sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

A COMPLETUDE DO ORDENAMENTO JURÍDICO

1.       A COMPLETUDE DO ORDENAMENTO JURÍDICO
1.1. O Problema das Lacunas

- Por completude entende-se a propriedade pela qual um ordenamento jurídico tem uma norma para regular qualquer caso [115 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- Um ordenamento é completo quando o juiz pode encontrar nele uma norma para regular qualquer caso que se lhe apresente [115 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- De fato, o que tentamos estabelecer é sempre a unidade: a unidade negativa, com a eliminação das contradições. A unidade positiva, com o preenchimento das lacunas [117 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- A completude é algo mais que uma exigência, é uma necessidade, quer dizer, é uma condição necessária para o funcionamento do sistema [118 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- A completude é, portanto, uma condição sem a qual o sistema em seu conjunto não poderia funcionar [118 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- O problema das lacunas se dá em virtude de duas características do ordenamento:
1. O juiz não pode deixar de julgar, pois neste caso o Direito não teria segurança;
2. O juiz precisa julgar de acordo com a lei.

1.2.  O Dogma da Completude

- O dogma da completude, isto é, o princípio de que o ordenamento jurídico seja completo para fornecer ao juiz, em cada caso, uma solução sem recorrer à equidade, foi dominante, e o é em parte até agora, na tória jurídica europeia de origem romana [119 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- O dogma da completude tornou-se parte integrante da concepção estatal de Direito [120 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- A onipotência do Estado reverteu-se sobre o Direito de origem estatal, e não foi reconhecido outro Direito, senão aquele emanado, direta ou indiretamente do soberano [120 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- Para manter seu monopólio, o Direito do Estado deve servir para todo uso [121 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite].

1.3. A Crítica da Completude

- A batalha da Escola do Direito Livre contra as várias Escolas da exegese é uma batalha pelas lacunas;
- Os motivos da crítica ao dogma da completude são:
1. O envelhecimento do ordenamento;
2. A inversão entre o Estado (ponto de vista do príncipe) e a população (ponto de vista do povo), no que diz respeito à visão sociológica (a visão da importância da sociedade em relação ao Estado);
- O programa da sociologia jurídica foi o de mostrar, principalmente no início, que o Direito era um fenômeno social, e que, portanto, a pretensão dos juristas ortodoxos de fazer do Direito um produto do Estado era infundada e conduzia a vários absurdos, como o de acreditar na completude do Direito codificado [125 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];

1.4.  O Espaço Jurídico Vazio

- Conceder cidadania ao Direito Livre significava quebrar a barreira do princípio da legalidade, que havia sido colocado em devesa do indivíduo [128 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- A completude não era mais um mito, mas uma exigência de justiça; não era uma função inútil, mas uma defesa útil de um dos valores supremos a que deve servir a ordem jurídica: a certeza [128 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- Era preciso demonstrar criticamente que a completude, longe de ser um cômodo fingimento ou, pior, uma ingênua crença, era uma característica construtiva de todo ordenamento jurídico [128 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- A teoria do espaço jurídico vazio, diz que existem dois espaços jurídicos:
1. O Espaço Jurídico Pleno no qual se encontram as condutas juridicamente relevantes, previstas por lei;
2. O Espaço Jurídico Vazio no qual se encontram as condutas juridicamente irrelevantes, de liberdade jurídica;
- Até onde o Direito alcança com suas normas, evidentemente não há lacunas; onde não alcança, há espaço jurídico vazio e, portanto, não há lacuna no Direito, mas há atividade indiferente ao Direito [129 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- Esta teoria ignora as coisas que se encontram entre os dois blocos, onde há condutas juridicamente relevantes nas quais prevalece a liberdade jurídica;
- A afirmação do Espaço Jurídico Vazio nasce da falsa identificação do jurídico como o obrigatório [130 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- Na realidade, a liberdade não-jurídica, poderia ser melhor definida como “liberdade não protegida” [130 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- Trata-se daquela liberdade que é reconhecida no próprio momento em que é imposta a terceiros a obrigação jurídica de não impedir o seu exercício [130 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- O fato de que a liberdade não seja protegida não torna essa situação jurídica irrelevante, porque, no momento em que a liberdade de agir de um não está protegida, está protegida a liberdade de outro de exercer a força; e enquanto está protegida, esta é juridicamente relevante em vez da outra [132 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite].

1.5. A Norma Geral Exclusiva

- Outra teoria contra a Escola do Direito Livre afirma que não há lacunas pela razão inversa, pelo fato de que o Direito nunca falta [132 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- Uma norma que regula um comportamento não só limita a regulamentação e, portanto, as consequências  jurídicas desta regulação derivam para aqueles comportamentos [133 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- Todos os comportamentos não compreendidos na norma particular são regulados por uma norma geral exclusiva, isto é, pela regra que exclui todos os comportamentos que não sejam aqueles previstos na norma particular [133 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- Também a teoria da norma geral exclusiva tem o seu ponto fraco. Normalmente em um ordenamento jurídico não existe somente ao mesmo tempo um conjunto de normas particulares inclusivas e uma norma geral exclusiva que as acompanha, mas também um terceiro tipo de norma, que é inclusiva como a primeira e geral, como a segunda, e podemos chamar de norma geral inclusiva [135 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- Chamamos de norma geral inclusiva uma norma segundo a qual, no caso de lacuna, o juiz deve recorrer às normas que regulam casos parecidos ou matérias análogas [135 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- Portanto, cabe ao intérprete decidir se, em caso de lacuna, ele deve aplicar a norma geral exclusiva e, portanto, excluir o caso não previsto de disciplina do caso previsto, ou aplicar a norma geral inclusiva e, portanto, incluir o caso não previsto na disciplina do caso previsto [136 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- Assim, no caso de lacuna, existem pelo menos duas soluções jurídicas:
1. A consideração do caso não regulamentado como diferente do regulamentado e a consequente aplicação da norma geral exclusiva;
2. A consideração do caso não regulamentado como semelhante ao regulamentado e a consequente aplicação da norma geral inclusiva.
- Se existem duas soluções ambas possíveis, e a decisão entre as duas, cabe ao intérprete, uma lacuna existe, e consiste justamente no fato de que o ordenamento deixou impreciso qual das duas soluções é a pretendida [137 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- A lacuna consiste justamente na falta de uma regra que permita acolher uma solução em vez da outra [137 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- Assim, o ordenamento jurídico, apesar da norma geral exclusiva, pode ser incompleto. E pode ser incompleto porque entre a norma particular inclusiva e a geral exclusiva, introduz-se, normalmente, a norma geral inclusiva, que estabelece uma zona intermediaria entre o regulamentado e o não regulamentado, em direção à qual tende a penetrar o ordenamento jurídico, forma quase sempre indeterminada e indeterminável [139 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- O fato de a solução não ser mais óbvia, isto é, de não se poder tirar do sistema nem uma solução nem a solução oposta revela a lacuna, isto é, revela a incompletude do ordenamento jurídico.

1.6. As Lacunas Ideológicas

- Entende-se também por lacuna a falta não de uma solução, qualquer que seja ela, mas de uma solução satisfatória, ou, em outras palavras, não já a falta de uma norma, mas a falta de uma norma justa [140 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- Ora, com respeito ao Direito Positivo, se é óbvio que cada ordenamento tem lacunas ideológicas, é igualmente óbvio que as lacunas com as quais deve se preocupar aquele que é chamado a aplicar o Direito não são as ideológicas, mas as reais [140 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];

1.7. Vários Tipos de Lacunas


 


                                   Reais (Próprias)                     Dentro do Ordenamento Jurídico

- LACUNAS
                                 
                                   Ideológicas (Impróprias)                      Derivam do ordenamento ideal

- A lacuna própria é uma lacuna do sistema ou dentro do sistema; a lacuna imprópria deriva da comparação do sistema real com o sistema ideal [143 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- Temos a lacuna própria somente onde, ao lado da norma geral exclusiva, existe também uma norma geral inclusiva, e o caso não regulamentado pode ser encaixado tanto em uma como na outra [143 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- O que distingue é a forma pela qual podem ser eliminadas:
1. A lacuna imprópria somente através da formulação de novas normas; São completáveis somente pelo legislador;
2. A lacuna própria mediante as leis vigentes; são completáveis por obra do intérprete.
- O problema da completude do ordenamento jurídico é se há e como podem ser eliminadas as lacunas próprias;
- Quanto aos motivos que as provocam as lacunas podem ser:
1. Subjetivas: quando dependem de algum motivo imputável ao legislador;
2. Objetivas: quando dependem do desenvolvimento das relações sociais; das novas invenções, de todas aquelas causas que provocam um envelhecimento dos textos legislativos;
- AS LACUNAS SUBJETIVAS podem ser:
1. Voluntárias: são aquelas que o próprio legislador deixa de propósito, quando a matéria é muito complexa, e é melhor confiá-la, caso por caso, à interpretação do juiz;
2. Involuntárias: são aquelas que dependem de um descuido do legislador.
- Em alguns casos o legislador distribui diretrizes que traçam as linhas gerais da ação a ser cumprida, mas deixam a determinação dos particulares a quem as deve executar ou aplicar;
- Onde age o poder criativo daquele que deve aplicar as normas do sistema, o sistema está sempre, em sentido próprio, completo;
- As lacunas também se dividem:
1. PRAETER LEGEM: Existem quando normas expressas para ser muito particulares, não compreendem todos os casos que podem apresentar-se a nível dessa particularidade;
2. INTRA LEGEM: Quando as normas são muito gerais e revelam, no interior das disposições dadas, vazios ou buracos que caberá ao intérprete preencher.

1.8. Heterointegração e Autointegração
 


                                                      Autointegração
LACUNAS REAIS   
                                                                    Heterointegração

 


                                                                              Analogia-Legis
      AUTOINTEGRAÇÃO   
                                                                           Analogia-Iuris


 
                                                                              Costumes
                                                                              Direito Judiciário (Jurisprudência)
     HETEROINTEGRAÇÃO                   Direito Científico (Doutrina)
Juízo de Equidade

- No Brasil, costumes fazem parte da analogia iuris; jurisprudência e doutrina não são fontes de Direito;
- Entre os casos inclusos expressamente e os casos exclusos há, em cada ordenamento uma zona incerta de casos não regulamentados mas potencialmente colocáveis na esfera de influência dos casos expressamente regulamentados [146 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- Se, estaticamente considerados, um ordenamento jurídico não é completo a não ser pela norma geral exclusiva, dinamicamente considerado, porém, é completável [146 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- A HETEROINTEGRAÇÃO é operada através do:
1. Recurso a ordenamentos diversos;
2. Recurso a fontes diversas daquela que é dominante (a lei);
- A AUTOINTERGRAÇÃO consiste na integração cumprida através do mesmo ordenamento, no âmbito da mesma fonte dominante;
- No caso da HETEROINTEGRAÇÃO o recurso a ordenamentos diversos podem ser:
1. Reenvio a ordenamentos anteriores no tempo;
2. Reenvio a ordenamentos vigentes contemporâneos;
- Ainda no caso da HETEROINTEGRAÇÃO o recurso a outras fontes diversas da dominante podem ser:
1. Costumes;
2. Direito Judiciário;
3. Direito Científico;
4. Juízo de Equidade.

1.9.  A Analogia

- Com os métodos de autointegração o legislador pretende ou presume que em caso de lacuna a regra deve ser encontrada no âmbito mesmo das leis vigentes, quer dizer, sem recorrer a outros ordenamentos nem a fontes diversas da lei [151 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- Entende-se por analogia o procedimento pelo qual se atribui a um caso não regulamentado a mesma disciplina que a um caso regulamentado semelhante [151 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- É preciso que entre os dois casos exista não uma semelhança qualquer, mas uma semelhança relevante, é preciso ascender dos dois casos a uma qualidade comum a ambos que seja ao mesmo tempo a razão suficiente pela qual ao caso regulamentado foram atribuídas aquelas e não outras consequências [153 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- Por razão suficiente entendemos aquela que tradicionalmente se chama a ratio legis. Então diremos que para que o raciocínio por analogia seja lícito no direito é necessário que os dois casos, o regulamentado e o não regulamentado tenham em comum a ratio legis [154 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- Analogia legis significa utilizar uma norma que está no ordenamento e aplicá-la;
- Analogia iuris significa utilizar os princípios do ordenamento;
- A interpretação extensiva estende os termos de uma norma para que ela se aplique a um caso real não previsto;
- Por analogia iuris entende-se o procedimento pelo qual se tira uma nova regra para um caso imprevisto não mais da regra que se refere a um caso singular, mas de todo o sistema ou de parte dele [154 - Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite];
- O efeito da extensão analógica (analogia legis) é a criação de uma nova norma jurídica;
- O efeito da interpretação extensiva é a extensão de uma norma para casos não previstos por essa;
- Tanto na analogia legis como na analogia iuris o juiz cria Direito;
- Na interpretação extensiva, apenas estende-se uma norma existente.

1.10.                     Os Princípios Gerais do Direito

- A recorrência aos Princípios Gerais de Direito é tradicionalmente conhecida como analogia iuris;
- Os Princípios Gerais de Direito são, para Bobbio, normas fundamentais ou generalíssimas do sistema, as normas mais gerais.



REFERÊNCIAS

- CIÊNCIA POLÍTICA E TEORIA DE ESTADO - CPTE - 2° e 3º BIMESTRE – PROF. MAURO IASI
- DIREITO CONSTITUCIONAL - 1º, 2º e 3º BIMESTRE - PROF. ROBERTO BAHIA
- DIREITO CIVIL I - 1°, 2º, 3º e 4º BIMESTRE PROF GERSON A. CALGARO
- DIREITO ROMANO - 1°, 2º, 3º e BIMESTRE. Prof. HÉLCIO M. F. MADEIRA
- FILOSOFIA GERAL – 3º BIMESTRE – PROFESSOR ROBSON MEZADRI
- IED – INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO – 2º, 3º E 4º BIMESTRE – PROFESSORA MÁRCIA A. ANTUNES
- Justiça, validade e eficácia das Normas Jurídicas - Carlos Henrique Bezerra Leite
- Thomas Mark – Direito Romano - 8ª ed. p. 74 a 149.

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