sua vontade. Essa pessoa será usufrutuário da coisa, podendo usar os frutos da coisa para criação do menor ou depositando em conta poupança ou coisa parecida, para que o menor não seja prejudicado. (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.954, acessado em 27/09/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.955. O fideicomissário pode renunciar a herança ou o legado, e, neste caso, o fideicomisso caduca, deixando de ser resolúvel a propriedade do fiduciário, se não houver disposição contrária do testador.

Como reporta o relator em sua doutrina, a substituição fideicomissária caduca e se extingue se o fideicomissário renunciar à herança ou ao legado. Deixa, portanto, de ser restrita e resolúvel, tomando-se plena e pura a propriedade do fiduciário, a não ser que haja disposição contrária do testador, como, por exemplo, se designou um substituto para o caso de renúncia do fideicomissário (cf. BGB, Art. 2.142; Código Civil brasileiro de 1916, Art. 1.735). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 1.016, CC 1.955, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 27/09/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Segundo Ricardo da Silva Bastos, pela renúncia do fideicomissário, nos termos do art. 1.955 do CC, o qual dispõe que, nesta hipótese, deixa de ser resolúvel a propriedade do fiduciário, ou seja, consolida-se a propriedade dos bens fideicomitidos no fiduciário, desde que outra não tenha sido a vontade expressa pelo fideicomitente, o qual poderá, por exemplo, ter determinado que os bens voltassem para os herdeiros legítimos. (Ricardo da Silva Bastos, em artigo publicado em 18/02/2019, no site bastosbertolaccini.adv.br, intitulado “Direito de acrescer e substituições testamentárias”, comentários aos artigos precedentes, CC 1.941 e ss., acessado em 27/09/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Convictamente, Guimarães e Mezzalira et al, sim, o fideicomissário poderá renunciar, o que é pouco provável, por se tratar de menor impúbere ou púbere, até que a coisa lhe seja entregue. Sua manifestação de vontade é restrita, sempre presente o Ministério Público para protege-lo. Seus genitores não poderão renunciar por ele, salvo autorização judicial. Isso significa que o texto legal é cópia do Código revogado, copiado pelo legislador atual.

 

Jurisprudência: Direito processual civil. Sucessões. Recurso especial. Disposição testamentária de última vontade. Substituição fideicomissária. Morte do fideicomissário. Caducidade do fideicomisso. Obediência aos critérios da sucessão legal. Transmissão da herança aos herdeiros legítimos, inexistes os necessários. – Não se conhece do recurso especial quanto à questão em que a orientação do STJ se firmou no mesmo sentido em que decidido pelo Tribunal de origem. – A substituição fideicomissária caduca se o fideicomissário morrer antes dos fiduciários, caso em que a propriedade destes consolida-se, deixando, assim, de ser restrita e resolúvel (arts. 1.955 e 1.958 do CC/02). – Afastada a hipótese de sucessão por disposição de última vontade, oriunda do extinto fideicomisso, e, por consequência, consolidando-se a propriedade nas mãos dos fiduciários, o falecimento de um destes sem deixar testamento, impõe estrita obediência aos critérios da sucessão legal, transmitindo-se a herança, desde logo, aos herdeiros legítimos, inexistindo herdeiros necessários. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido. (STJ – REsp 820814 SP 2006/0031403-9, Relator: Min. Nancy Andrighi, DJ 09/10/2007, T3, DJe 25/10/2007, p 168). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.955, acessado em 27/09/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Art. 1.956. Se o fideicomissário aceitar a herança ou o legado, terá direito à parte que, ao fiduciário, em qualquer tempo acrescer.

 

Como lógica a aquiescência na doutrina do relator, se a disposição era conjunta (arts. 1.941 e 1.942) e o fiduciário exerceu o direito de acrescer, vindo o fideicomissário a aceitar a herança ou legado, terá direito à parte que, ao fiduciário, em qualquer tempo acrescer. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 1.016-017, CC 1.956, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 27/09/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Neste sentido, Ricardo da Silva Bastos, quanto aos deveres do fiduciário, logo no item 1. a) Passar os bens ao fideicomissário. Sobre eventuais benfeitorias, não existe consenso na doutrina, entendendo Caio Mário (Instituições de Direito Civil, cit., p. 302.), com fundamento em Itabaiana de Oliveira (Tratado de Direito das Sucessões, cit., p. 292.), que teria o fiduciário direito às benfeitorias úteis e necessárias, não quanto às voluptuárias. Silvio Venosa, no entanto, posiciona-se totalmente contrário, quando afirma que “o fideicomissário recebe os bens com os acréscimos ou cômodos feitos pelo fiduciário (art. 1.956; antigo, art. 1.736). Não tem, pois o fiduciário direito à indenização ou retenção por benfeitorias. Justo, contudo, que possa levantar as benfeitorias voluptuárias”. Embora o art. 1.956 do CC estabeleça que “se o fideicomissário aceitar a herança ou o legado, terá direito à parte que, ao fiduciário, em qualquer tempo acrescer”, parece-nos que ainda resta ao fiduciário a indenização pelas benfeitorias úteis e necessárias, podendo inclusive levantar as voluptuárias, tudo nos termos do art. 1.219 do CC. O art. 1.956, por sua vez, menciona direito de acrescer, dando a impressão de tratar de situações outras, não de benfeitorias realizadas sobre os bens pelo próprio fiduciário. Eduardo Oliveira Leite, comentando o art. 1.956 do CC, cita vários exemplos em que poderá ocorrer direito de acrescer ao fiduciário beneficiando o fideicomissário. Assim, ” a) se o fideicomisso for de- legado, ao que acrescer ao fiduciário como legatário (art. 1.946); b) se o testador fez o fiduciário substituto de outro coerdeiro, ou legatário, o fideicomissário terá direito, também a essa parte; c) se o testador, com herdeiros legítimos, a um deles dá fideicomisso (“deixo a B o fideicomisso da quota do meu sobrinho mais velho”, “deixo aos meus herdeiros legítimos, sendo fiduciário do mais moço B”, ou se construtivos os fiduciários), o que advier em virtude dos arts. 1.906 e 1944, entende-se devido ao fideicomissário; d) se o legado ou modos imposto ao fiduciário cai (por exemplo, parágrafo único do art. 1.944) aproveita isso ao fideicomissário” (Comentários ao Novo Código Civil, cit., p. 623.). (Ricardo da Silva Bastos, em artigo publicado em 18/02/2019, no site bastosbertolaccini.adv.br, intitulado “Direito de acrescer e substituições testamentárias”, comentários aos artigos precedentes, CC 1.941 e ss., acessado em 27/09/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

 

Parecendo mais uma afirmação que comentário simples, acresce a equipe de Guimarães e Mezzalira – como o fiduciário detém a coisa, poderá fazer benfeitorias úteis, necessárias ou voluptuárias, sendo todas incorporadas à coisa. (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.956, acessado em 27/09/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

sexta-feira, 24 de setembro de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.951, 1.952, 1.953 DAS SUBSTITUIÇÕES – Da Substituição Fideicomissária - VARGAS, Paulo S. R. vargasdigitador.blogspot.com – digitadorvargas@outlook.com

Direito Civil Comentado – Art. 1.951, 1.952, 1.953
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Parte Especial – Livro V – Do Direito das Sucessões -
Título III – Da Sucessão Testamentária – Capítulo IX –-
DAS SUBSTITUIÇÕES – Seção II - Da Substituição
Fideicomissária (Art. 1.951 a 1.960)

 

Art. 1.951. Pode o testador instituir herdeiros ou legatários , estabelecendo que, por ocasião de sua morte, a herança ou o legado se transmita ao fiduciário , resolvendo-se o direito deste, por sua morte, a certo tempo ou sob certa condição, em favor de outrem , que se qualifica de fideicomissário. 

Na palavra deste autor VD, maquinismo desnecessário, perda de tempo, e, na doutrina do relator, não se confunde com qualquer regra testamentária. Segundo a doutrina de Ricardo Fiuza, relator do CC/2002, as fontes do fideicomisso estão no direito romano. Na Idade Media, o instituto foi utilizado larga e abusivamente, eternizando vínculos, mantendo por sucessivas gerações, os privilégios aristocráticos, o que lhe rendeu profunda antipatia, sendo considerado uma figura antidemocrática.

Dá-se o fideicomisso (substituição fideicomissária) quando o testador nomeia herdeiro ou legatário, determinando que, por ocasião da morte do instituído (quum morietur), a certo tempo ou sob certa condição, a herança ou legado passará a outra pessoa. Na prática na maioria dos casos, prevê-se a transmissão ao fideicomissário com a morte do fiduciário sendo raras as hipóteses de fideicomissos modais (submetidos a condição) e a termo (dependentes de certo prazo).

O Fideicomisso chama-se universal quando sua instituição disser respeito à totalidade da herança ou a uma quota ideal desta, e particular quando incide sobre a coisa certa e determinada do acervo hereditário. 

O art. 1.951 correspondente ao art. 1.733 do Código Civil de 1916, mas este fala na obrigação do fiduciário de transmitir a herança ou legado ao fideicomissário e, a rigor, o fiduciário não tem a obrigação de transmitir, pois quando chega o momento, a transmissão é automática, opera por força da lei, seguindo os ditames do testador. 

Confundem alguns autores usufruto e fideicomisso. São figuras semelhantes, muito parecidas até , mas completamente distintas. Muitas vezes, não se conclui pela simples leitura da clausula testamentária se o testador instituiu usufruto ou determinou substituição fideicomissária. A interpretação da clausula testamentária precisará revelar qual a real vontade do testador (art. 1899). A tarefa, não raramente, é exaustiva, dificílima. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 1.015, CC 1.951, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 24/09/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Seguindo com Ricardo da Silva Bastos, 2.2.3. Substituição fideicomissária.

Impropriamente denominada de substituição, o fideicomisso é uma forma de disposição da herança ou do legado, na qual o testador deixa os seus bens ao fiduciário, para que este, após certo tempo, implementado de uma condição, ou sua morte, passe os bens ao herdeiro fideicomissário. 

2.4. Do fideicomisso - O artigo 1.951 do novo Código Civil dispõe que “pode o testador instituir herdeiros ou legatários, estabelecendo que, por ocasião de sua morte, a herança ou o legado se transmita ao fiduciário, resolvendo-se o direito deste, por sua morte, a certo tempo ou sob certa condição, em favor de outrem, que se qualifica de fideicomissário.”

 

O fideicomisso não é novidade legislativa criada neste Código Civil. O estatuto de 1916 já previa a possibilidade do testador valer-se desta cláusula, embora o instituto tenha sofrido sensíveis modificações, como será visto. (O art. 1.733 do Código Civil revogado estabelecia que “pode também o testador instituir herdeiros ou legatários por meio de fideicomisso, impondo a um deles, o gravado ou fiduciário, a obrigação de, por sua morte, a certo tempo, ou sob certa condição, transmitir ao outro, que se qualifica de fideicomissário, a herança, ou o legado”).

 

O instituto jurídico do fideicomisso teve origem em Roma, diante da necessidade que tinham alguns testadores em deixar bens para pessoas não legitimadas para tanto. Assim, o “testador burlava eventuais proibições pedindo a um herdeiro que se encarregasse de entregar seus bens ao terceiro que o testador queria verdadeiramente beneficiar. O disponente confiava na boa-fé do herdeiro (fidei tua commito), de onde proveio a palavra fideicomisso (fideicomissum). O testador “cometia” (entregava) a herança a alguém, sob confiança de sua boa-fé (fidei tua).” (Silvio de Salvo Venosa, Direito Civil, vol. VII, cit., p. 283).

 

Deve-se entender por fideicomisso a disposição testamentária na qual o testador institui herdeiro ou legatário para que ao fim de determinado tempo, implemento de uma condição, ou a morte deste, receba outra pessoa o que lhe coube. O fideicomisso, segundo Itabaiana de Oliveira, poderá ser “a) universal – quando abrange a totalidade ou uma fração da massa hereditária, correspondente a uma instituição de herdeiro; b) particular – quando se restringe a uma porção certa e determinada da herança, sendo, neste caso, uma peculiar modalidade do legado”.

 

Advirta-se que o fideicomisso não é instituto exclusivo do direito das sucessões. Conforme Silvio de Salvo Venosa, “nada impede que, por ato entre vivos, no direito obrigacional, se estipule o fideicomisso. Nada existe na lei para impedi-lo e a propriedade resolúvel é legalmente aceita entre nós. Apenas ocorre que se trata de instituto típico do direito testamentário, do qual se originou. Se avençado por meio do direito obrigacional, não sofrerá as restrições próprias da sucessão. Se instituído por meio de doação, que muito se aproxima dos legados, os princípios sucessórios serão aplicados, em virtude das similitudes e dos reflexos no direito sucessório. Se inserido em negócio oneroso, tratar-se-á de contrato atípico, que apenas usa o mecanismo básico do instituto original. Ver-se-á, nesse caso, o fenômeno sob o prisma de um negócio jurídico entre vivos.” Direito Civil, vol. VII, cit., p. 282). Veja-se Tratado de Direito das Sucessões, cit., p. 290.

 

Caio Mário definiu o instituto como sendo a “instituição de herdeiro ou legatário, com o encargo de transmitir os bens a uma pessoa a certo tempo, por morte, ou sob condição preestabelecida” (Instituições de Direito Civil, cit., p. 295).

 

Para Itabaiana, “fideicomisso é a instituição de herdeiros ou legatários, feita pelo testador, impondo a um deles, o gravado ou fiduciário, a obrigação de, por sua morte, a certo tempo, ou sob certa condição, transmitir a outro, que se qualifica de fideicomissário, a herança ou legado.” (Tratado de Direito das Sucessões, cit., p. 288).

 

Eduardo Oliveira Leite aponta três características do instituto, “a) a dupla disposição testamentária; b) a obrigação de conservar e restituir os bens; e c) a ordem sucessiva, i. é, a execução daquela obrigação ou substituição fideicomissária deferida ao tempo da morte do fiduciário.” (Comentários ao Novo Código Civil, cit., p. 609). Dupla disposição testamentária porque o testador transmite a herança ou legado ao fiduciário e ao fideicomissário de uma só vez, apenas fazendo-o numa ordem sucessiva, ou seja, transmitindo ao fiduciário, para que a certo tempo, morte ou condição, entregue ao fideicomissário. Sendo a propriedade resolúvel, terá o fiduciário que conservá-la, garantindo, o parágrafo único do art. 1.953 ao fideicomissário que “o fiduciário é obrigado a proceder ao inventário dos bens gravados, e a prestar caução de restituí-los se o exigir o fideicomissário”.

 

Pode o testador instituir livremente o fideicomisso para porção da herança ou legado. Mas já se decidiu que não poderá haver fideicomisso para burlar a legítima dos herdeiros necessários. (“Fideicomisso – Instituto que não pode servir para deserdação ou mera atribuição de usufruto ao herdeiro necessário para que a herança seja transmitida a terceiro – Legítima do herdeiro necessário que não é alcançada por ato de vontade do autor da herança – Interpretação do art. 1.773 do CC que, conforme interpretação de tal artigo 1.773, o fideicomisso não pode servir para deserdação ou mera atribuição de usufruto ao herdeiro necessário para que a herança seja transmitida a terceiro, pois a instituição de herdeiro ou legatário é ato de vontade que não alcança a legítima do herdeiro necessário, cujo direito independe de ato de vontade do autor da herança (RT 789/222)”.

 

Na verdade não consiste o fideicomisso numa substituição. Embora seja denominada pela lei de “substituição fideicomissária”, necessário admitir não se tratar, tecnicamente, de uma substituição. Nesta, o testador indica um destinatário para a hipótese do herdeiro ou legatário não querer ou não poder aceitar, o que difere do fideicomisso, que é a instituição de um herdeiro ou legatário, que receberá a deixa, permanecendo com o dever de passá-la ao fim de um tempo, condição ou sua morte a outra pessoa.

 

Bem comentou Eduardo Oliveira Leite o art. 1.951 do Código Civil, citando Pontes de Miranda, ao dizer que “o Código Civil brasileiro “encambulhou” (juntou, uniu, ligou) as substituições vulgares e os fideicomissos, coisas distintíssimas. No fideicomisso, a sucessividade nos bens é essencial. O fideicomissário não recolhe os bens no instante da abertura da sucessão.

 

Na substituição, não há sucessividade temporal, e sim, instituição (Comentários ao Novo Código Civil, cit., p. 607. Ver também Silvio Salvo Venosa, Direito Civil, vol. VII, cit., p. 281) de um, em vez de outro (sub institutio).

 

Na substituição vulgar, diferentemente do que ocorre com o fideicomisso, há apenas uma liberalidade. Em vez de B, após A, a substituição vulgar consiste em instituição de A ou B. Para o fideicomisso exige-se a ordem sucessiva, dupla disposição, duas liberalidades, duas heranças, ou dois legados. Se uma ocorre na falta de outra, não se dispôs duplamente, de modo que ou uma das pessoas herda ou herda a outra.”

 

No fideicomisso, portanto, existe uma disposição testamentária na qual é instituído um herdeiro ou legatário, denominado fiduciário, o qual passará a certo tempo, condição ou sua morte a herança ou legado ao fideicomissário. O testador é denominado fideicomitente.

 

O fideicomissário é herdeiro não do fiduciário, mas sim do fideicomitente (testador). Assim, embora se diga na doutrina que o fiduciário “transmite”  a herança ou legado ao fideicomissário, o certo é que essa transmissão se dá pela droit de saisine, ou seja, dupla transmissão pelo próprio testador ao fiduciário e ao fideicomissário, apenas, de maneira sucessiva. (Maria Helena Diniz, por exemplo, conceituando o fideicomisso, diz que há uma “dupla liberalidade, em ordem sucessiva, ao fiduciário e ao fideicomissário, pois o fiduciário receberá, desde logo, a posse e a propriedade da herança ou do legado, transmitindo-o ao fideicomissário”. Curso de Direito Civil Brasileiro, 6ª vol., Saraiva, 2002, p. 269. Se há uma dupla liberalidade, como a própria conceituada civilista expôs, entendemos que não se deve utilizar o termo transmissão (que em direito das sucessões possui significado técnico) para a devolução do bem fideicometido ao fideicomissário pelo fiduciário.

 

À própria leitura do art. 1.951 do CC já se impõe tais conclusões, quando narra que “a herança ou legado se transmite ao fiduciário, resolvendo-se o direito deste, por sua morte, a certo tempo ou sob certa condição, em favor de outrem que se qualifica de fideicomissário”. Da mesma forma, pelo Código Civil português, no art. 2.286º, “diz-se substituição fideicomissária, ou fideicomisso, a disposição pela qual o testador impõe ao herdeiro instituído o encargo de conservar a herança, para que ela reverta, por sua morte, a favor de outrem; o herdeiro gravado com o encargo chama-se fiduciário, e fideicomissário o beneficiário da substituição”.

 

Curiosamente, no entanto, o Código Civil de 1916, em seu art. 1.733, utilizava, atecnicamente, o termo “transmitir”, quando mencionava a entrega dos bens ao fideicomissário pelo fiduciário. (“Art. 1.733. Pode também o testador instituir herdeiros ou legatários por meio de fideicomisso, impondo a um deles, o gravado ou fiduciário, a obrigação de, por sua morte, a certo tempo, ou sob certa condição, transmitir ao outro, que se qualifica de fideicomissário, a herança, ou o legado”).

 

Por este motivo, não deve ser aceito o posicionamento de Silvio Venosa, de que “os motivos que excluem da sucessão os herdeiros e legatários por indignidade devem também se aplicar ao fideicomissário com relação ao fiduciário” (O civilista expõe em seguida que “sumamente imoral seria permitir que o fideicomissário recebesse os bens fideicomitidos, se atentasse contra a vida do fiduciário, por exemplo. O mesmo se diga das demais causas, não tão graves, de indignidade, do art. 1.814 (antigo art. 1.595) que, também permitem essa exegese, e vão ao encontro do espírito da lei.” Direito Civil, vol. VII, cit., p. 287). Entretanto, não sendo o fideicomissário herdeiro do fiduciário, não há correspondência entre o ato praticado pelo fideicomissário em relação ao fiduciário e os efeitos jurídicos da indignidade.

 

Seria ato de indignidade (em seu conceito jurídico) do fideicomissário, por exemplo, se atentasse contra a liberdade de testar do fiduciário? Qual a relação com o bem fideicomitido, se tal bem já lhe foi transmitido pelo fideicomitente, sendo propriedade apenas resolúvel do fiduciário? Ora, o fideicomissário não depende do testamento do fiduciário. Por tais razões entende-se não se aplicar neste aspecto a indignidade), na medida em que o fideicomissário não é herdeiro do fiduciário, como já dito, e sim, diretamente do fideicomitente. (Neste sentido, ver Giselda Hironaka, in Curso Avançado, cit., p. 429).

 

O fiduciário tem, portanto, propriedade restrita e resolúvel (art. 1.953), pois deve transmiti-la (rectius, entregá-la, passá-la) ao fideicomissário e não aos seus próprios herdeiros. É denominada pela lei de resolúvel exatamente pelo caráter temporário da propriedade (Orlando Gomes, Direitos Reais, Forense, 16ª ed., p. 236) do fiduciário. Embora possa o fiduciário permanecer com o domínio durante toda sua vida, é certo que a impossibilidade de transmiti-la a seus herdeiros (exceto se houver caducidade do fideicomisso, quando a propriedade se consumará em mãos do fiduciário; mas mesmo existindo exceções, deve-se considerá-la limitada e resolúvel, por ser esta a essência do fideicomisso) já importa numa limitação temporal, sendo, pois, resolúvel.

 

A doutrina costuma mencionar que o fideicomissário é o titular de um direito eventual (Assim, Caio Mário, in Instituições de Direito Civil, cit., p. 303; Silvio de Salvo Venosa, Direito Civil, vol. VII, cit., p. 282; Orlando Gomes, Direito das Sucessões, cit., p. 196). O termo eventual, entretanto, liga-se a fato ou evento futuro e incerto (O art. 121 do CC, por exemplo, narra que “considera-se condição a cláusula que, derivando exclusivamente da vontade das partes, subordina o efeito do negócio jurídico a evento futuro e incerto.” Com o mesmo vocabulário jurídico, o art. 130 do CC dispõe que “ao titular de direito eventual, no casos de condição suspensiva e resolutiva, é permitido praticar os atos destinados a conservá-lo.” Diferentemente, quando trata do “termo”, o mesmo Código não utiliza a expressão “eventual”.), não se adaptando aos termos “morte” e “certo tempo”, previstos no art. 1.951.


Entretanto, o direito do fideicomissário deve ser mesmo considerado eventual. Embora tenha dito Orlando Gomes tratar-se de um direito diferido e não mera expectativa de direito (“Ocorrendo a substituição, torna-se adquirido esse direito eventual. Costuma-se dizer que até a aquisição tem simples expectativa de direito, mas, em verdade, é titular de um direito diferido, ao qual pode renunciar e até ceder, praticando o ato de disposição incompatível com a mera expectativa”  Talvez tenha se referido ao conceito de Itabaiana de Oliveira, por ter este último doutrinador dito que “o fideicomissário é, pois, um herdeiro, ou legatário, instituído sob a condição suspensiva de receber e para quem a expectativa do direito (spes dibitum iri) sobre a herança, ou o legado, só se cristaliza, em realidade, com o advento do termo que faz cessar o direito do fiduciário”. Tratado de Direito das Sucessões, cit., p. 293.), ainda assim, poderá o fideicomissário não vir a receber a herança ou o legado, o que mostra ser seu direito (ainda que exista desde a saisine) mesmo eventual. Assim, nas hipóteses de o fideicomissário morrer antes do fiduciário (art. 1.958), se renunciar seu direito sucessório (art. 1.955), ou se a coisa perecer em mãos do fiduciário (Ver Giselda Hironaka, Curso Avançado de Direito Civil, cit., p. 431.) sem que tenha havido culpa deste, caducará o fideicomisso, o que nos revela que seu direito, ainda que não tenha sido constituído sobre uma condição, pode ser considerado eventual. [...] (Ricardo da Silva Bastos, em artigo publicado em 18/02/2019, no site bastosbertolaccini.adv.br, intitulado “Direito de acrescer e substituições testamentárias”, comentários aos artigos precedentes, CC 1.941 e ss., acessado em 24/09/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD). 

Impende-se os comentários da Equipe de Guimarães e Mezzalira: Na substituição fideicomissária tem-se o fiduciário (primeiro beneficiado) e o fideicomissário, pessoa que, realmente, deverá receber a coisa fideicomitida. O que quer o testador? – que alguém receba a coisa, uma pessoa de sua confiança, por um tempo ou até sua morte e outra que tornar-se-á beneficiário com a morte do primeiro ou cumprido o tempo estabelecido. Essa instituição data da época dos romanos, vindo até à atualidade. Sempre haverá uma pessoa de muita confiança, que ficará com a coisa como usuário, até que o outro, inexistente, mas podendo vir a ser concebido dentro de um prazo, chegar a uma certa idade ou coisa semelhante. No Código Beviláqua diferente era tratado o instituto. Houve reação do pode econômico e o resultado aí está, como se vê do artigo seguinte.

 

Comenta Arnaldo Rizzardo que a substituição fideicomissária envolve dupla disposição, designando uma pessoa e, a segunda. Não se trata de dupla denominação de patrimônio, mas uma só, que, a certo tempo ou causa, entregará o objeto legado a outra. Há uma concomitância. (Rizzardo, Arnaldo. Direito das Sucessões, 4ª ed., Rio de Janeiro: Forense, p. 494).


Jurisprudência: Apelação Cível. Registro de Testamento. Validade. Morte do Legatário. Fideicomisso. Não perde a eficácia o testamento, com o falecimento do legatário antes da abertura do testamento, se estabelecida pela testadora a substituição fideicomissária em favor dos netos. Aplicação do art. 1.951, do CC/02. Sentença desconstituída para prosseguimento do processo na origem. Apelação Provida. (AC 70041424201, 7ª CV. TJRS, Relator: André Luiz Planella Villarinho, J 23/08/2011). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.951, acessado em 24/09/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.952. A substituição fideicomissária somente se permite em favor dos não concebidos ao tempo da morte do testador.

 

Parágrafo único. Se, ao tempo da morte do testador, já houver nascido o fideicomissário, adquirirá este a propriedade dos bens fideicomitidos, convertendo-se em usufruto o direito do fiduciário.

Há reconhecimento de inovação do dispositivo na doutrina do Relator, como expõe: Este dispositivo traz uma inovação ao nosso direito, estabelecendo importante restrição à substituição fideicomissária. O testador não pode eleger qualquer pessoa para ficar com a herança ou legado depois do fiduciário, O fideicomissário tem de ser pessoa ainda não concebida (prole eventual) ao tempo da morte do testador (art. 1.799, I).

O parágrafo único prevê o caso de já ter nascido o fideicomissário ao tempo da morte do testador, e resolve: adquirirá este a propriedade dos bens fideicomitidos, e o fiduciário, que seria o dono, tem o direito convertido em usufruto (art. 1.394). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 1.015, CC 1.952, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 24/09/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Entretanto, alerta Ricardo da Silva Bastos, para a Prole eventual. - O Novo Código Civil limitou o alcance do instituto, a impor a substituição fideicomissária somente aos não concebidos ao tempo da abertura da sucessão (art. 1.952 do CC). O parágrafo único do art. 1.952 admite, no entanto, que se o fideicomissário já tiver nascido no momento da abertura da sucessão adquirirá a propriedade do bem transmitido, convertendo-se em usufruto o direito do fiduciário. O Código Civil de 1916 não continha disposição semelhante, sendo esta uma significativa alteração do instituto do fideicomisso.

 

A nova roupagem do fideicomisso, no entanto, deve ser analisada com a devida atenção. O caput do art. 1.952 narra que “a substituição fideicomissária somente se permite em favor dos não concebidos ao tempo da morte do testador”. Assim, deve-se considerar nulo o fideicomisso se contemplado alguém já existente (ao menos concebido) na data da disposição testamentária. A conversão do fideicomisso em usufruto acontecerá se ao tempo da morte do testador já houver nascido o fideicomissário, só se podendo admitir o fideicomisso, nos termos do art. 1.952 se o fideicomissário for concebido após a morte do fideicomitente. (Giselda Hironaka em excelente exposição, demonstra as três hipóteses: “no sistema atual o fideicomisso só é passível de validade quando a deixa seja escrita em benefício de alguém ainda não concebido, a um indivíduo potencial. Se a pessoa já existia, ao menos como nascituro, ao tempo da deixa, nulo será o fideicomisso assim engendrado. Se, por outro lado, o beneficiário sucessivo da deixa testamentária não fora concebido no entretempo entre a facção do testamento e a morte do testador, subsistirá o fideicomisso. Por fim, se o fideicomissário fora concebido no período considerado na hipótese anterior, reger-se-á a deixa testamentária pelas regras atinentes ao usufruto, consoante o disposto no parágrafo único do art. 1.952.” Curso de Direito Civil, cit., p. 433).

 

Cabe dizer, entretanto, que o fideicomisso, conforme já visto, por disposição do art. 1.952 do CC, só se admite em favor dos não concebidos ao tempo da morte do testador, ou seja, em favor de prole futura. Portanto, não tendo o fideicomissário ainda nascido, restaria a pergunta de quem poderia exigir tal caução, tendo Caio Mário sugerido que possa “a caução ser exigida por quem tenha a guarda dos interesses do fideicomissário em expectativa”. (Instituições de Direito Civil, vol. VI, cit., p. 304). Sem dúvida, deveria o legislador ter apresentado uma solução para tanto, indicando quem deve resguardar os interesses do fideicomissário, ainda não concebido.

 

São direitos do fiduciário: a) Usar e gozar da coisa como proprietário legítimo que é. Enquanto durar seu título, poderá usufruir de seus direitos de proprietário; b) Alienar o bem fideicomitido. Como proprietário dos bens transmitidos em fideicomisso, o fiduciário pode alienar ou gravar com penhor ou hipoteca a coisa. Entretanto, com o implemento da condição, termo ou sua morte, resolve-se o domínio do adquirente e o bem é transferido ao fideicomissário. Portanto, trata-se de uma alienação sob condição resolutiva, pois mesmo com a alienação do bem pelo fiduciário permanecerá o fideicomissário com seu direito eventual inatingível. (Washington de Barros Monteiro, Curso de Direito Civil, cit., p. 236).

 

Nada impede que o testador institua o fideicomisso com cláusula de inalienabilidade, “quando realmente deseja que os bens fideicomitidos cheguem as mãos do fideicomissário”(Silvio Rodrigues, Direito Civil, cit., p. 248).Tal temor relaciona-se, evidentemente, com maior pertinência quanto aos bens móveis. Entretanto, há que se levar em conta, no que respeita aos bens móveis, o fato de que o fideicomisso deverá ser averbado na matrícula do imóvel, conforme o art. 167, II, nº 11, da Lei de Registros Públicos (Lei 6.015/73). E, “enquanto não houver registro, o fideicomisso só opera entre fiduciário e fideicomissário. Alienado o bem pelo fiduciário, valerá para os terceiros a alienação, não podendo o fideicomissário reivindicá-lo. Deve ser examinada, contudo, a boa-fé do terceiro adquirente. Se não puder reivindicar o bem, caberá ao fideicomissário pedir o valor da herança ou legado ao fiduciário, quando subentrar no direito sucessório, nunca antes.”(Silvio Salvo Venosa, Direito Civil, vol. VII, p. 285).  

 

A doutrina, (Ver Itabaiana de Oliveira, Tratado de Direito das Sucessões, cit., p. 295.) sempre considerou a falta de legitimidade e a exclusão do fideicomissário como hipótese de caducidade do fideicomisso. O novo Código Civil, no entanto, ao dispor no art. 1.952 que o fideicomisso será instituído para contemplar prole futura, acabou por afastar esta hipótese de caducidade.


Caio Mário (Instituições de Direito Civil, cit., p. 306.), porém, admite a indignidade do fideicomissário se “ao tempo da abertura da sucessão, já estiver vivo (caso do parágrafo único do art. 1.952) e em idade suficiente para a prática de qualquer dos atos descritos no art. 1.814.” Mas deve-se ressaltar que nesta hipótese o fideicomisso já tinha se transfigurado, por força do próprio parágrafo único do art. 1.952 em usufruto, não se podendo incluir tal indignidade no elenco das caducidades do fideicomisso. (Ricardo da Silva Bastos, em artigo publicado em 18/02/2019, no site bastosbertolaccini.adv.br, intitulado “Direito de acrescer e substituições testamentárias”, comentários aos artigos precedentes, CC 1.941 e ss., acessado em 24/09/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

A disposição da Equipe de Guimarães e Mezzalira acredita que a interferência do poder econômico tornou quase inviável o fideicomisso. A primeiro condição para a sua existência é que o fideicomissário não existe na época da morte do testador. Aquele terá de nascer ou ser concebido entre a data do óbito do testador e dois (2) após. Embora o instituto venha desde o Direito romano (fides tua committo, com o significado literal de “confio na tua fidelidade”), dois milênios, a ingerência dos “elevados valores financeiros” (Creio ter a Equipe ou o autor se constrangido e, portanto, não usado o termo ético/moral, nota VD), atuais tornou quase inviável a sua formação testamentária, sendo mais fácil deixar bens elegendo usufrutuário e proprietário (nuproprietário) (Rizzardo, Arnaldo, ob. cit., p. 495),

 

Avança um pouco mais Paulo Nader, complementando: O instituto surdiu em Roma, inicialmente sem validade jurídica, pois consistia em simples pedido formulado pelo autor hereditatis ao sucessor legítimo ou testamentário (fiduciário) para fazer chegar determinada coisa ao poder de outrem (fideicomissário). (Nader, Paulo. Curso de Direito Civil. V. 6, 2009. Rio de Janeiro: Forense, p. 273). Pode ocorrer, também, que o fideicomissário já esteja vivo, quando adquirirá os bens fideicomitidos, proprietário que será, e o fiduciário passará a ter o usufruto sobre esses bens.


Jurisprudência. “(...) Por fim e apenas a título complementar, não integrando, portanto, esta decisão, importa considerar que sob a ótica do CC/2002, as hipóteses de instituição de fideicomisso ficam restritas à salvaguarda de prole eventual, o que se extrai do art. 1.952, ao estabelecer que a substituição fideicomissária somente se permite em favor dos não concebidos ao tempo da morte do testador, o que sinaliza a intenção de se proteger os interesses coletivos e familiares relacionados à destinação do patrimônio deixado pelo autor da sucessão. Evitar-se-á, dessa forma, a disposição de fideicomisso como ocorrido nos autos, em que a ordem sucessiva foi invertida, subvertendo, assim, o instituto. (...)” (trecho do voto prolatado pela Min. Nancy Andrighi – no REsp 820814 SP 2006/0031403-9, STJ, J 09/10/2007, T-3, P DJ 25/10/2007, p. 168). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.952, acessado em 24/09/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.953. O fiduciário tem a propriedade da herança ou legado, mas restrita e resolúvel.

Parágrafo único. O fiduciário é obrigado a proceder ao inventário dos bens gravados, e a prestar caução de restitui-los se o exigir o fideicomissário. 

Valorize-se, pois, o comentário doutrinário do relator: O fiduciário é herdeiro ou legatário, mas seu direito, embora atual, é restrito, contingente, resolúvel, pois está na espera o fideicomissário, que tem um direito eventual, um direito expectativo à herança.

A principal obrigação do fiduciário é a de bem conservar os bens, para sua futura entrega ao fideicomissário, daí os deveres mencionados no parágrafo único: proceder ao inventário dos bens gravados e, se isso for exigido pelo fideicomissário, prestar caução de restituí-los. O inventário relaciona, especifica e descreve os bens sujeitos ao fideicomisso, tratando-se de providência obrigatória. A caução é garantia especial, com o objetivo de assegurar o cumprimento da restituição dos bens. A caução, todavia, depende de exigência do fideicomissário. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 1.015-016, CC 1.953, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 24/09/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Entre os deveres do fiduciário, como cita Ricardo da Silva Bastos, está o de Inventariar os bens fideicomitidos e prestar caução de restituí-los se o exigir o fideicomissário (art. 1953, parágrafo único). O fiduciário deverá não somente entregar a herança ou legado, como também inventariar os bens a serem entregues ao fideicomissário, advertindo-nos Eduardo de Oliveira Leite que “o fiduciário não pode ficar isento da obrigação de proceder ao inventário dos bens gravados, nem mesmo por determinação do testador, por ser matéria de ordem pública. Nem mesmo o fideicomissário poderá ser obstáculo a que o fiduciário proceda ao inventário, a que por lei fica obrigado” (Comentários ao Novo Código Civil, cit., p. 616). Quanto à exigência de caução por parte do fideicomissário, constitui um direito deste, com fundamento no parágrafo único do art. 1.953 do CC. A prerrogativa deve ser vista como forma de prevenir excessos do fiduciário, ou garantir a existência dos bens que estiverem na iminência de serem deteriorados, o que deve ser demonstrado pelo fideicomissário. Mas deve-se compreender a exigência no que diz respeito aos bens móveis, por serem bens de “fácil transmissão e difícil controle” (Silvio Salvo Venosa, Direito Civil, vol. VII, cit., p. 285). 

Curiosamente, no entanto, o Código Civil de 1916, em seu art. 1.733, utilizava, atecnicamente, o termo “transmitir”, quando mencionava a entrega dos bens ao fideicomissário pelo fiduciário. “Art. 1.733. Pode também o testador instituir herdeiros ou legatários por meio de fideicomisso, impondo a um deles, o gravado ou fiduciário, a obrigação de, por sua morte, a certo tempo, ou sob certa condição, transmitir ao outro, que se qualifica de fideicomissário, a herança, ou o legado”.

 

Por este motivo, não deve ser aceito o posicionamento de Silvio Venosa, de que “os motivos que excluem da sucessão os herdeiros e legatários por indignidade devem também se aplicar ao fideicomissário com relação ao fiduciário” (O civilista expõe em seguida que “sumamente imoral seria permitir que o fideicomissário recebesse os bens fideicomitidos, se atentasse contra a vida do fiduciário, por exemplo. O mesmo se diga das demais causas, não tão graves, de indignidade, do art. 1.814 (antigo art. 1.595) que, também permitem essa exegese, e vão ao encontro do espírito da lei.” Direito Civil, vol. VII, cit., p. 287. Entretanto, não sendo o fideicomissário herdeiro do fiduciário, não há correspondência entre o ato praticado pelo fideicomissário em relação ao fiduciário e os efeitos jurídicos da indignidade.

 

Seria ato de indignidade (em seu conceito jurídico) do fideicomissário, por exemplo, se atentasse contra a liberdade de testar do fiduciário? Qual a relação com o bem fideicomitido, se tal bem já lhe foi transmitido pelo fideicomitente, sendo propriedade apenas resolúvel do fiduciário?

 

Ora, o fideicomissário não depende do testamento do fiduciário. Por tais razões entende-se não se aplicar neste aspecto a indignidade.), na medida em que o fideicomissário não é herdeiro do fiduciário, como já dito, e sim diretamente do fideicomitente. (Neste sentido, comentado alhures  Giselda Hironaka, in Curso Avançado, cit., p. 429). 

O fiduciário tem, portanto, propriedade restrita e resolúvel (art. 1.953), pois deve transmiti-la (rectius, entregá-la, passá-la) ao fideicomissário e não aos seus próprios herdeiros. É denominada pela lei de resolúvel exatamente pelo caráter temporário da propriedade do fiduciário (Orlando Gomes, Direitos Reais, Forense, 16ª ed., p. 236.). Embora possa o fiduciário permanecer com o domínio durante toda sua vida, é certo que a impossibilidade de transmiti-la a seus herdeiros (exceto se houver caducidade do fideicomisso, quando a propriedade se consumará em mãos do fiduciário; mas mesmo existindo exceções, deve-se considerá-la limitada e resolúvel, por ser esta a essência do fideicomisso) já importa numa limitação temporal, sendo, pois, resolúvel. (Ricardo da Silva Bastos, em artigo publicado em 18/02/2019, no site bastosbertolaccini.adv.br, intitulado “Direito de acrescer e substituições testamentárias”, comentários aos artigos precedentes, CC 1.941 e ss., acessado em 24/09/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No lecionar de Guimarães, Mezzalira e sua Equipe, o fiduciário é dono, sim, é o proprietário, mas essa propriedade não é absoluta, sendo restrita e resolúvel. O que quer dizer isso? Ele detém a coisa, poderá usufruí-la, mas terá de, cumprindo testamento, destiná-la ao fideicomissário no tempo certo. Poderá vende-la? Sim, mas o adquirente saberá que a coisa transmitida não é plena e, com certo tempo ou decorrida a condição, a coisa deverá ser entregue ao fideicomissário. Aliás, este poderá exigir que o fiduciário preste caução, evitando que venha a ter prejuízo.

Jurisprudência: Agravo de Instrumento. Inventário. Testamento. Instituição de Fideicomisso. Falecimento dos fideicomissários antes do fiduciário. Caducidade. Legislação aplicável. Interpretação estrita de Cláusula. A legislação aplicável à solução do fideicomisso é a vigente na época do óbito do fiduciário e não àquela da morte da testadora, eis que a propriedade do bem herdado ou legado, embora resolúvel e restrita, está no âmbito jurídico do intermediário. O falecimento do fideicomissário antes da morte do fiduciário determina a caducidade do fideicomisso, pois não resta realizada a expectativa. (TJRS AI 70046212510 RS. Relator: Roberto Carvalho Fraga. DJ 11/04/2012. 7ª CV. DJe 25/04/2012). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.953, acessado em 24/09/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

quinta-feira, 23 de setembro de 2021

Direito Civil Comentado – Art. 1.947, 1.948, 1.949, 1.950 DAS SUBSTITUIÇÕES – Da Substituição vulgar e da recíproca - VARGAS, Paulo S. R. vargasdigitador.blogspot.com – digitadorvargas@outlook.com

 

Direito Civil Comentado – Art. 1.947, 1.948, 1.949, 1.950
DAS SUBSTITUIÇÕES – Da Substituição vulgar e da recíproca
- VARGAS, Paulo S. R. vargasdigitador.blogspot.com
digitadorvargas@outlook.com – Whatsap: +55 22 98829-9130
Pho Number: +55 22 98847-3044 m.me/DireitoVargas
Parte Especial – Livro V – Do Direito das Sucessões -
Título III – Da Sucessão Testamentária – Capítulo IX –-
DAS SUBSTITUIÇÕES – Seção I - Da Substituição vulgar e
da recíproca (Art. 1.947 a 1.950)

 

Art. 1.947. 0 testador pode substituir outra pessoa ao herdeiro ou ao legatário nomeado, para o caso de um ou outro não querer ou não poder aceitar a herança ou o legado, presumindo-se que a substituição foi determinada para as duas alternativas, ainda que o testador só a uma se refira.

Diz-se, segundo o relator, das opções do testador. Regula-se, aqui, a substituição vulgar ou direta, em que o testador, nomeando herdeiro ou legatário, prevê o caso de um ou outro não querer ou não poder aceitar a herança ou o legado, indicando outra pessoa — ou outras pessoas — como beneficiária da instituição. Inspiradas no Digesto, as Ordenações Filipinas (Livro 4, Tit. 87) davam exemplo de substituição vulgar: “Instituo a Pedro por meu herdeiro, e se não for meu herdeiro, seja meu herdeiro Paulo”.

 

O direito que tem o testador é de nomear substituto para o herdeiro (ou legatário) que designou. Não é lícita a nomeação de substituto para herdeiro necessário. Pelo princípio da intangibilidade da legítima, se um herdeiro necessário não quiser ou não puder aceitar a herança, esta se transfere para as pessoas indicadas na lei. Mas ao herdeiro simplesmente legitimo (facultativo) o testador pode nomear substituto. Por exemplo: “Se minhas irmãs não aceitarem a herança, meu herdeiro será Luiz Augusto”.

 

O substituto vai ficar no lugar vago, deixado pelo primeiro instituído, e recolherá a herança ou o legado. Trata-se de uma disposição alternativa (e não sucessiva), submetida a uma condição: o não querer ou não poder o  nomeado aceitar a herança ou legado. Note-se: o substituto é herdeiro ou legatário do de cujus, e não do substituído.

 

A renúncia é o exemplo típico de não querer ficar com a herança ou o legado. São casos de não poder o instituído aceitar a herança ou o legado se morreu antes do testador; se foi excluído da sucessão, por indignidade; se não tinha legitimação para suceder.


O substituto sucede nos direitos e obrigações, nas vantagens e ônus em que sucederia o primitivo nomeado (Art. 1.949). A substituição vulgar é figura antiquíssima, de raízes romanas (Inst., II, 15, pr.), e é regulada na generalidade dos Códigos: francês, wt. 898; alemão, arts. 2.096 e 2.097; suíço, Art. 487; espanhol, art. 174; italiano, Art. 688; português, Art. 2.281; chileno, Art. 1.156; peruano, art. 740; paraguaio, arts. 2.691 e 2.695; argentino, arts. 3.724 e 3.125; mexicano, art. 1.472. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 1.012-013, CC 1.947, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 23/09/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Ricardo da Silva Bastos fala no item 2. Das Substituições Testamentárias, conceituando-as em 2.1. Para Itabaiana de Oliveira, (Tratado de Direito das Sucessões, cit., p. 283.), “substituição é a disposição mediante a qual o testador chama, em lugar do herdeiro ou legatário, um outro, que se diz substituto, para que venha a fruir, no todo em parte, as mesmas vantagens e encargos, quando, por qualquer causa, a sua vocação cesse”.

Com efeito, o CC 1.947 disciplina que o testador pode substituir outra pessoa ao herdeiro ou ao legatário nomeado, para o caso de um ou outro não querer ou não poder aceitar a herança ou o legado, presumindo-se que a substituição foi determinada para as duas alternativas, ainda que o testador só a uma se refira.

A lei garante ao testador, portanto, a possibilidade de substituir um herdeiro ou legatário que não queira ou não possa receber seu quinhão ou legado, não havendo “limitação para a substituição vulgar, e, seguindo as palavras de Ney de Mello Almada, é permitido ao disponente estabelecer que, se Paulo não aceitar, caberá a herança ou legado a Sérgio, em cuja substituição funcionará Gabriela, e assim por diante”. (Giselda Hironaka, Curso Avançado de Direito Civil, cit., p. 426). (Ricardo da Silva Bastos, em artigo recente (dois anos), publicado em 18/02/2019, no site bastosbertolaccini.adv.br, intitulado “Direito de acrescer e substituições testamentárias”, comentários aos artigos precedentes, CC 1.941 e ss., acessado em 23/09/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Descortinando as possibilidades, Guimarães e Mezzalira et al, como se trata de porção disponível, pode o testador deixar o legado ou instituir herdeiro de forma direta, mas permite a lei que, não podendo o beneficiário receber, que seja substituído por uma outra pessoa ou grupo de pessoas, à sua vontade. Qualquer das duas alternativas poderá ser usada. Continua o testador soberano na distribuição de seus bens.

“A parte final do artigo contém regra interpretativa, supletiva, caso o testador não deixe clara sua vontade”. (Antonini, Mauro, in Código civil interpretado, coordenado pelo Min. Cezar Peluso. Ob. cit. p. 2.123). Por outro lado, Nelson Nery Júnior e Roa Maria Nery preferem, ao comentar o artigo, apresentar todas as possibilidades de substituição como diretas e oblíquas, vulgar, fideicomissária, negócio jurídico condicional e presunção interpretativa da vontade do testador. (Nery Jr. Nelson e rosa Maria, ob. cit. págs. 1.360/61).

Havendo substituto, deixará de existir a direito de acrescer, em havendo falta de um dos destinados. Essa alternativa é bastante usual na prática. Verificando-se o pressuposto da lei, o substituto é chamado para receber a herança como se fosse original legatário ou instituído. (MERZ, Sandro, ob. cit., p. 248).

Jurisprudência. Agravo de instrumento. Inventário. Morte de legatário no curso do inventário. O testamento deixado pela autora da herança favoreceu determinado legatário e, apenas na falta deste, é que favoreceu outro legatário. Nesse passo, falecendo o primeiro legatário após a abertura da sucessão da testadora, o bem legado transmite-se aos herdeiros do primeiro legatário, não ao segundo. Possível, contudo, a partilha o imóvel legado no mesmo inventário em que se dá cumprimento ao testamento, porquanto a primeira legatária deixou apenas um herdeiro, que também é legatário dos bens deixados pela testadora (art. 1.044 do CPC). Deram parcial provimento. (TJRS – AI 70039737556, Oitava Câmara Cível. Rel.: Rui Portanova. J 07/04/2011). (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.947, acessado em 23/09/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.948. Também é licito ao testador substituir muitas pessoas por uma só , ou vice-versa, e ainda substituir com reciprocidade ou sem ela.

Aqui, o relator especifica as formas de substituição estipuladas por lei: A substituição pode ser singular, quando o testador nomeia um só substituto, ou coletiva, quando indica vários substitutos para o herdeiro ou legatário que faltar.

Sendo vários os substitutos, dividirão a herança ou legado em partes iguais. Se, originariamente, seus quinhões são iguais. Na substituição recíproca, os herdeiros ou legatários são nomeados substitutos uns dos outros.

 A substituição recíproca pode ser geral e particular. Na substituição geral, todos substituem ao herdeiro ou legatário que não quis ou não pôde aceitar; na particular, determinados herdeiros ou legatários substituem outros, também determinados, e reciprocamente. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 1.013, CC 1.948, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 23/09/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Especificando Ricardo da Silva Bastos, em seu artigo/manual: Poderá ser singular ou plural a substituição, por ser lícito ao testador substituir muitas pessoas por uma só, ou vice-versa, e ainda substituir com reciprocidade ou sem ela (art. 1.948 do CC).

2.2. Espécies. As substituições podem ser: a) vulgar (art. 1.947 do CC), b) recíproca (art. 1.948 do CC), c) fideicomissária (art. 1.951 do CC) e d) compendiosa. 2.2.1 Substituição vulgar. A substituição vulgar consiste na previsão de um ou mais substitutos para receber a quota do herdeiro ou legatário que não quis ou não pôde aceitar. É exatamente a hipótese do art. 1.947 do CC. (Ricardo da Silva Bastos, publicado em 18/02/2019, no site bastosbertolaccini.adv.br, intitulado “Direito de acrescer e substituições testamentárias”, comentários aos artigos precedentes, CC 1.941 e ss., acessado em 23/09/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Arrematando Guimarães, Mezzalira et al, mais uma faculdade prevista na lei, para que o testador imponha sua vontade. Os nomeados jamais poderão contestar a deliberação do disponente. Afinal de contas, se o patrimônio é seu, a distribuição representa seu querer. Enquanto existir substituição não haverá direito de acrescer. Os institutos são incompatíveis, querendo o testador aventar todas as opções e evitando que bens sejam transmitidos para os herdeiros da sucessão legítima. (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.948, acessado em 23/09/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.949. O Substituto fica sujeito à condição ou encargo imposto ao substituído , quando não for diversa a intenção manifestada pelo testador, ou não resultar outra coisa da natureza da condição ou do encargo.

Continuando as exigências estipuladas por lei, remata o relator: O substituto fica no lugar do substituído, com os mesmos direitos e deveres. Sujeita-se à condição ou encargo imposto ao substituído. A não ser que o testador manifeste intenção diversa, ou não resultar outra coisa da natureza condição ou do encargo. Se a condição ou encargo estiver relacionado direta e especialmente à pessoa do instituído, não se pode irradiar ao substituto. Imagine-se o encargo de fazer uma operação cirúrgica na irmã do testador, e o substituto não é médico, mas professor de matemática. Ou sob a condição de continuar casado com a sobrinha do testador, e o substituto é solteiro. Mas o testador pode determinar que, mesmo se testando de encargo pessoal, tenha a mesma obrigação o substituto, e este haverá de cumpri-la; se não puder fazer pessoalmente, por intermédio de outrem, quando se tratar de prestação fungível. Pontes de Miranda (Tratado de direito privado, 3. ed., Rio de Janeiro, Borsoi, 1973, t. 58, § 5.825, p. 114) enuncia: “Se o instituído era pintor e a parte da herança lhe foi deixada como a função de pintar o retrato da filha, nomeado substituto terceira pessoa, e a verba diz que esta terá os mesmos encargos’, ou o substituto, sendo pintor, executará o quadro, ou, não no sendo, convidará pintor do mesmo valor que o outro”. (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 1.014, CC 1.949, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 23/09/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

No engenho, Ricardo da Silva Bastos, 2.2.1 Substituição vulgar. A substituição vulgar consiste na previsão de um ou mais substitutos para receber a quota do herdeiro ou legatário que não quis ou não pôde aceitar. É exatamente a hipótese do art. 1.947 do CC.

O substituto fica sujeito à condição ou encargo imposto ao substituído, se outra não for a vontade do testador ou não for a condição ou encargo compatível com o substituto (art. 1.949). Ou seja, a princípio, a condição ou encargo imposto ao substituído acompanha a herança ou o legado. Porém, se forem “incompatíveis com a pessoa do novo sucessor e com as circunstâncias que acompanham o substituído” (Silvio de Salvo Venosa, Direito Civil, vol. VII, Atlas, 4ª ed., p. 280), ou se outra tiver sido a vontade manifestada do testador não fica onerado o substituto.

 

Não poderia ser diferente, na medida em que tais deveres impostos pelo testador podem ser circunstanciais, não havendo, eventualmente, qualquer possibilidade do substituto cumpri-los, como no exemplo fornecido por Eduardo de Oliveira Leite, no qual, “na disposição testamentária, ‘instituo Pedro herdeiro de minha cota disponível, com a condição de pintar meu retrato’, a condição de pintar o retrato do testador é pessoal ao herdeiro, pintor, e, pois, não se transmite ao substituto.” (Comentários ao Novo Código Civil, cit., p. 603).


A regra principal, no entanto, deste dispositivo, é a de que se transmitem os encargos e as condições impostas ao instituído também ao substituto, se esta for a vontade do testador e se for possível ao substituto cumpri-la. Evidentemente que o substituto sempre terá a opção de renunciar à herança ou ao legado. (Ricardo da Silva Bastos, em artigo publicado em 18/02/2019, no site bastosbertolaccini.adv.br, intitulado “Direito de acrescer e substituições testamentárias”, comentários aos artigos precedentes, CC 1.941 e ss., acessado em 23/09/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Conclui o mecanismo a equipe de Guimarães e Mezzalira, que, em havendo encargo que o legatário deverá cumprir, o substituto receberá a coisa, permanecendo com a obrigação deixada. Mesmo ocorre com destinação de coisa ou bens sob condição. Enquanto não se cumprir, não poderá o legatário recebe-la, assim como o herdeiro instituído.


Muitas vezes o encargo é personalíssimo. Diga-se que ele seja pintor e se obriga a pintar determinado quadro, (exemplo apresentado alhures), doando-se a uma instituição. Vendo a existir a substituição, porque o primeiro não quis receber, pode o testador determinar de forma diferente, sabendo que o substituto não tem essa qualidade.  (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.949, acessado em 23/09/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Art. 1.950. Se, entre muitos coerdeiros ou legatários de partes desiguais, for estabelecida substituição recíproca, a proporção dos quinhões fixada na primeira disposição entender-se-á mantida na segunda; se, com as outras anteriormente nomeadas, for incluída mais alguma pessoa na substituição o quinhão vago pertencerá em partes iguais aos substitutos.

Desta forma explica o relator como é vista a coisa: Se os coerdeiros ou colegatários  foram instituídos em partes iguais, no caso de haver substituição recíproca, faltando um deles, os substitutos recolherão em igualdade a quota vaga. Porém, se forem desiguais os quinhões dos coerdeiros ou colegatários, em caso de substituição, os substitutos exercerão seus direitos na mesma proporção estabelecida na nomeação daqueles. A Proporção entre as quotas fixadas na primeira instituição se presume também repetida na substituição (cf. Art. 689, al. 2 do Código Civil italiano; art. 2.283, 2, do Código Civil português). Na Segunda parte deste artigo, prevê-se a introdução de mais uma pessoa como substituto, ou seja, além dos que já tinham sido primitivamente instituídos, aparece um estranho, que concorrerá com eles, no caso de substituição. Como o estranho, que concorrerá com eles , no caso de substituição, não tem quota que possa servir de base, a solução é dividir o quinhão vago em partes iguais (ex. O testador nomeia seus herdeiros Ruy, Clovis e Eliana, determinando que a herança caberá a eles em quotas desiguais; 40%, 35% e 25%, respectivamente, e prevendo que, na falta de algum dos nomeados, o seu quinhão caberá aos outros coerdeiros nomeados e a Francisco). Na hipótese de Ruy premorrer ao testador, a quota que ficou livre – 40% da herança – pertencerá, em partes iguais, a Clovis, Eliana e Francisco). (Direito Civil - doutrina, Ricardo Fiuza – p. 1.014, CC 1.950, apud Maria Helena Diniz Código Civil Comentado já impresso pdf 16ª ed., São Paulo, Saraiva, 2.012, pdf, Microsoft Word. Acessado em 23/09/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).

Concluindo seus comentários a respeito do dispositivo em pauta, CC 1.950, Ricardo da Silva Bastos, a regra principal, no entanto, deste dispositivo, é a de que se transmitem os encargos e as condições impostas ao instituído também ao substituto, se esta for a vontade do testador e se for possível ao substituto cumpri-la. Evidentemente que o substituto sempre terá a opção de renunciar à herança ou ao legado.

2.2.2. Substituição recíproca - A substituição recíproca ocorrerá se o testador instituir os próprios herdeiros ou legatários como substitutos uns dos outros. A substituição recíproca poderá ser geral ou particular. Será geral se todos os herdeiros ou legatários substituírem aquele que faltar, e particular se apenas um ou mais herdeiros ou legatários apontados pelo testador substituírem a quem não pôde ou não quis receber.

Na substituição recíproca será obedecida a proporcionalidade dos quinhões, em virtude do disposto no art. 1.950 do CC: “se, entre muitos coerdeiros ou legatários de partes desiguais, for estabelecida substituição recíproca, a proporção dos quinhões fixada na primeira disposição entender-se-á mantida na segunda; se, com as outras anteriormente nomeadas, for incluída mais alguma pessoa na substituição, o quinhão vago pertencerá em partes iguais aos substitutos.”


Itabaiana de Oliveira (Tratado de Direito das Sucessões, cit., p. 287.), a partir do art. 1.732 do CC de 1916, agora art. 1.950, expõe as três regras a serem observadas a partir da substituição recíproca. A primeira, que “se os herdeiros ou legatários forem instituídos em partes iguais, entender-se-á que os substitutos recebem partes iguais no quinhão vago”, permanecendo intacta a proporção dos quinhões, conforme estabelecido pelo testador. A segunda regra, tendo em vista o mesmo efeito, é que “se os herdeiros ou legatários forem instituídos em partes desiguais, a proporção dos quinhões, fixada na primeira disposição, entender-se-á mantida na segunda”. Portanto, se houve inicialmente distribuição desigual dos quinhões, a quota do que faltar será distribuída na mesma proporção, mantendo-se a disposição desigual entre os herdeiros ou legatários. Finalmente, “se, porém, com os herdeiros ou legatários instituídos em partes desiguais, for incluída mais alguma pessoa na substituição, o quinhão vago pertencerá em partes iguais aos substitutos”, mandamento este necessário ante a impossibilidade, nesta hipótese de se assegurar a mesma proporção. (Ricardo da Silva Bastos, em artigo publicado em 18/02/2019, no site bastosbertolaccini.adv.br, intitulado “Direito de acrescer e substituições testamentárias”, comentários aos artigos precedentes, CC 1.941 e ss., acessado em 23/09/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).


Finalizando a seção I, a Equipe de Guimarães e Mezzalira, a substituição recíproca permite que um seja substituto do outro e vice versa, ainda que os legatários ou coerdeiros recebam partes desiguais. Como o testador fixou desigualdades, poderá, em caso de substituição manter o mesmo ou determinar que a coisa ou coisas tenham outra partilha entre os que vão receber. Essas minúcias remontam ao início ou século XX, diferentes que eram os costumes. Mas a lei manteve a redação primitiva, de pouca valia nos dias atuais. (Luiz Paulo Cotrim Guimarães e Samuel Mezzalira et al, apud Direito.com, nos comentários ao CC 1.950, acessado em 23/09/2021, corrigido e aplicadas as devidas atualizações VD).